Porque sei que estás bem…

Deitado na cama e olhando o tecto branco, defini uma tela. Emoldurei parte do tecto e, partindo do branco absoluto, comecei a desenhar um esboço. Após as múltiplas edições efectuadas, na busca do perfeito absoluto, relembrei agruras e usei cores fortes e, nas emoções plenas, usei o verde mais atraente que a paleta de cores produziu e que temo não conseguir reproduzir…

Para as surpresas que a vida me vai dando usei um azul bebé, como que o embrião de uma obra que sabemos ser capazes de construir e superar. Como o interromper de um acordo tácito que tínhamos, e que não incluía cumprimentos, como armadilha futura para ser obrigado a cumprimentar de volta. Amei…

A imaginação ia criando novas cores sem que o pincel conseguisse acompanhar. O amarelo parecia ser brilhante demais mas era um bom ponto de referência para a imaginação carente de direcção. Rematou a obra com uns traços quase que secretos, como se acreditasse no destino e o soubesse replicar na obra, como se sentisse estar a ser conduzido mas a gostar de estar no lugar do passageiro. Uma espécie de recriar uma viagem pelo deserto em que o único oásis eras tu.

Não assinou a obra. Aguarda, tão serenamente quanto sempre esteve, um reencontro imaginário em que tentarão superar o maior abraço do mundo – recorde esse que já é detido por eles.

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A inércia da pesca…

Quando as pessoas estão a dormir nós, enquanto observadores, devemos respeitar esse sono e não incomodar – a menos que o sonho que idealizamos seja razão mais do que suficiente para arrancar a vítima do seu descanso. Infelizmente há muitos anzóis colocados na linha dos sonhos e os “peixes” que ousam sonhar, por vezes, deixam-se levar pelo engodo e, imitando os seus primos terrenos, mordem o anzol.

Há os mais fortes, mais sortudos, mais ágeis e os que, numa soma de todas essas virtudes, conseguem libertar-se do anzol mas outros, mais curiosos em saber que bicho é aquele na ponta daquela coisa brilhante, são agarrados pelo metal retorcido sem dó ou piedade! Uma questão de curiosidade fatal – bom título para um filme – em que o simples querer saber mais do peixe se transforma na refeição do pescador. A perversão de tudo o que nos é ensinado: que devemos sempre seguir, com curiosidade, aquilo que desperta em nós esse sentimento!

Enquanto agarrado ao anzol, o peixe só pensa em libertar-se! Constata o erro, assim que morde a curiosidade e começa um bailado desenfreado pela vida! Mas, nesta luta entre a natureza e o ser humano, as probabilidades do peixe são muito baixas – nem um 60/40 é, quase que o equivalente a alguém dar call a uma bet de 4BB’s com Ax na esperança de ver um A bater no flop e, mesmo após o A não ter batido, continuar a cobrir as apostas do adversário até perder as fichas todas.

Há peixes que, mercê de um bailado que deve ser ensinado no Bolshoi dos peixes, conseguem libertar-se e outros que, para gáudio de todos nós que gostamos de peixe, não conseguem. Dependendo do baile que dão, os peixes poderão ou não sobreviver. Eventualmente até haverá peixes que, com um sorriso entre guelras, saltam de boca aberta para o anzol mas não me parece que esse seja o comportamento maioritário e, certamente, não será o que o pescador espera quando, de manhã cedo, parte para a pesca.

Os linguados, esse sim, têm uma boa vida. A virar-se de frente ou costas – conforme estão na rocha ou areia – são os camaleões do fundo do mar. Certamente sabem o quão saborosos são e daí a atitude de dupla personalidade, conforme frequentam a areia ou as rochas. Com sorte, muita sorte, qualquer um de nós pode mergulhar uma mão na areia e, apertando forte, sacar um linguado mas, o que se passa a seguir é que conta: levo o linguado e como-o ou finjo não ter força para apertar e solto-o? É nessa inércia de falta de aperto que se resume todo um dia de pesca!

Quem disse que o assunto era pesca? – 5/6/2020

Da ilusão ao recomeço….

Sempre, mas mesmo sempre, tive receio de me aproximar de ti mas, no ano em que me permitiste que o silêncio cessasse, lá estava eu. Foste a maior ilusão e desilusão de 2019 mas…eu não estava preparado. Hoje, se me perguntarem, sou um homem mais regrado em tudo graças a ti mas, o mérito que te devo, é mau porque advém de uma mentira que nunca existiu.

Da imaturidade da adolescência até à idade adulta convenci-me que me tinha tornado adulto e, rodeado de ferramentas que os adultos usam, eu fui batalhar e julguei haver ganho. Mas, do amo-te ao não sei quem és vai um passo muito pequeno e, muito embora saiba assumir as ideias dos meus pecados, sei – acima de tudo – perceber demasiado bem, quais são os pecados não admitidos de outrem.

A falta de tempo, no amor e para quem realmente ama, é o maior valor que se apresenta na mesa da paixão! É simples, para quem não sente a disponibilidade, abdicar de um amor de uma vida. Com uma facilidade tão grande quanto seria o sarilho de aturar todas as vicissitudes inerentes a alguém que nem sequer sabe dominar a arte de esconder….

Não nasci para aventuras mas sim para amar e batalharei sempre para que assim seja!

Um conselho de ex-amigo? Aprende a amar e a saber reconhecer o amor e serás feliz!

O louco enamorado…-10/5/2020

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A vida sem lentes de contacto

Como se quase te tivesse tocado mas sem forças para esticar o braço, como se quase te tivesse sentido mas sem forças para avançar, como se tivesses rodas e tivesses derrapado para longe. Foram dois bons passeios os de ontem – ambos de extremo a extremo da cidade mas já sem hipótese de terminar no Zé Grande a comer uma “bucha” de presunto.

A fugir de tudo e de todos e evitado da mesma maneira – uma alegre maneira de começar a circular neste novo mundo que lá fora não parou. A sorte, a maravilhosa sorte de viver tão perto do mar que me faz sentir com 18 anos em cada dia que acordo e posso colocar a indumentária mais simples do mundo: uns calções, uma tshirt e havaianas, e sair despreocupadamente à rua – em tempos de pandemia julgo que a indumentária deverá ser a última coisa a ser comentada…ahahahahahahah

A ver um local de pernas esticadas na sua varanda, com um ar de dono de disto tudo, que não cumprimenta quem passa. Um casal de namorados a trocar mimos enquanto o cãozinho lhes vai mordendo os casacos, pés molhados na beira mar. A vontade de ver a bola Nivea erguida e alguma normalidade restituída. Uma bicicleta que passa a querer cumprimentar o meu ombro esquerdo (que seja católico e reencarne em asfalto!), um atleta que olha de lado ao humilde narrador que vai fumando enquanto deambula pelo calçadão Espinhense.

Pareceu-me sentir o teu cheiro mas afinal era eu – como confundo o meu e o teu num tão simples nosso! A tua omoplata sorriu-me e julgo que os nossos pés dialogaram mas…eu sou parte interessada e não posso tecer juízos de valor…O sol sorriu, como que confessando que o destino a nós cabia, e as ondas deram uma série como nunca antes – num claro festival de concordância e concessão desse favor especial de sermos aplaudidos pela natureza. Ainda bem que nunca fomos muito de vénias…

Apaixonado? Sempre! Pela vida.

anap