O sítio tornou-se o do costume e, sentado na mesa habitual, vou trincando o lanche encomendado. A Coca-Cola vem, erradamente, com um zero mas o erro é imediatamente corrigido e a empregada de mesa condenada a beber a dita, no refúgio seguro dela, mas que é bem visível da esplanada.
As motos de baixa cilindrada que fazem mais ruído do que os topos de gama, as conversas de trânsito – algo que pode sempre resvalar, as pessoas que se benzem quando o sino da igreja soa. Os grupos que bebem cervejas frente aos grupos que conversam, os telemóveis como alienamento permanente.
O Kiosk, frontalmente colocado, em permanente rebuliço – a servir todos os que buscam “as falhas” a caminho de casa, os casais que tentam distrair os bebés do calor, os namorados que discutem o dia que agora começa a acabar. O Lenny Kravitz que grita que quer “Fly away”, as pessoas que se abanam – numa infrutífera tentativa de se manterem frescas.
O toldo da esplanada é entretanto aberto e o humilde narrador tenta descortinar de onde chega toda esta “nova luminosidade”, a empregada de mesa que sorri – ao descortinar a procura do narrador e responde com um gesto que demonstra que é ela que está a gerir o processo, mostrando o comando do toldo.
Uma escultural grega que chega – obrigando a um discreto, mas muito forte, empurrar do queixo caído que, aproveitando a distração do dono, coloca a nu toda a indiscrição da situação. Limpados os resíduos do salivar intenso e já recomposto de mais um monumento ambulante que não conhecias. Toca o telemóvel e respondes com toda a segurança: estou em casa, a ouvir música. Pagas a conta e corres para casa!
O dia de trabalho passou sem que desses por isso e o duche frio disciplinou a moleirinha de volta ao mundo terrestre. A tosta mista na esplanada, de perna suada alçada, a Coca-Cola como refrigerante obrigatório, a água que fugiu num trago.
Música de fundo, ligeira quanto a brisa, duas beldades na mesa do lado, uma trinca como início das hostilidades; na tosta, entenda-se! O Sultans of swing salta nas colunas, conduzindo a uma reflexão pelos muitos momentos em que escutaste a música.
Recordas a frase cómica que ontem, antes do concerto, ouviste um ilustre desconhecido americano proferir “who the fuck wants to see an 80’s rock band playing in an Ancient Greek theater?”…descobri depois que era um dos teclistas do grupo! 😂👌
De sorriso em sorriso, sem roubar sorrisos alheios. Saltando de dia para dia, sem sucumbir ao calor. Sempre munido de uma garrafa de água, mantendo o esbelto corpo hidratado. Eu devia ter nascido grego e ter navegado…
A golden hour a cair, as luzes dos carros pressentem-se agora – apesar de sempre terem estado lá, pessoas que correm entre outras que, muito calmamente, observam as montras – o caos ordeiro, tanto no passeio como na estrada. Ao longe, os peões que correm na passadeira – enquanto se benzem – face a uma igreja com que se deparam.
As cores desbotadas – que se fixam perfeitamente, assim que colocas os óculos, uma brisa de 9 Km/h que a app de meteorologia afirma tornar os 30 em 31. As laranjeiras que dão a frescura a toda uma cidade, as pessoas que a animam, os animais que a habitam – com mais direitos adquiridos que muitos humanos, as luzes das farmácias que se acendem para uma eventual emergência. As famílias com o passo descoordenado, conforme o filho por que são responsáveis.
O calor chegou, e trouxe com ele a habitual adaptação da indumentária, o que – dado que estamos na Grécia – equivale a um desfile de monumentos históricos (porque imediatamente te ocorre ser um ombro amigo e ouvir todas as histórias, obedientemente), em trajes minimalistas, qual tela branca, por pintar, que clama por ser coberta por uma pluralidade de cores. Não nasci pintor, e não tenho a mínima veia para a arte, mas sei apreciar!
Imaginem um cérebro que, tirando proveito da rotina do caminho para o emprego, aproveita para deambular e apreciar “as bistas”, como se diz na minha terra. Equiparem a imagem dessa rotina à mais bela obra de arte que o vosso coração guarda e, mesmo assim, talvez não estejamos, ambos, sincronizados. Curioso, como o gosto por arte pode ser diversificado: o que é que nos conquista na arte? Porque não discutimos com ela mas sobre ela? Talvez seja precisamente esse facto que a torna tão bela…
As caras envergonhadas, as gatas assanhadas, os decotes suados, as saias que são curtas pela anca – mas que elas teimam em puxar para baixo. Os saloios e os olhares fotográficos, os encontrões do metro, o acaso da conversa, a coincidência de irmos ao mesmo concerto, a ousadia do trocar contactos, a notificação dos familiares mais próximos…
O despertar e o lento interiorizar o quão bem dormiste…acenas a ti próprio um sinal de concordância, após visualizar umas preguiçosas 8:30 no despertador – para quem habitualmente acorda às 5, há que celebrar estes eventos.
Sonhaste, e dás um sorriso envergonhado, assim que te ocorre o porquê de um sono tão retemperador. Olhas-te ao espelho, ciente de que não podes estar envergonhado contigo mesmo, isso não acontece…
Talvez o amadurecimento da vida traga estas mudanças de comportamento! Sei que havia duas covas que havia que transpor, após um galanteio mal dissimulado, e uma pergunta que havia que fazer. A pergunta libertava e soltava o humilde narrador para a tarefa seguinte.
Talvez tenha havido alguma palpação, para um duplo sentido de estímulo e a celebração da conquista daquelas duas adversárias, com tanto de ameaçador quanto erótico. Recordar, com saudade, que a louça ficou por lavar; apesar de bem esfregada, a gordura não se libertava e houve necessidade de recorrer a um desengordurante original, o sentimento de pleno a preencher os dotes de lavador de pratos do vosso humilde narrador…
Acordas, lavas a cara, atiras um bocado de desodorizante, lavas os dentes e sais.
A 20 metros da porta está um vizinho, que aguarda que o cão obre. Olhamo-nos e eu fico a pensar na situação do gajo: cerca de 2 metros de altura, uma trela enorme (só para chegar à manápula do gajo…), um cão que se assemelha a um coelho anão…que ladra e, salvo se não tivermos desenvolvimentos à vista, também obra!
O pensamento de merda esfuma-se e reduzo o ritmo (já de si bastante lento) para olhar a fotografia do grego irritado – há um fotógrafo grego, na esquina, que tem uma fotografia de um bebé irritado com o banho que o obrigam a tomar…dobro a esquina, como um verdadeiro super-herói, e vejo um café abandonado no orelhão da vizinhança…
Aproximo-me – o que, na Grécia, significa que fui para a rua e mantive uma distância segura – e vejo uma T-shirt, que descai de um suporte que o orelhão possui. No chão jazem calças e meias…apalpo-me e sinto o casaco vestido…não pode ter sido um golpe de calor, penso eu! 😂 Fotografo o momento, para a posteridade.
O caminho até ao café é longo e assemelha-se a uma travessia no deserto – quando, após umas centenas de quilómetros montado nas costas de um camelo, finalmente chegas ao oásis – apenas para constatares que tens que ir urinar, o que te obrigará a seres o último na fila de água do oásis (não é nada disto, fica a 100 metros de casa, mas há que enquadrar…😂😎). A areia são os passeios irregulares, a tempestade de areia é a possibilidade de levares com uma laranja nos cornos, ressalvo, couro cabeludo, o café é o almejado oásis…
Freddo espresso sketo, parakalo!
Um pequeno gole para o café, um enorme despertar para o Henrique!
Sorrio, com um sarcasmo interior que até tenho que conter os espasmos musculares de satisfação plena, quando lhes respondo “Não dá mesmo, tenho cenas combinadas que me é impossível cancelar.” E assim tenho sido feliz ( bem sei que sou um egoista exacerbado nessa procura mas, afinal, a minha felicidade merece essa devoção!)
Recordo, sem saudade, o dia em que a curiosidade se apoderou de mim e, num misto de procura, loucura e estoicismo, embarquei na caravana dos vencedores do passatempo. Faço aqui uma pausa, para reler o escrito, e constatar que a frase anterior é muito típica do vosso humilde narrador; sendo que, normalmente, a saudade existe! Adiante, onde íamos? Sim, na caravana dos vencedores do passatempo da empresa, no camarote, com cozinha aberta.
O inverno estava a chegar, e a promessa de um jogo de futebol em que o campeão nacional estava envolvido, prometia o tipo de aventura de que normalmente um expatriado não usufrui – jantar incluído, bar aberto, umas esculturas ambulantes a servirem-nos…um jogo de futebol ao vivo, em que elas servem os comes (um ideal machista internacional que fui obrigado a usufruir de).
Estava na primeira fila, com um prato preenchido com um misto de carnes brancas e porco, ladeados por um Tzaziki maravilhoso. Os cumprimentos das equipas, umas músicas que não conheço (era o hino do visitado), começa o jogo.
Na infância e adolescência temos os sprints em busca do conhecimento – corremos curtas distâncias na ânsia de obter as respostas que esclarecem as perguntas que constantemente nos assolam. Tudo é novo, tudo pode ser experimentado e o risco é algo que nem sequer cruza o nosso pensamento. Somos apelidados de putos – sem que o arrojo seja considerado, de imaturos – porque a experiência de vida carece de erros para providenciar certezas, de pessoas em fase de crescimento – uma analogia aos países em vias de desenvolvimento que desmotiva, face a uma evolução que não vemos esses países atingirem – ficaremos assim para sempre? Em vias de desenvolvimento? Podemos aspirar a ser um país desenvolvido? É a questão que nos colocamos, na certeza de nunca desistir em tão curta etapa! É assim que vejo a competição de abertura, com a corrida dos 100 metros.
O salto em comprimento acompanha-nos pela vida fora e mais não é do que um método alternativo para cobrir a distância que nos separa do objectivo – com a virtude de nos permitir saltar para mais longe, se queremos evitar um obstáculo, ou mais perto, se o objectivo é abraçar não um obstáculo mas uma qualquer fonte do nosso prazer interior.
O lançamento de peso é constante nas nossas vidas e mais não é do que o equilíbrio em que nos pesamos e nos sentimos bem – num mundo perfeito, sem pretensos magros ou gordos, em que gerimos o nosso peso no grau de satisfação interior que ele nos dá – num menosprezo total pelo que os outros pensam! Só tu interessas; porque no fim não há céu que nos acolha ou inferno que nos mantenha quentinhos!
O salto em altura é o crescimento – a constante que nos acompanha até ao final da vida, pois o conhecimento foi feito para crescer incessantemente. Como um alpinista, que escala cada nova montanha com uma atenção redobrada, nunca confiando na solidez providenciada pela natureza e sempre atento a toda a pequena indicação de gelo – num misto de deslumbramento e satisfação, de cada vez que sobe um socalco!
Os 400 metros que encerram o primeiro dia são o primeiro ensaio no percorrer de longas distâncias – após os 100 metros, quem não se diverte com uma volta completa ao estádio? A transição do final da adolescência para a vida adulta, passos de afirmação com muita confiança, planos elaborados com maior morosidade e atenção ao detalhe, os tempos em que és um pouco burguês até…
Os 110 metros barreiras, que abrem o segundo dia, são a representação de todos os obstáculos, alguns inertes incluídos, com que nos vamos deparar: alguns iremos superar, tropeçar noutros e, muito provavelmente, hesitar demasiado nos terceiros. Uma explicação sobre como superar obstáculos voando acima deles!
O lançamento do disco é toda a música que nos embala neste processo denominado vida. De diapasão na mão, numa procura constante pelo acorde perfeito. O aceitar sugestões de novos sons, enquanto mostras o que achas ser o valor do que ouves. As pessoas que nos davam acesso a uma cave, os amigos que aí colocavam música, a recordação de todos os copos cravados – com a dor da lembrança de todos os que tiveste que pagar. Uma melodia como símbolo de um porto seguro!
O salto com vara mais não é do que a superação com a ajuda certa. O acessório como elemento fundamental para a superação – numa simbiose tão perfeita que alguns homens jamais a conseguem superar (correndo o risco, segundo a sabedoria popular, de ficar cegos) e algumas mulheres são suspeitas, dado o exagerado consumo de energia eléctrica.
O lançamento do dardo são todas as paixões que tivemos, as reais, aquelas em que somos obrigados a “deter” o nosso coração e a interrogá-lo quanto às arritmias cardíacas de que passa a padecer. A submissão ao Cupido que, invariavelmente, nos apanha distraídos, na curva.
Os 1500 metros são o puro gozo com que desfrutamos da vida, o sentido de longo versus o que já conquistamos – em termos de “armas” para estarmos sempre acompanhados de um sorriso que, não sendo idiota, parece – mas esse é apenas o meu ponto de vista…
Por entre uma corrida, “contra” o caótico trânsito Ateniense – agravado pelo facto de ser sexta-feira e uma maioria se deslocar até a uma qualquer ilha ou local de nascimento – eis o vosso humilde narrador a chegar atrasado ao início do desafio. Sim, havíamos sido desafiados e, como povo conquistador que somos, fomos, vimos e conquistamos! Não uma repetição da reconquista errónea de outrora, mas tão só e apenas uma celebração que temos como habitual, no nosso calendário desportivo.
Ouvir os comentadores desportivos a usar “massacre”, “banho de bola”, “domínio avassalador”, “uma ocasião de golo em 90 minutos”, “não foi o habitual porque o Futebol Clube do Porto não deixou” deixou-me com a habitual lágrima de emoção Portista. Belisquei-me, era mesmo na SIC.
Coisas que brotam nos primeiros anos (apesar de viver em frente ao estádio de umas designadas Panteras), as recordações de uma coleção de caixas de fósforos com Campeões Nacionais como o Gabriel, Fonseca, Freitas, Murça, Rodolfo, António Oliveira…a praça Velasquez cheia de carros abandonados (a prioridade era o jogo), a varanda de onde se via a arquibancada, o sair de casa a implicar pegar em carros – num esforço bem coordenado sob a voz de “1, 2, para o lado). Subir ao primeiro andar do 147 implicava um refúgio sempre seguro! Ponto de encontro obrigatório, seguido do fino no café Velasquez e a partida para o estádio – tudo é mágico, quando se fala de recordações de infância. Vi o Futebol Clube do Porto vencer, debaixo de todos os climas imagináveis, com vários cenários de lágrimas de alegria a tomarem a dianteira, vivi algumas amarguras – em que questionamos a nossa existência face a um empate ou, livre-nos o Papa Jorge Nuno, uma derrota. Cresci numa família Portista, ao vivo vi-os ganhar em três ocasiões, várias vezes questionei o cardiologista quanto à cor do sangue que em mim pulsava.
Entrei em casa, com o jogo a decorrer, e constatei que já fechávamos muito bem (sou apologista do fazer crescer uma equipa da defesa para o ataque). Instalei-me no sofá e assisti a um massacre em que só faltou a bolinha encarnada, no canto superior direito do ecrã! É verdade que extravasei a minha alegria, numa Atenas que deve ter-me julgado como terrorista que merecia ser escutado (não fosse eu começar a gritar por deuses, aos quais normalmente se segue uma explosão – são um povo atento). Ninguém deve ter percebido os gritos, o vocabulário profundo, as lágrimas de alegria que faziam ruído…
Sentado no autocarro, com uma morena voluptuosa e linda sentada ao meu lado. A vontade de deixar descair o corpo, para sentir o dela, a tornar-se em algo sem sentido, quando ela deixa descair o corpo dela sobre o meu. Na imaginação dos transportes públicos tudo é possível e, cada vez mais imbuído desse espírito, sinto que os olhares trocados, ao longo das últimas semanas, dão agora o esperado fruto.
Quanto mais afasto o corpo para a janela mais sinto a pulsação do corpo dela, como um oposto que se atrai, ou uma alma inteligente que sabe tirar partido da inércia inerente a qualquer transporte público em movimento? A Grécia contém questões filosóficas profundas, não ao alcance do comum mortal. Planos maquiavelicamente amorosos são escrevinhados mentalmente, sem que os meios de defesa do estado sejam suficientes para os deter! Bem haja!
O tique nervoso do cabelo – bolas, ela fica ainda mais bonita quando o faz, a maneira como oscila a perna cruzada, que inevitavelmente embate em mim, a troca de contactos – agora que dialogamos e já nos conhecemos! Bom fim de semana e boa Páscoa!
Soltas – como se a liberdade só pudesse ser explicada por elas, sinónimas – numa deliciosa harmonia de significados tão iguais, antónimas – numa bela dança de opostos, maiúsculas – armadas de uma maturidade típica dos começos, minúsculas – como que pequenos anões que são fundamentais para a tela final, acentuadas – a típica nobreza, cedilhadas – a recordação de outrora, em que a cedilha parecia algo tão esquisito quanto os caracteres chineses.
Rodeadas pela pontuação – num exercício tão vezes falhado, com os pontos que impõem um final, vírgulas que implicam uma pausa e a imaginação constante como agregador de um processo que a ciência não explica. Façamos um parágrafo! Ou um ponto final e continuamos com o mesmo assunto? Talvez apenas uma longa vírgula, que nos permita saltar para o próximo parágrafo e dissertar sobre algo diferente, como o relato de um pouco do que é o quotidiano grego? Vamos nisso!
Se chegaste até aqui mais vale continuares até ao final. Imagina um pequeno troço, para o qual ninguém estava preparado, em que nos é dada a oportunidade de lermos algo que nunca tínhamos lido: o suor da antecipação, a taquicardia por cada letra abraçada, numa palavra que encaixa bem, vá, num enorme puzzle que, quando completo, até sugere uma exclamação! E sim, procuro sempre a exclamação, como forma de bem estar comigo próprio (a cena narcisista 😂).
É algo muito recompensador! Olhar para uma conjugação de esforços de palavras, colocado aleatoriamente num processador de texto muito simples, olhando em volta e constatando que…cheguei! Estou na minha paragem!
A sexta-feira, por falta de planeamento ou insónias (selecionar o que preferir), fugiu a uma rotina que existe – porque foi outrora delineada – mas que jamais teve existência prática. Há vários alarmes: 7, 7:30, 8, 8:15, com diferentes títulos: água quente, mexe-te, põe-te a andar, last call motherfucker – para um verdadeiro grito que me empurre para os transportes públicos.
Cheguei cedo demais ao autocarro e, daqui até Fix, viajei sozinho, no canto esquerdo do autocarro (em cima do motor, o assento mais quente do autocarro – não só pela minha presença…). Após Fix fiquei com um mastodonte do lado direito e o autocarro cheio. Arrancamos, não se esqueçam que a porta é o local de eleição para o utente grego, independentemente da paragem em que vão sair (obviamente um “case study” que a comunidade cientifica deveria investigar), e uma senhora, entre outros, resolveu validar o bilhete. Encostou o papel plastificado na máquina de validação e ouviu-se um som semelhante a um traque. Olhou para os que a rodeavam e eu sorria, porque ainda recordava o som engraçado da máquina ao não aceitar o bilhete. Passado uns minutos, testou novamente o bilhete e um novo traque surgiu (as probabilidades de aparecer um fiscal são baixas, mas acontece). A viagem prosseguiu tranquilamente até ao destino.
Há uma caminhada, de cerca de dez minutos, que separam a paragem de autocarro e a empresa. Um exercício físico diário a que me obrigo, saindo na paragem “antiga” quando existem paragens mais próximas.
O supermercado fica no meu caminho e, pedido o café no balcão do lado direito da entrada, sigo para o croissant quente, que fica já dentro do supermercado mas pode ser pago na caixa da cafeteria.
Foi ao voltar, com o croissant e aguardando o café pronto, que reparei que ela estava agora no primeiro lugar da caixa (a opção era ser segundo). Olhei-a, ela olhou-me e eu tomei a segunda posição como o meu novo lugar na fila. Abanava um saco plástico transparente que deixava ver o vapor de um croissant que almejava ser trincado.
Ela olhou-me novamente, do contacto visual aos olhos dela a percorrerem o meu corpo e, ao nível da anca, a pararem. Assim que me apercebi dos olhos esfomeados dela, tomei a única decisão sensata que qualquer homem na minha posição tomaria: escondi o croissant atrás de mim. Sorrimos, com os olhos ainda colados, e não ouvimos a senhora do café a perguntar o que queríamos. Fui indigno da minha educação “nos melhores colégios suíços” e respondi “freddo expresso sketo” e, apercebendo-me da minha indelicadeza, expliquei por gestos que ela era , de facto, a primeira da fila. Ela agradeceu-me com um olhar perdoador, eu anui a que ela fosse buscar croissants sem perder o lugar na fila.
Despedimo-nos, de uma forma pouco convencional para quem acaba de se conhecer, com o encontro marcado para um outro pequeno-almoço no futuro.
Deambulava pela rua, com o queixo demasiado levantado e os olhos num constante varrimento do que o rodeava, alheado na sua rotina de tudo ver – detendo-se, se a necessidade de ver melhor o detivesse – ou armado em hiker profissional, caso a vista já estivesse em memória – admitindo algumas paragens, para a actualição e substituição do backup anterior.
O calçado era limitado a três pares de sapatilhas – mesma marca, mesmo modelo, cores diferentes e um par de botas – mais cobertos de pó de falta de uso do que propriamente as solas gastas, de tanto uso. As meias eram todas pretas, num último suspiro anarquista, e as “coquilhas”, um objecto privado só ao alcance da urologista e de algumas, agora ilustres, beldades femininas não podem aqui ser expostos, sob pena de um atentado ao pudor cibernético (desconfio que não haveria “largura de banda 😂😂😂)!
O corpo, objecto de um estudo científico que decorre desde o dia da chegada, ganha uma dimensão que desperta a obrigatoriedade mental de andar, muito, galgar, ser “cavalar” na conquista de quilómetros, debaixo das solas. Com o espírito de um comandante de avião só quer acumular quilómetros de voo, tal a visualização mental que faz no aquecimento. Sorri, enquanto uma laranja cai sobre um tejadilho “mole” e o som sai com um tom cómico.
Perguntam-lhe como é que consegue viver despreocupado assim e ele, sem que a pergunta acabe, já está a responder “como é que consegues viver preocupada assim?!” Sorriram e observaram o espaço que os rodeava e, terminado o exercício, foram juntos em direção ao pôr-do-sol, que distava uns quilómetros valentes do local onde se encontravam.
Nunca acreditei no sobrenatural mas, depois de ter visto a beldade grega a subir para o autocarro, confesso que há algo endeusado nela. Enquanto aguardamos para virar para Sigrou, consigo um olhar de soslaio, por cima do oligofrénico que se sentou à minha esquerda.
É alta, calça um número grande (provavelmente para suster toda aquela beleza), tem um sorriso discreto que, muito provavelmente, até um cego faz sorrir. O inevitável cabelo encaracolado, uns olhos profundos, de um azul capaz de se confundir (novatos talvez) com a mais bela imagem do mar Mediterrâneo! O ruivo despenteado, enrolada num casaco perfeito para o dia de hoje – de um verde de esperança que reforça toda a convicção na raça humana!
Esperança!, grita a voz humorística da tua mente. Respondes com um “enquanto há vida!”, e sorris – perante o olhar alucinado do gajo que está ao teu lado! Apetece-te cochichar ao ouvido do gajo e, com um tom de Charles Manson, dizeres “You picked the wrong day to seat by my side!”, assim, enigmático mas com um desejo profundo que a paragem dele chegue!
Ela, entretanto, sorve mais um pouco do freddo expresso e o sorriso natural dela parece derreter o gelo do café – tornando-o ainda mais saboroso. A segurança envergonhada da beleza que possui é directamente proporcional à beleza que efectivamente magnetiza quem a pode apreciar! Se fosse de gesso certamente estaria num museu mas, tratando-se de um ser humano, está apenas sorridente, divertida e a pensar em toda a beleza que uma sexta-feira pode conter!
Ela já se apercebeu que as travagens do autocarro são por mim aproveitadas e, tirando partido do embalo, aproveito para arriscar o torcicolo, olhando para a esquerda! Curioso como, visto por quem não conhece o contexto, a cena pode ser hilariante: autocarro trava, a inércia actua e olhamos um para o outro.
Ouve-se muito, em Portugal, a expressão “isto é que me revolta” e, tendo em conta o acidente ocorrido, só me resta concordar! Revolta ver um dos países mais lindos da Europa, quiçá do mundo, devorado por canibais financeiros, cuja única consideração é o dinheiro. Em 2015, as principais estruturas gregas foram desbaratadas em função do que a Alemanha oferecia. O Porto de Piraeus, um colosso que se estende por quilómetros, foi um desses casos. A ferrovia, sempre a dar prejuízo, foi entregue às Rodovias do estado italiano (desconheço em que termos).
Todos os dias acordava cedo, apanhava boleia e ia trabalhar. Simples, barato (o passe mensal custa 27 euros) e eficaz (duas horas diárias a comutar). Hoje cheguei a casa às 21 horas (saí de casa às 8) 5 horas a comutar! Não me arrependo, pois sei que nunca mais entrarei num comboio grego (a viagem Atenas-Thessaloniki era algo que vinha planeando e que só não aconteceu neste fim de semana por um acaso, um feliz acaso).
Enquanto utilizador do suburbano, não era raro termos que parar para que o “rápido”, que liga Atenas a Thessaloniki, passasse. O meu plano era apanhar o primeiro comboio da manhã, já de merenda pronta, para curtir as 6 horas de viagem a fazer algo que adoro – apreciar a paisagem (sim, há tolinhos assim)!
A confiança foi abalada, pela primeira vez, quando o comboio que eu aguardava, em Doukissis Plakentias, chegou do lado errado – maquinista aos berros para que embarcássemos rapidamente. O abalo seguinte foi algo que fui notando: de cada vez que demorávamos mais um bocadinho, parados numa qualquer estação, era possível ouvir o maquinista, a falar, no sentido de obter autorização para prosseguir (sempre tomei a informação que me era dada como uma piada…que, afinal, não o era).
Aborrecem-me estas nódoas que, de alguma forma, afectam a tela mental que tinha idealizado…
Há uma parafernália de sons, radicalmente opostos mas complementares na beleza sonora que irradiam, capazes de exercitar em nós um conjunto de novas sensações.
Tem sido, quase sempre, bastante recompensador recordar: o azeiteiro, de carro rebaixado e vidros escuros, é quem normalmente fecha a noite. Numa espécie de exibicionismo de mau gosto (devia ser punível), que vai da vestimenta até ao modo como tenta atrair a atenção de uma vizinhança mais focada na intimidade familiar. Do escape de rendimento a uma seleção musical que quase faz regurgitar.
Antes de caíres no sono nocturno, e quando já estás afectado por ele, ainda consegues ouvir uma ou outra laranja que, caindo da laranjeira, faz um som bastante engraçado ao embater no metal dos carros estacionados. Mais engraçado se torna quando a laranja salta, após o embate, num equivalente sonoro ao conseguir fazer uma pedra chapinhar inúmeras vezes.
O adormecer profundo está normalmente associado ao som das tampas dos contadores de água – são tampas metálicas, de aproximadamente 50x50cm, que estão no passeio público, frente ao prédio a que dizem respeito. Entendam as diferenças: nós temos contadores de água e luz dentro do prédio e, na Grécia, as tampas da água é onde está o contador do consumo, os contadores da luz estão na sub-cave, onde também está o enorme radiador a óleo que aquece as partes comuns do edifício. A sub-cave é um local digno de um filme do Stephen King: teias de aranha, uma corrente de ar inexplicável, escuro – mesmo com as luzes acesas, arrepiante – no sentido em que os pêlos em pé só perdem a potência quando se voltam a sentir confortáveis e longe dali.
O despertar varia, consoante os artistas disponíveis: pode ser a repetição da laranja, o azeiteiro que se atrasou no regresso a casa ou, o meu preferido, quando começam os diálogos junto da padaria em frente ao prédio (é sinal que já abriu e, abrindo as janelas, consigo “roubar” algum do cheiro a pão quente. Livrei-me da aprendiz de flautista (de quem até os ratos fugiam, numa espécie de “Hamelín”, ao contrário!), ouço agora ópera – de um vizinho velhinho que gosta de exibir o seu bom gosto musical, por vezes o vizinho do acordeão aparece. Anteriormente era o reunir dos pássaros que te despertava – reuniam-se todos no prédio em frente ao meu e, assim que o sol nascia, partiam para os seus diferentes destinos. Poucos minutos depois eram substituídos pelos papagaios dos jardins nacionais que, amantes de desportos radicais, voavam por entre as árvores.
O agir como um turista, no caminho que separa a casa do trabalho, tem as suas virtudes e defeitos – o virtuosismo fica contigo: acordas, atrasas-te, apanhas o interregional ou o autocarro, vais documentando o caminho – sem que haja um compromisso para algum dia reunir tudo, sabes a magia do que saber guardar – em termos de imagens – e o que desprezar, em termos de espaço disponível na cloud.
A secretaria é agora mais pequena mas, atrás de ti, está o departamento de informática, pelo que, qualquer pequeno distúrbio binário é rapidamente ultrapassado. Há uma clarabóia acima de ti – que te seduz pela luz natural que deixa entrar, ou faz chorar – quando reflectida no monitor. A cozinha está perto, pelo que és obrigado a superar o babar – quando o olfacto detecta o pão torrado, no ponto perfeito, entre o torrado e o perigo de causar um incêndio.
A fonte de água está a escassos passos de ti, o que te obriga a uma penitência – entre Sex Pistols, PIL, Joy Division, na tentativa de abafar o som da catarata de água, evitando despertar em ti o desejo de visitar o WC. Em frente tenho uma enciclopédia humana, ao lado uma colega permanentemente a sorrir. Não questiono nada nem ninguém – apenas usufruo das imagens das pessoas, no constante burburinho que um escritório com 3000 pessoas produz.
O cozinheiro de serviço foi um dos concorrentes do Master Chef local e, pelo que me tem sido dado a provar, não percebo como não ganhou! Tivemos um churrasco, num momento de comunhão de toda a empresa, e poder-se-ia pensar que a qualidade decresceria – dada a dimensão do evento – mas eu ousaria dizer que, mais uma vez, ele superou as expectativas! Tropeças na grande líder, cumprimentas o grande líder, estás na fila para usufruir de um pequeno lanche grego, conforme designação humorística local. Estava divino! Percebes igualmente que é hora de ponta no WC (não desse tipo de ponta mas agrada-me o teu raciocínio 😉).
O dia de trabalho chega ao fim com um alento adicional – ainda é de dia e podemos observar, bem ao fundo, o sol a cobrir o Peloponeso e a dirigir-se para o outro lado do planeta. Uma passada vigorosa, por entre conversas escutadas em grego, e estás no caminho de volta, por entre umas centenas – que te acompanham, neste regresso de final do dia.
O frio está a acabar, os dias a crescer, a vontade de planear ao rubro, fim de semana prolongado a chegar.
Começa cedo, por volta das 6 da manhã, num misto de palpação e preguiça – palpação do estómago e a natural preguiça de quem não tem grande força. A falta de força teve origem numa intoxicação alimentar, após o que eu pensava ser um delicioso bife de vaca (na altura soube muito bem), seguido de um tsunami de emoções, em que o vosso humilde narrador se viu confinado ao quarto de hotel (daqueles de 20 euros por noite, tão típico de quem procura casa e está “entre tectos”).
A palpação advém do facto de todos nós conhecermos o nosso corpo suficientemente bem para sabermos onde tocar, antes de tentar emborcar algo. Obviamente é um conhecimento fútil, descobri eu, por entre coloridos arco-íris de bílis (a agonia de padecer de uma enfermidade que, para além do desconforto corporal, ainda proporciona cores tão pouco bem sucedidas) – aquele aparte desportivo fundamental para aborrecer o lagarto mais paciente.😬
Com a preciosa colaboração de uma funcionária do café, consegui ingerir um latte e duas torradas (branquinhas), com um muito ligeiro toque de manteiga. Uma hora de check-up continuo, muito perto do “trono”, e eis o vosso humilde narrador pronto para a aventura diária que é viver neste maravilhoso país. Investido de um novo vigor, percorre a distância entre o hotel e Monastiraki, sem ressentimentos, relembrando os locais por onde passa e a associação dos amigos que recordo ter recebido em Atenas.
Monastiraki recebe-me com um misto de sonoros batuques, o ruído das mangueiras – que limpam as provas de vida da noite anterior, o cheiro a eucalipto e alguns zombies que ainda procuram a direção certa. Já que chegamos aqui, e porque o Atlantikus ainda está fechado, arrisco caminhar até Thissio (como ir de São Bento até à baixa do Porto, sem a inclinação da rua da fábrica!) Constato que estou bem, sinto-me bem e quero um café! Erro crasso ou um risco necessário? Foi uma prova dos nove, antes de atravessar a cidade! Passei…
Metro de Thissio para Kallithea e há que trabalhar: sexta-feira foi feriado (cenas fictícias ortodoxas) e não consegui mais do que contactar alguns apartamentos para alugar (o processo de alugar uma casa é algo absolutamente surreal – também o foi na República da Irlanda (Eire) e já sabia ao que vinha – tirar fotografias de potenciais alugueres e retomar o contacto na segunda-feira). Antes da parte aborrecida, resolvi antecipar a parte divertida – aferir a minha acuidade visual e comprar uma armação para suster as lentes. Descubro uma optometrista grega, de inglês duvidável, cujo marido complementa o inglês não entendido com o italiano de nascença. Por entre inglês, italiano e grego eis que atingimos a graduação necessária e, como sou alguém que “ama fazer compras”, demoro 5 minutos a escolher a armação. Estão prontos na terça-feira pelo que, agora, só tenho que evitar sentar-me em cima deles (com um corpo tão esbelto 😂, ainda hoje duvido que tenha sido o meu peso a parti-los 🙄 😉 🤥).
Parto, na procura de anúncios para fotografar (na Grécia, os alugueres são anunciados nas portas dos prédios, usando para o efeito uns autocolantes amarelos – de tamanho único – impossíveis de não serem notados) e, após fotografar um deles – e tentar o contacto telefónico, perguntei ao senhor da loja ao lado se ele poderia traduzir. Não só o fez (era um espaço comercial) como também me disse: tire uma fotografia dessa placa (que, para mim, não passava de uma placa com caracteres gregos) porque esse senhor é de uma imobiliária, que fica aqui em cima. Tirei a fotografia, liguei e lá me apareceu o homem, na sua Suzuki 125 (até hoje confiei em poucas pessoas para andar de moto – o António Pedro que me ensinou, o Chico, que me levou do liceu a casa e de volta ao liceu, em tempo recorde, e o meu irmão que, como andava a estudar ortopedia, era de confiança 😂). Montamos, vi motos de frente, andamos em sentido contrário, fizemos mudanças de sentido pela passadeira que serve de separador central, chegamos!
É um rés do chão, que aqui são alteados porque há sub-caves, tem o quarto desejado, uma sala, WC e cozinha. Está sujo (tirando Airbnb é a norma) pelo que vai requerer um esforço adicional. Voltamos ao escritório, por entre carros, passeios, pessoas e, após uma troca monetária, recebo as chaves. A alegria é tal que corri para o hotel (de metro), peguei nas cenas todas e trouxe para aqui – estava ávido por poder responder “estou em casa”! A primeira limpeza está feita, o quarto está como novo, a casa tem agora um cheiro agradável. As aventuras posteriores nada mais são do que a intimidade da casa.
Há dias em que tudo, absolutamente tudo, corre bem – 7/1/2023
Não é um prato tradicional grego e, caso optes por encomendar um bife de vaca e estejas acompanhado de um cidadão grego, ele (ou ela) dir-te-ão quão perigoso é. Tratando-se de algo invulgar – na Grécia come-se, sobretudo, carne de porco e frango. A vitela também faz parte da ementa mas, porque menos consumida, também é um prato de risco – excepção feita às tavernas, onde a comida é fresca e raramente é de risco.
Segundo dia de cama, com uma intoxicação alimentar brutal, que me fez passar a noite a expelir líquidos pelos vários canais possíveis. Obviamente só há um culpado – eu. Assumo a fraqueza que me acudiu, sabendo os riscos que corria, sobretudo porque já passei pelo mesmo em casa – chegar, num dia de verão com luz do dia até às 22, grelhar um bife e, imediatamente, ficar de cama!
Não foi gula, não foi extravagância (um bife de vaca tem um preço que começa nos 12-15 euros e que, dependendo da denominação do local onde se consome, pode encarecer bastante) – um ex-café, redenominado gastro bar (ou qualquer outra denominação azeiteira) consegue inflacionar o produto, sem que a qualidade acompanhe! Pagas o “conceito”, chegas a casa, vomitas o conceito, obras o conceito, expeles o conceito – até o estómago começar a dar mostras de conseguir suster.
Ligas para o amigo de sempre que, inevitavelmente, te recorda o número de vezes em que o prato inicialmente escolhido, acabou por não ser o da encomenda final. Recordas episódios passados – em que a luz faltava em Atenas, durante o horário laboral, e tu chegavas a casa e, sem demora, esvaziavas o congelador, tudo directamente para o lixo!
Agora, que as partes baixas do aparelho digestivo começam a conseguir suster, esboças um sorriso – numa cara pálida que caminha para a normalidade.
Agora, que já ultrapassaste os 10% de ilhas habitadas – Aegina, Kea, Hydra, Zakynthos (Zante), Rhodes, Santorini, Amorgos, Naxos, Milos, Lefkada, Kefalonia, Skorpios, Ithaca, Meganisi, Madouri, Evia (Euboea) – começas a planear as visitas de 2023! Será num“trilho” repetido – mas com mais detalhe para dispensar.
Paros e Koufonissia? Certamente! Há aquela necessidade de – como se de um daltónico se tratasse – ver cores diferentes, num caminho marítimo que termina em Amorgos! O processo de acostumar os olhinhos ao deslumbramento é moroso e convém que seja gradual, para bem dos músculos do queixo que, habituado a ceder ao espanto com um deslocamento vertical, pode gradualmente fortalecer-se para as aventuras que se avizinham!
A parte do orgulhoso observador:
Falemos dos transportes públicos na Grécia! Leiam atentamente porque eu, como dizia o outro, não duro sempre!
O lugar mais cobiçado, nos transportes públicos gregos, é junto à porta! Não me perguntem porquê, confunde-me tanto como a vocês. Um exemplo? Entras no metro, autocarro ou comboio e, caso não estejas atento, o cidadão da frente trava e tu bates directamente nele/a (isto são lições que proveem da Grécia antiga e são transmitidas de geração em geração!!!!). O ser humano entrou no transporte público, viu uma oportunidade de viajar como VIP, e não hesitou em travar a fundo para o conquistar! Ainda bem que nos aviões vamos todos sentados…😬
Novo ano, novo IKA? Vê-se logo que não me conheces… – 1/1/2023
O humilde narrador a descer ao mais profundo de Atenas.
Não tinha nada para ser especial ou diferente de uma normal ligação do ponto A ao ponto B. É verdade que levantamos voo com cerca de trinta minutos de atraso, o que nos concedeu tempo suficiente para nos conhecermos. Marialena, Henrique…how are you? e o questionário habitual de sondagem de opinião.
Nem o facto de já só haver menu vegetariano afastou o vosso humilde narrador da conversa. Moramos em cidades separadas, temos gostos muito semelhantes e a linha de pensamento muito alinhada, numa espécie de acorde perfeito que enfeitiça ambos os envolvidos. De mão dada, por causa da turbulência e não com qualquer conotação amorosa (pelo menos admitida pelos envolvidos), decidimos ser amigos e, sem que qualquer troca de contactos tenha ocorrido, despedimo-nos com um “até um dia destes”, tendo ela acrescentado: estou certa que acontecerá!
Curioso como uma novidade pode começar com um “this shithole?” mútuo. Agora vou ter que ir a Thessaloniki, numa aposta cega num encontro inesperado. Haja loucura e tempo para nos divertirmos com ela. Cheers!
O voo de ida foi uma batalha para obter mas, após aquela pesquisa profunda, entre todas as apps possíveis e imaginárias, eis o vosso humilde narrador a conseguir sacar um bilhete a bom preço (obviamente o voo de volta não era só até Atenas, já que segue amanhã para Istambul, mas eu já não irei nele…usufruindo de um bilhete de volta de 91 euros)! 😉😬
O objectivo era dar dois abraços mas, mercê das circunstâncias, acabei por trocar abraços com quase todas as duas famílias que a mim se reuniram. O dia de chegada como celebração e, no segundo dia, a continuação da exploração da cidade – 43 quilómetros em dois dias! 👌 Sem quaisquer bolhas visíveis, após análise cuidada, já em Atenas.
Um paraíso de bom gosto, com a sua dose equilibrada de parolices típicas do ambiente, construção divinal – numa peça harmoniosa em que todas as partes integrantes nos fazem sorrir, de satisfação – pela bela maneira como encaixam e aumentam o volume de construção, como se de uma tela se tratasse. Uma harmonia quase divina, na fluidez do trânsito de bicicletas, aqui e ali interrompidas por discussões em que ambos partilham as culpas – traços de personalidade civilizada. 😍
Não só eles souberam conquistar terra ao mar como também o fizeram com muito bom gosto. 👍 A voltar, muito em breve!!! 🔜
Há algo de mágico na maneira como pisam o chão – como se o chão se tornasse no anfitrião perfeito, perante tanta beleza emocional. Os pés parecem gravitar, antes de tocar o solo – num movimento de perícia semelhante à recuperação de um foguetão da Falcon X. Ondulam, não andam! Num Mediterrâneo de temperatura perfeita e paisagens sem igual.
Saiu do metro, de encontro à mãe (que já aguardava na plataforma), num passo tão lento que, caso quiséssemos simular o movimento em câmara lenta, não haveria disponibilidade de velocidade tão lenta. Não confundir lentidão com laxismo! Enquanto se preparava para sair, ela focou o alvo e deu um festival de emoção gestual que, somente a ideia, me faz arrepiar os pelos que ainda detenho.
Agora, que já tudo passou, posso dizer que ela teve um gesto simpático para comigo…olhou, marcou, pavoneou e partiu. Obviamente poderia escrever uma trilogia sobre o momento mas, por agora, vou desfrutar da conversa com ela!
Há folhas caídas e assam-se castanhas na rua (algo muito cómico, quando comparado com o método português do fogareiro), estão 22 graus e há corajosos na praia (com potencial para criar um bom ajuntamento de carros, no retorno à capital).
As tabernas estão cheias e o cheiro a vitela estufada com ervilhas consegue embriagar o teu palato estomacal, os degraus estão secos e bem seguros, pelo que os chinelos foram uma boa opção, no que a locomoção diz respeito. Olham-te porque estás com a habitual indumentária, cumprimentam-te porque te reconhecem nessa mesma indumentária.
Cumpres os teus rituais sociais e sobes a rua, acompanhado do teu Freddo e dos biscoitos do Veneti. Observas tudo o que te rodeia, como método de estimular a mente enquanto mecanicamente regressas a casa. Vês as diferenças nos prédios da vizinhança, cumprimentas as velhinhas na janela ou varanda, ouves a música de uma flauta, ao longe – questionas-te se vais obedecer à flauta, numa fábula rápida que te cruza o raciocínio.
Cedeste, quando passaste por outra taberna, e agora aqui estamos – a dizer bem do saganaki, das batatas fritas, da vitela estufada…por vezes é bom ceder emocionalmente! É o mais racional a fazer…
Foi uma promessa secreta, ou com o pretensiosismo de o ser. Uma jura solitária, profunda, com o valor de honra, caso pretendam obter uma escala de valores. Um pacto de tal maneira sólido que não haviam ainda inventado um antídoto para a sua solidez.
Assim que o combinado e acordado foi colocado em prática eis que os resultados imediatamente começaram a surgir – como se o escondido pudesse ser mais forte por simplesmente ignorar a nossa presença ou, melhor ainda, tendo a certeza da nossa ausência.
Há a certeza de uma melhor saúde, menor emoção mas muito mais serenidade, no global, daquilo que é a vida em sociedade. É verdade que nunca deixo de espreitar o desenvolvimento, sempre após o acontecimento mais próximo, mas com um carácter meramente informativo, onde quase diria: não existe emoção.
Os dias passam, acontecimentos são superados com enorme elevação e distinção, acabas por ser informado sem que tenhas feito um esforço para isso. Sentes um enorme orgulho interior, que guardas para ti – num exercício de inveja. Aplaudes, enquanto sozinho e sem testemunhas, e continuas a cumprir.
Assim são os dias de jogo do Futebol Clube do Porto…💙
Cachecol da final da Taça UEFA * 21 de Maio de 2003 * (Futebol Clube do Porto 3 – Celtic Glasgow 2)
As sextas-feiras possuem, no seu núcleo, uma aura de boa disposição que se alarga ou retrai, conforme o dia decorre. Em Atenas, tal significa que tanto podes acordar com um dos milhares de sinos de igrejas que te rodeiam ou continuar o teu sono, até que algum pássaro – obviamente aterrado junto à tua janela – comece a canção que definirá a sua tarde.
Saída de casa, a vizinha passeia o cão, a passagem obrigatória pelo contentor do lixo. Um barulho estranho, uma velhinha que me estica a mão, enquanto me deseja bom dia. Pergunto, em grego, se fala inglês, uma vez que o meu grego é limitado (estou na fase do “só sei que nada sei”). Para minha surpresa (e agora também para espanto dos 7,753 biliões de subscritores deste blogue) a conversa continuou em inglês! E o inglês da senhora é brilhante!
É a senhora que alimenta os rafeiros da vizinhança. Atenas tem cerca de 4 milhões de cães e gatos de rua e, quando o governo propôs um programa de esterilização, todos os veterinários do país entraram em greve. Imagine-se um grego sem acesso ao veterinário! Há tantos animais domésticos quanto população logo, basta imaginar.
Enquanto a senhora conversava sobre os gatos, cumprimentou a vizinha com o cão e eu também, continuei a ouvir a explicação sobre o método utilizado para alimentar a gataria toda da vizinhança. Havia o sentimento de estar a ser flanqueado e, rodando a cabeça, apercebo-me que estou rodeado de uns 20 gatos (ninjas, que nem um ruído fizeram com aquelas pantufas calçadas). Ela sorri, perante o meu espanto, e exclama, com orgulho grego “São os meus meninos, eles reconhecem-me”. Ambos sorrimos, enquanto os ninjas começam a miar “despachem lá a conversa que nós estamos com fome”!
Despedimo-nos, com o sentimento que nos voltaremos a encontrar. Entretanto, no cimo das escadas, está a equipa de jardinagem que cumprimento – da última vez tive que ouvir 15 minutos com o homem a explicar-me que o 15 de Agosto era dia da Madonna…e eu, inculto, nem sabia que uma estrela pop dava direito a feriado…
Não que tenha experiência (em design de interiores) para opinar mas, enquanto Lusitano, sinto uma espécie de formigueiro – que normalmente antecede uma renovação do lar. A ansiedade de quem aguarda a entrega, mentalmente fazendo a distribuição dos bens a serem entregues pelo espaço vazio que, por ora, te rodeia.
Aquele espreitar pela janela, confundindo todos os veículos que passam com a entrega que aguardas – uma espécie de patrulha de vizinhança, que impede que qualquer movimento não planeado seja imediatamente interceptado e a ameaça neutralizada. O miocárdio aperta de antecipação e refreias a emoção – pois temes estar cansado, quando a emoção se concretizar.
O exterior é um belo jardim verde, com uma piscina média, do lado direito, mesmo em frente ao mar que, quando muito, está a uma distância medida em passos. A sede da equipa começou a ser solidificada, de fora para dentro, e a entrega de hoje é apenas o concretizar de toda a bela simbiose em que se haviam tornado. Até concordaram com juras de fidelidade e felicidade eternas, como nos filmes…
A aguardar que os vizinhos de outrora voltem a Atenas, para um jantar de convívio e celebração, como só eles sabem gerar. De livro aberto e sol no corpo, eis o vosso humilde narrador a relaxar, no último dia do fim de semana.
É aquele sol, com a temperatura do equador mas sem a humidade, com o brilho do verão mas somente a energia do outono, a abrilhantar sem magoar, a acompanhar sempre solidariamente – como um verdadeiro companheiro de aventuras.
Hidratando constantemente, até um cúmulo de me sentir uma picota humana que, gota após gota, se vê transformado num intermediário humano entre a fonte e a sanita. De cabeça enfiada na leitura despede-se de ti, com um abraço apertado.
Primeiro apelidei-a de primata emocional mas, com o passar do tempo, apercebi-me que havia uma só vontade, em termos emocionais, que era precisamente nunca evoluir! Uma opção voluntária ou induzida, num ambiente em que o rebanho é a forma comum de sociabilização. Como se de um filme se tratasse: de ficção científica, em que o sentimento é reprimido e ilegal.
O lado cientista tentava decifrar a fórmula científica que poderia levar a que algo se afastasse, voluntariamente, do Nirvana emocional – mas a comunidade científica mundial não acreditava que existisse prova de que alguém conseguisse, voluntariamente, repelir sentimentos e, como tal, o objecto de pesquisa caiu no esquecimento.
Testemunhas anónimas deixavam o seu testemunho, de momentos de pleno sentimento e as diferentes formas de expressão que haviam assumido para cada uma delas. Era como um livro, básico e de escola primária, em que o público tentava que o primata aprendesse, mas os ensinamentos da república das bananas prevaleciam sempre. A comunidade científica internacional tentava agora um derradeiro plano: a criação de uma rotina, na mente do primata, de maneira a que as emoções fossem estimuladas diariamente. Teletrabalho, obviamente! A uma distância segura e sem contacto! Tal era a esperança depositada no projecto!!!
Em Evia, de pés ao alto sobre o varão da varanda, de olhar perdido na beleza do horizonte. Vinte e nove horas e meia a guiar, de queixo caído na maioria dos trajectos, de corpo salgado na totalidade das paragens – tão belas e recompensadoras as previstas e as imprevistas.
Vi inúmeros tons diferentes de água, conforme a luz nela incide, abrandei a velocidade para deixar passar ursos (quando, na vida real, devemos sempre acelerar, bem sei), ajudei um cágado a atravessar a estrada, andei misturado com o povo numa típica excursão à praia.
Saltei do topo de um barco para o “azul profundo”, com os seus vinte e sete graus de temperatura e tão transparente quanto a água da piscina. Arrisquei ficar sem gasolina, encontrei desconhecidos que já não o são. Conheci o sempre imprevisível carácter Grego, almocei com os donos de uma taverna.
Nadei como se fosse um puto e talvez tenha sido esse puto o que fez tudo isto – com um sorriso aberto, lágrimas de satisfação e alegria, um coração que parece expandir, após o inspirar obrigatório de quem suspira enquanto escreve o que se passou com uma vontade enorme de voltar a repetir, com mais tempo em cada etapa.
Até podia ser o nome de uma nova série a estrear mas foi apenas uma conjugação de eventos felizes. O voo de ida já estava marcado, check in feito e essas burocracias todas despachadas! Era a hora de fazer a mala!
Coloquei todo o meu ar minimalista e, aspirando demonstrar ser um sábio dessas coisas, lá coloquei o básico necessário e duas peças de reserva, não fosse o Diabo tecê-las…o Diabo não teceu, o conjunto idealizado era O perfeito!
Chegada a Lisboa numa madrugada sem comboios nem autocarros…uma busca rápida por um hotel e, já alojado, uma Super Bock! Aquela lágrima de saudosismo, orgulhosamente derramada, a conscientização de que…sim…há mais! A mente perde-se por campos de cevada sem fim, o líquido fresco escorre pela garganta, o humilde narrador exclama um Ahh, curto na duração mas infinito de emoção!
Viagem até ao Porto num comboio cheio (sexta-feira), a francesinha comida no local de eleição, a casa (onde vou ficar hospedado encontrada). Umas pequenas compras, regresso a casa para desfrutar de um bom banho e uma cerveja – enquanto observo os aviões. Adormeço.
Acordo com o aviso que a hora do casamento está próxima e, já fardado a rigor, chegamos a uma belíssima capela, em cima do mar. A beleza da paisagem a complementar a espiritualidade da capela, os noivos que chegam e casam, os convidados que não pararam de chegar. Da beleza da capela e dos noivos para o local da cerimónia que, soberbamente localizado, nos recebe de copo fresco de Caipirosca…
O copo de água decorreu maravilhosamente e, tendo sido desafiado, concordei ir ao Jamor (é óbvio que não fui torturado e disse que sim, assim que sugerido). O ponto de encontro foi em Pinheiro Manso e, rodeado por quatro maravilhosos Portistas, fizemos uma viagem divertida e rápida, segura e bem sustentada, por um manjar digno de um grupo como o nosso!
Limpamos a Taça de Portugal e, findo o jogo, fiquei no Humberto Delgado. Recebi os noivos no aeroporto, voamos até Atenas e eu…vim para casa! Cansado, feliz e a pé…desde Syntagma!
As melhores 72 horas da minha vida!
Futebol Clube do Porto vence a Taça de Portugal 2022.
Sentado numa taverna, onde acidentalmente vim parar no primeiro dia, vou relembrando o que já passou.
O primeiro passeio exploratório, sempre feito sem mapa para propositadamente me perder, terminou aqui. Seriam umas 18 horas e, após virar à esquerda (contra a indicação do GPS que indicava o caminho em frente como sendo o correcto), parei porque o empregado se atravessou na estrada e exclamou “Look no further, this is the spot!”
Não conhecendo as certezas dos outros, fiz o obséquio de obedecer e, após largar o carro no meio da rua (“está perfeitamente estacionado”, disse o empregado, enquanto me abria a porta para eu sair), dei por mim num ambiente tipicamente Grego: comida, amena cavaqueira e bebida.
Um freddo expresso sem açúcar, uma garrafa de água, e eis o vosso humilde narrador alegremente a observar o que o rodeia, os cheiros que chegam do grelhador, a moussaka que passa, os copos que voltam a ser enchidos – numa coreografia genial cujo único propósito é a boa disposição!
Esta ilha é muito bonita e uma só visita fica aquém de tudo o que certamente não vi (há muitos lugares acessíveis só por caminhos de cabras, que obrigam ao aluguer de um 4×4), outros que tive a felicidade de encontrar e outros que só um diálogo profundo com os locais permite encontrar (mesmo que interrompam o domingo de Páscoa para levar o turista a locais que são um exclusivo Grego).
O sentimento, antes do regresso a Atenas, é sempre o mesmo: uma felicidade imensa por ter colecionado mais uma ilha ao mesmo tempo que uma estranha angústia nos questiona: porque não ficas? Sim, para sempre!
O coração cheio de felicidade por tudo o que os olhinhos viram, os aromas que o nariz cheirou, o que pudeste tocar, o que pudeste saborear, os inúmeros pássaros que escutaste – mesmo durante o desafio de Páscoa (que consiste no lançamento de petardos, entre as 11 e as 12, de maneira a aferir qual a aldeia que produz mais ruído…),
Há algo de profundamente recompensador em cada uma destas ilhas – talvez o reconhecimento de que há sempre mais para aprender – num exercício de conhecimento que não queremos que termine nunca….pelo simples estímulo de satisfação que produz.
Rodeado de água por todos os lados, num exercício de solidão autoinfligido, abastecido com o mínimo necessário, percorro o caminho dos comuns enquanto, pelo canto do olho, vou procurando um canto tranquilo para ler, junto ao mar, com café gelado e água. “Não tem de ser obrigatoriamente um canto”, dou por mim a pensar, um sítio minimamente agradável onde possa largar a mochila, abrir o livro e, com a paisagem visível pelo canto do olho, desfrutar de toda a atmosfera criada.
Sorrio, ao pensar no porquê do canto do parágrafo anterior, enquanto largo tudo num sítio bem protegido do vento, de frente para o sol e com o Porto visível. Não é o melhor sítio do mundo – não possui nenhuma das comodidades a que estamos habituados e, visto ao longe, poderá haver quem, tal como eu, consiga ver um oásis de paz só superada pela Fortaleza da Solidão que, como todos sabemos, não passa de ficção. Assim, e ciente de que a realidade que tenho é perfeita para a leitura, sento-me, de pés virados para o mar e com as costas almofadadas por uma duna, num conforto de total imersão na natureza, enquanto à tona, posso agora submergir no livro.
A transferência de lugar dá-se quando o vento resolve mostrar toda a sua força e, como uma folha que ondula por entre brisas cruzadas, o humilde narrador está agora a ler numa esplanada, em frente ao Porto, enquanto saboreia uma Heineken (a primeira de 2022). O anfitrião puxa pela conversa e pergunta o que faço ali (há sempre uma pergunta existencialista na calha de curiosidade de cada um de nós mas os Gregos são mais tenazes na forma como questionam). Respondo que busco a paz de uma esplanada, o devaneio de um bom livro e a hidratação de uma cerveja. Ele olha-me, do cabelo aos pés, e exclama “The Greek way” e eu, com um gesto afirmativo com a cabeça, concordei com ele.
Devaneios de uma tarde de total ausência de esforço – 26/3/2022
Uma das primeiras preocupações, de qualquer expatriado que se preze, é a sincronia entre o intestino e o local onde agora se encontram. Em Portugal temos produtos lácteos maravilhosos mas que em nada se assemelham a uma República da Irlanda ou Grécia (são diferentes, não estamos a aferir qualidade).
Num país que deu a democracia ao mundo, nem a prisão de ventre é permitida! Numa dieta improvisada, que normalmente começa numa quinta-feira, eis o vosso humilde narrador a consumir iogurte, com nozes e mel, que nem um esquilo a almoçar com um urso, num planeamento cuidadosamente delineado, de maneira a ter um fim-de-semana de “plenos poderes”, sentado no trono, orgulhosamente obrando tudo o que a semana reuniu até então.
O poder de todo um filme de aventuras, que começa com o primeiro take e só termina após o herói principal desaparecer. Toda uma limpeza interior que supera qualquer meditação, os sons que se assemelham a taças tibetanas que, muito depois de manuseadas, prolongam o seu som até uma última vibração muito ténue. O amontoado de todas as virtudes e insucessos da semana para, com uma purga turbinada, enfrentar a nova semana.
O autoclismo que encerra todo o devaneio merdoso, enquanto o nadegueiro culpa o Gameboy pela baixa temperatura a que se encontra. Porque és um homem de prioridades, terminas o Super Mário em 45 minutos e, após uma cuidadosa limpeza de toda a zona de batalha, exclamas, enquanto gentilmente bates na barriguinha: Ahhhhhh
E sabes que estás pronto para um novo dia…
“Do not touch” must be one of the scariest things to read in Braille.
Não sei se é um acto de autoflagelação ou apenas diferentes manifestações de força: se por um lado a neve destruiu grande parte das árvores fracas da rua, por outro ei-las que brotam com o dobro da força, no mínimo, que eu não sou gajo para ir lá medir…a olho, carecendo de certificação científica, vá…
Onde jaziam tocos do que outrora haviam sido árvores, olhando sem esforço, vemos agora um vigoroso tronco bébé que, claramente, não precisa de cuidados maternos. – Tens um futuro brilhante, trocamos hoje impressões. Infelizmente, talvez fruto da idade, não obtive resposta mas, o que a vista deslumbrava, era prova suficiente!
Numa fase em que não há nada palpável mas, consultando a cloud, está lá tudo – palpável, com sentimento, com o sorriso envergonhado que tanto aprecio, com os silêncios que dizem mais verdades do que qualquer Bíblia que se queira interpor no nosso caminho.
Clicando no rato consigo obter todos os detalhes de um dado ficheiro mas, a natureza humana não se deixa subjugar por um rato, independentemente do modo como conduzimos a seta na direção que pretendemos clicar. Assim, é necessário compilar todo um conjunto de instruções, cuidadosamente programadas, de maneira a extrairmos essa informação, do modo menos automatizado do mundo – porque lidamos com a natureza humana, usamos a computação como meio para, por tentativa e erro, tentarmos definir a direção aconselhada que, misturada com sentimentos frescos do miocárdio, resultam numa forma quase infalível de amar.
O cérebro tem, constantemente, uma imagem dela em memória, como uma ROM que permanentemente o desperta para um suspiro que mais não é do que um catalisador para a frequência com que pensa no assunto! Ou não será sequer racional, devaneia sem pensar! Talvez tenha existido uma primavera árabe dentro de si e ele não houvesse escutado os gritos de celebração, talvez se tivesse rendido a um sentir diferente que mais não é do que a ansiedade normal de quem aguarda o abraço seguinte…
Num raro momento em que a cabeça consegue pensar eis que tenta expirar uns ares de macho latino, numa vã filosofia de vida, que termina com mais um suspiro, este já com um misto de mal estar entre o cérebro e o miocárdio (um diálogo entre tecidos esponjosos)! E, tal como uma esponja que sorve a água do corpo, ambos tinham consciência do quão arrojados estavam a ser, tendo em conta o terreno que, ainda não haviam pisado, e já estavam apaixonados!
É bom tropeçar no desconhecido! Sobretudo quando o sentimento de partilha de ambos está perfeitamente alinhado!
A promessa havia sido feita, perante si mesmo, de que tal não voltaria a acontecer! A insensibilidade iria ser a poção mágica, que o livraria do efeito da magia negra, que fingia sentir padecer. Havíamos ultrapassado a fase do fingimento, dada a forma como havíamos sido atingidos, e o despudor da conversa só era mantido porque somos produtos de famílias, que dispensaram o seu tempo e dinheiro, na nossa evolução como seres humanos socialmente integrados!
Já não eram calafrios mas sim todo um corpo humano que cedia, já eram bandos de pássaros que o acompanhavam, com escoltas das mais belas borboletas que a natureza é capaz de gerar. Havia uma falta de apetite que, logo depois, era contrastada por um apetite insaciável que o obrigava a respirar fundo – muito rapidamente, para não deixar o cérebro pensar e deixar apenas o coração fluir. A pulsação era mentalmente medida, no único esforço para o qual o músculo era solicitado, de forma a manter todo o restante conjunto livre para desfrutar.
Sem palavras e com imensos silêncios nas respostas, com voyeurismo cibernético a acirrar, com palavras simples e, no entanto, tão reveladoras quanto quem as usa para se revelar, com gestos distantes que são superiormente sentidos e com movimentos firmes e bem direcionados, que obrigam a uma rendição emocional para, juntos, construírem a sua história, a fénix emocional de um casal muito bonito.
Nunca, se não houvesse uma intenção clara, eu ousaria trincá-la como trinquei…não consigo descortinar um nível de insaciabilidade que pudesse ter conduzido a um acto tão irreflectido quanto saboroso. Quando recordo o momento, mais não consigo do que desejar nunca mais esquecer de andar com tzaziki no bolso! Um bolso refrigerado, seja, alimentado por um power bank escondido no bolso…porque não? O desejo é louco…mas quem deseja apenas sofre de insanidade temporária!!! Inimputável, ou talvez não…
Ao longe eu era capaz de distinguir toda a minha dentição mas, estar longe não estava perto dos meus planos!!!! Apareci pela esquerda e notei, assim que nos vimos, que a cor e a temperatura dela tinha sofrido alterações. Parecia ter agora o corpo mais bem delineado (é possível aperfeiçoar a perfeição???), um corado bem dentro do erótico, um olhar que só exclamava uma expressão silenciosa “Come-me”!
Depois do orgulhoso, corajoso e tipicamente lusitano “engolir em seco”, eis que a tenho nas mãos – o odor que exala, a forma como sua de “emoção”, o ar salgado com que me encara…mordi-a ali mesmo, arriscando mais uma acusação de atentado ao pudor. A língua, as gengivas, os dentes…de repente toda uma revolução industrial palatal saúda-a!
Foi a melhor espetada de frango que já comi!
A maturidade mais não é do que a conquista do saber manusear as sucessivas ferramentas que nos são disponibilizadas para desfrutar do verdadeiro sentido da vida. 🤗
Uma lufada de ar fresco! Senão, vejamos: após um recolhimento deveras antecipado, em relação ao habitualmente praticado, e após um acordar tão sereno que ainda consegui encontrar o culpado pelo miar de presença, arrastei-me até uma varanda, gelada pela temperatura mas, obviamente, a descongelar pela minha ardente presença, para degustar um arábico, duplo, e aguardei, com uma paciência – que deixou de ter limites para ter admissões muito reservadas – por um dos espectáculos diários que a natureza nos proporciona.
A cadeira colocada virada para a montanha que, apesar do aumento da temperatura, ainda ostenta uns, muito breves, fios de neve, e o café a estabelecer a temperatura das mãos. Ao longe o barulho de estores, que vão sendo levantados para mais uma jornada de trabalho, por cima de mim, pendurado numa antena, um pássaro preto e branco que parece perguntar-me o que faço ali. Tento estabelecer contacto ocular mas a ave não parece querer deixar transparecer em que direcção está a olhar. Envio uma mensagem telepática que, espero, seja entregue. O pássaro olha-me e, com um desdém de quem não lhe interessa sequer defecar em mim, parte rumo ao nascer do sol.
A luz parece ligada a um reóstato que intensifica o céu – ou será a lua que tirou a intensidade? – e o vosso humilde narrador mais não conseguiu do que esboçar um sorriso aberto e lindo perante a natureza que o obrigou a render-se! O café foi sorvido, o cigarro foi fumado e o prazer do início do dia ainda perdura.
É com um sol quente, enquanto bate na cara, que vos escrevo. Com uma montanha branca, no meu lado esquerdo e uma cidade a derreter, no meu lado direito – um bom retrato da beleza da vida que, de um lado, possui montanhas – que ora estão escaldantes ora estão geladas e, do outro, mostra as consequências, a aprendizagem, a maturidade do processo.
Ambos os pés em cima do corrimão da varanda do quinto andar, uma Coca-Cola fresca e uma boa leitura em perspectiva – eis um bom domingo, por entre momentos de saltimbanco, à mercê de nuvens frias e teimosas que teimam em nublar o maravilhoso sol que, por entre elas, nos vai piscando uns raios solares de incentivo.
O quarto é virado para trás (um luxo, numa capital onde vive mais de metade da população do país) e o despertar é natural…ora com o inconfundível ruído do vento a passar nos suportes dos toldos que, ao oscilar, criam uma melodia diferente de cada vez, ora com um pássaro que aproveita para se lavar, numa concentração de água que habitualmente aí existe,
A vizinhança é espectacular e consigo ter sol no apartamento durante o dia inteiro…bravo, como se celebra por cá. Tudo existe num raio de 250 metros e o centro está a cinco minutos de distância! Este momento de felicidade é uma conjugação de tudo o que anteriormente foi enumerado, num contexto de coração saudosista. De quê? Não sei…vou continuar a procurar!
Durante a vida na Irlanda, eram comuns – chegou a acontecer em Agosto – os alarmes meteorológicos (o de Agosto foi quando a temperatura chegou aos 26 graus centígrados e o Governo ponderava evacuar o país) mas, foi com grande espanto, que presenciei o nevão desta semana – digno da República da Irlanda, num dia de indisposição meteorológica!
Há, obviamente, algo de sarcástico no fugir das tempestades para as vir encontrar, mais serenas, mais maduras, muito menos imaturas…mas não deixam de ser tempestades!!!! 🙄😂
Hoje foi dia de trabalho, após dois dias de feriado por imposição governamental, e o caminho fez-se por entre vários tipos de neve: a que eu designo por Napoleão – porque é suficientemente estável para caminhar de mãos nos bolsos, o Hitleriano – que obriga a um reequilíbrio constante, obrigando a que as mãos se pavoneiem em saudações menos dignas e, o meu preferido, o John Holmes – em que o barulho produzido pela neve, já bastante empapada e aguada, reproduz com extrema exactidão os sons outrora escutados nas produções desse tão viril actor de outrora.
Passar por baixo de uma videira carregada de neve a assemelhar-se a um mergulho numa gruta ao ar livre, os gatos – sempre eles – que olham para ti com o desdém habitual de quem não é reconhecido por lhes dar de comer, o mergulho nas escadas rolantes do metro e, ainda com mestria para fechar os olhos até ao destino, o submergir do metro para a realidade branca do exterior. O transitar por entre os ditadores acima referidos e o constatar que hoje trabalhamos juntos no escritório!
Os dias assemelham-se a horas de bem-estar, procura livre de novos projectos, avaliação do dia anterior, gargalhadas genuínas de quem está numa equipa de gente que sabe estar satisfeita. Sobretudo sabe estar, que é superiormente complementado pela satisfação.
É não ter dormido, num misto de antecipação e por força de uns eventuais berros, em norueguês, de um hipotético colega de casa, enquanto matava adversários num cenário virtual? É estar tão sedento, que o saciar a sede se sobrepõe ao efeito habitual dos cafés da manhã? Não faço ideia…
A viagem passa como o dia de casamento: muito rápido, mal tens tempo de abraçar todos, já é a hora da despedida…um piscar de olhos e estávamos em Páros e, eu que já conheço o caminho, sei que depois são 45 minutos…que são percorridos com o vosso humilde narrador a esfregar as mãos de contentamento por, finalmente, ir pisar esta terra!
Fui o primeiro a sair do barco (porque tinha um camião encostado à bunda e, com estímulos desses, eu fujo), sem qualquer comparação com o parolo que se levanta assim que o avião aterra, e meti uma primeira velocidade curta, logo seguida de uma segunda e a mudança do aspecto visual exterior de “turista” para “desconhecido que tem um passo decidido pelo que deve conhecer a ilha”. Qual Batman, rindo às gargalhadas por dentro, parei no que me pareceu um local de culto dos locais. Pedi um freddo expresso sem açúcar e contemplei o mar, enquanto um suspiro se soltava de mim…exactamente assim, como se eu observasse um suspiro de satisfação que se afastava de mim.
A menina do café depressa descobre quem sou, já que a amiga é quem trabalha na recepção do hotel onde vou ficar e, fruto dessa feliz coincidência, vêm-me buscar. Sou obrigado a retirar o pé da água quente do mar para conhecer o hotel que é a 100 metros de distância…
Pouso tudo, tomo um duche e saio para me perder – algo fundamental para mim, assim que chego a um local diferente (obviamente não se aplica nas viagens no continente africano, sobretudo no Krüger National Park…como o “outro”!). A praia é interligada a outras praias, de ambos os lados. O sol está a descer e há que capturar o momento – primeiro com a mente e depois com o telemóvel. Perdido vou fotografando o caminho, sem deixar de espreitar o pôr-do-sol que se prepara…
O sol já se pôs, o jantar estava maravilhoso e o iogurte de sobremesa foi o gesto desafiador para um passeio pela beira-mar…
Como se de uma feira popular se tratasse, os caracóis são a montanha russa perfeita para os meus olhos se regalarem; são inúmeros os caminhos que eles percorrem e, com a ajuda da natureza, já os vi ondular – de uma forma tão ousada que, pela primeira vez na vida, exclamei: estes cabelos intimidam-me…ao ponto de eu desejar que os meus olhos não me traiam! Mas eles, cobardemente apaixonados pela emoção do que presenciam, imediatamente fixam-se na forma perfeita de uns lábios que, em detalhe, parecem ansiar pelos meus!
Sobejamente traído por todo o bem estar da situação, ciente – tal como um espião, um qualquer agente duplo num qualquer país do mundo – de ter sido desmascarado, de sorriso inocentemente apaixonado no rosto, de pensamento completamente arrebatado pelo sentimento, a dar uma boa inspiradela, antes de voltar a fixar-me naqueles lábios tão bem definidos, tão carentes dos meus, tão traídos pela vida própria que possuem, aquando observados!
Observo as linhas das orelhas, num planeamento minucioso do melhor ângulo para as saborear, prevejo a ponta do nariz húmida – como início de uma brincadeira com comichão, o pescoço está totalmente reconhecido e, após análise dos dados apurados, o ponto de união de ambos os corpos perfeitamente apurado – num ângulo que permite a troca de mimos enquanto encaixado em outrem.
Os ombros não serão suficientes para suster o ímpeto, e também não serão poupados a uma apurada análise de sensibilidade! Já o peito despido, dita o decoro, obriga-nos a saltar a descrição para o umbigo – uma covinha amorosa, sabiamente colocada numa barriguinha perfeita.
As coxas percorridas pelas pontas dos dedos, como um sonar humano que reage ao toque, os corpos totalmente rendidos, um no outro!
Sentes, claramente e muito antes de acontecer, naquele primeiro momento em que os olhos se entrelaçam, que a onda de choque te vai atingir e, instintivamente, o teu corpo parece recuar perante um desejo que te impele! Há uma espécie de salto fantasma, que possivelmente só ocorre na tua imaginação (a expressão anterior carece de valor científico; não há provas factuais…a imaginação recusa-se a auto incriminar-se e o recurso aos tribunais está fora de questão!).
Avanço, com a confiança do Alex, no Madagáscar, pronto a ser lançado de uma carcaça de avião, pilotada por mamíferos superiores. O passo é seguro e, olhando à volta, pareces observar borboletas…exiges explicações à tua imaginação e tudo o que escutas são gargalhadas como resposta. Terá a primavera chegado mais cedo? Interrogas-te…e a imaginação envia o som de ainda mais gargalhadas…O cumprimento é comprido, duradouro, acariciador! A tua mente deixou de interrogar a imaginação e sorri com ela, como dois bons amigos, abraçados, a observar o desenlace.
É verde, a expressão que mais recordo dela, talvez sinónimo de uma beleza absolutamente arrebatadora. Um nariz perfeito, como que anunciando uns lábios que me chamam. Tremo de emoção perante o arrebatamento consentido, sei que dou por mim fixado nas expressões e, a qualquer momento, aguardo que entre uma qualquer polícia que nos prenda. Saberia descrever todos os detalhes que fui observando, principalmente quando sou sempre correspondido com igual atenção, finjo não saber o que sinto para, como resposta, ouvir uma duradoura e sonora gargalhada da imaginação.
Chegou pela esquerda e vimo-nos! Mas fingimos não ter visto – num jogo de fingimento que nasceu nos tempos mais antigos da civilização. Continuamos a olhar-nos, mas desta vez já com uma audiência de espectadores casuais que mais pareciam esfomeados do que propriamente predispostos a aprofundar conhecimento. Indiferentes a tudo e a todos acabamos na mesma mesa…por vicissitudes várias da noite talvez se tenham até beijado mas, arrolado como testemunha, o kiosk nada confessou!
Talvez a conversa fosse interessante para ambos ou talvez fosse apenas uma noite de verão na Boavista mas, por momentos, senti paixão pelo sentido que tudo fazia naquela conversa! Continuamos a partilha de informação e sorrimos das incoerências que faziam tudo ser coerente, do diálogo fluido que parecia ter décadas de entrosamento, das gargalhadas sincronizadas que parecíamos ter inventado.
Era como uma brisa agradável numa noite de verão Ateniense – refrescava-me a mente ao mesmo tempo que a visão turvava, arrefecia-me o corpo ao mesmo tempo que ele aquecia, enchia-me o coração ao mesmo tempo que ele pulsava!
A expressão muda e, apesar do peito cheio de um bem-estar sem igual, já sentes a nostalgia da ilha – as noites mal dormidas a pensar, enquanto ao longe escutavas música inglesa pela noite dentro, os caminhos que percorreste, os saltos que deste face a cobras e lagartos tão rápidos que só a atenção permanente te permitiram detectar, a felicidade de poder percorrer caminhos com que sempre sonhei e a alegria permanentemente presente.
Alheado de copos, muito embrenhado no café e na água, a sede de querer conhecer tudo enquanto sentias que não tinhas conhecido nada, a vontade de tudo conquistar sem em nada tocar. O sorriso sonoro que, por momentos muito breves, te envergonhava a ser compreendido por quem te rodeia, porque o entendem. O caminhar altivo a identificar a tua vontade de fazeres esta descoberta sozinho – sem quaisquer aborrecimentos excepto tu próprio que jamais te aborreces sozinho.
A chegada ao porto de partida a ser feita pela obrigatória passagem pelo caixote do lixo onde ontem desmarcaste as provas de que havias fumado dentro do carro – recordaste o ar dançante com que saíste do carro, ao som de Peter Tosh, e o quão reconfortante foi esse momento que antecedeu a tensão normal anterior à entrega do carro alugado (há sempre algo mal quando fazes a entrega mas, com seguro contra todos os riscos, é só entregar as chaves).
Até já pensas em deixar de fumar…num devaneio típico da meia-idade! Como se, em vez de investir num cabriolet, resolvesses investir em ti….Sentes alguma vergonha pelo que sentes interiormente pois parece que roubas felicidade quando, na realidade, ela vive dentro de ti. Percebes novamente que não precisas de ninguém para ser feliz mas interrogaste-te se a felicidade não seria maior – sabes a resposta mas não a revelas ao mundo….és um egoísta no que à tua felicidade diz respeito!
E ao chegar ao porto de Katapola recebes um email com boas notícias….podia ser melhor? O futuro a mim pertence!
Dia de entregar o carro – começa a alavancagem de emoções…fazes força e recordas tudo com saudade. Sorris quando recordas o bifteki da ilha que é tão pujante quanto uma feijoada portuguesa – obviamente o facto de acompanhares com tzaziki não ajudou muito na dieta imaginária que te esqueces sempre de colocar em prática!
Que belas férias, afirmas! Com a noção perfeita de que agora és refém do autocarro! Revês mentalmente as praias, o poder teres o teu espaço e tempo, as pedras e os tombos, o escaldão e o hidratante, as três cervejas que custaram €14….dás uma sonora gargalhada naquela que é, por estes dias, a tua padaria de eleição!
Sorves mais um pouco de freddo cappuccino sketo e, enquanto o saboreias, recordas as noites muito bem dormidas, o candeeiro que quase partiste – como um soldado descontrolado, armado de toalha molhada, a tentar matar o inimigo – um mosquito que fazia voos rasantes na tua orelha. Como um Zero japonês, que apostava a vida no alvo, também ele sucumbiu à batalha!
Constatas que já deixaste um pedacinho do coração na Fuzeta e na Oura, enquanto criança. Sabes que África ficou com um pedaço talvez maior – sendo a única porta entreaberta que deixaste, a nível sentimental. O Brasil, superiormente mostrado por dois amigos para a vida conquistou mais um pouco e, quando julgavas que te tinhas tratado, e estavas imune a sentimentalismos, eis que voltas à Grécia para mais uma jornada de pura beleza e dedicação!
De todas as minhas imperfeições talvez essa seja a melhor! Pelo menos é a que mais aprecio – o sentir um oxigénio que amas a entrar, o coração a trepidar de alegria, a emoção da vista na curva seguinte, a sede de aprender, ver e saber perfeitamente o que é amar!
Acordado desde madrugada por um sonho, resolvi abrir as portadas da varanda e buscar inspiração para voltar a dormir o que faltava! Bastou respirar fundo, constatar que havia malucos a nadar e saber onde estava! Foi-se o sonho mas veio o sono – numa perda de imaginação colmatada pela bela realidade…nada se perdeu!
Hoje foi dia de constipação mas até esse pequeno detalhe foi incapaz de travar o ímpeto e a alegria! No cimo da montanha estavam as nuvens e nevoeiro frios e, junto ao mar, o calor habitual – como para chegar a um tens que passar pelo outro o resultado foram alguns espirros que em nada mais deram!
Visitei os dois lados da ilha e constatei que é de uma beleza singular! As cabras que se atravessam na frente do carro, o preço do pequeno-almoço que diminui um euro quando pedes em grego, as três cervejas de ontem que custaram 14 euros…😂 Há uma semelhança enorme com o Algarve dos anos 80 em que, enquanto os ingleses não chegavam, éramos espoliados através de uma aritmética manhosa feita no papel da mesa ou, pior ainda, feita de cabeça e acertada pela dezena superior…nunca há preços iguais e os “recibos” são pedaços de papel retirados de uma máquina de calcular com rolo de papel….🤗😂😂😂
Antes que o sol se ponha já estou em casa e tomo aquele banho retemperador que, na maior parte das vezes, me atira para a cama logo a seguir ao jantar…geração geriátrica…Tenho a dúvida se será isso ou o querer ver mais, conhecer mais e melhor, saber tudo quando consegui ver tão pouco! Não tenho agenda e esse tem sido o grande segredo de todo este regresso!
Não é sono mas sim cansaço puro de quem só falhou uma praia hoje, por culpa própria! As havaianas, que são as mais duradouras de sempre, cederam no caminho de acesso ao barco naufragado! Começaram como chinelos de quarto e, muito provavelmente, acabam aqui a sua história! Andaram em três continentes, voltaram a casa, conheceram sítios nunca antes calcados! Bolas….tiveram um percurso feliz!
Na ressaca do dia resolvi vir para a beira-mar o que, numa ilha, é algo mais fácil de atingir. Tenho um sorriso parvo de satisfação, o peito parece irradiar felicidade e já estudo por que caminhos me vou achar amanhã! Na Grécia os carros de aluguer são entregues com gasolina suficiente para chegar ao posto mais próximo e eu, sentindo-me poderoso, atestei o depósito!
Poucas pessoas conhecem a minha paixão por esta ilha que, nem na intimidade, partilhei. Sabem apenas as que me impactam – da forma que eu prezo e protejo – e pouco mais! E essas eu guardo no coração de tal maneira aferrolhado, que só agora algumas perceberão do que falo. Ainda não saí daqui e já estou saudosista….
É um estado de embriaguez emocional – estás no barco, a alta velocidade, e só pensas na chegada – como uma criança que passa a viagem toda a perguntar se já chegamos!
Alguns dormem, as crianças correm, outros sonham acordados – como eu! Foram dois dias de despedidas que agora se reflectem num corpo sedento de aventura e querer ver, obviamente para crer!
A companheira de viagem escreve, com a mão esquerda, e apanha os cabelos que, entretanto, já se animhavam na minha face. Sorrio, porque escrevo também e não tenho preocupações com o cabelo solto – nem com o dela nem com o meu!
O barco baloiça, por entre a ondulação que vai atravessando, e vêem-se agora os primeiros enjoos de quem sofre nestas máquinas de transporte marítimo. A sensação de coração cheio, aquando da chegada ao Porto de Piraeus, ainda está bem presente – a alegria desmedida, somada com a intemporalidade típica das férias, num resultado de respiração profunda, extremamente calma, e um sorriso capaz de importunar só quem não entende a alegria de viver!
Mentiria se dissesse que nunca havia pensado nesta viagem – e nunca fui gajo de mentiras, mentiria se dissesse que não sinto um nervoso miudinho – desde que a vi, pela primeira vez, que o sinto…recorrentemente! Mentiria se dissesse que é o paraíso – porque muito dificilmente me tirarão da memória tudo o que vivi no Bazaruto e que, muito provavelmente, jamais terei oportunidade de repetir! Mentiria se dissesse que não sinto uma enorme vontade de já lá estar – com os meus botões, os meus livros, a minha curiosidade e os meus horários – e nisso eu sou muito egoísta e jamais mentiria!
Não são as férias de sostrice e descanso puro e duro mas sim a aventura de um Robinson Crusoe tão dedicado a conhecer que faz a ficção confundir-se com a realidade. É a leitura de um pedaço de terra, no meio do mar “plantado”, pelos olhos de um leitor que sempre desejou conhecer aqueles parágrafos, aquela pontuação, toda aquela gramática que sempre lhe encheu o coração. A deliciosa sensação de seres mais um desconhecido, entre turistas, quando na realidade és um residente!
Pensei levar um barco de pesca – para acompanhar o barco que me leva até à ilha, mas depressa me disseram que tal era impossível…pensei em nadar ao lado do barco que me leva, mas depressa me convenceram que a distância jamais havia sido alcançada…pensei em ir escrevendo, durante a viagem, o evoluir das sensações que me percorrem e, graciosamente, fui informado que tal é permitido…assim será!
A estranha sensação maravilhosa que é ambicionar chegar, ver, tocar, cheirar e, obviamente, saborear todos as iguarias locais – as audíveis, as observáveis, as comestíveis…
Era o final de 1988, um ano de aprendizagem – entre o inter-rail despesista e a aprendizagem amorosa, a adolescência e os seus calores, os passeios e os trilhos virgens, novos filmes e novas tecnologias. Madrugadas de filmes, num horário irracional da meia-noite às 7 da manhã – enquanto a casa dormia! Snacks na cozinha ou investidas na noite espinhense, em busca de um aperitivo nocturno.
No horizonte adivinhavam-se mudanças e, fruto da curiosidade própria da idade – com o catalisador da irreverência ligado e a uma velocidade estonteante – o humilde narrador raramente via um filme do início ao fim – bicho carpinteiro ou natureza? Jamais a ciência saberá a resposta!!!!
As almofadas estavam prontas e o público enchia já a sala, nessa altura com a lotação esgotada no máximo de duas pessoas! Barriga composta, por um qualquer cachorro quente improvisado e prontos para ver um filme de quase três horas de duração. Confesso que a natureza sempre constituiu um amor – em querer ver para, posteriormente e se possível, conhecer.
O filme começou e imediatamente ficamos deslumbrados com todas as imagens e a espectacularidade da fotografia! Exclamei “Um dia vou ter que conhecer o sítio onde isto foi gravado!” e o meu irmão, gajo sempre atento a detalhes, indicou a Grécia como sendo o local a visitar. Ao longo da vida muitas foram as vezes que repeti a visualização do filme e sempre, sem excepção, a vontade de “ver para crer” estava presente!
O filme retrata a vida de um homem encarcerado num corpo de golfinho, o amor pela natureza num superar constante dos limites, um ser irrequieto e irreverente que não encaixa nos padrões normais da sociedade e que resolve criar o seu próprio mundo – com os inerentes defeitos e virtudes – é assim que eu o vejo!
Quando cá desembarquei, para dar continuidade a uma saga feliz iniciada em 2015, sabia que teria que ser uma das primeiras visitas! Num misto de teimosia, curiosidade e não deixar para amanhã! Assim, e porque a primeira oportunidade foi usada para ir a Meteora, tratei de começar o planeamento logo após a chegada do Norte! O estúdio sobre a praia a um preço médio-alto, o bilhete do barco com lugar reservado e o certificado digital de vacinação Covid estão prontos e o dia da partida mais não é do que um excitante natural, ao nível da melhor cafeína comercialmente disponível!
Faltam cinco dias de trabalho e depois vou conhecer o paraíso! Não na vossa definição da palavra mas sim na definição do que o meu coração precisa!
É uma Atenas rodeada de fogos – até a tua antiga praia, que só descobriste como fruto da empatia de uma grega simpática, tem chamas como cartão de visita para quem estiver a sair da água. Uma nova vizinhança, em que te fazes acompanhar pela tua melhor personalidade, novas caras – de personagens novos na tua vida, enquanto planeias a única viagem que sempre quiseste fazer, sem que ninguém possa interferir na tua felicidade. Um egoísmo saudável…
Agradeces ao teu instinto toda a intuição que te tem dado assim como o perdoas por te ter permitido, em raras ocasiões da vida, deixar as coisas chegaram a um ponto intolerável – até para ti. Sorris com amigos, com os projectos que lhes revelas e recebes uma solidariedade profundamente amigável de quem, sem lutar, também batalha por ver-te feliz. Estás rodeado de pessoas recentes que sabem, instintivamente, detectar o teu estado de espírito – ora embarcando na felicidade dele ora erguendo-te de uma melancolia passageira que uma qualquer música te possa causar!
És um bombeiro, num fogo imaginário da vida, disposto a dar-lhe um combate sem tréguas – amando ou ignorando, com a mesma paixão e sem nunca deixar a tua integridade ser afectada. Conheces e reconheces a importância dos valores que te foram incutidos e que, com o diapasão da experiência de vida, foste aperfeiçoando à tua personalidade imperfeita. Dás um grito de força e fazes a reserva e agora? Agora só falta fazer a mala e marcar o barco…algo tão simples quanto respirar vida!
As pernas eram compridas e, diariamente, cruzávamo-nos no mesmo lugar. O corpo era desenvolvido para uma idade que não aparentava ter – o corpo musculoso, a velocidade com que se deslocava, a aparente indiferença com que fazia o percurso, tudo nela inspirava uma confiança desmedida! Parecia a matriz da perfeição dos seres, aquela por quem todos copiam – comportamentos, confiança, segura de si!
Era quinta-feira à noite quando, cheio de coragem, achei que tinha confiança suficiente para a enfrentar – num diálogo entre desconhecidos que pressupõe sempre alguma tensão, nervoso miudinho, fraqueza de membros que, no dia-a-dia, nunca nos falham e, até pelo contrário, nos impulsionam para conhecer horizontes desconhecidos. A noite seria seguida por três dias de descanso, numa conjugação de um dia de férias e o fim-de-semana de descanso a que todos temos direito!
Tinha-a baptizado de Kareem Abdul-Jabbar – não só pela altura que tinha como também pelo corpo que era semelhante ao de um atleta de alta competição. Mas, nessa noite, fui obrigado a rebaptizar de Michael Jordan! Pela forma como deu um salto, assim que me viu! Recuei, pois a falsa timidez deu lugar a um medo frenético! Ela atirava-se a mim e eu, de pelos em pé e surpreendido por uma reacção tão espontânea quanto corajosa, dei por mim a tirar a havaiana para me defender! “Se é de violência que gostas então é violência que terás!”
Tirei-lhe as medidas, enquanto reparava que ela se propunha voar para mim. Calço 44 mas a havaiana parecia pequena para ela! Agitei-a no ar, na esperança que o movimento a fizesse debandar mas obtive apenas uma mudança de cor nas costas dela que, pela pose agressiva, se assemelhava a uma leoa, que mostra os dentes antes de matar a presa. Rapidamente recoloquei a havaiana no pé e fugi, rua acima!
Foi das baratas mais ferozes que enfrentei…
Quando o IKA está em todo o lado…Quando o IKA está em todo o lado…
Talvez o melhor de tudo isto seja o tempo que tenho disponível para gastar em mim próprio – não sendo egoísta mas preservando tempo livre para todas as pequenas tarefas que gosto de executar com uma calma capaz de fazer corar um caracol que, apressado, tenta ultrapassar-me. Talvez possa culpar o calor mas a verdade é que ainda não estou aclimatizado tão bem quanto outrora e ainda tenho que tomar doses diárias de chuveiros gelados que, aquando da estadia anterior, já não necessitava.
Sinto uma sadia maturidade em todos os passos que vou dando e que, cada vez mais, fazem diferenciar quem atraio ou por quem sou atraído – numa espécie de magnetismo perfeito, sem histerismos ou desequilíbrios artificialmente sustentados, rumo a um estado de espírito de alegria, conforto e, acima de tudo, paz! Como se tivesse assinado um armistício comigo mesmo e conseguisse abordar qualquer assunto com uma abertura que, por vezes, me choca interiormente sem que a reacção passe de uma gargalhada.
A respiração é profunda e pausada e o que me rodeia traz uma uma satisfação que, não sendo elevada, é sempre constante – como se não descesse de uma velocidade ou subisse mas tão só e apenas mantivesse uma velocidade que, não sendo perfeita, é perfeita para mim. Vejo a natureza de forma mais cuidada, observo as obras humanas de maneira mais cuidada e nutro por mim mais cuidados do que alguma vez tive – não que ambicione ser um metrossexual do século XXI mas porque me dá um certo gozo – dentro da tal velocidade constante – “perder tempo” a cuidar de mim.
Desenho o itinerário da próxima viagem, desta vez sozinho, e constato que o destino tem que ser visitado por um humilde narrador desprovido de companhia e totalmente focado numa viagem com tantos anos de recordação que, contados, seriam suficientes para fazer corar qualquer viajante auto suficiente. Não quero ser um viajante mas sim o tripulante da minha nave espacial de sonhos que, provida de tempo suficiente, me levará a ilhas que ambiciono conhecer e que sei que poucos terão o mesmo desejo – o meu ideal de viagem é mesmo esse…alcançar algo meu, sem seguir passos, roteiros ou conselhos de outrem. Desprovido de catana, de “exploradores” anteriores, mas armado de coragem e disposto a afastar todos os ramos mais persistentes com que a natureza ouse desafiar-me.
As horas passadas no barco mais não são do que a natureza a demonstrar a sua grandeza e tu, com o grande respeito que sempre tiveste por ela, sabes que é possível ver diferenças num mar a ser conquistado por um barco – seja nas gaivotas que o acompanham, nas vagas que ele vai criando ou até, simplesmente, a observar a esteira do caminho percorrido e esse exercício de imaginação é o que de mais puro tens, como arma descarregada, para o desafio seguinte.
Cheguei a 18 de Maio, depois de uma noite sem dormir, na escala em Istambul, enquanto aguardava a autorização do Governo Grego para entrar. A noite foi passada, como sempre movido pela curiosidade, a tentar descobrir ao máximo o novo aeroporto de Istambul que, diga-se, tem uma escala descomunal. Países normais constroem aeroportos, mas os Turcos construíram uma megacidade a que deram o nome de aeroporto! Não falta absolutamente nada…
Completamente estourado à chegada, e sem paciência para o X95, armei-me em capitalista e fui de táxi para o hotel designado. Não era bem o Hilton, como eu havia sonhado, mas dava para cumprir o propósito de descansar. Central, demasiado central, ousaria dizer, estava perto de todo um mundo que conjuga mais nacionalidades do que o tempo me permite enumerar. Um bom iogurte grego, após o primeiro sono, foi o suficiente para me sentir de volta e, sem mais demora, fui espreitar o “meu” antigo apartamento em Antiochias! Estava tudo como eu havia deixado…o mercadinho, a bomba de gasolina, a vizinhança que olhava com ar de quem não acredita que o antigo vizinho tenha voltado.
Já munido de cartão da Vodafone grega e ávido por confraternizar, numa altura em que o simples pensar em estar com outrém pode ser considerado crime, lá liguei aos “suspeitos do costume” que, como se no dia anterior tivesse partido, me saudaram com a saudade e carinho de outrora. A caminhada até Kallithea, para a bougatsa no sítio do costume, o saudar dos soldados que guardam o soldado desconhecido, o ter a oportunidade de voltar às minhas espetadas preferidas de frango, a tripa que reage prontamente ao iogurte e ao tzatziki, o galgar por ruas que conheço como a palma da minha mão. A cerveja de final de tarde, a vista da Acrópole, o coração sempre a encher-se de emoções e a lágrima no canto do olho.
Foram quase dois anos parado – em termos de trabalho. Com perdas irreparáveis, momentos de alegria indescritível e tristeza como nunca esperei viver. O recordar da cidade que me viu nascer mas que está completamente transformada – invadida por estranhos sem gosto, um deserto de locais de confraternização, com o que já foi a maior feira semanal do país a definhar…cada dia me revejo menos ali e mais aqui. Foi com um final que se deu o meu início da procura de algo novo, perto da Grécia – era o objectivo – e, de uma proposta para a Bulgária surgiu um imprevisto grego que, urgentemente, precisava de portugueses nativos e eu, que penso muito pouco no que toca a voltar à Grécia, aceitei….logo.
Os finais têm o dom de serem seguidos por novos inícios e, temendo ou não (um ateu teme menos), voltei a fazer um trabalho que me permite viver num país que quero descobrir, até esgotar as minhas forças. Se me dá poder de compra ou a possibilidade de poupar, como na Irlanda? Claro que não! Mas oferece a possibilidade de descobrires 200 ilhas, por entre um continente – também ele – cheio de maravilhas da natureza…e eu sempre fui um homem de uma natureza diferente dos demais.
Obrigado miúdas, pela vossa amizade tão irreverente quanto recompensadora!
A meio da refeição há um exemplar feminino que se senta na mesa em frente a ti e tu, que és um moço atento, apesar de estares a falar ao telemóvel, exclamas “Semelhante a uma boa fêvera lusitana” e, assim que a chamada termina, o dito exemplar volta-se de frente e exclama: é Português? Corado de coragem, algo imperceptível para quem não conhece, respondes com um quase mudo: sou….
Já no final de um hipotético dia de trabalho recebes uma chamada de alguém com 7 longos anos de experiência que não permite que lhe seja explicado o procedimento correcto para obter o que pretende. A experiência de 7 anos a tentar sobrepor-se a uma série de procedimentos escritos desde a fundação do negócio derrapou para um bairrismo que, sabendo existir, não pratico mas, quando desafiado, fui ensinado a responder com elegância! Dizem os 7 anos de experiência: você é do Norte, não é? Sou, respondeu o vosso humilde narrador. “No Norte sempre foram um pouco lentos de compreensão”, volta o Ronaldo da experiência à carga…”Só com a reconquista aos mouros” respondi.
Sentado num balcão, que combina a temperatura exterior com a brisa fresca que vem do ar condicionado interior, munido de um copo de água e um Freddo expresso sketo, de olhar perdido na esplanada e com um sorriso aberto – esta é a melhor definição do meu domingo.
A patroa da casa que assombra as funcionárias, o café que sai a um ritmo inversamente proporcional à água, as beldades gregas que quase se atropelam para obter o melhor ângulo da esplanada. Os pombos que lutam por migalhas enquanto os humanos reclamam porque a conta está errada, enquanto as motorizadas, sempre kitadas com escapes de rendimento, dão uma sonoridade tão irritante quanto típica na Grécia.
Num canto está o “Abrumhosa”, assim designado porque nunca tira os óculos escuros, no centro a patroa continua, tão exuberante quanto irrequieta, a tentar controlar tudo o que se passa sem deixar transparecer estar tão perdida quanto as funcionárias. Param tudo e sincronizam o que está a ser facturado a cada mesa – num exercício de racionalidade tão atípico nestes negócios – tentando evitar que a Grega, de mão na cintura, volte a reclamar estar a ser cobrada em excesso.
Ao longe, em termos de distância mas não do olhar, está uma diva semelhante à Claire Forlani – numa versão mais humana, mais acessível e de uma beleza ainda mais calorosa do que o “original”! Sai uma mota para fazer as entregas e os nossos olhares cruzam-se, envergonhados mas sinceros, a demora em desviar o olhar deixa a imaginação a transpirar e, cuidadoso como sempre, aproximo o banco alto do balcão de forma a usufruir de mais ar condicionado interior!
Um sorriso, ao longe, obriga-nos a um novo cruzar de olhares e a adoptar uma postura mais defensiva – cruza os braços enquanto acaricia a mão – num gesto de carícia própria que parece acalmar a ideia de carícias menos próprias, conforme definido socialmente.
O corpo está afastado da mesa, uns dois palmos, e apoia o queixo sob as mãos, delicadamente sobrepostas. Braços estendidos e esculturais, cabelo castanho claro que brilha com o impacto do sol. A iluminação natural faz sobressair toda uma simplicidade de uma pessoa que, sem pudor, fixa o olhar no meu! Será um desafio de olhares? Não ouso dizer mas constato que não quero perder! É de olhares fixos que somos “apanhados” por quem nos acompanha mas, sem temermos ser autuados, afundamos os olhos um no outro sem que qualquer lei possa ser aplicada! Uns fora-da-lei sem pudor!
É a única destemida, de um grupo de três pessoas, que enfrenta o sol, com um ímpeto muito mais radiante do que o astro, com os óculos escuros no cimo da cabeça, com um cabelo que, conforme o ângulo vai variando, parece tornar-se mais belo, mais atraente, mais digno de ser tocado. A mão esquerda sobre o braço direito – como que refrigerando a temperatura, o vestido que parece colar-se, mais e mais, a um corpo desenhado por um Da Vinci da anatomia…a forma como lentamente sorve a água, depois do café terminado, é de uma beleza simples mas descomprometida – como se tudo nela fosse simples e, ao mesmo tempo, de uma beleza indescritível que apenas se pode tentar descrever….
Não se trata da história de um jogador de futebol, especialista na marcação de escanteios, como dizem os Brasileiros, mas apenas uma reunião de locais que nos conquistam – não no sentido parolo de quanto mas caro, melhor – mas no sentido emocional do quando mais reconfortante é recompensador, melhor! Este conquistou-me pelos limões! Não, não se trata de uma analogia às partes do corpo masculino, habitualmente penduradas no meio das pernas, mas sim da minha homenagem a uma das melhores limonadas que já provei!
Afinal é sobre limonada, dirão os incautos, inconscientes de que falamos da mãe de todas as limonadas e não de apenas mais uma limonada! Há uma clara diferença que é preciso acentuar, numa tentativa constante de afastar o comum mortal da frivolidade rumo ao conhecimento, ao norte, ao estímulo intelectual! Basta espremer limões, esclarecerá o intelecto do analista desportivo, ciente da sua incapacidade para aprender versus o curioso que, interrompendo o analista, lhe pede para deixar ouvir até ao fim pois tem curiosidade em conhecer, independentemente da aparente simplicidade do assunto.
Talvez a receita seja tão secreta quanto o molho de francesinha, em que nem o cônjuge pode estar presente na preparação, apesar de todos os votos de até que a morte os separe! A verdade é que é um prazer estar a saboreá-la, no calor mais controlado de hoje, assistindo a tudo o que me rodeia, num exercício equiparável ao dos pacientes em estado vegetativo – de olhar perdido, a seguir um ou outro pássaro, tentando não salivar em demasia e, porventura, só voltando a mim quando um carro azeiteiro passa, com as colunas de som num volume ao nível da estupidez de quem o conduz!
É a fruta preferida dos praticantes de tiro, sobretudo nos Estados Unidos da América, pelas semelhanças com o corpo humano (o que diz bastante sobre o povo que constituiu esse país e sobre nós, enquanto seres humanos, que não passamos de uma enorme percentagem de água que possui raciocínio)! Sendo ambicioso, vá, porque certamente há exemplos que claramente já deixaram que ambos se diluíssem!
E porque é de calor que se fala – pelo menos por aqui – anuncio desde já a chegada dos 40 graus, para os próximos dias. Como não pretendo fazer parte do grupo das melancias, vou arriscar e não fumar durante os picos de calor. Já passamos pelos 39, duas vezes, mas numa das ocasiões eu estava na frescura de Meteora, muito longe do epicentro do calor e rodeado de uma frescura de montanha, enquanto subia por caminhos endeusados (dizem) e dava por mim com um joelho brutalmente dorido! Um sinal das trevas, claro está…
São dias de cansaço extremo, sobretudo devido ao calor e independentemente da quantidade de água ingerida. Um corrupio constante para o chuveiro para, com a água gelada, obrigar o corpo a descer a temperatura! Não levo toalha porque o simples trânsito entre o final do chuveiro e o quarto permite que o corpo seque e estou pronto para o chuveiro seguinte. Devo andar com um sorriso parvo na cara mas, quem conhece, sabe o que tal sorriso significa…estou em casa!!!!
Devaneios de uma noite quente, mais uma! – 30/6/2021
O dicionário dá, como significado de abrasador, “que queima, ou abrasa” e “ardente” – o que, em abono da verdade, fica aquém do que estes dias têm sido! Acho que só me recordo de algo semelhante aquando da visita à África do Sul. Dias escaldantes, lá está, com temperaturas mínimas sempre acima dos trinta graus! Sim, um banho nocturno aqui é bem mais recompensador do que um banho na Baía dos Porcos espinhense, num voltar a recordar os 22 anos e a loucura permanente de então – dividida em partes iguais entre sensatez e insensatez! (Talvez não fossem partes iguais mas há que manter a ficção do blogue e, por vezes, mentir inocentemente)!!!!
Deitar cedo para aproveitar o facto de estarem apenas 30 graus e acordar cedo porque a temperatura já disparou acima dos 30 graus! Duches gelados para esfriar a moleirinha que parece diluir-se, num regresso ao estado de um recém-nascido. Ventoinhas, ar condicionado, água gelada, freddo expresso … Sonho com locais frescos e ocorre-me a ideia de adormecer num hotel de gelo que, perante a temperatura actual, se vai diluindo lentamente, adormecendo-me mais e mais profundamente, num equilíbrio perfeito entre calor e frescura.
Caminhadas madrugadoras, longe de casa, regressos efusivamente festejados com quantidades anormais de água. Sonhos eróticos com a partida para uma ilha quebrados pela lotação esgotada dos barcos, a observação da população de Atenas a sair bem cedo para a praia e a confirmação telefónica de que, às 8 da manhã, já há engarrafamentos para aceder às praias.
Almoços Luso-Gregos a manter o equilíbrio gastronómico, com acesso a saladas tão completas que todo o restante é apenas uma série de cerejas no cimo de um bolo de felicidade. A celebração da amizade, antiga e recente, como tónico para uma vida que tem demasiados sorrisos para o vulgar invejoso. A constatação de que foi a melhor decisão da última década!
Obrigado Grécia por tudo o que de novo me dás, dia após dia! – 27/6/2021
Talvez seja uma conjugação de factores que me traz aqui – a cara bonita, a simpatia singular, o facto de colocarem a música grega num volume anormalmente alto, os olhares que trocamos ou as cervejas com que me vai mantendo aqui…não sei! Ou talvez tenha a certeza mas não quero admitir o óbvio! A cerveja é servida a uma temperatura próxima do congelamento que, para mim, é a temperatura ideal – as noites já não são frescas como outrora, ao longe ouço The Cure a tocar bem alto e, de forma envergonhada mas sentida, finjo não ouvir – para não prejudicar o romance envergonhado!
A alteração manual das músicas é feita por cima do balcão – o que prejudica bastante a lucidez de qualquer heterossexual assumido! A indumentária é a armar ao simples e despretensiosa mas perfeitamente ajustada a um corpo que se assemelha bastante a uma ideia antiga – agora tornada realidade – de como uma deusa grega é! Ouvem-se petardos ao longe e, tratando-se da Grécia, não sabemos se me leram e estão a celebrar ou se começou uma guerra civil! Ela aproxima-se e sussurra-me que é normal…como se o normal existisse na Grécia….eu finjo não ouvir muito bem e recebo um sorriso tão empático que acabo por corar. Ela sorri e afasta-se com o sentimento de dever cumprido….por me ter acalmado, julga ela, como se eu estivesse concentrado no ruído!!!!
Interrompe a música que tocava, debruçará sobre o balcão, com um top do qual só existe o topo e um mostrar atrevido de um traseiro que nem esculpido poderia ser criado de forma tão perfeita! Continuo sem conseguir ouvir, finjo apenas que o faço, qual impostor da audição! Só a visão e o coração funcionam – num sincronismo que apenas é interrompido pelo final da música! Não que eu consiga escutar….é a visão que me mantém informado!!!!
Sabíamos que o caminho era longo, apesar de muito divertido e de grande beleza, sabíamos que poderíamos ir no sábado e fazer um dia e meio de carácter profissional, não sabíamos era que nos poderíamos apaixonar. Num pequeno Micra, alugado no dia anterior e intacto após o percurso de Sigrou até casa, ousamos subir em direcção a Thessaloniki, muito embora soubéssemos que o destino era anterior a essa bela cidade. Seriam umas cinco da tarde quando iniciamos uma viagem que sabíamos ser de bastantes horas mas, munidos de uma vontade desmedida, aceleramos pela A1 local.
Googlamos, para ter a certeza que havia resultados de outros Micras terem feito percursos de igual dimensão e, sem obter resultados dignos desse nome, arriscamos ser os pioneiros! A loucura, semelhante a um Pedro Álvares Cabral, fez-nos chegar a uma localidade chamada Kalabaka. Era noite quando finalmente subimos para o quarto 306 e constatamos que estávamos cercados por ruidosos Gregos. Como não somos feitos de genes que nos fazem desistir, saímos do quarto – já livres das mochilas, e fomos jantar a uma taverna que não distava mais do que uns dez passos – actos corajosos de pessoas exaustas.
Talvez tenhamos adormecido, após os Gregos se calarem na varanda exterior ou talvez estivéssemos a planear – mentalmente – o dia seguinte mas acordamos naturalmente e com um apetite voraz. Descemos para um pequeno-almoço típico de uma aldeia e, após saciarmos a fome (que nos países normais corresponde a umas três refeições completas) saímos para explorar as redondezas. O objectivo, para além de visualizar, era sentir – o que é que sentimos quando a natureza é deslumbrante? Foi a nossa pergunta matinal e saímos com a intenção clara de voltar com uma resposta clara e inequívoca!
O joelho direito havia cedido pelo que a caminhada estava fora de questão. Munidos de um Micra “capitalista” (alugado na capital), subimos ao primeiro mosteiro para, em primeira mão, constatar toda a beleza local – ousamos entrar por jardins proibidos, sem comer maçãs ou alterar a paisagem presente, de maneira a obter o melhor ângulo de visão do pequeno teleférico que….transportava mantimentos! Após constatarmos que jamais ousaríamos andar em algo semelhante, partimos para o mosteiro seguinte. Tínhamos tudo muito bem planeado e o Google Maps não passou de um acessório para a beleza e ligação natural que se estabeleceu mas, melhor do que continuar com a descrição, prefiro instigar-vos a conhecer Meteora porque é um dos mais belos locais que a natureza nos oferece! Vão, visitem!
Acordado cedo, com a intenção de conseguir fazer o caminho de casa até ao trabalho a pé, dou por mim numa lição de história diária – principalmente porque ainda não me adaptei a uma vizinhança que, apesar de aconchegante, ainda é um mistério para este “miúdo novo no bairro”! Os desvios constantes levam a novas ruas, novos becos, novos locais e novas realidades – como se fosse um fundo novo, numa reunião via Zoom que não existe mas cujo fundo nos dá uma nova e bela imagem, dia após dia! São cerca de cinco quilómetros, quer no percurso de ida quer no percurso de volta, que percorro com maior dificuldade (mas o mesmo prazer) no regresso a casa – influência de dias intensos de treino e o calor – que já se faz sentir – e que derrete, com maior ou menor grau de dificuldade, o esbelto corpo do humilde narrador. 😎😉😂
As horas de treino passam rapidamente e, apesar de termos algum atraso em relação ao horário planeado, estamos juntos na tarefa de superar as dificuldades que vão surgindo – inerentes a todo aquele que se propõe aprender algo novo…e eu adoro novidades, mesmo quando são amizades que nos confessam algo que já deveríamos ter cumprido e que agora podemos cumprir! É reconfortante saber que, de uma maneira diferente, tocamos no mais profundo de outrem! Ainda não existe música nos bares gregos mas, como tudo na Grécia, nada é suficiente para demover as massas populares de se reunirem, falarem e, obviamente, conspirarem! A Grécia é pródiga em personagens diferentes, pensamentos que outros não entendem ou não se esforçam por entender, pródiga em pequenos e grandes acontecimentos que nos obrigam a pensar, raciocinar, aprofundar e, em última análise, enfrentar o amor da fera grega!
As semanas são um equilíbrio entre o trabalho a desenvolver e o destino de fim de semana a escolher – num país onde não faltam destinos de sonho e onde facilmente consegues alimentar a visão com tudo de gourmet que a natureza tem para te deliciares. As horas, pós trabalho, num exercício de descanso da mente e a escrita de algumas palavras que, juntas, desejamos façam sentido. A saga para encontrar um apartamento continua sem que o humilde narrador sinta qualquer pressão no local em que se encontra – uma espécie de aguardar pela ocasião perfeita – como se de um goleador profissional se tratasse no aguardar da ocasião perfeita para aproveitar a única ocasião em que a defesa adversária comete um erro! A empregada de mesa que tem a mesma simpatia de um monge que já não vê pessoas desde o início da reclusão, o bar que sempre frequentaste e que nem sob tortura divulgarias a localização, os carros gregos que insistem em circular numa zona pejada de pessoas, os cães e gatos que merecem mais consideração do que qualquer outro ser.
São dias de aprendizagem que fazes com o mesmo sorriso de outrora, são dias de sorrisos com a mesma alegria de outrora ou, sejamos ousados, são dias felizes!
O célebre ditado popular pretende comparar duas coisas que são o oposto, uma da outra. Se a aventura começou em Omonia, por entre seres humanos que lutam pela vida enquanto esgravatam os contentores do lixo por comida, prostitutos e prostitutas – com o corpo usado para lá de quaisquer limites que anteriormente tenhas presenciado ou ouvido falar, com negociantes de produtos que não encontras nas cadeias normais de retalho, todo um mundo paralelo ao mundo real de tão surreal que é.
Se, iniciei eu o parágrafo anterior, sem que tenha feito qualquer comparação porque não há comparação possível. Como um astronauta sinto que voltei a colocar os pés na Terra! A vizinhança cumprimenta-se, as pessoas sorriem e sinto que aterrei num planeta em que há todo o potencial para ser feliz. Um quarto maravilhoso, uma senhoria que gere a casa dos seus sonhos, um hóspede que sorri de cada vez que volta a perder-se e é obrigado a recorrer ao Google Maps para voltar para casa.
Este retorno está rodeado de curiosidades que, cada vez mais, me fazem recordar o porquê do amor que me ficou gravado aquando da primeira vivência por terras gregas – as pessoas, os sítios, a meteorologia, a loucura inerente ao povo, o bem que se sobrepõe ao mal com uma naturalidade que só não existe em termos de condução – ao volante, refira-se, porque ninguém é perfeito e o Grego acelera bem mais do que utiliza os travões – numa condução que, parecendo desgovernada ou caótica, atinge sempre os seus objetivos.
O som da linguagem – um amor antigo que de aprofundou – como estímulo para uma audição que ansiava pela rotina de o escutar, a beleza constante pela qual os meus olhinhos penavam e que agora volto a ter que proteger, por trás de uns óculos escuros, as papilas gustativas que parecem festejar este regresso como se fossem tambores Taiko japoneses – por entre kebabs, pitas ou o iogurte – essa iguaria que me faz render e aguardar por permissão mental para a vez seguinte (é melhor abreviar a parte gastronómica, sob pena de engordar este texto muito para além de qualquer limite tolerável). O olfacto a espirrar de contentamento perante toda uma natureza que, doméstica ou não, parece ansiar por penetrar-nos com uma panóplia de cheiros que, apesar de não conseguires reconhecer todos, te agradam – de uma forma que é um misto de espanto, saudosismo e satisfação.
Parece ser um texto em que falo dos cinco sentidos, numa lógica de texto que faça sentido (passo a redundância) mas não posso falar do tacto. Não que exista uma proibição de o abordar mas tão só porque seria deselegante menosprezar a intimidade – algo que sempre preservei com um amor próprio primeiro e sorriso nostálgico ou presente, de seguida. Sejamos oudazes: sentir o toque ou ceder o toque a outrem é algo que o nosso íntimo guarda, numa qualquer “cloud” da memória, e eu esqueci a password de acesso (por vontade própria) – só tenho permissão de leitura mas não posso editar ou modificar, seja de que forma for! Bravo, digo a mim mesmo, de cada vez que me recordo dessa fechadura que, apesar de rudimentar, é uma solução moderna e actual.
Não sei o que é a felicidade enquanto estado de espírito permanente mas reconheço, com muito respeito e carinho, o momento presente de felicidade!
Das caminhadas junto ao mar até às caminhadas por Atenas – se bem que o mar rejuvenesce a alma, a verdade é que a minha cabeça sempre ficou por aqui. Poderão afirmar que menti a mim mesmo durante o tempo em que estive ausente mas a verdade é que fui vivendo, amando, conhecendo e sorrindo enquanto não voltei! Com total entrega – e até dei por mim a não me importar de seguir outrem para que não houvesse interrupções na entrega mútua. Se a vida assim não quis então será porque a Grécia, com o seu espírito livre e amoroso, me quis ainda mais.
Fui fiel a mim mesmo e, na impossibilidade de simplesmente voltar sem trabalhar (que chegou a ser questionada, uma vez que tenho toda a documentação de cidadão Grego), entreguei-me nos braços de um amor antigo que, mea culpa feita, eu não soube preservar – com todo o respeito e carinho que ainda conseguimos ter.
Assisti a uma partida deste mundo que levou muita da beleza que só uma amizade singular proporciona – a irmã que nunca tive decidiu descansar de todas as agruras que a maldita doença lhe provocava e jamais deixarei de a chorar – pois sinto, constantemente, a sua presença – com o sorriso maravilhoso de incentivo, o abraço de profunda amizade, o recordar de segredos tão nossos que eu juraria terem começado quando ainda éramos bebés. Visitarei o Petros, na ilha que visitaste, para recordar locais que não conheço mas, sabendo e conhecendo a tua curiosidade, estou certo que conheceste toda a ilha para depois, com conhecimento de causa, teres deitado na melhor praia que havias descoberto. Sinto em mim o teu incentivo e tal advém da forma única como crescemos – como grandes e inseparáveis amigos.
Num dia concorro a Sofia, na Bulgária, mas dada a demora da empresa a responder, a recrutadora da agência falou em Atenas, como se de uma alternativa se tratasse!!!! O meu mundo parou e o meu tom de voz despiu-se perante a possibilidade de regressar. A recrutadora estava pasmada com a expressão que eu usei, assim que ouvi “Atenas”. Hoje tomei a liberdade de lhe enviar uma mensagem, com uma fotografia anexada, a agradecer o facto de estar aqui. A resposta dela não tardou e dizia “Raramente nas fotografias vemos a felicidade nua que exibes. Um obrigado por me teres deixado participar na tua felicidade”!
Tenho a certeza que ela também tem razão e, tal como outrora me dizias que a Grécia era o meu país, também eu começo a ter a certeza que ambas têm razão – eu é que simplesmente neguei o inegável! Um abraço muito forte, com todo o cuidado. Daqueles que as pessoas comentavam que lhes causava inveja!
Dia fenomenal em que consegui estar com o melhor amigo Grego e com a melhor amiga Grega (sem qualquer relação de parentesco entre eles). Foi reconfortante receber o abraço do George e voltar a viver a “doce loucura sã” da Angelina, foi bom continuar as conversas como se o tempo não tivesse passado, foi delicioso estar com duas pessoas tão singulares quanto a pluralidade cultural que representam para mim.
Amanhã começa a formação e continua o convívio com os amigos que ainda falta rever – a Maria, o Thanasis, o Mido (que saudades de um Egípcio que é o mais europeu de todos nós), rever a Vicky, ir ao Dry…uma infinidade de tarefas que encaro com um sorriso aberto que condena a palavra “tarefas”, atrás usada.
Estamos no terraço a conversar sobre o dedilhar de guitarras que, entretanto, transformamos em dedilhar de corpos femininos gregos – influência do país em que nos encontramos 🙄😂
O desporto como forma de aproveitar para passear – estamos numa cidade em que tudo pode ser feito a pé e, o vosso humilde narrador tem uma bolha de água em cada pé para provar o amor que coloca em cada um dos momentos exploratórios! (Orgulho Lusitano!!!!).
Tenho sono mas a temperatura amena convida a estar a confraternizar enquanto, de maneira participativa mas talvez egoísta, vos escrevo estas palavras! Admito…ainda acordo de noite para me beliscar e poder exclamar: é verdade, estou de volta à minha amada pátria!
Já em casa da mãe há uma predileção por um degrau – não há nada de especial com ele mas, se aprofundarmos a relação, um degrau pode ser tudo na vida – um assento improvisado, o último ou o primeiro a ser conquistado, um exercício de cardio, um ponto de encontro. Quando aprofundado tudo pode ser o que nós quisermos que seja…
Uma viagem de 4 horas e meia transformou-se numa aventura de 40 horas – a obrigatoriedade de dormir em Istambul porque o Governo Grego obriga a um registo prévio de todos os cidadãos que chegam e eu cingi-me ao teste negativo de Covid….Quando soube só pude sorrir e, ao telefone com um cidadão local, rirmo-nos porque a chegada é feita com o amor grego – só entra se cumprir – e está de tal forma enraizado que os países de partida se recusam a deixar voar, quem quer que seja, sem o Passenger Locator Form!
Nada nervoso mas ansioso por fazer o que neste momento faço – beber uma limonada nos degraus de Plaka! O local de reunião que sempre usamos, o ponto de encontro onde anda sempre um amigo, o meio caminho entre as pitas 🥙 e o prazer de aperitivar, entre o ócio criativo anterior ao jantar e o visualizar o passado com o respeito e intimidade que ele merece. As flores que enchem o quadro visual de cores, os gatos que se passeiam como os verdadeiros donos disto tudo que realmente são.
A Grécia não é igual a nenhum país por onde eu tenha passado – há um orgulho imenso na república mas também gozam os percalços de que a mesma sofre, há uma solidariedade sem igual mas, no mínimo, exige-se uma conversa como método de “pagamento” dessa mesma solidariedade – e há conversas profundas sobre todos os temas, tal como a que me foi “exigida” quando a limonada me foi servida (obviamente o método de elaboração do sumo foi o tema).
Há um prazer simples em conversar, aprender, crescer como pessoa e isso, perdoem-me, faz muita falta em qualquer lugar do mundo! E sim, eles também são fanáticos por futebol…
Desejos são objectivos que definimos como sendo tão recompensadores quanto a nossa imaginação os valoriza ou sente. É a melhor definição que me ocorre, enquanto deitado numa cama de rede que o sol teima, e bem, em aquecer!
Há desejos na vida que alcançamos, outros que continuamos a ambicionar e existem ainda os desejos que, após alcançados, não pretendemos reviver e que, prescrevem na memória enquanto aprendizagem – sendo relevante reter os sinais/sintomas que nos podem ajudar a reescrever toda uma história de desejos e melhor alcançar o pretendido – sem nos determos nos desvios a que a aprendizagem obriga mas antes focando no objectivo final que é o nosso bem estar!
Há desejos muito fortificantes, que nos relançam para o momento seguinte da vida com o fôlego de um super-herói há desejos inalcançáveis que perduram como se fossem a última tentação de um ateu (os ateus também são tentados) mas cuja temporalidade vai sendo questionada – obrigando assim a uma desvalorização em termos de importância, há os desejos simples de concretizar mas dependentes de cooperação externa – o que obriga a um trabalho de equipa para o qual não nascemos vocacionados mas que facilmente aprendemos na sociedade em que vivemos.
Talvez os desejos, aquando de um relacionamento, sejam a soma perfeita de duas vontades que exibem socialmente, mas mais até intimamente, o prazer da sincronia de duas mentes que, não sendo perfeitas, possuem a ambição de aprender de mãos dadas!
Identificados todos os especímenes de um bando de pardais é agora mais fácil descortinar cada um pelos diferentes tipos de voos – com a contribuição de columbófilos de toda a região, e num exercício de natureza empática – ou de empatia com a natureza, conforme prefiram ler.
As migalhas deixadas constituíam o alimento que não se podiam negar a bicar e, inevitavelmente, voltavam diariamente para alegria dos que preferem a paz do seu canto matinal. As manhãs começavam sempre com o chilrear envergonhado que, muito rapidamente, dava lugar a um cantar mais pujante e desavergonhado.
Os melros e o seu contraste de cores como exemplo da possibilidade de convivência entre pássaros que não são iguais, as gaivotas que não conseguem aterrar neste jardim mas defecam abundantemente os jardins vizinhos, o casal, de uma espécie que não identifico, que chega para aterrar na nespereira e deliciar-se com uma dieta de fruta.
A paz de olhar para o chaveiro de casa e constatar que há molhos de chaves que não voltarão e outros que deveriam voltar, a olhar para o canto da sala e sorrir – com a cadeira ao sol, o chapéu do Rio Grande do Sul. A ultimar a chegada de amigos do coração que merecem tudo o que tiver em mim para dar!
A fachada impõe-se perante uma sucessão de outros edifícios e, sem dúvida, desperta a curiosidade daquele investidor que, tendo o coração cheio de amor para investir, pretende uma casa onde o aspecto exterior também tem o seu valor.
Assim que sobe as escadas exteriores o autor repara que há uma série de caminhos pelos quais pode começar – uma espécie de encruzilhada que não o intimida mas, pelo contrário, o estimula. Sente-se seguro mas não deixa de averiguar se tudo não passará de uma fachada – uma antecâmara interior que evita, de forma subtil, qualquer forma de responsabilização do comportamento do arquitecto.
Vê um WC à direita e, sem hesitar, entra e lava a cara das impurezas do exterior – numa espécie de gesto educado face ao desconhecido perante o qual se pretende apresentar da melhor maneira – não que exista a necessidade de mascarar algo mas, bem pelo contrário, porque foi educado de maneira a nunca julgar sem conhecer o réu e a apresentar-se sempre de face lavada e descoberta de qualquer preconceito.
Saiu do WC e, virando à direita, dirigiu-se a um espaço aberto onde sentiu a segurança necessária para dizer tudo o que pensava. Os alicerces da casa tremiam, pois nunca antes haviam enfrentado a verdade nua e crua – era a primeira vez que ouviam a palavra responsabilidade! O autor não pretende derrubar os alicerces mas tão só e apenas aferir se, apesar de a nova realidade os obrigar a ser responsáveis, tal é suficiente para que a obra se mantenha firme por muitas gerações! Ele sabe a resposta!
Os alicerces desconfiam – não que tenham nascido assim mas, infelizmente, foram desenvolvidos para serem assim. O humilde narrador, continuando virado para norte, dirige-se a uma porta, pelo seu lado direito, e atravessa a cozinha até chegar a um degrau que outrora foi seu confidente.
Aquele degrau, honesto como pedra, recordou-o de alguns detalhes – do melhor do mundo ao pior. A pedra e respectiva temperatura eram o tónico para a reflexão que já inúmeras vezes havia sido feita sem que a casa perdesse toda uma série de defeitos de construção que, parecia, se orgulhava de ter ou, num orgulho desmedido, por não obedecer a nenhum arquitecto – se tornava algo tão idiota e infantil que, por mais que se esforçasse, não encontrava palavras para descrever.
Respirou fundo, olhou num ângulo que abrangia todo o seu campo de visão, e levantou-se para sair. O agente imobiliário ainda lhe disse que faltava ver o andar superior mas a qualidade dos alicerces continuava a deixar demasiado a desejar pelo que sugeriu algo ao vendedor: coloque toda a honestidade neste seu empreendimento e eu serei o primeiro a apresentar-se para nele embarcar – da mesma forma que o caminho marítimo para a Índia nos mostrou o Brasil, também aqui o erro passado poderia constituir o grande feito do futuro!
Abandonou, relutantemente, o degrau de pedra e, levando consigo a bituca do cigarro, levantou-se e atravessou a cozinha, não sem antes olhar para a placa do fogão e, até aí, recordar que tudo o que havia feito havia sempre sido classificado como um erro, uma culpa que não transportava mas que recordava lhe haver sido sempre imputada. Talvez o vendedor lhe tivesse vendido a ideia de uma casa e, após a vistoria, ele achasse que o vendedor só poderia estar a falar de outra habitação que não aquela em que se encontrava.
Atravessou o espaço aberto que constituía a sala de estar e de jantar e olhou, muito discretamente, para o instrumento musical à esquerda e sorriu perante o pensamento que lhe atravessou o emocional cérebro! “Começou como uma melodia mas depressa se transformou em thrashmetal que abominava, apesar de ser grande fã de heavymetal!” – numa conclusão só sua: por vezes o estilo de música até pode ser semelhante mas os solos de guitarra, esses gestos tão egoístas, deixavam sempre transparecer a verdade.
Mentalmente sentia-se um baterista de grande nível – muito embora tivesse os pés sempre com o ritmo correcto, sem afectar o ritmo diferente das mãos, o som que saía ainda não era a verdadeira essência do que pretendia. Saiu do “sonho acordado”, suspirou com tantas infantilidades que, não só mas também, ali havia presenciado e, de um só salto, abriu a pesada porta da casa e saiu – sem ruído, gentilmente encostando a porta até sentir o trinco da fechadura a impedi-lo de voltar.
Respirou fundo – fazia sempre este exercício para estimular o pulmão e, com um bocadinho de sorte, o músculo que se encontra ao lado do pulmão esquerdo! Desceu os degraus de pedra – a pedra, naquele edifício, pecava por escassa, tendo em conta sobretudo a frieza que aí havia conhecido, esboçou um sorriso aberto e recordou que até naqueles degraus havia a recordação de pretensos erros seus!
Exclamou “Foda-se!”, baixinho o suficiente para que a memória ficasse gravada no músculo anteriormente mencionado, fez uns quadradinhos mentais enquanto dava uma gargalhada para dentro e, de maneira involuntária, fez um coração com as mãos de maneira a abrir o portão com um sorriso – a expressão facial que mais o caracteriza.
Não fugia! Essas fugas estavam sempre reservadas à parte irresponsável da obra. Andou, tão lentamente quanto o gozo interior que sentia! Ainda não havia chegado à esquina e já ouvia o ruído de alguém a fazer as malas. Não pestanejou sequer e, numa rápida e muito breve reflexão mental, sorriu…era o costume, só isso.
Despertar louco, de madrugada, numa tentativa vã de acalmar a passarada que alimento. Uma mistura de pão recesso com bolachas de água e sal e os jovens lá acalmaram de maneira a permitir o sono do vosso humilde narrador.
A gata preta que salta o portão, os pássaros que fogem e eu que fico sem saber se, quando voltarem, terei que novamente os calar com mais comida….parece aquela aldeia de irredutíveis gauleses em que a comida é o ponto de ligação entre as tarefas do dia.
Felizmente eu adoro o som que os pássaros produzem e entendo o privilégio de morar numa casa com jardim que permite que eu os alimente e eles, em troca, alimentam-me os ouvidos com as suas melodias que rapidamente me adormecem – numa simbiose perfeita!
Acordei com fome e lá fui obrigado a desistir do aconchego do pijama – o presente de aniversário que mais prezo no mundo – e, levitando após o duche tomado, fui até uma padaria da vizinhança. A esplanada estava vazia e eu podia esticar-me a meu belo prazer.
O croissant com fiambre, o ice tea de limão, o café após os dois toques ligeiros no vidro que me separa do interior. Um ritual do fim-de-semana que apenas varia de local.
A chuva que começa a cair – levando a que as clientes entretanto chegadas tivessem que se aproximar. A funcionária que, com algum sarcasmo subtil e muito engraçado, exclama que, com todos bem apertadinhos, ninguém se molhará…mas não acatamos o conselho e mantivemos a distância a que a lei obriga.
Expulso às 13 horas em ponto e, como ainda chovia, obrigado a fazer o caminho de volta – de havaianas – a curtir a chuva na cara e nos pés nus. A chuva é fria mas, há que testar uma boa dose, de cabeça tombada para trás e oferecendo a face a uma natureza que não se faz rogada em humidificar o humilde narrador. A comunhão ideal para início de fim-de-semana! Um sorriso numa cara humidamente feliz. ☺️
Começou inocentemente, como as coisas simples e bonitas da vida começam, mas depressa o sumo de cevada começou a libertar os presentes para um final de tarde de maravilhoso convívio, boa conversa e muitas gargalhadas.
A ausência do contacto, ou de convívio, expressão usada pelo patrão, talvez tenha contribuído mas a qualidade dos presentes era muito mais do que qualquer planeamento poderia reunir! Havia calor, saudade, carinho mas, acima de tudo, uma saudade enorme de celebrar de copo na mão, de dar gargalhadas sonoras e saudáveis.
Até o inquilino e amigo passou e deu o seu aval ao festim saudosista que no Bombar se desenrolava. Fomos putos saudáveis, num excelente final de tarde que, posteriormente e fruto do calção molhado, degenerou em resfriado bem chato de afastar – nada que a receita do mano não cure mas que me chumbou em sonos profundos dois dias seguidos!
Poder-se-ia dizer que houve de tudo um pouco – numa clara alusão ao contributo de cada um – mas seria redutor tendo em conta que só o conjunto fez o sucesso do convívio. Até o espanhol, agora residente português, compareceu para os habituais amendoins…
Foi como voltar a Buenos Aires, abraçar o Aníbal e a sua família e recordar que a amizade pode sempre acontecer…até no táxi de um Peronista que, indo buscar um cliente ao hotel mais capitalista, se surpreendeu por ele não ser tão capitalista quanto o hotel!
Memórias de um final de tarde maravilhoso – 9/4/2021
Numa conotação meramente futebolística o humilde narrador havia cortado a bola pela linha final, chutando assim o assunto para canto. O árbitro apitou para o final e todo o estádio percebeu que o resultado estava manipulado pela razão, muito acima de qualquer emoção…e que bem que ele se sentiu com o resultado final. Saboreou a derrota como a mais bela vitória do palmarés do clube! Como uma dádiva da razão ao emocional do moço que escreve. Deu inúmeras voltas a um estádio vazio celebrando a razão! Parecia um filósofo grego armado em atleta…feliz e escrevendo umas cenas! ✌️
A alegria contagiou a mente e o coração bombeava melhor a cada caminhada – mesmo quando o caminho é o saboroso norte – oposto de desnorte (Ahahah). O hotel ao fundo, numa perspectiva de início de caminhada dantesca, a mente completamente liberta de pensamento, o passo que, de cada vez que penso nele, sai trocado, a madeira que cede de diferentes formas sob o peso – cada vez menor – do humilde narrador. Um respirar mais profundo a despertar a ideia de um cigarro que a mente, mentindo a si mesmo, diz ser desnecessário ao esforço em progresso. 🍺
Uma das coisas mais apetecíveis, para mim é o retornar a uma alegria egoísta – que além de ser só minha e ter a aura de intimidade própria – é o mais estimulante dos tónicos. Há quem o entenda como egoísmo ou arrogância, mas eu chamo-lhe amor-próprio. A alegria da leitura sem horários, o ver e rever aqueles documentários sobre desastres aéreos – que estão espectacularmente bem feitos – ao ponto de colocarem o humilde narrador no lugar do investigador, sem que ele se mova do cadeirão! África, sempre África, com as paisagens a perder de vista e o bichinho adormecido a acordar para te enumerar os destinos que te faltam visitar mas que, enquanto não visitas, saboreias com os olhinhos, através das imagens que sorves da televisão. A leitura e a música como instrumentos ideais para conjugar as palavras do autor com a mente do humilde narrador – num vaguear ao nível de um saltimbanco profissional, que nunca constrói algo permanente mas apenas procura a subsistência, andando até encontrar…esse tipo de vaguear da mente! ❤️
Imaginação vadia, o quanto eu gosto de ti! Eu deixo-a ir e ela, quando volta, traz os ensinamentos ao nível dos descobridores portugueses de outrora! Vou comprar uma pulseira electrónica, numa tentativa vã de conter a amplitude de movimento da imaginação! Até lá, vou amando a natureza! 😎
Talvez fosse da pele morena ou da altura dela mas o facto é que os nossos olhos colam-se, quando os olhares se interceptam. A dada altura viraste-me as costas da maneira mais sexy do mundo e fiquei diante do teu rabo, levantado ao nível dos meus olhos. Senti-me um cãozinho, obedientemente de cabeça baixa enquanto olhava de esguelha. Acabamos sempre a sorrir, quando os olhares se cruzam…será alegria ou um simples jogo de olhos? O futuro o dirá… É verdade que maioritariamente somos nós a força motriz daquele local, tão escondido quanto à vista de todos, e o teu andar e sorriso são um bom alento a querer ser ainda mais adepto daquele clube de bons amigos e conhecidos. De norte surge mais uma verdinha fresca e dou por nós fixados nos olhos um do outro. Talvez também tivesses pedido uma cerveja e julgasses que fosse a tua…
Subimos e descemos nas cadeiras, procurando o melhor ângulo de observação, de tal maneira que qualquer dia as cadeiras, com o desgaste, não passarão de pequenos bancos…ahahahahah. Estavam todos presentes e foi um gozo enorme a celebração espontânea que teve lugar. Saí antes do final porque o final costuma ser uma mistura de álcool e falta de bom senso e, nessas coisas, já tive a minha quota parte de azar.
A vida vai-nos sorrindo e ter sabido o teu primeiro nome foi um passo agradável para esse sorriso.
De costas direitas e bem firmes, de indumentária leve – mas com o obrigatório aconchego da camisola de Verão para a humidade noturna, de passo típico de despreocupação, os sorrisos a ultrapassarem a cadência da locomoção.
Descendo os escassos metros que separam a casa da praia, a trocarem impressões sobre o dia que ainda não havia acabado, idealizando projectos concretos para os dias que virão. Subitamente, no final da rua, deparam-se com o Sol a preparar o palco para a sua despedida diária e, ambos, deixam o queixo cair e concordam que o espectáculo tem que ser visto.
Nascidos numa terra de pescadores e separados por escassos anos, recordam o ano de 1988, quando se conheceram. Detalhes muito turvos em relação a detalhes de 1988 mas a visão muito apurada para o show mágico que tinham decidido assistir. Como locais que são, meteram os pés na areia e sentaram-se na última “fatia” de areia que não estava húmida – uma espécie de palco só nosso, de vista desimpedida e na companhia dos profissionais da praia.
As mãos escondidas pela areia procuravam o contacto um do outro e foi certamente o GPS emocional que as ligou. E foi assim, de mão dada coberta pela areia, que presenciaram o maior espectáculo do Mundo. Uns profissionais a sair da água enquanto outros profissionais se dedicavam à procura do melhor local para lançar o anzol.
Fisgados, primeiro no Sol e depois nos olhos um do outro, saudaram o pôr do Sol com um valente beijo. Ele ergueu-se primeiro e esticou a mão para que ela o pudesse fazer. De passos suaves na areia retomaram o caminho do melhor arroz de polvo do Mundo e nem os amigos de longa data com que se depararam poderiam explicar o porquê daqueles sorrisos tão abertos e cúmplices. Nada haviam roubado mas estavam condenados a amar-se…a mais bela pena a que um ser humano pode ser condenado!
Sentado no lugar 1A, já ouvi o “cross-check” e as instruções no caso de emergência – basicamente, ouvi a hospedeira explicar que, caso dê merda e houver tempo, devemos seguir as recomendações dela…A mulher do 1B tem a mão esquerda cravada no apoio de cotovelo que separa os nossos lugares e olha para mim com um ar de medo profundo – há uma união de sentimentos no receio mas acalmo-a dizendo que estas coisas raramente têm acidentes o que, numa semana com mais um acidente aéreo, não inspira grande confiança…
O plano de ataque está definido, o plano de voo á muito que foi aprovado e o destino pertence a uma conjugação de factores naturais que não convém desafiar. “Clear to take off” e posicionamo-nos na pista, prontos para largar…motores a fundo, travões também e, após o soltar dos travões, eis que o nosso avião ganha altura ruma aos céus…onde aquelas rodas vão pousar é algo que só à nossa imaginação pertence…
18 de Março de 2017. Foi esse o dia em que aterrei em Cork e comecei a fase irlandesa da minha vida. 2 anos, 5 dias…recordo que marquei a viagem para chegar – propositadamente – após a festa nacional, o Saint Patrick’s Day. Uma decisão corajosa de quem vinha de uma série de festas de despedida – algumas a superar o nível de alguns dos filmes da trilogia ressaca – que me fazia sempre recordar a máxima “Poupa o teu fígado!”.
Era um dia nublado e chuvoso aquele em que cheguei. A natureza, de um verde insuperável, dava esperança ao humilde narrador de que talvez houvesse um dia em que se pudesse (eventualmente) até fazer praia…era, obviamente, a visão deturpada pelo cansaço da viagem que teve que ser feita com escala em Londres. Mas sim, consegui um dia ir à praia na Irlanda e farei questão, caso a situação ocorra, de contar aos meus netos para que nunca façam merdas desse tipo!!!!!!
Trocas de casa, pessoas novas conhecidas e acarinhadas, pessoas novas conhecidas e remetidas ao esquecimento, sorrisos, gritos de luta e incentivo e, ultimamente, uma vista muito mais sorridente. Tal como o rio, que nos serve de imagem diária para quem frequenta uma sala completamente rodeada de vidro, também a vida flui naturalmente – talvez não para o rio que desejamos, mas há que fazer o melhor com o que vamos encontrando nas margens ou procurar sítios mais distantes para buscar o pão.
E que rico pão…vivemos a uns 100 metros de uma padaria francesa fabulosa (na Irlanda consome-se mais o nosso pão de forma pelo que a padaria, enquanto estabelecimento, é um conceito quase não existente para eles) na qual os produtos que estão expostos são de fazer babar o mais bem-educado dos meninos de um qualquer colégio particular em Portugal.
Olhos bem abertos na constante procura de mais ver; uma procura constante por novos pequenos nadas que vão surgindo e que urge apreciar. Um lugar quase cativo no autocarro e a construção de uma nova “seita” no fundo do mesmo. Gargalhadas com humores semelhantes, gargalhadas com humores diferentes.
Trocas de olhar e sorrisos constantes, condutores demasiado expeditos e recém-encartados ao volante. Viagens de pura adrenalina versus sermos ultrapassados por caracóis. E, lentamente, conhecendo….
Nunca fomentamos a nossa relação pela exigência no contacto mas percebo que exijas mais de mim do que presentemente te tenho dado. Ando egoísta, talvez seja isso! Mais relaxado, mais dado a tarefas caseiras, mais dado a gargalhadas com os que mais gosto.
Livrei-me do velho portátil e teclo-te agora de um modelo novo. Nem percebo como deixei algo chegar a tão velho mas, por vezes, deixamos coisas envelhecer ao nosso lado sem que exista mérito para que tal aconteça. Não mais voltará a acontecer: mereces que as novas criações provenham de um modelo ao teu nível! E assim será, doravante.
Continuamos a curtir a nossa casa, em frente ao rio, com uns endiabrados (de bons) brunches aos domingos. Vamos usando os sábados para ir conhecendo novos locais para o pequeno-almoço tardio mas os domingos são nossos!!!! A nossa varanda tornou-se o nosso local de culto e o rio, constantemente a fluir em direcção ao mar, a minha alegoria para largar palavras velhas e usar um diálogo novo!
Acusam-me de evitar-te! Que desabafo demasiado contigo, que as pessoas que interessam – só essas existem – são sempre as segundas a saber do que se passa. Acho que são ciúmes, más línguas ou apenas uma forma amorosa de expressarem o seu gosto pelos escritos passados. Mas, tal como na bolsa, lucros passados não são garantia de lucros futuros e, com os escritos antigos, é precisamente a mesma coisa.
Vou começar a natação, assim que consiga atravessar os 20 metros que me separam entre a porta de casa e a piscina do hotel. Com trezentos euros anuais tenho acesso a tudo o que se passa na piscina e, qualquer dia, lá estarei com os velhinhos todos a fazer hidroginástica!
Passos pequenos mas muito seguros. Fevereiro de 2019.
Havia muito tempo que mentalmente estavam planeadas! Uma espécie – para não usar a palavra “tipo” – de descanso do guerreiro que mais não é do que levar o guerreiro a prestar vassalagem ao Sol.
Partir do aeroporto de Cork assemelha-se, em muito, a partir do aeroporto de São Tomé: as máquinas são ligadas para inspeccionar as bagagens, há muitos sorrisos – por parte dos passageiros que sabem que vão evoluir, pelo menos, uns 20 graus centígrados em termos de temperatura, a boa disposição impera e contagia!
Voo tranquilo, apesar da histérica que seguia a meu lado e que, a cada pedaço de turbulência, se agarrava a mim…fosse a Claudia Maria Schiffer e a história teria sido diferente! Sem turbulência, claro está! A chegada foi tardia e as primeiras impressões de uma semelhança brutal com a Gran Canaria – entre a Playa del Ingles e a Playa de Las Americas há semelhanças tão incontornáveis quanto a relação de vizinhança das 2 ilhas!
Dias passados maioritariamente entre o Papagayo e a praia! Papagayo para hidratar e a praia para plena satisfação da necessidade vital para quem nasceu tão perto do mar! A temperatura da água não seria a ideal – de acordo com os padrões Gregos – mas, para um Espinhense habituado a estas lides…estava fresca!
Festejamos a amizade Luso-Helénica, em todos os momentos em que pudemos estar juntos, e descobrimos que temos maneiras de ser bastante idênticas – sempre sem afectar a amizade ou respeito que nos unem.
Maravilhoso voo de volta para Cork – que estava 21 graus abaixo da temperatura da ilha – e o tabaco a ser capturado na fronteira, por um troglodita da alfândega (que não a discoteca em Caminha….antes fosse!!!!) que só exclamava que a Espanha nunca tinha pertencido à União Europeia! Um intelectual, claro está!
Após pedir uma qualquer declaração, atestando que o tabaco tinha sido apreendido, resolvi dar meia volta e seguir para casa – onde me esperava uma mudança para o apartamento novo!
A ironia da vida é agora tentar perceber como é que 4 dias apenas te colocam na cara um sorriso tão duradouro….
Prometeste-te (sim, está bem escrito…prometes a ti próprio) um fim de semana tranquilo, cumprindo somente a tradição habitual do brunch e pouco mais. Compras só algumas Super-Bock para acompanhar e sabes que o fim de semana vai ser de descanso.
Se a sexta-feira foi de música, amendoins e Super-Bock, enjaulado entre as quatro paredes da casa do Altus que te permitem vencer o frio, já o mesmo não se pode dizer dos dias seguintes…viver com Brasileiros é um samba constante!
Não só a Super-Bock desapareceu como o frigorífico apareceu cheio de Heineken!
Um homem nunca se deixa derrotar e, por entre uns hambúrgueres maravilhosamente confeccionados, a Heineken foi escorregando pelo esófago. Acho que tanto o sábado como o domingo foram momentos ímpares de confraternização, gargalhadas – com e sem sentido – e uma dor de cabeça no dia seguinte.
O que tem realmente piada na casa é o facto de conseguirmos sempre mais uma gargalhada, mais um sorriso, mais uma situação inesperada – com que todos nos rimos – sem atrapalhar a harmonia diária.
Sentado no sofá e refém da sua caneca de café. Mentalmente analisando a evolução do percurso: começou num pequeno curto pela manhã, evoluiu para dois curtos pela manhã para, finalmente, voltar ao conforto da cafeteira de sempre – a quantidade ideal, o aroma possível para a tecnologia utilizada, a temperatura ideal!
Revê os emails recebidos, analisa cada proposta como uma oportunidade de ir conhecer outras paragens, responde no messenger e sorri. Ainda não está funcional e a audácia leva-o a uma segunda cafeteira de café. Recorda a combinação que fizeram na casa e, caso tudo corra bem, em breve terão uma máquina de café para todos!
Liga a TV e acompanha o pequeno-almoço das várias emissoras: os programas simples feitos para uma audiência fácil de cativar e ainda mais fácil de manipular. Muda para a CNN e dá de caras com o Jim Acosta, de sorriso renovado, que me dá as últimas notícias da Casa Branca.
Levanta-se do sofá, desliga a TV e chega à conclusão inicial: deveria haver uma fórmula mágica que, analisando o estado do paciente, indicasse imediatamente a dose de café necessária para o equilíbrio diário! Ora….aí está uma invenção digna e capaz de gerar lucros por muitas gerações.
Está frio, exclama enquanto abre a porta para sair de casa! A diferença de temperatura entre o interior e o exterior é elevada e o choque térmico leva-o a bater a porta, ficando dentro de casa!
Devaneios matinais de quem precisa de um edredão eléctrico para se deslocar…
Se me perguntasses como viver um sonho eu respondia: entra com o pé que te apetecer, distribui as coisas como o consenso dos habitantes o ditar, faz uma primeira refeição de sonho, lavem a louça juntas, sentem-se no sofá a digerir à volta de um bom jogo de caixa dos antigos…chamem-lhe o baptismo, se quiserem!
Como não perguntaste…também não te conto! 😉 Ahahahahahahah. Apenas feliz, sabendo que estás bem! Medos, receios e afins não constam nas tuas batalhas passadas e certamente não ousarão marcar presença na vida presente e futura! Ri, despropositadamente, e espalha essa “virose” por todos os habitantes. Estabeleçam consensos, distribuam tarefas, criem laços de equipa e vivam sem imaginar o gozo que é a vossa vida!
Na mesma situação eu recordo que dei uma festa para todos os meus vizinhos – não, não conhecia nenhum! A casa acabou de pantanas mas a surpresa maior estava reservada para o dia seguinte quando, saídos do nada, todos os convidados do dia anterior se apresentaram para ajudar na faxina!
A vida está cheia de feitos inesperados e tu és o mais bonito que me aconteceu!
Ainda caíam gotas dela….notava-se que estava a precisar de descanso mas a hora era de acção e o descanso passou para um segundo plano.
Toquei-lhe com a gentileza possível de quem toca algo húmido e a precisar de repouso. A minha mão rodeou-a e apertei-a um pouco para que não me fugisse.
Coloquei aquilo que ela gosta bem dentro dela e fiz uma ligeira pressão para ter a certeza que estava conforme fui ensinado. Sim, estava.
Aqueci-a até obter dela os primeiros acordes de sucesso. Assim que ouvi a sua manifestação de dever cumprido, imediatamente peguei nela e, manipulando-a cuidadosamente, virei-a!
É um prazer diário. Adoro a minha máquina de café!
É verdade, não devemos nunca ficar alegres com a tristeza alheia. Sim, eu sei. Tratando-se de uma batalha pela felicidade, não sinto que esteja alegre com tristeza alguma! Quando se batalha por algo, da forma – pausada mas racional – como o fazes, só posso estar alegre por ter-te perto de mim.
Falaste do meu coração como se o conhecesses. Muito provavelmente porque ele tem a estranha mania de controlar as minhas acções românticas e, após as suas acções, sai de fininho – rindo como o Muttley. Não que se ria do sentimento mas apenas se ri de satisfação por estar mais perto de um coração semelhante.
Nem só de semelhanças é feita a vida mas, e aqui dou um voto de louvor a nós os dois, que nós temos tido a nossa dose de semelhanças…não há como negá-lo. Somos o fruto de uma série de coincidências que nos colocou no caminho um do outro. A mais bela série de coincidências, ousaria dizer.
O teu texto de hoje tem tudo o que eu gostaria de receber de ti: honestidade, pragmatismo, receio…acima de tudo, tem uma dose de força tua para enfrentares as adversidades com que te deparares.
Quero poder dizer-te ao ouvido palavras que nunca te escreverei mas que ousarei tentar fazer-te sentir, sempre!
Mais do que um beijo, o maior abraço amoroso do mundo!
A cara, linda como sempre, aparece no canto superior direito acompanhada de uma bola verde à sua direita. Respiro fundo, trocamos breves impressões e a cara linda e a bola verde cedem o lugar a outros que continuam ligados. 😦
Questionas-te se faz sentido ficar corado perante uma imagem que aparece e desaparece…são questões que te são respondidas de dentro para fora e, sem dares conta que estás com o teu sorriso traquinas (sorriso traquinas é uma marca registada por mim e qualquer utilização requer autorização prévia). 🙂
Conheces o sorriso traquinas e sabes demasiado bem o que ele significa para ti. Não dominas os momentos em que ele aparece mas é algo que sabes que estar a acontecer pois começas quase a fumegar das faces coradas. Sabes perfeitamente que colocar uma cara de quem acabou de ser bafejado pela fuligem de uma locomotiva não é a melhor maneira de disfarçar o que sentes. Nunca disfarçaste nada, não comeces agora! Diz-te o Zé… 🙂 🙂
Apresento-vos o Zé! Provavelmente já tinham lido algo sobre ele mas hoje eu apresento-o à sociedade. Não vai debutar no Ateneu Comercial do Porto mas as redes socias, blogs e afins parecem-me um cenário muito mais digno de iniciar a sua vida em sociedade!
O Zé, indivíduo de uns quarenta e qualquer coisa anos de idade, é o mais assertivo dos seres sem existẽncia física! Dá-te conselhos que não acatas, dá-te sugestões que raramente segues mas, acima de tudo, é o teu maior confidente – aquele tipo de pessoa que, apesar de apresentarmos à sociedade, sabemos que colocamos a nossa vida nas mãos dele (se ele as tivesse).
Aquela vozinha, no fundo da tua cabeça, que sempre te incentivou quanto te faltava incentivo, sempre te empurrou quando não querias andar, obrigou-te a correr quando querias descansar. Obrigado Zé! 🙂
Numa galáxia perto de si, a apenas alguns milhões de anos-luz, os sujeitinhos locais argumentavam sobre qual a melhor maneira de comunicar. Os sons que emitiam não formavam uma linguagem perceptível por ambos e as faces alteradas pela cor da emoção não disfarçavam o sentimento.
De um lado o macho, sem quaisquer pretensões alfa (nunca é demais salientar), abanava o seu corpo – numa espécie de dança inventada para o efeito: corpo muito atabalhoado no movimento, face corada pela falta de movimento natural mas cheio de convicção que o objectivo da dança seria alcançado. Do outro lado a donzela – a face linda que ele havia memorizado havia tantos anos, os olhos concisos e mordazes, a face dourada aos olhos de quem a olhava, o sorriso escondido pela face obrigada a estar séria.
Ao tocar na mão dela – talvez porque fosse a primeira vez que o faziam com o sentimento presente – estremeceu. Ela perguntou-lhe se ele estava nervoso e ele, quase a hiperventilar e desesperadamente procurando um saco para repôr o ritmo respiratório normal, respondeu que estava “apenas” emocionado…(ele era mentiroso nas situações em que sabia que seria imediatamente apanhado).
Para quem olhava ao longe eles nitidamente pareciam alinhados mas, para ambos, eles estavam apenas sintonizados numa mesma onda, obviamente larga, mas a maré ora enchia ora vazava. Era na praia-mar que estavam mais juntos – quando percorriam a areia do conhecimento que pretendiam ter um do outro e, ora molhando o pé na água salgada e fria ora voltando à areia, debatiam o que os separava.
Foi no debater o que os separava que descobriram o que os unia…e foram felizes para sempre!
O Zé lutava contra os pontos finais. O máximo que ele algum dia arriscou foi um ponto e vírgula que, posteriormente, substituiu por reticências. Nunca mais voltou ao assunto, olhou à volta e viu que o mundo continuava alegre e pronto a abraçá-lo. Abraçou-o de volta e submergiu no seu novo mundo.
Foi a busca de abraços que o levou a uma pausa que não havia programado. Recordava aquela conversa, no muro das Sereias, como se haviam encontrado, as vicissitudes do encontro e a que agora se tornou a “habitual espia” – que rondava como um perdigueiro que sente o odor da presa mas anda perdida na procura para a entregar ao dono.
Se havia algo que eu notava no Zé era a grande evolução em termos de inteligência emocional – ele não sabia a quem atribuir o mérito e eu ousei perguntar-lhe se o facto de se ter rodeado dos melhores e ter tido as ervas daninhas afastadas não teria contribuído para o belo prado verdejante em que a sua vida se tornara. Ficou no ar, como pergunta retórica, pois o Zé é um homem de poucas respostas…
O Zé olhou-me nos olhos e disse: arrisquei uma vírgula! A cara estava corada e, em termos de Zé, isso significa que a vírgula tinha sido deliberadamente colocada para sugerir o que lhe ia no pensamento. Não se desculpou com o uso da vírgula pois sabia que o diálogo, em que a havia usado, era com a escolha pessoal dele.
Arrisquei perguntar ao Zé…é mútuo? O Zé mudou de expressão e, com cara de garoto que se sente encurralado por uma sugestão que pode ser a verdade, confessou: não sei. Queria que fosse, disse. Faço o que posso para que seja mas temo demasiado o que possa ser. Temes?, perguntei eu. Não, respondeu-me o Zé, com as bochechas ainda ruborizadas…
O Zé aproximou-se do meu ouvido e segredou-me: sempre gostei dela! Daquelas linhas artísticas que ela tem, do dom linguístico que aplica de cada vez que se expressa, da sua maneira de agir e de pensar. Subiu o tom de voz para dizer: isto dura desde os 17 anos…haverá cura? – perguntou como se estivesse perante uma pandemia em que ele é a única real vítima.
Zé, perguntei com um tom de quem precisa de saber a verdade para continuar a conversa de amigos: porque achas que se trata de uma doença se tu tens a vacina…tudo o que tens que fazer é perguntar-lhe! O Zé assimilou a resposta – ou fingiu assimilar porque este homem já sabe as respostas às perguntas que coloca – olhou-me nos olhos e disse-me: é bom ter-te como amigo porque permites que a conversa flua sem que todas as respostas estejam presentes…
Levantou-se, deu-me um abraço e, quando já caminhava para casa, voltou-se para trás e exclamou: um dia vamo-nos rir disto! Sorri-lhe de volta e percebi que a vírgula não tinha sido usada como pausa mas como catalizador…o Zé havia sido directo e tinha agora um pretenso receio da sua acção.
Foi com uma sonora gargalhada que reagimos ao “um dia vamo-nos rir disto”! Já passamos por tanto juntos que os segredos de um não passavam, para o outro, de um intervalo de tempo em que toda a história seria revelada…
Dia de celebração, de contentamento, de Super-Bock, de tempestade e de muita televisão. Porquê? Porque agora o menino “Callum” está a atravessar a cidade de Cork – ventos estupidamente fortes, chuva de toda e qualquer direcção, frio, algumas enchentes na cidade e um mal estar…
Enquanto Irlandês herdado temporariamente pela República da Irlanda, telefonei para o Off Licence e reservei oito Super-Bocks para o fim de semana (4 litros de cerveja para entreter estes dias de reclusão). Preso em casa mas com a mente solta a navegar por ideias que nem sempre ouso escrever, gritos que não vou dar e abraços que, estando em stock, terei que entregar.
Após ter passado o dia de ontem a desfilar o casaco novo pela herdade de Altus, hoje é dia de melhorar as prestações no Fortnite! Começar uns treinos após o jantar, pausa para uma trinca rápida e de volta ao treino. O gozo inerente ao já não conseguir jogar o que outrora jogava e ver outros, com a idade que outrora tive, a darem verdadeiras lições de como jogar o jogo.
A vida é igual…mas real e sem armas! Combate-se com o coração…
Talvez uma palavra a ser censurada do dicionário português! Trata-se de um acto violento – para ambos os sexos – e o seu uso deveria assentar numa autorização prévia de um qualquer organismo público que supervisionasse a sua utilização.
O homem nasce e agarra-se às mamas para sobreviver, quando muito ainda tem direito a um suplemento – já fora da mama – mas enganado por objectos que apenas simulam o mamilo. Assim, desde tenra idade o recém-nascido habitua-se à ideia que a mama é fonte de alimento. Precisa delas para sobreviver, para se desenvolver e crescer. A natureza humana sobrepõe-se a qualquer preconceito e a Mãe alimenta o filho(a) em qualquer ocasião em que tal seja necessário.
O fascínio, todavia, não termina por aí e, apesar de um hiato de tempo em que o outrora recém-nascido esquece a beleza da sua fonte de energia, depressa as protuberâncias femininas voltam a fazer parte do quotidiano do adolescente. Deixam de ver a fonte de energia de uma forma para a passarem a ver como fonte de energia para actos mais apaixonantes, não tão recompensadores energeticamente – bem pelo contrário – mas demasiado recompensadores de outras formas e feitios (porque a beleza provém também da diversidade existente).
Existem as ameaçadoras – que gritam por alguma acção no perímetro delas, existem as sensíveis – que se exaltam quando “sofrem” um afecto mais enérgico, existem as ultra sensíveis – que clamam que qualquer tipo de acção que interrompa o status quo é passível de conduzir a algo mais (eu, pessoalmente, designo estas por falsos positivos).
Existem de vários tamanhos e feitios e é isso que talvez conduza a que o homem não resista a olhar – o homem tem esse gesto não como voyeur mas porque apenas pretende saber em que pasta do seu arquivo deverá colocar a memória do que acabou de visualizar. O homem, como ser estudioso que é, procura o maior número de modelos de maneira a produzir um catálogo que possa passar a gerações futuras, numa procura insaciável (belo termo) pelo par perfeito.
Curioso é constatar que é um trabalho que nunca acaba! Saúdo os homens que todos os dias saem de casa – quais columbófilos – na procura da melhor ave. Umas voam, outras são estáticas mas, acima de tudo, todas nos deixam recordações.
O simples Porto-> Faro e Faro-> Porto transforma-se num Porto-> Amesterdão e Amesterdão-> Dublin. Assim começou o domingo de retorno a Cork…voo cancelado e a opção a não ser a melhor mas a possível. A KLM dá-me a protecção de preço e o voo passa a ser Porto-> Madrid e Madrid-> Dublin…menos mal mas ainda tens 3 horas e meia de autocarro entre o aterrar em Dublin e chegares a casa em Cork. O voo ideal, marcado com meses de antecedência, por uns míseros EUR 92 transforma-se numa saga de EUR 260 e mais EUR 20 para o autocarro…ninguém merece mas a Ryanair faz questão de dar estas “ofertas”.
Chegas a Madrid e tens 20 minutos para apanhar o Madrid-> Dublin, o joelho cede quando começas a tentar um passo mais acelerado e, graças ao feliz encontro com o homem do carrinho de golfe – que apoia os menos válidos (o trocadilho aqui aplia-se porque em espanhol se diz mesmo assim) – que te leva à porta H4 quando o relógio assinala as 15:55 (hora de partida do voo). Cais no lugar do meio e só acordas em Dublin…haja algo de bom na viagem de regresso! Chegado a Dublin eis que a Aircouch está a minutos de chegar e tu já tens bilhete para as 3 horas e meia seguintes…chegas a casa às 23 horas quando tinhas tudo previsto para ter chegado às 15:30 a Cork!
Sentes diferentes vazios…um porque é a tua amizade mais próxima e merece todo o carinho e atenção do mundo, outro porque não deste continuidade a algo que gostavas que tivesse continuidade e um último porque uma viagem que deveria ter sido tranquila se tornou em algo tão atribulado. Levantas o nariz e enfrentas as adversidades! Verificas o email e vês que recebeste uma notificação com os nomes das tempestades para 2018/19 e exclamas “voltei, já tenho informação privilegiada para enfrentar o clima!” Sorrio mas não é um sorriso de felicidade…é apenas uma exclamação sob a forma de sorriso, talvez tenha sido um suspiro…quem sabe?
De volta à cidade e pronto para as vicissitudes da semana irlandesa. Haja virtuosismo e boa disposição!!!! Até já!
Ela falava com pontos finais e de exclamação e eu respondia com pontos e vírgulas e interrogações. Semelhante a um interrogatório dos tempos da Gestapo, o suposto espião desviava-se das questões mais pertinentes (soariam a acusações?) sem nunca colocar um final na cadência do diálogo: como se se tratasse de um sádico, que adora aquecer debaixo do holofote potente dirigido aos seus olhos.
Ela fazia analogias e ele teorizava sobre ambos os lados a serem comparados. Ela fazia parágrafos e ele abandonou a pontuação e, ao melhor estilo de Saramago, perguntou-lhe se ela seria a Pilar del Río dele…A pergunta devia ser retórica, sem que o autor se apercebesse, pois recebeu como resposta mais uma série de pontos finais.
Ele lutava por vírgulas, pontos e vírgulas, reticências e ela respondia-lhe com pontos finais, pontos de exclamação e parágrafos. Parágrafos sem que houvesse qualquer discurso directo de seguida, apenas soando a uma pausa no diálogo imposta pelo bom senso feminino.
Falaram de tudo sem nunca aprofundar nada e, no final, ficaram com a sensação que poderiam ter aprofundado tudo sem falar quase nada. Talvez não seja a distância que os separa mas apenas e só as diferentes maneiras que usam para pontuar as frases…
O reencontro com o meu descendente foi tão recompensador quanto o reencontro entre dois melhores amigos. Obviamente que me perguntou se a prenda de aniversário da Mãe tinha chegado e eu entreguei-lha…fugiu para um canto para testar o seu novo som e era vê-lo colocar o polegar ao alto para me informar que estava de acordo com as expectativas.
Na primeira noite ainda corri para o cantinho húmido do costume: Jorge a dar o seu melhor, Fellaini a rasgar com o seu rock alternativo todo e a Super-Bock a saltar geladinha. Recordo-me apenas que optei por não sair de dentro do Bombar e ter optado por ficar a delirar – sim, delirar – com todo o metal com que o Fellaini nos brindou – até Wolfmother nos entreteve! Eram 2 da manhã quando cheguei e a polícia acabou com a festa por volta das 3 e meia – o que acabou por resultar muito bem porque me permitiu passar pela padaria e engordar mais um pouco!
No dia seguinte corri para o porto seguro de sempre onde a mãe adoptiva estava com o seu filho e a minha melhor amiga. Abraçamo-nos como sempre e retomamos a conversa onde a tínhamos deixado: não havia novidades que eu não soubesse mas apenas uma necessidade de reforçar o apoio a quem mais significou e significa – sempre – em termos de amizade, dedicação e carinho. És insuperável na tua maneira de seres minha amiga, Obrigado!
O inesperado serviu para darmos uma lição de amizade a todos os que nos rodeiam e, mais uma vez, superamos a “prova” com distinção. Num momento infeliz houve uma equipa de amigos que conseguiu, com toda a naturalidade do mundo, proteger uma pessoa que sempre nos disse e diz tanto, ensinou e ensina tanto, dedicou e dedica tanto tempo. Há amizades insuperáveis e esta é e será sempre a minha. Sei que estás em boas mãos pois vi o quanto todos queremos o teu bem e quanto naturalmente damos para que tal aconteça! Nunca conseguiremos ser tão completos quanto tu és mas sempre te serviremos com a mesma dedicação com que nos ensinaste e estamos sempre aqui para ti! Mereces todo o bem do mundo.
Muitas vezes, ao longo da minha vida, conseguiste milagres: roubei-te uma amiga com quem casei e de quem sou um grande amigo, mostraste-me sempre um sentido mais amplo e calmo das coisas e das pessoas, és e sempre serás a minha inspiração para o que de mais belo há no mundo – uma das raras pessoas que existem no mundo capaz de o fazer e que eu, cedo na vida, tive a sorte de ter encontrado. Sempre juntos!
Obrigado a todos pelos bons momentos e pela forma como juntos superamos os momentos menos felizes nesta curta passagem por Espinho. Vocês mostraram-me que a união faz a força e que grande força nós somos!
Mudei o ângulo em que tinha a cadeira e observei ambas. Havia uma expressão comum nas duas: eram lutadoras como eu nunca havia visto na vida real, estavam numa pose de descanso, mas descortinava-se nas suas faces as chagas das batalhas e o olhar pensava no fim da guerra sem nunca descurar que a batalha seguinte estava a minutos de distância.
A soma de anos de amizade comigo aproxima-se de 100 e eu, um pouco afastado mentalmente da conversa, só pensava nas voltas que a vida realmente dá. Haviam concretizado os seus sonhos, mas com grandes custos. São mulheres com ideais muito semelhantes aos meus e não demorou muito até que eu fosse criticado por outrora me ter misturado com gente sem ideais.
Adoro ambas num sentido completamente diferente: de um lado a melhor amiga que nasceu comigo e, do outro, a primeira paixão que nunca deixou de me fazer corar sempre que a vejo. Sinto-me um puto reguila quando estamos juntos – não pelas traquinices da juventude, mas pela sorte que tenho por tê-las perto de mim. Fico com a mesma cara de um recém-nascido após a primeira gargalhada…quando o bebé tem o primeiro sorriso e, porque talvez tenha gostado da sensação que o sorriso lhe provocou, o repete vezes sem conta.
Adorava poder conceder a ambas tudo o que desejassem – mesmo se eu não estivesse incluído – pelo simples prazer de voltar a ver os sorrisos de outrora nas faces delas. Abertos, sonoros, vindos do mais profundo de dentro delas e de fazer as multidões corar de inveja.
Não tendo o dom de mudar as coisas eu aproveito para passar o meu tempo com elas: as palavras são ditas com mais facilidade que os actos, disse-lhes. Todos temos uma maturidade diferente de quando crescemos juntos, aceitamos partes do destino sem nunca deixar de o enfrentar, rimos com a consciência de que o minuto seguinte poderá ser de lágrimas mas nunca deixaremos de ser o que sempre fomos: bons amigos.
Adoro-vos! E esse sentimento nunca deixarei que mude.
Havia muito tempo que o Zé não se cruzava com esta amiga para quem se dirigia agora. De facto, o Zé não tinha a certeza de ser considerado um amigo, mas acima de tudo, ele sabia que ela é das caras mais bonitas da sua vizinhança. Ele nunca a havia esquecido; bem pelo contrário, ele recordava-se amiúde dela.
Haviam confidenciado detalhes das suas vidas e, de alguma maneira, haviam-se ajudado mutuamente. Havia, pelo menos, um carinho implícito nas palavras que haviam trocado. Trajado de desconhecido, na visão que ele imaginava que a amiga tivesse, ele caminhou ao encontro dela. Havia borboletas no estômago, recordações muito vagas na sua mente, mas também muita coragem no querer – de facto – estar com a amiga em questão.
A coragem misturava-se com a cobardia e a coragem ganhou. Saiu de casa, caminhou pela rua abaixo e chegou ao destino sem que conseguisse encontrar a amiga que o fazia mexer nesse início de tarde. Fazia muito calor, mas o Zé – homem outrora sediado na cidade de Atenas – sabia bem superar as agruras do calor extremo. Havia descartado a camisa de algodão ateniense em prol de uma camisa mais clara e em tons azuis que combinavam com os calções de banho azuis que trajava. As sandálias eram as habituais Havaianas a que se havia rendido aquando da sua passagem pela Grécia.
Encontrou um amigo de longa data, que o chamou, para logo de seguida encontrar um outro. Pensou estar, de certa maneira, cercado por testemunhas, mas, calmamente, percorreu mentalmente todo o percurso e rapidamente chegou à conclusão que estaria mais perto de um ataque de pânico do que propriamente cercado.
Ela chegou, ele despediu-se do amigo e partiu com ela. Trocaram palavras simples, mas acerca de um assunto complexo. Sentaram-se no muro da praia que outrora foi sua e aprofundaram o diálogo. Não havia nada de romântico no que falavam e o tema era absurdamente oposto a qualquer romantismo. O Zé olhava mais para ela do que escutava a conversa. O Zé estava claramente ofuscado pela beleza que havia diante dele.
Decidem trocar de local e caminham pela cidade acima. São dois seres que gostam da sua cidade e ele leva-a até à rua que a conduzirá até ao supermercado onde faz as suas compras. Abandona-a no meio de uma feira de usados, após ter indicado o caminho correcto, e desce para casa. Olha para trás duas vezes e questiona-se sobre o que aconteceu. Não sabe a resposta e não sabe sequer se havia essa pergunta.
Interroga-se agora em casa e decidiu ligar-me. O Zé tem sempre prioridade no meu atendimento e, juntos, debatemos o tema. O Zé acha que não é nada e eu acho que pode ser tudo. Estamos em extremos opostos em termos do que achamos que a situação é.
O Zé adormece no sofá e eu vejo o sorriso dele a abrir enquanto vai perdendo a luta com o sono. Eu já vi o Zé assim.…ele está com dúvidas, mas feliz.
Passei toda a minha vida sempre com uma amizade que designei como sendo a melhor. Melhor porque é superior em tudo: na bondade, na presença, na cooperação, na partilha de momentos únicos, nas gargalhadas que ainda hoje demos, no medo e receio que tínhamos com desafios que enfrentamos, na praia e no campo, no mar e na terra. Este bem poderia transformar-se o maior parágrafo alguma vez escrito se eu fosse enumerar todas as tuas virtudes! Não o farei porque é a intimidade da nossa amizade que prevalecerá – contra tudo e contra todos.
Não tenho a receita mágica para te devolver todas as forças de que precisas, mas dou-te toda a minha força para que triunfes…sempre! Sempre foi assim e sempre será! Essa é uma certeza que terás que viver sempre com.
Num mundo perfeito jamais te terias cruzado com as adversidades com que te cruzaste e que eu presenciei. Num mundo perfeito o povo ansiaria por ser como tu, trabalharia para conseguir tanto como tu sem nada pedir em troca. Num mundo perfeito tu irias sentir-te envergonhada com todo o reconhecimento que te seria dispensado, mas, como tens a certeza do teu valor, saberias superar o reconhecimento para, como sempre o fazes, superar-te cada vez mais.
Vejo-te como o desenho perfeito da amizade – sem qualquer necessidade de retoque ou edição. Nunca conseguirei sequer estar perto de um esboço desse desenho perfeito de amizade que és, mas a simples tarefa de tentar dá-me a certeza da tua grandeza e do teu engrandecer constante.
Tudo em ti parece fácil de executar – porque és tu que executas! Se, após ter memorizado como o executas, tentar o mesmo exercício eu apenas consigo sorrir, desistir de tentar e, com o meu sorriso malandro, sentir o maior orgulho do mundo de cada vez que me chamas de amigo.
Amar é possível na amizade e eu sempre soube que amava a nossa amizade pela simplicidade com que sempre a executamos. Uma espécie de engrenagem que se encaixa e se mantém em movimento muito para além do tempo em que estamos juntos.
Tentei, mas acho que ainda não consegui a descrição ideal da nossa amizade. Continuarei a tentar! Sempre juntos!!!
Bastaria levantar-se e sair pelo lado esquerdo. A lógica, vista pelo meu ponto de vista, assim o dita. Todavia, levanta-se e vira-se de frente, dá um jeito na silhueta e, escolhendo o lado esquerdo de agora – oposto ao lado esquerdo de quando estava de costas – passa pela minha frente.
Sem lentes de contacto, mas a fazer um esforço por equilibrar o astigmatismo e a ligeira miopia, utilizo o canto do olho para marcar a trajectória. Assemelho-me a um central que, aquando da marcação do pontapé de canto, se ergue para cabecear como mandam as regras….de cima para baixo!
Faz deslizar a sua silhueta, por um “relvado” de alcatifa, num estilo semelhante aos melhores pontas de lança quando se dirigem isolados para a baliza…não falha a marcação e a convicção com que se isolou já o determinou.
Volta do intervalo com um sorriso renovado, solta o cabelo com os dedos, concentra-se na segunda parte. Está na frente do marcador e os segundos 45 minutos decidirão quem ganhará o jogo. O equipamento ainda tem provas do esforço despendido no primeiro tempo – colado ao corpo, revelando as formas e o quão em forma está.
Dá um jeito às chuteiras, puxa as meias até ao joelho, respira fundo e começa a segunda parte…
Eram imagens rápidas, mas de uma beleza cativante – quase me projectavam para a presença, em termos de espaço e tempo. Decorava e sorvia os detalhes como se não houvesse amanhã e, com grande esforço, consegui armazenar uma grande parte na minha memória…espero não perder esse dom!
Foi totalmente inesperado, mas de uma proximidade sem igual. Foi a expressão de um desejo versus a expressão do mesmo desejo. Confusos? A confusão faz parte do caminho a trilhar para descobrirmos o caminho – uma espécie de vegetação densa que, com a ajuda de uma boa catana, se vai desbravando. Sim, já em 2002 passaste por uma experiência semelhante e, após o caminho aberto, viste uma das mais belas paisagens da tua vida. Parece que estás habilitado a este tipo de experiências e nunca deixaste de explorar a paisagem em todo o seu esplendor.
Há vontade de correr, de apertar, de ver mais de perto e poder, em conjunto, descobrir a paisagem na sua plenitude. Vontade de repetir a imagem, vezes sem conta, até se tornar uma memória permanente no teu cérebro. Uma espécie de beleza que queres incrustada na cabeça para, qual GPS, descobrires os melhores caminhos para a clareira.
Debateste as melhores formas de abordar o caminho e, em conjunto, chegaram à conclusão que é melhor perder o mapa e usufruir apenas dos sentidos para – tateando – descobrir a paisagem que procuram.
É um jogo de vontades e alinhamentos, de desejos e curiosidade, mas acima de tudo é a vida a desenrolar-se numa direcção que te apraz registar e aguardas pela tua vez de usar a catana para chegar ao objectivo. Com golpes delicados, mas decididos!
Hoje foi uma espécie de dia atípico em que me coube a missão de explicar à audiência as diferentes fases de evolução de um programa (aplicação ou o desenvolvimento de software do início ao fim).
Não houve o início que todos esperavam pois comecei com uma grande gargalhada – maioritariamente cruzei-me com o assunto em 1988, ajudei ao desenvolvimento da aplicação de então e fiquei com a incumbência de, em ambiente de teste, obrigar a aplicação a cargas sempre superiores ao que a empresa desenvolvedora recomendava.
O produto passou por ambientes de teste, desenvolvimento e, após tudo muito bem testado e comprovado, foi colocado em produção. Foi, mais tarde, substituído por uma versão em que já não havia necessidade de dial-up a uma rede X25, nem N.U.I.’s…nada! A nova versão assentava nessa coisa inovadora de então que se designava por internet.
Confesso que já não me lembrava de grande coisa dessa altura, mas com a ajuda de alguns colegas de trabalho de outrora, construí algo que deixou o assunto bem explicado e interiorizado – foi a opinião final que me deram.
A gargalhada do início vem do termo “alfa” – que, na informática, designa a versão mais simples da aplicação. Significa isto que a primeira versão entregue tem que ser testada muito mais exaustivamente que todas as seguintes pois será a que mais erros certamente irá conter.
Incrivelmente dei por mim com um olhar de satisfação…talvez pelo facto dessa versão alfa se ter desenvolvido e se ter tornado num dos mais apetecíveis produtos de um dos bancos portugueses. Ou talvez tenha sido um ar de reprovação…por outras versões alfa nunca conseguirem sequer ver a luz do dia…. Curioso como a aplicação deixou saudades!
A informática tem o dom de fazer despertar chagas de outrora, mas – e todos hoje o sabemos – a informática é uma ciência de 0’s (desligado) ou 1’s (ligado) e, para memória futura, essa aplicação ainda hoje é usada por empresas com um número de movimentos diários que mais nenhuma outra aplicação comporta…talvez seja uma espécie de produto velho a quem não é dada a oportunidade de se reformar!
É ao som de Soundgarden que o dia se desenrola…misturado com umas músicas de Kasabian (a inevitável gravação do King Power Stadium, aquando da conquista do campeonato por parte do Leicester). 🙂
Voltou o misto de chuva e sol…mas está um frio desagradável. Aqueles dias de calor, em que o vosso humilde arriscou mesmo uma ida à praia e um mergulho, estão no passado e agora estou somente focado na viagem a casa! 🙂 🙂 🙂
A vizinhança melhorou bastante e já consigo ver a verdura do exterior do edifício (LOL) – as árvores, bem pronunciadas, o relvado bem aparado e a beleza natural das árvores jovens que se vão desenvolvendo. Trata-se de uma analogia tão óbvia que até me apetece deixar isso escrito para memória futura…
De casaco simples mas com capuz, de sapatos quentes mas sem vontade de os usar, de cabeça num mergulho de praia mas refém num escritório de cimento.
Sorrindo por antecipação e amargurado pela demora! 😦 Quase a caminho. 😉
Há sempre um sorriso quando ele chega. A maneira de falar, o sotaque que uma vida não mudará, o sarcasmo muito bem aprimorado, eis o amigalhaço escocês logo pela manhã! Este homem é o personagem mais terapêutico do edifício em que me encontro: tem absoluta noção de onde está, porque está e quanto tempo vai estar e, acima de tudo, ainda nos ensina o porquê de tudo isto lhe dar tanto gozo.
Há que criar o contexto para que percebam melhor: indivíduo na casa dos seus sessenta anos, com pouco cabelo – que permanece permanentemente coberto por um gorro, aqueles óculos caídos pelo nariz, os poucos cabelos brancos e o olhar entre a parte de cima dos óculos e os teus olhos. Um encolher de ombros quando as condições meteorológicas mudam – algo que, aqui, acontece a cada piscar de olhos, um sorriso perante o Sol e uma imediata piada, com aquele sotaque bem profundo, contatando algo como: foi por causa deste Sol que me mudei para este país “tropical”.
Incentiva-nos pela experiência de vida que nos vai contando, pela piada que sabe que o seu sotaque causa – há inclusivé um outro escocês que diz não o entender muito bem (e sorri, enquanto o diz) e pela rapidez de raciocínio com que alimenta o diálogo – que por vezes se torna num monólogo – de tal maneira os restantes intervenientes ficam de queixo caído perante o “dialecto”.
A melhor comparação que conheço, para vos tentar elucidar, serão os dois velhotes dos Marretas (Statler & Waldorf) mas, e este mas faz toda a diferença, naqueles momentos de elevado sarcasmo que, pelo menos uma vez, terminam com um velhote desaparecido do balcão e o outro a perguntar “ele saltou?”
A semana começa numa segunda-feira mas o sentido de humor nunca adormece!
Num país onde não tens carro, e onde o autocarro pode demorar 20 minutos a chegar e outros 40 até ao centro, qualquer oferta de boleia para casa é uma benção – para quem acredita nessas coisas. 😉
Acho que, pela quinta vez, me cruzei com o mesmo português – a quem outrora pedi desculpa por não ter reconhecido – e, mais uma vez (nestas coisas há que ser coerente) não o reconheci. Saí por volta das 20, para apanhar ar, e vi alguém – numa postura quase militar, de face mal humorada e com cara de poucos amigos – que me intimidou pela pose. Quinze minutos depois, quando todos saímos, qual não foi o meu espanto quando o colega que me tinha dito que havia boleia se dirigiu ao “alguém” de postura militar e lhe perguntou se havia boleia para mim… 🙂
Obviamente estes desencontros devem fazer parte desse processo milenar designado por envelhecimento! 🙂 A gargalhada que eu e o “alguém” demos foi mesmo porque ele tinha a certeza que eu não o reconheceria e a certeza dele – que se tinha confirmado…mais uma vez! Tenho que arranjar uns comprimidos para a memória ou começar a guardar fotografias das pessoas que mais vezes esqueço – haverá cartões de memória capazes de armazenar tanta informação? 🙂
Viagem divertida e bem tranquila até ao centro, num carro que tinha chegado no próprio dia, e foi já na última curva que o pneu cedeu….cedeu perante a pressão da curva à esquerda em que, por segundos, o pneu foi trilhado contra o passeio e…borracha versus cimento é uma luta desigual! 😉
Saltamos os cinco do carro e, qual equipa de mecânicos de Fórmula 1, tratamos da mudança do pneu estourado. Eu disse “qual equipa de mecânicos de Fórmula 1”? Menti…tivemos que ver vídeos no YouTube para entender como se removia a roda e, mercê do conhecimento mais profundo de um dos envolvidos – que enfiou um bom biqueiro no pneu – o pneu foi substituído pela “rodinha 24” que hoje em dia serve de pneu suplente. 🙂
Seguiram-se as despedidas, com o sentimento de dever cumprido, e o caminho para o centro. Entretanto o Cucas havia ligado e estava a acompanhar – via Skype – a mudança do pneu, o estado de espírito dos envolvidos e, com palavras de força e incentivo, resolvemos o problema com toda a motivação do mundo.
Demos umas gargalhadas valentes – eu e o Cucas – pela piada que é o programares tudo para ainda haver tempo para compras, antes do jantar, sendo que a mudança do pneu havia frustrado esses planos. Lá fomos juntos, na conversa até casa, a debater o novo plantel desse grande treinador do Fifa 2017. 🙂 🙂 🙂
Pequenos momentos inesperados que conquistamos com um sorriso na face!
Sonhei que idealizava a amizade perfeita: com um sincronismo de raciocínio muito semelhante entre as duas pessoas, com um sentimentalismo muito parecido, com uma cumplicidade muito superior à de qualquer irmão, com um sorriso permanente – muito semelhante ao do vencedor que, do degrau mais alto do pódio, sorri perante as adversidades que acabou de vencer…para ser o melhor.
Acordei e vi que me tinhas enviado uma mensagem com um simples “Só tu…” e um emoji simbolizando uma gargalhada nossa. Há duas exclamações em ti, pelo menos para comigo, que sempre me habituei a responder com uma gargalhada – nunca de gozo mas sim de antecipação!
As expressões são o “Só tu…” e o “Oh IKA” – que, desde sempre, serviram para tu exemplificares algo com o qual não concordas mas igualmente não discordas! Naquela tua maneira tão low-profile de fingir que se trata de algo que jamais farias mas, e ao mesmo tempo, não discordas totalmente que eu o tenha feito. Enfim, respeitas que eu seja traquinas e sorves cada detalhe dos meus momentos de traquinice – que, embora não sendo muitos, são deliciosos. Eu sei porque os vivo e, apesar da amargura em alguns dos casos, a experiência tem sido muito recompensadora.
Vivo sabendo que és real, que batalhas, que sorris, que discutes, que gritas, que dás gargalhadas sonoras que tentas retirar, depois de dadas, como se estivesses envergonhada do volume das mesmas. Nunca estejas! São sorrisos desses que fazem as pessoas sentir aquela doce sensação de felicidade que tanto procuramos e tu…tu ensinaste-me a saber procurá-la, constatar quando a achasse…talvez agora aprenda a saber segurá-la! Cabe-me a mim aprender essa lição.
Obrigado amizade, sempre contigo! Beijo de uma grandeza tal que permita expurgar tudo o que te apoquenta e trocar tudo isso por sorrisos!
Parecia ter tudo para ser mais um jantar com amigos – alguma cerveja, boa carne, a vontade de cozinhar segundo o conceito gastronómico brasileiro, mais cerveja, mais…bem, já perceberam a ideia!
A malta que se foi reunindo cedo mostrou que dificilmente abandonaria a reunião. Houve os que chegaram cedo, os que chegaram cedo, os que foram chegando…não havia controle sobre entradas e saídas. Havia um fluxo natural de pessoas.
As manhãs do fim de semana são sempre muito iguais: o brunch, imposto de maneira fascista por todos os que nele participam, obriga a um acordar com despertador (algo proibido em países sensíveis, durante o fim de semana). A maneira como os participantes tentam demonstrar que estão vivos, quase prontos para fazerem o caminho que os separa da Meca do brunch – o Brick Lane, demonstra bem o quanto a preguiça é combatida – pela imagem de uma tosta, uma fatia de bacon, ovos mexidos com pedaços de chouriço e uma água fresca! Uma espécie de fazer amor em jejum…com o brunch! 🙂
Irónica mensagem da colega decasa que, ao chegar ao portão, teclou um enigmático “o prédio está ardendo”. Eu, que prezo muito a minha temperatura corporal, respondi com um “qual prédio? O nosso?”. Obviamente era o nosso prédio! Medo!!!!! Corremos para a porta de entrada, nessa altura já pejada de bombeiros, e observamos os trabalhos dos bombeiros enquanto o vidro da varanda estourava – provavelmente estaria muito quente do fogo e estalou com a diferença de temperatura imposta pela água! Brutal filme de acção este que nos era dado a presenciar…gratuitamente! Fomos espectadores atentos, de cerveja na mão e sempre obedecendo às instruções que nos eram dadas.
O jantar, como sempre, correu muito bem e as pessoas estavam bem satisfeitas. Muitos momentos com muita piada, as inevitáveis desistências e esfomeados que julgávamos extintos da raça humana – mas o ser humano surpreende-nos sempre com alguém que tem um apetite bem superior aos demais…
O primo é um bem disposto, o futebol não correu tão bem quanto desejávamos: o Vasco da Gama ganhou ao Grémio com um golo absolutamente idiota. O dia já não corria bem – em termos desportivos – pois já tinha visto o Vettel a desistir de um G. P. da Alemanha – que ele liderava – com uma falha absolutamente imperdoável.
Sempre tudo arrumado após a revolução da festa. Sempre um acordar bem disposto. Um dia publico uma fotografia minha…a sorrir! 😉
Voltou o céu cinzento, o sono por força da falta de incentivo para sair do quentinho e enfrentar a meteorologia irlandesa, o vento mais frio, os casacos.
Ao contrário do ano passado, este ano houve bastantes dias risonhos de sol bem aberto. Se bem que o ânimo atinge picos de loucura a verdade é que a terra está completamente seca pela falta de água. Há países que não nasceram para ter verão e certamente também existem os que não nasceram para ter inverno.
Aquela lufada de sorrisos, vinda do continente, com as respostas de uma pessoa bem mais do que importante. A constatação de que a nossa amizade é realmente abençoada – ironicamente escrito por quem não acredita em mitologia…
Tempo de curtir o fim de semana – durante umas semanas seremos 4 a viver na mesma casa – com a visita e os sempre amorosos colegas de casa. Ensinar a visita a acompanhar-nos no brunch, as tradições irlandeses, os detalhes escondidos, os becos desconhecidos, as bebidas frescas e as bebidas naturais mas de teor alcoólico acima do recomendável!
Em jeito de crónica de autocarro, vejo a colega com quem tenho trocado mais impressões: casaco de ganga, calça preta perfeitamente alinhada- nem justa nem larga – e aquele sorriso bonito enquanto coloca a vaselina nos lábios.
O habitual diálogo de circunstância, abordando temas tão inocentes quanto a qualidade do sono, o despertar e a constatação conjunta de que ambos idolatramos o café.
Diálogo de qualidade, por enquanto com a inocência característica de quem desconfia do que se seguirá, e um foco extremo nos olhos um do outro.
Sorrisos inocentes mas prevenidos, gestos livres mas regrados na emoção. Respiramos fundo, com a desconfiança de que há suspiros entre inspirações.
Quinta-feira, já com os objectivos semanais atingidos e com a mente imersa num fim de semana de sonho e de trabalho: na segunda-feira terei atingido o objectivo de saber a resposta à questão: o sonho comanda a vida?
P.S. – Após um ataque ao website fui obrigado a apagar todos os subscritores e utilizadores. Se, por lapso, foste afectado então, por favor, subscreve novamente.
Com um sorriso largo, após a tua resposta! Sabia que estavas bem mas queria sabê-lo por ti e não por terceiros. Glorioso o momento em que a resposta veio! Bem haja!
Combinando, com toda a calma do mundo, a visita de Outono. 🙂 Recordando todas as nossas conversas, em flashes de segundos, e sorrindo com cada momento. A gargalhada que soltei quando recordei a única vez que nos chateamos e, chegado a casa, já tinha um recado para que o “chateado” não passasse de uma impressão e não algo real.
A nossa amizade tem tantos momentos bons e tão nossos que realmente só nos conseguimos rir deles quando, na nossa intimidade e no nosso círculo, partilhamos histórias. Por entre uma cadela completamente louca e aos saltos – bem sei que é culpa minha mas adoro brincar com animais – por entre crianças fascinadas porque descobriram uma brincadeira nova, por entre cervejas que vou bebendo e por entre as nossas histórias – passadas, presentes e nossos sonhos de futuro – nós somos capazes das gargalhadas mais sinceras e, de lágrima no olho, depois de mais uma recordação, deliciamo-nos com as surpresas de outrora que nos conduziram ao presente de hoje.
Outrora a tua melhor amiga obrigou-me a confessar que eu tinha tido saudades dela – aquando de umas férias dela ao estrangeiro. Custou-me a sair a confissão mas os benefícios de uma vida em comum e o filho maravilhoso que hoje temos foi a prova maior de que realmente mais vale falarmos a verdade do que vivermos numa encenação de beleza que em nada se assemelha à realidade.
Conhecemo-nos desde sempre e isso nota-se. Orgulho imenso em ter-te como amiga e poder saber que me consideras amigo.
Dias passados ao som de Kasabian – adorável o concerto, gravado ao vivo no King Power Stadium, aquando da vitória do Leicester City na Premier League.
Mais dois dias de férias marcados – há que respeitar a existência de meias-finais do Campeonato do Mundo – e a ideia de 2 dias para ordenar o que não tem estado bem ordenado…ultimamente.
Melhorias substanciais na capacidade de jogar o Fortnite – muito por influência do filho, do sobrinho e do colega de casa – empurram-me para os lugares cimeiros. Ainda a anos-luz do jogo praticado pelos habituais finalistas mas, e isso sempre foi o mais importante, com muitas gargalhadas soltas perante o superior jogo dos adolescentes.
Farto do sol…talvez não esteja habituado a ele aqui. A República começa a apresentar os primeiros sinais dessa falta de Sol e o racionamento de água já se faz em Dublin. Há uma imposição contra a rega de jardins e afins (desperdícios de água) para prevenir o esgotar da água presentemente existente.
Mais um capítulo fechado, no que a passado diz respeito. Em paz com ele, de olhos no presente mas com o sonho no futuro – as férias com a família. Saudade de mergulhos de mar e rio, de gargalhadas com as piadas do júnior, de finais de tarde de cansaço mas com o sentimento de dever cumprido. Vontade de cumprir essas férias longe de casa, com os de casa – pode parecer ironia mas temos tanto para descobrir juntos…
Quase na hora de desejar um feliz aniversário a uma menina lindíssima, que nos acompanha desde 2004, que já deve estar uma pequena adulta, à semelhança do primo.
Sorridente? Sim. Com uma agenda bastante atribulada para Julho/Agosto porque, finalmente, vou cortar o cabelo.
Voltarei a escrever quando houver algo racional para dizer!
Sentados no autocarro, debatendo a temperatura (alta) que se faz sentir, e eis que surge a polémica frase “Hoje está mais calor aqui do que em Ibiza”. O vosso humilde narrador, ao ouvir a expressão de regozijo face à alta temperatura que se faz sentir, aproveita para responder com um “Mal posso imaginar o número de festas que nos aguarda…em terraços irlandeses devidamente apetrechados para o efeito”.
Ambos soltam uma gargalhada e, quase em uníssono, concordam que a descida dos terraços irlandeses em festa até à realidade do autocarro que, numa segunda-feira nos transporta até ao emprego, está ao nível das maiores tristezas da humanidade.
Constatamos que podemos não ter a meteorologia de Ibiza mas temos as nossas festas bem mais completas e bem mais privadas.
A imprensa insiste em avisar a população que hoje, ao contrário dos restantes 364 dias, o índice ultravioleta é perigoso e devemos proteger-nos com protector solar com um índice mínimo de 50 que, após colocado na pele, nos faz a todos parecer irlandeses…
“Um dia de cada vez” foi a resposta que obtive a uma questão que coloquei. Soa a frase feita mas parece ser o comportamento mais adequado a ter…sempre. Uma espécie de analogia com o ditado popular que nos incentiva a viver cada dia como se fosse o último porque, eventualmente, acabamos por acertar!
Por entre torcedoras da selecção Portuguesa e adeptos da selecção brasileira eis-nos a aguardar o jogo seguinte neste campeonato do mundo.
Giro, e ao mesmo tempo ingrato, como tantas “competições” importantes estão a ser jogadas ao mesmo tempo. Dá a impressão que o tempo não chega para acompanhar todos os resultados! Sim, já sei: um dia de cada vez!
Tenho-me esquecido de ti mas não é por más razões, como bem sabes. Se a viagem de ida foi extenuante, mas com uma chegada bem recompensadora, a viagem de volta foi saudosista e com uma vontade imensa de ficar.
Foi tudo feito sem planeamento, sem agenda definida – excepto no que a dentista diz respeito – e cumpriste quase tudo o que te propunhas fazer…faltaram coisas insignificantes, mas as mais significativas foram cumpridas; regressaste com uma vontade imensa de ser emocional e não voltar, de lutar contra a razão e deixar a emoção tomar conta do destino.
Estiveste com o teu filho e conseguiram retomar a conversa onde a tinham deixado ficar, estiveste com a tua família e, todos juntos, conseguiram voltar atrás no tempo e rir – com prazer desmedido – de factos outrora ocorridos e cuja memória os teus primos, todos mais velhos, agradeceriam que não recordasses. Conseguiste cumprir os pequenos objectivos a que te propunhas e ainda elevaste uma amizade à condição de namorada…nada mau para 2 semanas na tua cidade natal!
Agora regressaste a uma rotina que criaste, que te faz sorrir num país sem sol – que te faz mais forte num país marcado por uma larga ausência de sol, forte presença de chuva e frio, mas de paisagens espectaculares. Anseias a visita, para juntos darem passeios pelos verdes campos irlandeses, qual Heidi e Pedro mas com ideias mais adultas.
“Um dia de cada vez.”, explicaram-te um dia. Nunca duvidei dessa explicação.
A mochila como acessório para fingimento puro de quem não leva absolutamente nada dentro dela. Uma espécie de princípio, que finge determinar que regresso a casa apenas de passagem, e que a casa a que regresso possui tudo – o que determina o porquê desta ser A casa a que retorno.
O som como método de, juntamente com a leitura, bailar. Uma melodia que acompanha o humilde narrador – da cidade em que habita até à cidade em que nasceu. Um trautear que começa na partida e só termina quando o regresso a Cork acontece. Um som e uma leitura que só terminam quando a mochila regressa ao armário de onde saiu e o humilde narrador exclama “Voltei”. Uma leitura que me permite exclamar “Já?” em cada escala feita. Um folhear que é alimentado pela imaginação do leitor perante as palavras do autor – um divagar pelo mundo, pelo espaço, pela natureza, pelas pessoas – movido pela imaginação de outrém mas ajustado à imaginação de quem lê.
A saudade é aquela portuguesa de difícil tradução. Já aqui abordei o “matar saudades” – como uma espécie de homicídio legal, com que as autoridades pactuam e que, uma vez executado, contribui de maneira profunda para um restaurar de valores, dos sentidos, do significado de cada um e cada coisa nesta jornada a que chamamos de vida.
…utilizado para expressar algo que já era costume fazer, ou visitar e estar num lugar já habitual.
Imaginando que sou alguém capaz de fazer uma mala – com a intenção de viajar até casa – detenho-me perante um teclado que me interroga porque não o tenho usado para actualizar o blogue…rimos ambos – porque ambos sabemos a verdade (sou muito íntimo com o meu teclado).
Por entre peças de roupa que, na minha imaginação, vou precisar de usar, vou-me detendo e sorrio a cada peça de roupa que efectivamente decido não levar comigo…normalmente a mochila está completamente vazia quando viajo para Espinho…porque é que desta vez haverá de ser diferente? É tão giro improvisar com a roupa que ficou em casa…uma espécie de combinação impossível – feita de vestuário, que foste abandonando ao longo dos anos – sem que nunca o tenhas deixado partir totalmente…
Ainda estás a ultimar a agenda para Agosto e já decidiste até onde vais…antes de partir para as férias do Verão. Semelhanças com 2017? Talvez…afinal, tratar-se-á de mais um sonho concretizado! A visita a uma cidade que, quando eras um puto, acompanhavas a cada batida, a cada gesto de opressão, a cada gesto de rebelião….em breve estarás lá, e visualizarás os cenários que outrora só conseguias imaginar pelos textos que te chegavam! Em breve estarás lá…a beber uma pint paga em libras e a saborear o momento histórico – para ti – de quem pode saborear história de sítios tão diferentes…uma espécie de iguaria para quem tanto gosta de “refeições” bem confeccionadas.
Andas com o mesmo sorriso que tinhas…aguenta-o, usufrui dele, exagera nele!
Nunca tiveste jeito para despedidas e foges delas como o Diabo da cruz. 😁
O simples facto de teres escolhido hoje como o dia de partida – dia em que chegou o presidente de Israel – com Syntagma fechada, polícia de choque, a Mossad, o povo palestiniano a manifestar-se e um caos de trânsito (de pessoas e veículos)…e tu, qual traquinas, a furar por entre a confusão até a paragem seguinte do X95 que haveria de te trazer até ao aeroporto. 😎
Não és um turista neste país e a excitação da chegada e o vazio na partida demonstram-no (deve ser do azul e branco). 😉
Rodeaste-te dos que puderam estar presentes.
Tiveste demonstrações de força de alguém que, apesar de conheceres mal, te fez esboçar um sorriso pela forma como, apesar da tenra idade, superou tudo para conquistar o que queria.
Uma alegria imensa por veres uma ex-colega de trabalho – inteligentissima – grávida do primeiro rebento.
Uma amiga que gentilmente te cedeu um quarto para a tua estadia e te acompanhou nas incursões nocturnas.
A tua espanhola preferida que continua a ser muito engraçada e cheia de alegria de viver.
Deixaste o cartão de débito na máquina, após o levantamento de dinheiro no aeroporto, mas nada te podia roubar o sorriso. Nada nem ninguém. Cartão cancelado e a aventura continuou.
Sentado nos bancos do exterior do aeroporto, dás por ti a pensar em todas as aventuras e ilhas que “conquistaste” a partir daqui…e bate uma saudade imensa de voltar, um dia, de vez!
Obrigado a todos pela qualidade do tempo aqui passado. Só foi possível graças a vocês.
Dia primeiro do mês de Janeiro de 2018. Dia de trabalho. Céu completamente azul e um sol que, ao incidir no asfalto, confunde a visão de qualquer humano.
Terceiro planeta a contar do sol. Hemisfério Norte, ilha a Oeste do continente europeu.
Noite bem passada e de sono retemperador ao ponto de permitir um dia de trabalho “normal”. Água…muita água, fresca, transparente e a hidratar o corpo do vosso humilde narrador.
Frio, várias aves que, de acordo com o taxista local, são um sinal de neve nos próximos dias.
Sem resoluções de Ano Novo – apenas manter a moral e bons costumes enquanto vou descobrindo novas pessoas. Continuar a esquecer, continuar a relembrar, continuar…palavra de ordem é continuar!
Batalhar por melhores dias, por um abraço ao meu mais que tudo, ver a família e amigos enquanto devoro uma refeição típica do meu país.
Sorrir! Exercitar os músculos da face, com sorrisos abertos e desmedidos, até ficar com a textura de um bodybuilder! Rir….resolve muitos dos problemas!
Mudar de número de telemóvel é considerado resolução de Ano Novo? 🙂
…quem a comanda és tu. A tua vida, os sonhos que pretendes concretizar, as acções que pretendes desenvolver, onde queres chegar. Cabe-te a ti miúdo…e teres sonhos sem sentido faz tanto sentido quanto guiar pelo lado errado da estrada! Apesar de viveres na Irlanda…😁
Leste – porque adoras ler – com todo o cuidado o texto que aparecia no ecrã. Releste, não porque houvesse uma incerteza no contexto mas porque era demasiado semelhante ao contexto que pretendias. Era “demasiado honesto”, algo não fazia sentido. Seriam palavras vãs? Um voto contra a castidade? Um grito de ajuda? Uma dissertação sobre outrora? Porquê agora? Acordaste com a sensação de ter sonhado…
Procuraste o que achaste que existia, tentaste extrair dali um sentido mas não achaste o que pensavas que tinhas lido e o sentido permaneceu o mesmo de outrora.
Saltaste da cama, despiste o pijama e tomaste um duche bem quente. Sorrias enquanto te lavavas e havia um ar de contentamento na tua cara. Tudo tinha acontecido sem que algo se tivesse passado. Sorriste e saíste para a rua com um ar diferente….de sonhador alegre, com uma paz diferente e, no entanto, nada havia acontecido.
Gosto da definição de festa que aparece no Dicionário de Língua Portuguesa Online. Copiando o que lá consta temos, entre outras possíveis respostas, a “Reunião em que há regozijo”. Não vejo nenhuma mais bem conseguida do que essa…a sensação de que há satisfação e júbilo.
Recordam-se perús anteriormente trinchados e já digeridos, presentes anteriormente surpreendentes mas já usados até à exaustão, momentos de confraternização que nos uniram em volta de pratos tão suculentos quanto os momentos daqueles que os presenciaram.
A saudade marca muito e, apesar de não o mencionarmos, todos o sentimos. Uma espécie de sentimento esquecido mas recordado sem que seja mencionado. Uma homenagem sentida a quem nos falta, uma saudação especial para os mais novos que vão recordar alguém que não conheceram através das palavras dos que com ele mais de perto conviveram.
É delicioso ver a cara deles enquanto as aventuras de outrora vão sendo reveladas…são o doce que deixamos neste planeta.
O concerto havia acabado e estavas na esplanada – esse teu amor por esplanadas vai dar origem a um livro – a terminar a tua pint. Entre a primeira banda de punk rock e a segunda, haviam passado cerca de 2 horas e meia e algumas pints. Tranquilamente fumavas um cigarro, aquecias a mão para poderes a voltar pegar no copo de cerveja, quando o telefone tocou.
O bolso esquerdo das calças trepidava e, sem te teres apercebido, atendeste a chamada e viste uma cara conhecida: o sorriso habitual, a traquinice do costume, um barulho de fundo que tanto poderia ser do emissor como do receptor. Soltaste uma sonora gargalhada e eis que outra cara conhecida tomou o lugar da primeira e ficaste sensibilizado – confessa…ficaste! Brindavam a ti e pediam desculpa pelo atraso (sempre encaraste os atrasos como um sinal de que a paternidade poderia estar ao virar da esquina, muito embora só uma vez o tenhas feito numa esquina…).
Quando uma terceira cara surgiu no ecrã tu já estavas lá, já não estavas em Cork, mas sim no teu canto, de Super-Bock na mão e pronto a discutir a conta final com o mesmo argumento de sempre: – Quem é que bebeu estas cervejas? 🙂
Foi bom termos passados estes minutos juntos! Fui a Espinho e voltei em forma de 0’s e 1’s! Viajei como um pacote de dados e a uma velocidade digna de uns 5G! Brindamos juntos, rimos juntos e soltamos um suspiro (não porque é Natal…um suspiro de saudade!)…um fenomenal suspiro!
Obrigado miúdos; não gosto de surpresas, mas vocês surpreenderam-me, como sempre o fazem. Loucos, com naturalidade…
Há um sentido mais puro quando a linha de raciocínio é semelhante. Uma espécie de paz sem que algum dia a guerra tivesse existido, um reencontro de almas gémeas sem que algum dia tivessem sido iguais (porque tão diferentes), um abraço sem que algum dia se toquem.
O silêncio como forma de demonstrar o quão grande é a vontade de falar, o receio de falar sem que, posteriormente, se possa voltar ao silêncio. O desviar do olhar como forma de defesa, a cegueira como forma de ver, de maneira mais clara, a realidade dos factos.
A revisão mental (e constante) das expressões de outrém, sem recorrer ao olhar. O sentir a audição vibrar porque consegues escutar o que diz. A permanente atenção sem que possas fingir-te desatento. O recurso a reflexos para olhar, sem ser “apanhado”. O ser apanhado e ver na própria face o reflexo de quem adorou tê-lo sido.
Arriscas a vida e sais sem casaco, reconheces a tua falha e voltas atrás para o buscar. Refugiado no ambiente mais quente que o casaco te dá, começas a raciocinar melhor do que no ambiente glaciar anterior.
Relembras a Grécia, quando tropeças num vídeo que mostra imagens da “tua”praça – aguardando a visita do chefe de estado vizinho…Turco. Deve ser um dia giríssimo para ouvir o humor dos gregos, dada a animosidade existente entre Gregos e Turcos e, conhecedor da situação, sorris por não poder estar presente mas imaginando todos os detalhes de todas as conversas que, neste dia, certamente terão lugar.
O frio leva-te a recordar o Rakomelo – essa bebida dos deuses que permite a qualquer ser humano manter-se quente. Devia haver um negócio mundial que permitisse a permanente circulação – obviamente livre – destas receitas populares cujas origens remontam a tempos certamente não documentados…e funcionam!
De volta ao calor resolves escrever umas linhas e…sai isto. Aproveitas os intervalos, entre ausências de trabalho, para documentares momentos, no teu blog . Haverá quem não o ache a melhor das ideias mas nunca foste um grande fã de críticos e sempre lhes deste a dimensão e importância que eles merecem.
Descobriste agora que foste objecto de um qualquer pitoresco estudo sociológico e estás exactamente na mesma após o teres constatado. Continuas sem reconhecer os dias da semana, continuas a descansar quanto baste aos fins de semana. Dás uma gargalhada pois quase nada do que acabaste de escrever é real…apenas algo que fantasiaste para teres umas linhas para escrever.
Uma sexta-feira que me foi roubada, um fim de semana que me foi oferecido. Eis um resumo sucinto do quão díspares os dias podem ser nesta Manhattan irlandesa.
De um encontro às cegas a uma festa de pizza…houve de tudo um pouco. A hospitalidade irlandesa é um riso constante e, estar às 2 da manhã a debater a melhor forma de fazer uma pizza, tornou-se deveras hilariante.
Conhecido o grupo de desconhecidos, que por sua vez “meteu conversa” com outro grupo de desconhecidas. Dás por ti a ser surpreendido por alguém que não julgavas que te pudesse surpreender e terminas a noite com um sorriso desmedido na cara – limpa de cabelos compridos e barbas descomunais.
Um acordar diferente, um café saboroso, um fim de semana muito lucrativo em termos emocionais. Mais uma lufada de ar fresco para a semana que já quase termina.
Uma lógica na falta de lógica, um vento num país habituado a chuva. Sol….acho que foi do Sol….
A folha não tinha absolutamente nada nela. Estava conforme foi expedida da fábrica e destinava-se a ser usada por quem soubesse o melhor uso para ela. Estava propositadamente em branco.
O facto de todos os lápis de cor, pincéis, tintas e demais utensílios habilitados para a preencher estarem afastados não era obra do acaso, mas sim a própria folha que o impunha! Ela queria manter-se em branco até se sentir em condições de ser preenchida pelas melhores cores para a cobrirem e mostrarem ao mundo todo o potencial dessa união.
A folha gostava do cheiro de certas cores – costumava mesmo partilhar com a restante resma que “havia cheiros que a faziam ceder”. Ouvi esta confissão de uma folha que me entrou no escritório e resolveu denunciar a folha que “tinha gostos e era desprevenida”. Não pedi para conhecer a folha mas, sem que eu desse por isso, a folha conhecia-me melhor do que eu…
Revês as palavras escritas, revês as respostas recebidas. Com uma atenção redobrada percebes que há uma palavra que, muito embora mal escrita, é a mais relevante de toda a conversa e, após constatares que nem sequer reparaste nessa palavra – cujo sentido atribuíste a uma língua que não dominas – ficas a pensar no quão desvirtuada a conversa ficou. Uma gralha transforma toda a percepção das palavras numa conversa completamente diferente.
Apetece-te gritar por existirem gralhas – que emitem sons que podem perturbar toda e qualquer comunicação – mas sabes que as borboletas conseguem harmonizar: com a sua beleza, aquele seu voo belo e sincronizado, aquelas asas que te lembram todos os testes psicotécnicos que fizeste, toda a sua harmonia…que sabe voar!
Saboreias cada palavra – como se tivesses vivido a aventura da tua vida e precisasses de voltar a relembrar. Sorris a cada troca de detalhe mais íntimo, falas sozinho porque aprecias toda a envolvência. Não nasceste para julgar ninguém e estás perfeitamente bem com todo e qualquer julgamento que queiram fazer de ti, aguardas uma ocasião singular que te permita trilhar o caminho que optaste por confessar.
Têm sido dias diferentes, mas recompensadores ao ponto de te levarem a escrever estas palavras.
Estava eu sentado na esplanada quando ele chegou. Exclamou “Devo estar a ficar maluco” e eu, com uma boca aberta de espanto, apenas respondi “Ah?” ao que ele imediatamente respondeu “Eu sei que sou maluco, mas não precisas de puxar por mim para que o diga”. Duas gargalhadas explodiram naquele quase silencioso final de tarde – apenas quebrado pelo ruído de algumas gaivotas, que pairavam sobre nós como pedinchando alguns tremoços e um pouco de cerveja.
Era dia de desabafos e, enquanto profissionais do amigável desabafo, os dois sabíamos perfeitamente o que esperar um do outro. A amizade tem aquele dom de nos dar a conhecer a pessoa amiga – as suas rotinas, os seus tiques, suas virtudes e defeitos, forma de contornar uns assuntos e de enfrentar outros. A cerveja chegou, sem ter sido pedida; os tremoços seguiram-se como se estivéssemos perante uma rotina de muitos anos. Quem nos servia era também um amigo – que sabia, de antemão, que no final dos aperitivos nós iríamos contestar a conta, refutar sequer ter participado no consumo de uma das cervejas que nos era apresentada ou que algum dia houvéssemos sequer provado os tremoços – fazia tudo parte de uma coreografia que, jamais ensaiada, nos levava sempre ao mesmo desfecho.
Após a constatação de que a sede é uma virtude e deve ser saciada, eis que os dois amigos se levantavam e, com a promessa de voltar muito em breve, dirigiram-se para o restaurante onde o arroz de polvo esperava por eles. O grande desafio: qual o acompanhamento certo com o arroz de polvo? Misturar vinho com cerveja pode tornar-se um desafio insuperável à medida que os anos avançam e, enquanto um se defende e opta por manter-se na companhia da cevada de Leça do Balio, o outro faz uma incursão nas uvas esmagadas e apuradas em cascos de uma qualquer madeira. Já não debatem qual a madeira que terá apurado o vinho, mas sim a bela noite que a varanda lhes proporciona.
Não resistem a um café no final da refeição – muito embora saibam que já não têm 18 anos e os efeitos da cafeína poderão ser mais prolongados. Esta não é uma noite defensiva…é dia de desabafos, lembram-se? Olham para a adição de todos os elementos do jantar e, sem ousar sequer contestar o olhar da senhora que lhes entregou a conta, pagam o valor sem esquecer uma bonificação que lhes permita lá voltar e ter o tratamento acolhedor a que estão habituados. Descem as escadas e o patrão da casa coloca-lhes uma questão sobre o Futebol Clube do Porto – algo também tradicional nestas “incursões ao arroz de polvo” – que sabem que vai demorar a responder. Há que usufruir das cervejas que são gentilmente colocadas no balcão, reunir consensos na resposta e avançar.
Voltam ao local onde inicialmente se encontraram. A nortada afasta-os do muro e coloca-os na mesa do meio – uma fila atrás de onde começaram. Estão animados, embalados e contentes por estarem juntos. O arroz de polvo estava bom, a cerveja e o vinho evitam qualquer rouquidão na voz e o meu amigo pergunta-me “Ouve lá, porque é que concordaste comigo quando eu me apelidei de louco?” …, entretanto, e por entre gargalhadas, chegam dois finos! A noite está salva…
Instalado no novo apartamento, no mais calmo dos condomínios fechados de Cork, trocando a “solidão” de viver sozinho pela comunhão de partilhar a casa com um casal amigo. Num dúplex, em que os quartos são no andar inferior – sala e cozinha no andar superior – vou desfrutando a calma do espaço – com noites muito bem dormidas, com despertares naturais, com passeios matinais pelo bosque que ladeia o Rio Lee. Há uma certa ironia em gostar imenso de um dado local na cidade e, subitamente, termos a oportunidade de viver mesmo ao lado do local de eleição.
Passeios entre raposas e humanos, entre crianças e gelados, entre um bosque solarengo ou chuvoso, entremeado por fotografias a toda a natureza que me rodeia. Com um sorriso parvo de satisfação, com o estômago reconfortado – depois de mais um repasto de comida tradicional portuguesa, depois do contacto com os que mais sinto como “meus” sem que detenha a sua propriedade.
Caminhando muito, numa base diária, sempre fiel ao novo café de eleição (infiel ao anterior), já adaptado ao clima – e com o sexto sentido quase adaptado às mudanças de humor meteorológicas. A pensar seriamente em questões da maior importância: compro ou não compro umas galochas para os dias de cheias? Com muito poucas dúvidas e muitas certezas, com muita vontade de continuar a explorar enquanto vou amealhando roteiros fictícios que um dia tornarei reais.
A recomeçar, sem que o anterior começo tenha sido interrompido. A rever, sem que consiga atingir o pleno conhecimento da natureza que me rodeia. A interrogar os locais – com temas tão abrangentes quanto a passarada que este país possui. A sorrir, sem esquecer as conquistas do meu rebento que tanto contribui para essa mudança de feições.
Afastado de nostalgias e a reconstruir novos dias. A estabelecer novas amizades e a construir noites diferentes. A ser garoto sem deixar de ser adulto e a ser adulto sem esquecer o que me fez sorrir na infância – será nostalgia infantil? Talvez seja…mas é salutar! Sinto-me num imenso relvado verde, com a bola a rolar e pronto para um grande jogo de futebol! Acho que, para visão de ateu, estou a ser o Deus do meu próprio presente e futuro. Radiante que assim seja!
Originalmente publicado a 6 de Novembro de 2015 mas perdido nas inúmeras mudanças de alojamento do domínio.
Foi de repente…
Não esperava que voltasses. Não que não tivesse um desejo enorme de voltar a ter-te (“Tudo o que não nos destrói, torna-nos mais fortes”, já escrevia Nietzsche) mas simplesmente porque a febre que impões em mim eleva-me a uma categoria de forno industrial – daqueles usados para fabricar o vidro e cujo simples colocar em funcionamento obriga a horas de preparação, calor e muita areia – pensei que te tinha visto, de costas voltadas à beira-mar mas, afinal, voltaste!
Fugi de ti para o mais longe que consegui. Escondi-me, fugi, corri, tive medo e receio de ti e, no entanto, parece que voaste ao meu encontro. As minhas costas cederam perante a pressão que sobre elas exerceste e, ao invés de um passeio romântico a três – eu, tu e a cadela – de repente gritaste-me: não sais de casa! E eu, que já te vou conhecendo, tentei contrariar essa temperatura com que fazes questão de me contemplar. Apresentei-te aos meus amigos e eles não gostaram de te ver. Desde desculpas de “energias negativas” a espirros de saudação eis-nos escorraçados para a reclusão até que partas!
Não sei porque me persegues!!! Porque me fazes chorar quando tudo o que pretendo é rir?! Porque me fazes ter corrimento se eu sou um homem?! Porque me atiras abaixo sem um segundo propósito definido?! Não te quero ver mais este ano! Desaparece, por favor. Fui e sempre serei educado para contigo – especialmente quando estás com outros e não comigo – mas, desta vez, parece que tens a força do exército grego aquando da Batalha de Marathónas e todos sabemos que os gregos estavam demasiado fortes naquele dia.
Dei-te uma de 4 em 4 horas e não desististe – mas enfraqueceste – e pude alterar a cadência para uma de 8 em 8 horas e estou quase a vencer-te. O meu último lenço branco não será um sinal de rendição mas sim de vitória.
Mais vale culpar a memória pela minha ausência aqui. É óbvio que não corresponde à verdade mas parece-me ser a maneira menos dura de enfrentar o facto de te ter abandonado durante quase um mês.
Das refeições portuguesas, no Rio Café, ao pós-dilúvio das duas tempestades que enfrentamos, houve sempre muitos pequenos detalhes que ficaram por contar. Ver uma raposa a nadar no rio, logo pela manhã, o festival de jazz e os novos caminhos descobertos.
A raposa foi talvez a mais salutar de todas as experiências, em termos de contacto directo com a natureza. Caminhava eu pela ponte, em direcção ao café matinal no Union Grind, quando reparei num animal molhado que tentava o equilíbrio nos cabos que percorrem as margens do Lee. Obviamente desequilibrou-se e caiu no rio, nadou até às escadas e, qual animal assustado no meio citadino, correu pela rua fora e desapareceu nos jardins da Câmara municipal (provavelmente para pedir asilo….ahahahahahah).
As viagens directas, de Cork para Reykjavík, terminaram no final de Outubro e lá terei que aguardar pela Primavera (ou ir via Dublin) para visitar a Islândia. Não é “bucket list” mas é uma idéia que começou a formar-se por me encontrar aqui tão perto – um pouco à semelhança da visita à Roménia quando me encontrava na Grécia – algo diferente e aqui tão perto.
Estou a poucos dias de mudar de apartamento, para um apartamento dividido com a minha colega de trabalho, e conto as horas que faltam. A casa não tem alcatifa o que, em muito, vai contribuir para uma melhor saúde pulmonar (soa a piada de fumador mas é uma realidade).
Prometo voltar em breve para tentar voltar à cadência das aventuras que vocês merecem ler. Até lá deixo-vos…Aquele abraço!
Chove! Mas chove de maneira semelhante à que levaria qualquer outro país a emitir um alerta meteorológico; aqui temos um simples alerta amarelo, que corresponde a “alguma pluviosidade”.
Assim como não entendo o “feels like”, na temperatura das aplicações, também nisto dos alertas sou um pouco desconfiado. Quem determina a sensação de uma dada temperatura e quem determina que a pluviosidade é em excesso?
A conclusão é que tudo depende da perspectiva: a temperatura pode fazer um Grego sentir frio enquanto um Irlandês passa por ele de manga curta e calções. O agricultor pode exclamar que choveu pouco enquanto que o citadino – afectado pelas cheias do rio – exclama que foi uma intempérie monetariamente dolorosa.
Mais vale uma perspectiva abrangente do que uma expectativa remota.
O ditado popular, com a interpretação que cada um lhe quiser dar, significa para mim, que depois da parte má segue-se a parte boa – numa tradução literal, fácil de entender e que é a minha tradução.
Depois de 12 horas com o vento a soprar muito forte, de ver um carvalho a dobrar – como se de um ramo se tratasse, de ver objectos a passar no ar – como se fizessem parte do céu, de atentamente tudo acompanhar – no apartamento virado a norte (logo, de costas voltadas para a força do vento), de consultar os relatos dos inúmeros sites que cobriam o acontecimento e que diziam que havia pessoas no mar…que queriam testar a força da tempestade…posso finalmente exclamar “Estou aqui! Estou bem.”.
Provavelmente não será a maior tempestade a que assisti – talvez a de Cuba, em 1997, tenha sido maior, mas aqui, não me perguntem porquê, sentia-me mais frágil perante a natureza. O carvalho, no jardim das traseiras do apartamento, oscilava como um simples ramo e eu, que o conheço desde que me mudei para aqui, sei bem que um abraço dos meus não chega para abraçar aquela árvore…assim, a Ideia que constantemente me assolava era “Se aquele elemento da natureza (árvore) perde a batalha contra o outro elemento da natureza (vento) como é que esperam que nós – meros humanos – nos saíamos desta intempérie?”
O facto de haver a obrigatoriedade de estar fechado em casa não ajuda…aproveitei para limpar a casa, lavar a roupa e dormir uma longa sesta – embalado pelos assobios daquele vento que ainda esta noite me passou pelos sonhos. Sim, pelos sonhos…porque apesar de parecer obra de um pesadelo a verdade é que um espectáculo desta natureza (no sentido literal da coisa) não é algo que todos possam presenciar e usufruir. Foi como dormir embalado por uma música diferente do habitual e, para quem nutre um gosto ímpar pela natureza, isso assemelha-se a um embalo muito reconfortante!
O espírito irlandês começou a surgir, a meio da tarde e quando se começou a constatar que o vento baixava de intensidade. No Crisis response do Facebook, relativo à Storm Ophelia, sucediam-se os pedidos de ajuda de irlandeses que solicitavam aqueles bens de primeira necessidade, após uma catástrofe, mas no contexto irlandês. 99% pedia cerveja e 1% solicitava papel higiénico…De seguida, e numa série de organizações espontâneas, começaram a aparecer convites para festas intituladas “Eu sobrevivi à tempestade Ophelia” e os pubs a requisitar mais pessoal para poder lidar com a imensa moldura humana que se havia formado! Bonito de ver, de brindar, de celebrar!
Hoje a manhã assemelhava-se a uma tela pronta a ser pintada pelo artista. Ou, melhor ainda, a obra-prima de um artista após ter presenciado algo ímpar e ter recebido uma inspiração que, aqueles que acreditam, traduzem por divina. Descreveria o dia de hoje como um novo começo…o céu parecia pintado de um azul diferente, o verde parecia mais limpo e desejoso de ser visto, toda a cidade estava limpa e apenas os amontoados de folhas denunciavam os acontecimentos do dia anterior. As pessoas tinham um sorriso muito pronunciado nas faces e os cumprimentos eram mais longos e calorosos que anteriormente. Se não soubesse eu diria que tinham aberto as portas a uma cidade completamente nova onde as pessoas eram naturalmente felizes…
As coisas começam a assemelhar-se a vivências de territórios habitualmente afectados por intempéries: as lojas retiram os placares exteriores, as janelas são cobertas com madeira e a sensação que tens é que estás nas mãos da natureza.
Assistir a uma loura a estacionar o carro, num local onde cabem dois, foi o entretenimento a partir desta húmida esplanada. Falhei a feijoada no Rio café mas vinguei-me nuns divinais baked beans.
Agora debato o estacionamento com a loura…terá sido o meu olhar crítico a providenciar este momento? Seja…
Chove, desde que acordaste. As previsões meteorológicas dizem que a tempestade Ophelia deverá passar muito perto de Cork. Estás abastecido de mantimentos.
Se a chuva, por si só, não constitui uma novidade sabes, de antemão, que o alerta vermelho indicia algo de perigoso. O plano de contingência passa por chamar um táxi para, da maneira que te parece ser a mais segura, ires trabalhar. As escolas estarão fechadas e há um alerta para eventuais cheias do Rio Lee!
Vieste de uma terra de alertas vermelhos porque estavam 42 graus e havia uma tempestade de areia para uma terra com alertas vermelhos onde levas com cargas de água semelhantes á que levou o outro senhor a construir uma arca…opções!
As árvores demonstram a força do vento e estás seriamente a ponderar ir para um hotel, só por uma noite, para evitares o receio que é estar a viver ao lado de pinheiros com mais de 25 metros a cerca de 10 metros de casa! Não é preciso ser um génio da matemática para perceber que são potencialmente perigosos.
Terminada a aventura com a conterrânea do Sr. Putin, estás agora mais livre para fazeres aquilo que gostas. E continuas com a Escócia debaixo de olho! Nunca paraste a tua procura e sabes que, a qualquer momento, poderás ter que fazer as malas e partir. Não são malas de cartão e tu há muito que compreendeste a piada que é partir para um sítio novo, desconhecido e cheio de locais para conhecer – não de férias, mas para trabalhar e conhecer, de novo, pessoas novas, locais novos e ver a natureza, acima de tudo isso, desses novos lugares por explorar.
De dedos cruzados e com um sorriso de quem quer o melhor para si próprio, sem réstia de egoísmo, mas com a certeza do seu valor próprio, vais tomar um duche e desces até à cidade.
Há sempre um alerta meteorológico neste país! Hoje é amarelo e, desde que cheguei, acho que nunca houve um dia sem o registo de uma qualquer intempérie…se está sol (um milagre que raramente acontece) a exposição UV é sempre perigosa e, quando chove, há sempre vento a acompanhar…8 ou 80!
Ainda não consegui perceber como é que os locais conseguem andar 90% do tempo vestidos de calções e t-shirt mas confesso que não vou esforçar-me mais por compreender.
Que, de facto, são um povo caloroso isso não há dúvida! Que possuem um património digno de ser preservado e partilhado com as gerações futuras…sem dúvida.
Adoro o verde neste país. Sinto-me em África com a frescura irlandesa.
Qualquer analogia daltónica entre o coelho branco e o coelho laranja merecerá um comentário apagado. São as novas regras da democracia que o ditam!
Após uma noite passada no White Rabbit (“Follow the White Rabbit”, ring a bell?), a assistir ao Irlanda-Gales, em que as restantes pessoas que assistiam olhavam para o ecrã com cara de quem não reconhecia o desporto em causa (o futebol será, porventura, o terceiro ou quarto desporto – em termos de praticantes – neste país), eis que hoje a selecção jogou.
Um orgulho ver como a bandeira une o povo português. Senão, vejamos: o ponto de encontro é de uma trivialidade tal que somente um incauto, com muitas dificuldades de visão, audição e afins, não conseguirá encontrá-lo. E, após o apito inicial, noto que há uma camisola de um tom que não aprecio particularmente, bastante desbotada (tal como o clube em causa), e a única ideia que me ocorreu foi enviar um email ao proprietário a notificá-lo daquele potencial atentado ao pudor!
Nutro, pelo desporto-rei, um certo amor e não tolero que o mesmo seja abusado sem qualquer perspectiva de compromisso! Embora, no caso anteriormente descrito, a fé seja tanta que, muito provavelmente, não caberá à camisola o abuso, mas sim ao jogo de bastidores!
“Chega!”, gritou a voz de adepto da selecção nacional! “Chega o quê?”, respondeu a voz do adepto do Futebol Clube do Porto que, na ocasião, observava atentamente um jogo da selecção nacional de futebol. Umas pancadinhas no ouvido direito, igual número de pancadinhas no ouvido esquerdo e eis que as vozes se desvanecem…
Há um golo dos nossos e, enquanto outros se questionam quem terá sido o autor, tu já festejas o simples facto da bola ter ultrapassado a linha de golo, estar a caminho do centro do campo e estarmos em vantagem por um golo de diferença! “Está na hora!”, pensas para ti mesmo e, de facto, estava na hora de encomendar a segunda pint e ver os restantes minutos do desafio. O puto que te habituaste a ver crescer domina a bola com o pé esquerdo, passa para o direito e enfia o segundo na rede dos Suíços!!!!! Vibras, contemplas o teu amigo destas andanças (e não só destas andanças!!!!), e constatámos que realmente estamos a ficar velhos para perceber de futebol. Festejamos…ele segura – orgulhosamente – uma meia-pint e tu brindas com a pint que, entretanto, chega.
Não é a mesma sensação que tiveste quando voltaste de Sevilha, ou de Gelsenkirchen, ou de Dublin…mas é um alegre momento que, enquanto expatriado, te faz sentir em casa!
Havia a oportunidade de mudar o alojamento do site de um local para outro que me faz um preço por 3 anos correspondente ao preço de 1 ano do site anterior…não é preciso ser economista para optar imediatamente pela mudança!
Não sei ainda se consegui importar todos os subscritores anteriores, mas espero que sim. Com algum tempo e dedicação acho que vou conseguir desenvolver melhor o site e torná-lo graficamente mais atraente…muito embora só me importe com o que escrevo, reconheço que as aparências podem ajudar na apresentação da escrita!
Nunca deixará de ter o propósito inicial – ser o meu diário de ficção – para um dia mais tarde me poder rir com as palermices que vou inventando ou vivendo…confesso que até eu fico confundido com escritos de outrora e não sei se foram ficção ou realidade! Ou talvez não sejam os escritos passados, mas as vivências passadas, mas…quem está a olhar para trás?
Dias de cansaço, dias de glória, dias de esforço, dias de ócio…tudo junto numa compilação de histórias que, um dia, constituirão o livro da minha vida. Com muita coisa escondida, outra sub-repticiamente implícita, mas, acima de tudo, com a vontade de ter uma pena, tinta e papel até que o último bafo me leve! Na falta desses três eu vou teclando no teclado e guardando as conversas online!
Que nunca vos falte a paciência para ler…aqui ou em qualquer outro lado.
Vais andando em direcção ao bacalhau mas a ementa só referia arroz de pato.
Cruzas-te com uma mãe e os seus filhos e, perante a avó que assiste, uma das crianças pergunta à mãe o que é a tentação (a mãe havia dito às crianças para segurarem bem o Labrador, quando passaram perto da água, por causa da tentação). A avó sorri perante a pergunta mas a mãe – fruto da sua experiência – responde dizendo que é resistir a algo que se quer muito…sorri, a avó e a mãe também, e as crianças ficaram a pensar naquilo! Devia ter parado para ver e ouvir como acabou!!!
Sentado a comer o arroz de pato, a observar as folhas que caíram na água e são levadas pela corrente numa forma que se assemelha muito a pintainhos a serem carregados para jusante.
Já me servem o café como eu aprecio e sou saudado por um grupo que se desloca em kayaks. Ainda a reflectir no melhor local para ver o derby – está encoberto mas a temperatura ronda uns agradáveis 17 Celsius.
Entras no autocarro e dás de caras com um italiano que chegou a Cork, vindo de Atenas, no mesmo dia em que tu chegaste. Todas as suas expressões são de satisfação imensa e recordas que ele esteve de férias e, muito provavelmente, este é o primeiro dia de trabalho dele. E assim é, faz-te um resumo da árdua mas recompensadora tarefa que é visitar tudo e todos e o quanto isso nos dá em termos de satisfação.
Os italianos são bastante semelhantes a nós, em termos de valores familiares, e revejo o mesmo sentimento nele conforme o meu, aquando da chegada das últimas férias.
Dizia ele: só me faltou visitar uma pessoa que, já muito tarde soube, precisava da minha visita! Também eu, respondi…mas tento agora retomar o diálogo de outrora – algures numa esplanada em Espinho, quando falamos muito e tivemos a certeza de sermos amigos.
A vida é um ballet e nós temos que criar a nossa melhor coreografia!
Por vezes escreves como se quisesses que o mundo te ouvisse, outras vezes escreves como se de um sussurro se tratasse – e não queres que ninguém leia…
Por vezes apetece-te largar tudo e mudar o mundo, outras vezes deitas-te no sofá até que te passe…
Gritas bem alto os pensamentos que te ocorrem, somente para te sentires incomodado pelo ruído que tu próprio causaste. Tapas as orelhas e questionas-te se já terá passado…
Estás entre a acção e a inacção, perdido entre sonhos e objectivos concretizados, dividido entre o que está por fazer e o que orgulhosamente já atingiste e perguntas-te, em mais um dos teus monólogos, se realmente serás altruísta ou egoísta…
Viagem longa para quem está só a duas horas de Portugal – duas horas e vinte de avião e três horas e meia de autocarro…
É bom voltar a ver algumas caras, locais, coisas…e estar de volta ao cabeleireiro para tirar este peso extra de cima de mim. Se já tinha a mania do cabelo curto agora tenho a mania do pente 4 – uma espécie de vingança por um dia me terem obrigado a cortar por essa medida e, logo depois, chegou um telegrama a dizer que já não necessário.
Saíram pessoas da equipa portuguesa e o volume de trabalho decresceu substancialmente. Os dias de trabalho são passados na leitura de Saramago e Arturo Pérez-Reverte e na conversa com o resto da equipa.
Nunca parando de pesquisar o mundo, na procura de algo melhor e num país tão agradável quanto a Grécia, nunca esmorecendo a dedicação presente, nunca fugindo ao conhecimento de novos locais, pessoas, diferentes maneiras de ser e de agir.
Sempre de sorriso aberto, agora com mais um dente – temporário – que, no próximo ano, dará lugar à obra completa! Um grande abraço a duas dentistas que trataram exemplarmente desta empreitada.
Agora posso afirmar: já nada me espanta neste mundo!
Há muito que aprendeste a ultrapassar as agruras da vida e, apesar delas, este foi realmente o melhor período de férias que alguma vez tive na vida adulta. Chegado a 1 de Setembro, depois de apanhar o metro e o comboio, subi a rua e encontrei o jovem de 12 anos e 364 dias a correr para os meus braços. Ele já havia ido 2 vezes à estação para ver se eu chegava…sem sucesso! Cheguei no terceiro comboio e o Samsung continuava sem conseguir registar-se numa rede portuguesa…incontactável!
Foi um abraço como só os pais que amam os filhos sabem dar e receber. Foi um agradecimento de um Pai a um filho por todo o esforço que ele tem colocado naquilo que é o emprego dele – os estudos – bem como na forma como tem evoluído socialmente, desportivamente e a maneira como define os seus objectivos futuros. Obviamente o jantar foi escolha dele e as pizzas do Tomate foram a escolha…culpa da menina Paula que lhe mostrou o sabor das ditas e imediatamente o colocou a fazer a sua própria pizza – não estive contigo desta vez, mas nunca és esquecida.
Adaptar-me a Espinho é algo que faço com um gosto que me sai naturalmente! Talvez não seja o que esperam de mim, mas o que eu quero…a t-shirt, as havaianas e o calção de banho são a indumentária mais utilizada! Furando por entre os “rurales” ainda conseguimos um dia de bastantes mergulhos e, com grande alegria, constato que já não fico gelado após o primeiro mergulho – está perdida a adaptação às águas Gregas e recuperada a adaptação às águas espinhenses.
Ri-me, como sempre o fiz, com o Luís Pires e chegamos à conclusão que já só faltam aproximadamente 28 meses até os Pais voltarem a dormir como outrora o fizeram. Debatemos os velhos métodos para adormecer crianças – o aspirador, o exaustor da cozinha, etc…apenas para chegar à conclusão que o rebento dele e da Henrieta consegue triunfar e não cede a métodos velhos de adormecimento.
Coloquei a conversa em dia com a Carla Lacerda e com o Ricardo Tavares e, retomando onde havíamos ficado da última vez, progredimos no conhecimento daquilo e daqueles que nos rodeiam. Muito recompensador e libertador. Bem hajam.
Passei tempos deliciosos com os meus primos, mãe, irmão, madrinha e padrinho “adoptado” e não consigo encontrar palavras suficientes para lhes agradecer. Terá que ser por acções. O Pedro a.k.a. “Careca” foi, como sempre, o impecável animador daquelas noites espinhenses que todos julgam que não vão dar em nada e.…dão sempre! Sempre com o acompanhamento do Roger Waters e alguns discos pedidos – alguns mesmo pirosos – de outrora. Vi a factura detalhada ser introduzida no Bombar e chorei à gargalhada com o detalhe a que se pode chegar!
Gosto muito da minha cidade e de um certo número de pessoas que a habitam. Muitos ainda procuram a sua vocação, mas, acima de tudo, são pessoas que sabem dar tudo em prol dessa palavra que é a amizade. São o que nos faz voltar e ter saudades. Bem hajam.
Sair no aeroporto de Dublin e encontrar o Quim Tó à espera da Mãe dele demonstrou-me que os espinhenses estão em todo o lado, mas os bons…merecem sempre um abraço!
Nunca digo adeus e, quem me conhece, sabe que me despeço com um “Até já”. É mais demonstrativo do desejo de voltar e de estar com aqueles que nos dizem tudo e eu não consegui estar com todos. Com os meus erros e uma ou outra virtude sempre estarei cá para vós. Se me esqueci de mencionar alguém foi por puro descuido meu, perdoem-me!
Disse-me um amigo, muito recentemente, que eu sou uma pessoa que sabe – com a minha maneira própria – trabalhar para a minha própria paz. Tratando-se de alguém que me tem acompanhado de perto – fruto da amizade que nos une e que já nos fez percorrer caminhos agrestes, soalheiros e, acima de tudo, rendeu uma tremenda dose de experiência – tomei a frase como um elogio.
Ele ainda tentou desconcertar-me e, tipo ratoeira e num interrogatório (existem interrogatórios entre amigos ou, quando confiamos e contamos tudo são apenas conversas?) muito bem planeado, abordar temas de outrora e, pacificamente (!) arrancou-me uns sorrisos e, bem-dispostos, brindamos com um fino.
Conseguiu, esse amigo, afirmar que eu sempre soube imiscuir-me nos mais diversos meios e, ao mesmo tempo, manter salvaguardados os valores que mais me são queridos. Achei bastante bonita a forma como ele colocou a questão e acabamos a conversa comparando tais tempos a alguém que tem que usar o salto alto da Joana Vasconcelos e, ainda por cima, com uma pedra que, entretanto, se alojou entre o pé e o azeiteiro salto alto. A dor provocada pela pedra aliada ao fraco gosto de ter que usar aquele salto alto específico.
Agora que estou a poucos dias da partida, e salvo algum imprevisto de maior, vou levar no coração estas férias como das melhores que tive até hoje. Uma proximidade com as amizades que me dizem tudo, a habitual visita a todos os restantes familiares, o FCP a ser goleado no Dragão e ainda os inesquecíveis mergulhos com o meu rebento na Baía dos Porcos!
Vou partir de coração cheio e desejoso de repetir muitas mais vezes este mesmo cenário. Não sei se fui eu que mudei (também), não sei se tudo mudou ou se, muito provavelmente, tudo se manteve, mas uma certeza eu tenho: é bom ter poucos amigos com uma riqueza tão grande como os que tenho!
Não haverá Natal em “casa”, mas muito provavelmente teremos uma Páscoa muito especial – sobretudo para o mais novo membro da família. Por enquanto são desejos, mas assim que se tornem realidade, ouvir-me-ão sorrir porque quererei acordar todos e exclamar a plenos pulmões: voltei!!!!!!
Fazes a direita apertada, entras no tabuleiro da obra construída pelo saudoso Eng. Egar Cardoso, vertes uma lágrima quando vês o estádio ao longe. Tentas recompor-te mas a “fome de bola” é superior e, quando chegas ao final da ponte, já há lágrimas derramadas por toda a face…
Não é fanatismo, é um amor por algo não palpável. Vais buscar o jovem de 13 anos e 11 dias e, juntos, caminham até ao centro de estágio.
Encontras a tua prima que, por sua vez, não encontra a chave de casa. Surge o teu primo. Pelo canto do olho continuas a deliciar-te com o resumo do CSKA.
Encomendas uma francesinha e um prego no prato e sorris quando os pratos chegam.
Muitas vezes nos questionamos quem são os nossos amigos. Interrogamo-nos, num diálogo mudo, sobre o porquê da amizade que existe entre nós e outrem e, na maioria das vezes, damos por nós a sorrir de momentos muito bem passados e relembramos então o porquê de os apelidarmos de amigos.
Hoje tive a alegria de estar com um amigo de há muitos anos. A vida separou-nos algures por volta dos nossos 22 anos – quando eu tomei uma direcção e esse amigo optou por seguir outra via! Ele estava correcto e eu errado, mas nunca deixei de o apelidar de amigo, apesar da frieza com que fui então tratado.
Ele sempre se pautou por ser uma pessoa de uma serenidade acima da média e, recordo agora, tivemos muitas conversas sobre a decisão de outrora. Talvez fosse a minha maneira de enfrentar os tempos de então, mas, na altura, a decisão errada parecia-me a mais correcta. Ainda hoje ele me recordou – sem precisar de palavras – o quão errado eu estava e, quando o fez, eu sorri como que admitindo toda a minha culpa e desculpando-me por ter escolhido a via incorrecta.
Voltamos, por breves horas, a ter 15 anos. Estávamos os mesmos 3 de outrora e sorríamos como se os anos não tivessem passado…como os putos de outrora. Há muitas recompensas na vida – algumas pelas quais trabalhamos e outras que simplesmente nos são dadas – e esta, sem qualquer margem para dúvida, foi um retroceder até aos tempos da nossa virgindade e sabermos que, apesar de termos tomado direcções opostas num anterior momento da vida, agora nos encontramos no mesmo caminho.
É bom sorrir com um amigo. Muito bom! Agora imaginem com 2….
O blog recebe aquela visita de França que teima em não voltar a Cork – será que algo ainda há para dizer? Para fazer? Para concretizar? Os dias de confraternização familiar continuam e os repastos alongam-se em tempo e amena cavaqueira.
Reservas um dia específico para os copos, outro para o almoço com os primos, ainda um para a praia – que grande tareia a que levaste do Atlântico…fazes o teu caminho habitual, respiras fundo, vês pessoas que não sabias ter saudades de ver – dos teus tempos de pretenso jogador de voleibol, sorris com as histórias, dissecas as vivências e rimos em conjunto do quanto caminhamos até termos chegado aqui.
Espinho é uma cidade em que podes fazer tudo a pé e só um parolo é que usa carro (salvo pessoas com necessidades especiais). É uma cidade em que a praia dista, no máximo, uns 10 minutos a pé – para o residente mais afastado. Analisas cada novidade, fazes o teu juízo de valor que interiorizas sem revelar e continuas, de cabeça sempre voltada à procura de novos detalhes – desde a última visita.
Andas trôpego com as palavras reveladas pelos professores do teu filho – em que todos o querem ter na equipa mesmo se houver necessidade de lutar por ele – todos gostam da sua atitude, da sua sabedoria e da sua inteligência. Ressalta nas palavras deles o seu sarcasmo – do qual sou Pai – e a sua inteligência na maneira como aborda as problemáticas de vários ângulos e com várias possibilidades.
Estás contente por estares na tua terra, puto. É só isso que interessa! Diverte-te.
Com toda a calma do mundo vais repondo o teu sono. Dás um beijo de agradecimento às persianas antes de adormeceres e agradeces o sono concedido ao acordar.
Tomas o teu café a 50 metros de casa e até arriscas dizer umas verdades à tua paixão do ciclo. Devia haver um tratamento para traquinas como eu…para podermos rejeitar o tratamento e, com um sorriso de verdade, sabermos abraçar aquelas pessoas que nos chamam amigo.
Estás com o teu filho, tens passeado e nadado bastante. As conversas têm sido longas e muito recompensadoras – estás a ouvir as idéias dele para o futuro – o que significa que ele está atento ao mundo e às suas necessidades.
Hoje chega a maninha e estás desejoso de lhe contar aquela traquinice que fizeste – como enganaste alguém com a verdade e escapaste…ela vai sorrir, dizer “Oh IKA…” e vamos ambos sorrir dessa paixão que nunca se concretizou ou deixou de o ser.
É assim que tu és…traquinas mas ficas sem jeito perante uma só pessoa. Desde tenra idade…
Não é que estejas constantemente a verificar quanto tempo falta mas, na verdade, estás.
Não é que estejas constantemente a pensar naquele abraço á chegada mas, sendo realista, estás.
Não é que sonhes com a gastronomia do teu país mas, com franqueza, sonhas.
Divagas sobre aquele homicídio que a lei permite – o matar saudades – e sabes que, nesse capítulo, és como um soldado no campo de batalha! Saltitando de abraço em abraço até ao abraço final.
Recapitular abraços é tão reconfortante e enriquecedor quanto ver o Casablanca pela enésima vez – sabes como termina, já tinhas outros planos mas abdicas de tudo, com o teu sorriso traquinas, e vês a obra-prima mais uma vez.
Contas horas, minutos, segundos! Tens um tic-tac mental que, não sendo explosivo, é emocionante. Queres bater as asas e voar mas ainda tens 3 horas de autocarro até Dublin.
Anseias por sol e dizem-te que chove, anseias por praia e ouves dizer que o verão acabou…anseias por uma Super-Bock fresquinha e sabes que essa nunca te falhará.
Sonhas com tremoços, amendoins e o pôr-do-sol na tua praia. Imaginas uns banhos de mangueira para remover o sal.
Vagas que te permitam mergulhar, a água estupidamente gelada, o ouvido sempre a ameaçar uma otite. Os membros paralisados com a temperatura e outros mirrados sob a sua influência.
Aquela sexta-feira muito dificilmente sairá da tua lembrança – a piada da espontaneidade, o vinho, a cerveja mas – acima de tudo – a empatia.
Conseguires debater tudo o que querias, com quem querias e, sem que estivesses preparado, da maneira que querias.
Há experiências realmente valiosas nesta vida e essa noite será sempre um post-it de sobre como podemos ter tanto com tão pouco.
Há beijos que nos tiram a seriedade e outros que nos despertam sorrisos tão longos que deviam ser emoldurados. Numa moldura que nos relembrasse sempre quão bom foi pintar a tela.
Quando comemoras 5 meses e 2 dias num país que não é o teu tens tendência para já ter armazenado as diferenças mais significativas entre os dois povos – o teu e o do país em que te encontras. Sem laivos de superioridade, ou inferioridade, sem pretensões sequer de fazer a comparação. Simples constatações!
É óbvio que, sempre que tomas o teu café da manhã, há sempre alguém por perto a beber uma pint. Óbvio porque os turnos de trabalho também implicam trabalho nocturno e, obviamente, esses profissionais fazem-no no final do expediente. Sim…é óbvio que nem todos se encaixam no perfil, mas não vamos ser picuinhas!
Viver na Irlanda deve assemelhar-se muito a viver nos Açores. Há muita chuva, a humidade é sempre elevada, mas as paisagens compensam todo o incómodo do “inverno constante”. Há algo de muito castiço neste povo que é o fazerem exactamente o mesmo que os países quentes fazem no Verão…vestirem roupas de Verão. Olho para as montras e largo mais um espirro, sorrindo quando vejo a decoração de uma qualquer praia com imenso sol. Eis que passa mais um local, vestido com os seus calções e a sua t-shirt e eu, refugiado no meu casaco apertado, pergunto se haverá um calor que eu desconheça – no exterior do meu casaco. Não há!
A verdade é que basta afastarmo-nos alguns quilómetros de uma grande cidade e imediatamente percebemos o porquê da Irlanda. Campos de um verde puro, que só a natureza pode dar, como se fossem roupas deixadas na chuva para realçar as cores. As vacas têm um ar mais robusto e, após horas a pastarem, simplesmente deitam-se no campo e dormem. Os milhões de estrelas que conseguimos observar, assim que a noite toma conta do céu, são dignas de registo. Um registo que faço mentalmente, num constante alimentar da vontade de conhecer a natureza, cada vez mais e cada vez melhor.
A cerveja é boa, as paisagens são divinais, as praias são do mais bonito que tenho conhecido, o povo é amistoso e muito acolhedor. Porque esperam? Venham daí enquanto é Verão! 😉
Após a limpeza da casa dirijo-me para o meu canto pacífico onde, ironicamente, há um casamento. Lentamente comendo o meu bife com cebola grelhada, a calma é interrompida pelos convidados que resolvem vir fumar para a esplanada.
Os empregados olham os noivos que chegam num clássico. Carro bonito e noivos de cara feliz, abraçando aqueles que os saúdam logo á entrada.
O gerente dá um ar da sua graça quando exclama, dirigindo-se às funcionárias, um sarcástico “até parece que nunca viram um casamento” mas o olhar das funcionárias está naquele momento, no que sentem as pessoas, na felicidade que paira no ar.
Uma lufada de ar fresco numa rotina de trabalho? Talvez. Um momento a observar? Sempre. A constatação da felicidade alheia é sempre um bom contributo para a nossa própria felicidade – um alhear daqueles sentimentos que são considerados pecados e uma empatia com os valores mais nobres da vida em sociedade.
Mais uma pint, um sorriso quando a convidada dá um nó de laço no vestido de maneira completamente oposta á que utilizarias. Uma constatação de que tudo na vida pode ser feito ao contrário da maneira como fazes e o resultado ser perfeito.
Os teus três dentes novos estão quase prontos, o autocarro chega pontualmente, ainda não tomaste o pequeno-almoço, tens aquele sorriso na cara…
O que se passa contigo miúdo? Questionas-te. Acho que nada de anormal…respondes a ti mesmo. Então porquê o sorriso traquinas? Deve ser o subconsciente a preparar alguma… é a única explicação que tens!
Depois de um dia de grande esforço, assustas a espanhola – quando te sentas ao lado dela no autocarro. Sorriem com a impertinência do vosso humilde narrador e, após uma breve troca de palavras, troco de lugar. Para vos escrever, é a minha justificação quando, na verdade, é para evitar que os restantes dentes sejam acusados de assédio! A ponderar seriamente se não seria melhor usar uma placa dentária que me protegesse destas situações….
Quando chegas ao centro da cidade parece que chegaste a uma cidade abandonada – o trânsito é escasso, há uma pessoa que caminha á tua frente e que, de 20 em 20 metros olha para trás com receio de ser violada (?!). O teu raciocínio pré-café apenas te diz que – caso dependesse de vocês os dois – a raça humana extinguir-se-ia! Sorris, porque sabes o disparate que acabas de pensar, e o teu pensamento volta a estar focado no café…
O Néctar está fechado, o café italiano também. Continuas pela Oliver Plunkett e, finalmente, encontras o O’Brien’s aberto! Um suspiro de alívio, uma saudação do interior… ainda te conhecem! Apostas num cappuccino e num cheesecake com muito bom aspecto e esperas na esplanada.
Tens uma vista lateral da Oliver Plunkett, de frente para a farmácia e os primeiros madrugadores começam a circular. O facto de veres outros seres vivos e o café dão-te uma primeira lufada de vigor. Sorris ao ouvir a música que toca e és atirado para o passado – mesma música mas nos antípodas da Irlanda – e constatas que a tua sorte sempre foi o facto de nunca teres parado de sorrir – na saúde e na doença, na alegria e na tristeza, na paz e na guerra.
Sonhas com os teus dentes novos…e sabes que vais poder voltar ao teu sorriso bem aberto.
Trabalhas nos feriados locais e tens 29 dias úteis de férias. De que te queixas?
Quando tens aquela possibilidade de, durante o teu horário de trabalho, simplesmente parar. Aproveitar o sol, deitado na almofada gigante, vendo os corvos a passar – certamente a caminho de mais uma travessura – a responsável pela horta a mostrar-te as últimas colheitas, os carros que passam ao longe… muito saboroso!
Hoje é dia de despedida de alguém que tem um significado especial para ti. Durante dois meses vão estar afastados e, muito provavelmente, o reencontro será em Outubro. Aguardas serenamente e gozas este teu novo estado de espírito…a serenidade é o melhor dos confortos.
Toca o despertador e, perante o chilrear dos pássaros, percorres o caminho de volta ao teu posto de trabalho. Dias cansativos mas largamente recompensadores.