Talvez por ser dia de feira semanal.

Depois de um domingo de doze horas de trabalho – a passear, a fotografar, a comer bem e a passar por caminhos municipais que nunca sonhei que um dia pudesse encontrar, eis que a cidade recebe a feira semanal. Talvez por querer continuar a trabalhar, no seguimento de um domingo de descanso intenso, fujo para os territórios de onde provém a maior parte dos clientes da feira e consigo encontrar a tão necessária qualidade de paz que a cidade não providencia. 

Ironicamente, ou talvez confirmando a decisão tomada, sou o único passageiro que sai do comboio e, após confirmar isso mesmo, dou início ao meu passeio de descanso produtivo, como resolvi apelidá-lo. O objectivo é não ter objectivo e simplesmente deambular pelo destino enquanto, com uma espécie de costela de turista, vou procurando motivos novos para fotografar. A beleza do processo é que me permite conhecer um destino novo enquanto descanso activamente. Fica a sugestão para quem quiser experimentar.

A aplicação vai indicando os quilómetros percorridos e os olhos e corpo vão aferindo o quanto querem continuar ou parar. É um processo democrático, em que racional e emocional definem juntos qual a ementa de cada um dos passeios, sem que dois percursos se repitam. Respira-se fundo, há enganos propositados, sorrisos perante algo novo que se encontra, desabafos perante algo menos cuidado com potencial para estar bem melhor. O processo é interno e não carece de validação externa, é um jogo de gozo puro – apenas e só!

É só quando o pôr-do-sol se aproxima que tudo pára: câmara no tripé, acerto o ISO, shutter e a abertura e aguardo o momento ideal para disparar uma série interminável de fotografias de maneira a poder escolher a perfeita, tal como o dia, que começa com o nascer do sol e acaba com ele a pôr-se. Uma delícia que não engorda!

Dos passeios que dou – 27/5/2024

Deslumbrado com a natureza.

A realidade como consequência da expectativa.

Há que rentabilizar uma tarde em que sabes que a cidade vai estar cheia. O planeamento é muito importante e os dados recolhidos são fundamentais para o cálculo quântico (lol) do destino a escolher: qual a proveniência dos que enchem a cidade? Quais as horas a que chegam e partem da cidade? Que tipo de transporte usam? Se viajam por etapas, como evitar os pontos de trânsito, entre etapas? Onde é que há uma boa esplanada, com sombra, onde possa ver o MotoGP em paz e sossego?

Após a introdução dos dados, no mega computador que é a tua imaginação, decides não optar por Alfarelos e rumas a Ovar. Não é o pão de ló que te conduz – muito embora a sedução por ele exista. Um simples apalpão nos seios é suficiente para te afastar da doçaria. A pergunta “porque tens uns seios pronunciados?” é suficiente para te afastar de guloseimas eróticas e conduzir o pensamento para o lanche: “um cachorro especial é apenas o colmatar de uma saudade de quem não usufrui dele há bastante tempo…”

Um par de estalos emocional – faz-se mentalmente, sem necessidade de uma auto-agressão na via pública – é suficiente para te focares no objectivo: a esplanada, a sombra, o GP de Portugal de MotoGP! A memória, essa traiçoeira, passa-te a imagem mental de um jardim que ficava perto da estação…uma revista aos azulejos da estação – que podiam estar melhor cuidados – e começas a trilhar a rua, rumo ao destino que esperas ainda corresponda à imagem mental. 

Ouves pássaros, há um rio, “é aqui perto”, exclamas com alegria. Mais uns metros e enxergas uma esplanada deserta de onde vem o som do hino nacional. Perfeito, diz-te o coração, como se aconchegasse num abraço ao corpo. “Tem multibanco?”, procurando por um terminal que não consta dos objectos presentes no balcão. Indicam-te o Santander (o banco e não a cidade da Cantábria) e partes para a recolha de um montante mínimo que te permita pagar a despesa resultante do tempo passado a ver o Grande Prémio. 

Desces a rampa que subiste e escolhes uma mesa exterior com vista central para o ecrã interior. “Perfeito!”, exclamas. Os pilotos estão a terminar a volta de reconhecimento e a partida segue-se! Corrida louca, como sempre, com alguns erros a baralharem o resultado final (o costume). Segue-se o caminho de volta e, apesar de teres planeado um regresso a pé, resolves mudar o ponto de partida para mais perto de casa. Fazes o percurso nuns 90 minutos e, comandado por um automatismo que não controlas, dás por ti a enfrentar um cachorro especial…

Porque até os domingos são especiais. – 24/3/2024

Rumo ao norte, enfrentando a nortada.