Os mesmos maneirismos.

Ao longo da vida, fruto da experiência ou da causa/efeito, vamos aprendendo que convém experimentar novas abordagens – se o que pretendemos são resultados diferentes – de maneira a alcançarmos o objectivo a que nos propusemos. A minha maior virtude, quando pretendo que resulte, é a humildade (seja reconhecendo o erro ou a envolvência que me levou a errar e partir daí para uma nova tentativa).

Tal como aprendemos a andar, a saber estar calados, a lidar com um casal de ladrões, também vamos constatando que começamos por tropeçar, dissemos algo inconveniente, confiamos em alguém que não merece estar neste mundo – são tudo processos de aprendizagem que nos afastam de errar novamente e excluem cancros da nossa vida quotidiana. Usamos a dor como catalisador preventivo – o alarme soa quando nos deparamos com os sinais que conduziram ao tropeção, ao comentário inconveniente ou ao sociabilizar com gatunos. Evitamos a repetição logo não repetimos a dor!

Pretender que o tempo tudo apaga, aguardar que o erro seja repetido por quem sentiu a dor ou deixar a carteira perante um casal de gatunos, só pode ser um exercício de fé de quem aguarda uma intervenção divina que tudo resolva. É uma espécie de imaturidade social, ou demasiada autoconfiança, que muito raramente dará resultados diferentes dos anteriores. Logo, e atentando a que o tempo é o nosso bem mais precioso, uma mágoa que não pretendemos repetir.

Sentado num alpendre imaginário – até um dia em que o tornarei real e pautarei os meus dias por longas caminhadas no próprio terreno, intervaladas por chuveiros de mangueira e uma dieta dos frutos da quinta – sorrio perante a adversidade do sentir mas caminhar sempre na direção contrária – que evita reencontros, tropeções, palavras inconvenientes ou roubos demasiado familiares. Com uma força Imparável e um rumo tracejado pela razão, a minha razão!

Devaneio de fim de tarde – 14/10/2025

Aos leitores: em breve alterarei todos os textos para uma página no Facebook – de maneira a evitar custos com domínio e alojamento. Nessa altura informarei qual o endereço da página. Obrigado e cumprimentos.

O pássaro pensador.

A ver quem passa.

Abstraído do que me rodeia e completamente livre de pensamentos, decisões ou o que quer que seja que habitualmente faz o cérebro funcionar. Olhos perdidos no horizonte – sem que o enxergue – mas somente para atingir a plenitude do deixar o pensamento vaguear sem que a ação de pensar sequer exista. Olhos que se dividem entre os chapéus do cigano aqui em frente e o vestido amarelo, com tons de cinza, da mulher que se encontra em frente a mim.

Agora que constato que o texto não surgiria a menos que houvesse algum – por muito mínimo que seja – pensamento articulado que permite colocar o que se passa em palavras perceptíveis para os que, não estando presentes, consigam  perceber e visualizar o desenrolar de tudo o que descrevo, entendo que é possível divagar sem pensar ou, talvez melhor descrito, pensar enquanto se divaga com o olhar perdido. Entretanto ela levanta-se e muda de lugar.

Está ligeiramente posicionada à minha direita e o sol brilha sobre ela. O vestido parece reflectir as linhas do corpo e estar perfeitamente ajustado – como que esculpindo a silhueta e revelando a nudez que esconde. Os cabelos são compridos e os chinelos condizem com o amarelo do vestido – talvez, melhor ainda, conseguem fazer perceber que há uma intenção de fazer o conjunto rimar – numa imagem poética que, sempre que tento captar mais detalhes, sou flagrantemente apanhado a delinear o que pretendo descrever.

Tem uma cara séria, não sorridente e de poucos amigos. Como que habituada a ser observada mas jamais contente por se sentir observada. Trocamos olhares mas a expressão não se dilui da dureza que ela impõe. Os minutos passam e a hora de partir está agora mais perto. Impõe-se a pergunta: tentas que sorria ou deixas a vida continuar sem que saibas a resposta a uma pergunta que não colocaste? 

Incógnitas da vida – 22/6/2025

Profissional da pesca.

Message in a bottle.

Era dia de Portugal e, desde que me lembro, sempre celebrei o dia 10 de Junho. Não porque fosse a celebração do dia do nosso país mas porque a melhor amiga do mundo celebrava o aniversário nesse dia.

Era uma comemoração muito intimista, com poucos mas bons amigos, o celebrar de mais um ano de amizade e a recordação alegre dos bons momentos e o recordar de quanto os maus momentos nos haviam ensinado.

Bebíamos sobretudo sumos e afins – porque a vingança alcoólica era nocturna e ficava escondida pela escuridão do sol posto. Conversávamos sobre as aventuras de cada um, com um sorriso pela superação das adversidades.

O champanhe era o mote para um brinde, simples de gesto mas como se um abraço nos envolvesse a todos e gritássemos os parabéns, a uma só voz. A aniversariante enchia-nos o coração com o seu sorriso – pleno de honestidade, satisfação e alegria.

O restaurante era o mote para estreitarmos o diálogo, as bebidas o catalisador para uma conversa mais fluida e descomplexada, as entradas como o verdadeiro aperitivo para um momento a sós, com ela e para ela. A despesa era solenemente dividida por todos menos a festejada.

Atravessávamos a rua para um pub conhecido, que o tempo remodelou em clínica do coração, e espalhávamos a nossa magia e bem estar por inúmeras das pequenas mesas para quatro pessoas. O café era pedido a um senhor com nome de flor e a fronteira aberta para uma dimensão mais alcoolizada das celebrações.

Éramos chamados ao telefone, porque a hora do recolher já havia sido ultrapassada, e caminhávamos até à casa da matriarca da aniversariante a solicitar uma extensão temporal que o telefonema já havia negado. Descíamos novamente a rua, todos juntos, felizes por termos mais umas horas de celebração.

Éramos felizes – 12/6/2025

O egoísmo da liberdade.

Numa qualquer caminhada, sem destino traçado ou cadência planeada. Num qualquer passadiço, de olhar perdido a vaguear por entre a natureza que o rodeia. Num qualquer snackbar, paragem obrigatória de um quotidiano castiço e rapioqueiro.

Uma voz que nos chama de caminheiro e nos acena para aproximar, uma mente que lentamente se desliga da abstração total e tenta perceber quem nos interpela. Um neurónio mais rápido que nos cochicha mentalmente a resposta e um gesto, que se finge inapto, que saúda o interpelador.

Uma cara sorridente responde ao reconhecer as duas caras amigas e um diálogo de recordações que nos faz recuar umas décadas, até um colégio de uma branda saudade. Um discorrer sobre quem éramos e quem somos e uma saudável saudade de simplesmente falarmos.

A constatação da provecta idade e das próteses que agora ambicionamos ter, fruto de todos os excessos que até aqui tivemos. O sorriso como forma de demonstrar que, enquanto falamos do agora e relembramos o outrora, há uma profunda saudade de todos os caminhos que percorremos juntos.

No outro dia miúdos e agora graúdos que unanimemente concordam em recordar o quanto o passado trouxe para este presente e quão recompensador é poder relembrar cada pequeno pedacinho de história que fez de nós quem somos.

Numa qualquer esplanada – 14/5/2025

As más escolhas.

Havia um número quase igual de sombras e, mercê de um qualquer impulso cuja origem desconheço, escolhi uma sombra onde poderia colocar as pernas no sol – que constituía a fronteira natural entre o fim da sombra do guarda-sol e o início do sol de primavera que já ameaçava chamar-se de verão.

Diante de mim está uma jovem dos seus trinta anos ou algo semelhante. A roupa que veste é simples e aparenta ser uma escolha de recurso para quem saiu rapidamente de casa, sem tempo para poder pensar numa indumentária mais cuidada. Claramente a totalidade da conversa pertencia-lhe e não parecia disposta a ouvir conselhos.

Ao lado esquerdo dela está sentado o que parece ser a cara-metade, de indumentária mais cuidada mas, mesmo assim, de cuecas azuis a imitar um fio dental feminino. “Ela quis foi apalpar os tomates!”, diz a mulher e eu, homem que se preza por ser vegetariano em certas situações, levantei a cabeça para ver de onde vinha a frase.

A coluna aos berros, colocada sobre a minha mesa, explicava agora o porquê de não haver ninguém a usufruir da sombra tão estrategicamente colocada – claramente há gente com um poder de análise mais rápido que evita estes inconvenientes sonoros do dia-a-dia. Olhei para a coluna e fingi que o meu interesse vinha dali e não da conversa sobre leguminosas que emanava da mesa em frente.

O dia até já havia começado com piada, com um diagnóstico de hipersensibilidade acústica que, fiando-me eu nas palavras do médico que fez o diagnóstico, me levou a uma primeira gafe no dia…uma mulher que elegantemente caminhava na minha direção e eu, com as fichas todas apostadas na hipersensibilidade acústica, a dizer “que beldade que desfila perante mim!” (no que julgava ser um sussurro) e ela a agradecer o piropo que não era suposto sê-lo!

A quebrar rotinas desde 1970 – 14/4/2025

O abstracto.

Acreditando no formigueiro de uma ligação divinal que a ciência nega, escravizando o pensamento de modo a fugir a sonhos mundanos, totalmente apostado no conhecimento profundo e inequívoco do seu eu interior, ciente do quão agradável a jornada tem sido, antecipando a caminhada seguinte em que a chuva o acompanhará.

Sorrindo perante o pensamento que discorre na sua cabeça enquanto escreve, sorrindo perante o ter optado pela palavra cabeça e não pela palavra mente (que, numa achega simplista, poderia ser confundida com o verbo mentir), visualizando paisagens futuras com base na recordação de imagens passadas, emitindo um sorriso com gargalhada que revela satisfação.

Massajando os pés exaustos da quilometragem de hoje, sonhando com o novo percurso de amanhã. Vestindo-se mentalmente para um tempo de chuva, enquanto exibe um sorriso ternurento típico de meteorologia enxuta. Discorrendo sobre cenários a fotografar e os melhores ângulos para o fazer, recordando a ordem fundamental que dita que a visualização e interiorização vale mais do que mil palavras (e imagens também).

Apostado em colecionar sorrisos numa caderneta infinita, gargalhadas sonoras como factor distintivo. Sem necessidade de colar a beleza do que vai contemplando e com a memória a servir de elemento aglutinador. Ao fundo uma buzina de automóvel e os gritos das crianças da escola primária que, acima de qualquer adulto, possuem o dom de sonhar mais e melhor!

Saiu-me isto… – 1/4/2025

Era de manhã cedo…😂

Avisados destemidos.

Por todo o lado apareciam avisos: escritos, radiofónicos, de amigos, de pessoas conhecidas, de desconhecidos. Por gestos, com olhares, reagindo ou apenas agindo antes do acontecimento, por medo ou solidariedade na hora de defrontar a natureza. Tudo se resumia a um acontecimento que, por antecipação, era visto como algo a temer.

Algures no globo a que chamamos Terra, vestidos como se estivessem de partida para os polos, religiosamente reunidos ao soar das 6:30 da madrugada, eis que começam a subir a 33, rumo ao norte do país, onde a previsão meteorológica aponta para um frio de rachar, mas sem chuva. Esfregam as mãos de contentamento e, como habitualmente, verificam se as aplicações que vão usar para lá chegar estão a funcionar correctamente.

Material fotográfico e reservas de roupa devidamente encaixadas no banco traseiro, temperatura interior definida e introduzida na consola central, baterias suplementares verificadas e colocadas por perto, ao alcance de uma mão. Um último olhar como confirmação de que podemos arrancar para o Portugal profundo e o okay de ambos para continuar rumo ao destino pelo qual optaram.

Almoço reservado para as 12:00 – a habitual entrada de alheira e presunto, seguido do primeiro prato que é uma feijoada divinal e, por último, um maravilhoso cozido a encher eventuais espaços livres que, de facto, não existem, excepto para o pudim de sobremesa. O reunir coragem para um passeio a digerir o repasto, o descer até um convento abandonado e isolado de tudo, o largar de provisões em excesso e que já não fazem o regresso, o sentir a água corrente local como uma benção numa meteorologia de merda.

O novo eu que se ergue, tão lavadinho quanto o da madrugada de início de viagem, passo firme com as botas – que claramente estão aprovadas para este tipo de eventos, subindo o caminho de volta para o carro, rumo ao destino seguinte e ciente de que, algures na natureza, esconde-se uma fotografia perfeita que um dia captarás!

Vadiagem pelo país – 25/3/2025

Achamos neve!

Meteorologia de daltónicos.

A persiana é aberta e um cinzento claro saúda-me; a toalha de banho enxuta o corpo e, por entre a cortina fechada, vejo uma nesga de sol que me faz sorrir e mentalmente começar a esboçar um trilho para percorrer hoje. 

Corpinho seco de toda a água que o lavou, mala fotográfica pronta, boné e água a completar as necessidades básicas do passeio mentalmente esboçado. Comboio como meio de transporte e a opção por sair numa cidade diferente da que havias pensado.

Olhos bem abertos assim que ouves o canto de um pássaro que, apesar de já ser familiar, nunca visualizaste e a procura com o pescoço bem esticado. O percorrer de todo o cenário que te rodeia e o nada achar, apesar da lente utilizada com o zoom a auxiliar. Um sorriso pela derrota sentida por ver fugir um pássaro mais veloz do que a tua destreza fotográfica.

Galochas enlameadas, fato impermeável cheio de terra molhada, umas cegonhas e um flamingo capturados fotograficamente, corpo cansado da caminhada e coração cheio pela satisfação do dia. Revês as fotografias tiradas num qualquer tasco que surge e cujo nome é sempre de uma simplicidade enorme. 

Protestas, mentalmente, pelo facto de não teres usado ângulos diferentes, aqui e ali, quando o que realmente pretendes é incentivar-te a conseguires superar-te, em cada saída que tens! Usas diferentes tonalidades de cores, na revisão mental que fazes da edição que se vai seguir, como se fossem já uma fotografia impressa e pronta a emoldurar, para mais tarde recordar.

Enches os pulmões de ar, sorris com a conquista do teres deixado de fumar, sentes algo diferente no teu corpo – como se um novo início tivesse lugar, tal o grau de plenitude de satisfação. Dás uma sonora gargalhada porque imaginaste este texto e o alarme toca para que te ponhas a caminho da estação para o comboio de regresso.

Recordações intemporalmente retemperadoras – 17/3/2025

Chuvinha.

É por entre as gotas que a lembrança se dá – as “abertas” em que não há água corrente e o céu permanece ameaçador mais não são do que pausas que permitem um inspirar fundo e relembrar todo o jogo de força que percorreste e te trouxe até aqui. As gotas grossas, que fustigam as janelas de vidro, como se pretendessem chicotear-te por teres ousado. Como ousas? Pareces escutar.

Os valores, sempre eles, como expoente máximo daquilo que ambicionas ser, os erros vistos como tropelias necessárias para uma aprendizagem completa. A chuva parece acelerar o ritmo, quando recordas as circunstâncias negativas, mas a tua experiência e destreza mental colocam-te num clima equatorial e extrais da recordação o quanto ela contribuiu para a realidade do agora.

O livro que jaz aberto a teu lado, sedento por um par de olhos que descortine nas palavras o sentido que o autor lhes quis dar, o céu cinzento que, apesar da hora, parece estar ao serviço da EDP no querer que ligues a luz para uma melhor compreensão dos parágrafos. A água que jorra do telhado para o jardim e se ouve a descer com ímpeto a canalização existente para o efeito.

Como se toda a natureza existisse numa simbiose tão perfeita e profunda que o teu único objectivo no universo fosse a procura da tua função nessa engrenagem tão perfeita. Vendo ladrões como seres menores e a amizade como o vínculo que mais progresso dá. Como se uma fotografia perfeita aguardasse a captura, através da tua objectiva da vida, que apelidas de memória. Sorris perante a procura constante que é, em si mesma, a mais profunda riqueza da vida: o conhecimento.

Um aguaceiro de ideias transpostas para um agregado de palavras – 10/3/2025

No cimo da serra.

Saudações diferenciadas.

Seja no acaso de chegar no mesmo comboio, no facto de ouvir uma voz que diz que vou todo esticadinho pela rua fora, ou alguém que já não vemos há anos. Seja pelo impacto que têm ou tiveram em algum momento da nossa vida, pelo pulsar que nos dão quando os revemos e, ao contrário de outrora, ao facto de agora pararmos para um pequeno mas recompensador diálogo.

Porque nem todos os campos são cultivados com belas tulipas, porque algumas planícies são mais aconchegantes do que outros topos de montanha, porque todos pensamos e agimos de forma diferente numa sociedade que procura mais a uniformidade do igual. Porque somos humanos e reagimos ao chamamento de quem nos interpela para um momento de conversa e, com a espontaneidade a prevalecer, tem um “sabor” a perfeição.

Há momentos em que, muito indiscretamente, literalmente não exalo simpatia ou vontade de participar mas, ao contrário desses momentos, esta semana foi de inspiração pela forma como colocou tanto sujeito bom, em tão pouco tempo, diante de mim. É quando o coração repousa enquanto bate, os pulmões se enchem sem que o peito se mova, os olhos emocionam-se obrigando a um pouco de racional para suster tanta emoção.

Colegas de infância, da primária, da equipa com a qual sempre treinaste e da qual foste o 55o reserva, vizinhos e até conhecidos que querem ultrapassar essa definição na relação existente. Como se o universo se tivesse conjugado para que sorrisses, despreocupado, espontaneamente, do nada. 

Sem planeamento, sem visita marcada, sem o reservar de tempo para que tal aconteça e, quando assim é, olho as estrelas e, deslumbrado com o alinhamento que observo, pergunto-me como agradecer quando, sei de antemão, que os acontecimentos em si são uma forma de também agradecermos e sermos agradecidos.

A chuva toldou-lhe o raciocínio – 8/2/2025

General Torres.

A fotografia.

Foi nos idos de 2023 que resolvi comprar uma máquina fotográfica. Uma pesquisa demorada, qual o modelo que melhor se adapta a um aprendiz, que lentes existem, o que procurar fotografar.

A Nikon D3500 aparecia, de forma consistente, em todos os artigos: era a mais antiga, a mais barata, a mais fácil na adaptação dos dedos à máquina, a escolha acertada para quem queria experimentar sem gastar mais de €1000.

A pesquisa continuou e, mercê do fim de linha do modelo, rapidamente encontrei uma unidade a bom preço, com duas lentes incluídas. Atenas, com todas as obras de arte que os Ingleses não conseguiram roubar, tornou-se o cenário ideal para os primeiros tiros e, com alguns cursos do YouTube, lá consegui sair do modo automático e praticar em modo manual.

Chegado a Portugal, e para dar continuidade a todo o ciclo de aprendizagem grego, inscrevi-me num curso de fotografia dos fuzileiros navais da arte de bem fotografar. Assim, expressões como “Essa merda de fotografia é a fotografia que todos tiram!”, “Esses pássaros são “caga-lentes” o que, traduzido, significa que são demasiado fáceis de fotografar – para sequer serem perseguidos para esse efeito.

O quebrar de toda a confiança leva a uma procura constante por uma nova confiança que permita afirmar a aprendizagem através da qualidade do que se exibe e, vista a evolução tida, dou graças aos que têm tido paciência para me ensinar enquanto eu me limito a apreender o que ouço para, constantemente, tentar falar através de imagens.

É assim que eu vejo o hobby – 29/12/2024

O humilde narrador.

Sagitários 

Nunca fui gajo de me acreditar em astros e cenas – da mesma maneira que me é mais fácil acreditar num Tio Patinhas a ver alguma verdade numa bíblia lida com um espírito crítico – mas ontem, mercê da conjugação do tempo, deparei-me com um aniversariante recente e, como a boa educação obriga, dei-lhe os parabéns atrasados (já o havia feito via redes sociais mas quem é que verdadeiramente sente um abraço enviado digitalmente?)

O aniversariante recente conversava com uma amiga dele e eu, não querendo incomodar, só ia dar um abraço e continuar o caminho até casa. Saudei-o com um “os meus parabéns atrasados, ó comparsa Sagitário!”, ao que a amiga respondeu com um “Estamos três Sagitários reunidos?” (na teoria dos signos, os Sagitários são tidos como pessoas que dizem o que honestamente pensam sem pensar em consequências para as palavras que proferem; uns desbocados honestos, como outrora ouvi serem chamados).

A conversa foi de circunstância, com a piada inerente à época natalícia, e abordamos vários temas com o despudor habitual dos Sagitários. Rimos, recordamos pessoas que ainda vivem mas já não estão presentes, houve mágoa inerente ao recordar melhores dias e gargalhadas por existir no mundo quem outrora tenha trocado sandes de marmelada por testes de inglês feitos na hora. Uma conversa agradável que fez o tempo fluir mais rapidamente do que é habitual. 

E porque é no constante questionar que o conhecimento assenta, não pude deixar de soltar uma das mais sonoras gargalhadas da vida quando, após as despedidas, a amiga do meu amigo, se dirigiu a uma mulher que tentava estacionar atrás do carro dela (com espaço livre para estacionar dois autocarros) e disse “Eu já vou tirar o carro e assim já lhe facilito a manobra!!!”, num tom típico dos Sagitários que, apesar de eu não acreditar nisso, andam por aí…desbocados honestos, como outrora ouvi serem chamados!

Humor de natal – 21/12/2024

Saudades compartimentalizadas.

Os arranjos começam com avanços e recuos, como qualquer combinação que parte do nada e ambiciona transformar-se em algo, mas rapidamente conseguimos o acerto necessário para que o algo se concretize. A logística envolve que um nortenho se desloque ao sul, de onde são naturais a maioria dos participantes, e que todos possuam uma aberta no calendário para todos estarmos juntos – parece fácil mas as probabilidades multiplicam-se pelo número de pessoas envolvidas, o local pretendido e a proximidade da época natalícia, que traz os inevitáveis jantares de natal da empresa.

Há um longo debate via WhatsApp (longo na troca de impressões, buscando a precisão democrática de quem pretende um local que agrade a todos) e os detalhes finais começam a surgir mais filtrados – com um ponto de encontro democraticamente encontrado. Segue-se a viagem para a capital do império e um “turistar” que dura até à hora de nos encontrarmos no local selecionado. O destino, este ano, conduziu-nos a uma vizinhança que foi a minha, de 1999 a 2002, e onde comprei um apartamento: onde vi o Air Force One a aterrar – sentado na piscina do topo do prédio – onde namorei e vivi casado, onde vivia numa pequena aldeia da alta de Lisboa que se confundia com uma aldeia real – tal a serenidade que transmitia.

Voltar e estar com os meus antigos colegas de trabalho, que hoje tenho como amigos, numa vizinhança que era tão minha, foi o relembrar o quanto nos divertimos enquanto estivemos juntos. O que criamos, o que investigamos, as pessoas que conhecemos ao longo de todo o percurso do projecto, o percorrer o norte e sul de Portugal enquanto não havia colega a ajudar, as pessoas que integram e gerem as maiores empresas de Portugal bem como os respectivos gestores de conta, a necessidade que tinham de ter os movimentos bancários em tempo real. Todas as diferentes culturas, ambições, cidades, vilas e locais que integravam a carteira de clientes do banco, os métodos de trabalho, a diferente gestão, a busca pelo sucesso monetário.

Os compartimentos permitem selar essas recordações, em contentores fechados nos tempos de outrora. Acedemos a eles com a certeza absoluta de que jamais voltarão, mas com a profunda convicção de que foram plenamente vividos. Com um sorriso pleno de satisfação por possuirmos memórias tão poderosas que obrigam a uma série de medidas de segurança…para que ninguém as roube e para que a saudade não nos feche num tempo que, apesar de perfeito, já não volta.

As confraternizações da vida – 30/11/2024

Saudosista recorrente.

O passeio foi o de sempre, quando se trata de vaguear pela cidade em que nasceu, e hoje teve o dom de ter a lua alinhada com a segunda prancha da piscina local. Até podia ter olhado e continuado mas a memória traiu-o! Parou e recordou os inúmeros saltos da segunda prancha, um dos quais foi de cabeça e teve o dom de o convencer a nunca mais repetir a façanha – correu bem mas o tempo entre o salto e a entrada na água é algo que fica na memória.

Os dois saltos da terceira prancha – uma loucura para quem tem vertigens e, uma vez chegado ao terceiro andar, não conseguia recuar. Aí sim, recordou-se de ter encontrado o Zé e, num diálogo curto, saltou para o que pareceu uma aventura sem fim – foi o voo de uma vida. O diálogo foi de pretensos heróis e ambos os putos presentes mentiram quando afirmaram estar habituadíssimos a saltar daquelas alturas…

Senti-me voar novamente, porque quis sentí-lo e, por uns míseros segundos, estive na companhia de pessoas tão queridas de outrora. Num sonho acordado, com os pés bem assentes na terra, com os olhos bem despertos para a realidade, sorri com eles e, por entre fantasmas, senti uma boa disposição imensa, como se a mente tivesse perdido toda a razão e somente o coração pulsasse. Numa embriaguez sóbria, numa inconsciência muito presente, num voar imaginário em que não só ultrapassei Ícaro, sem asas, mas também o superei numa satisfação tão plena que nenhuma cera conseguiria suster.

Vadiagem pela cidade – 11/11/2024

A lua que salta da segunda prancha.

A mala de viagem.

Com toda a parafernália electrónica a carregar – escova de dentes incluída – sucedem-se as notas mentais como forma de tentar não esquecer nenhum detalhe que, de alguma maneira ou feitio, coloque a maratona fotográfica em causa.

Baterias antecipadamente carregadas, cartões de memória previamente formatados e prontos a salvaguardar as imagens, máquina limpa de impurezas das recentes saídas citadinas, uma revisão final por todos os botões cujas novas funções estão memorizadas.

Roupa leve e larga para as caminhadas que são inevitáveis, uma última revisão pelas notas mais importantes do curso de fotografia, um sorriso de satisfação pelas pequenas mas muito satisfatórias conquistas, o desejo de captar o outono na sua plenitude.

O farnel separado para que esteja sempre acessível, a falta da garrafa de água para que haja uma desculpa para um primeiro café já em trânsito, um soluço de agonia pela hora de partida tão madrugadora. Um visualizar mental de tudo o que há a fazer e um inspirar profundo,  face a uma aventura que antevê como o exame final de um processo de aprendizagem.

Material todo embalado e organizado, um respirar fundo a fingir que ficou cansado, um sorriso matreiro semelhante ao dos putos – que sabem que partem para a conquista, com o mesmo espírito com que conquistamos o Brasil, muito embora procurássemos a Índia.

Falso esforço – 1/11/2024

O que pinga do céu.

Cada gota um pensamento e cada sucessão de gotas uma emoção que parte e não volta. A cadência da chuva é o martelo pneumático, que afunda pensamentos nefastos numa fossa mais profunda do que as Marianas. Selados pelo cinzento do céu que, na sua cor impenetrável torna impossível qualquer regressão, eis que o sorriso se impõe como a bonança após a tempestade.

As covinhas que substituem a falta de expressão, o brilho nos olhos – com a alegria de quem desvenda o futuro numa bola de cristal que só a imaginação permite existir – enquanto o corpo se adapta a toda uma aragem, que renova o estado de espírito, e faz o miocárdio bater mais forte e mais confiante. Disposto a contagiar o mundo com o seu abraço e a destruir tudo e todos que se lhe oponham.

Como um exterminador implacável, imbuído de alegria e boa vontade, rumando sem mapa e aceitando o destino como bússola. Recordando agruras, que se esbatem em gotas, e são constantemente substituídas por abraços das folhas verdes e castanhas que, não só representam a mudança de estação mas também são o catalisador de toda uma mudança emocional. Suspiros, de alegria. 

Saído da imaginação – 2/10/2024

Gotas, folhas e sentimentos.

O ponto mais alto.

Acordar às 5:30 da madrugada, depois de uma noite “distraída” a rever o Reservoir Dogs e a emborcar mais uma cerveja do que o aconselhável, o atravessar a rua até ao vidrão – para reciclar o vidro que conteve o líquido fresco e loiro da noite anterior, o ser surpreendido pelo companheiro de trabalho e a partida para a serra.

Atravessar caminhos chamuscados e outros com pequenos reacendimentos, o cheirar o queimado que empestou a região durante a semana passada, a primeira paragem para um café e a garrafa de água de 1,5L. Uma legião de motas que nos ultrapassa e uma outra que é ultrapassada por nós, a chegada a Manteigas para um reforço do pequeno-almoço e a compra de um pão local.

O seguir o mapa de outrém, para encontrar o início do trilho, o pedir informações a alguém local – que nos indica que “é sempre a subir!!!” (como aviso para a impossibilidade de ser feito a pé), o regresso ao carro com a certeza que escapamos ao inferno da subida. Nove minutos de carro, “sempre a subir” e eis a entrada do trilho e a constatação de que o carro foi a escolha acertada!

A imersão na verdura, acompanhados de perto por borboletas e outros bichos, um toque irritante na mão que mais não é do que um gafanhoto que parece pretender ser fotografado, imensas paragens para recolher imagens da natureza que nos rodeia, palavras de incentivo – sob a forma de “isso é o que todos fotografam!!!” – como forma de me obrigar a procurar ver o que habitualmente não é visto ou fotografado.

Por caminhos municipais, na procura de uma vista para acompanhar o almoço, estacionando junto a um pastor para o repasto pleno de colesterol e boa disposição. O retomar da fotografia, na descida da montanha, a bateria da máquina que cede muito antes do previsto. O regresso pelo caminho de ida e a atenção constante a bestas quadradas que apenas guiam um dia por semana.

Domingos de trabalho – 23/9/2024

Quando se almoça com esta vista…👌

O clique que faltava.

Já não me recordava da última expedição punitiva que havíamos feito ou sequer qual havia sido o destino o que, em bom abono da verdade, apenas significa que fui obrigado a relembrar as fotografias para poder lembrar-me do percurso. Viana do Castelo, pois claro!

Em cima da mesa estava agora a possibilidade de visitar uma praia de outrora e, da margem oposta, captar os melhores momentos do fogo de artifício que encerra o evento. Como sempre, a aventura não se cingiria ao planeado e tencionávamos aproveitar o máximo de luz solar bem como o pôr-do-sol.

Por entre domingueiros dispostos a guiar num dia diferente do habitual e “fanáticos” armados com toda a parafernália para um mês de férias, eis-nos a reconhecer o território muito antes da hora do evento principal. O local ideal, onde fazer a inversão de marcha para evitar o trânsito no final, onde beber um copo, planos B variados…nada foi deixado ao acaso!

Um salto rápido até a uma cidade próxima, um churrasco valente a servir de repasto, um copo tranquilamente bebido num Furadouro pejado de pessoas. A hora rapidamente chegou e, munidos de todos os estudos antecipadamente elaborados, dirigimo-nos para o ponto X, definido como o ponto perfeito para captar a essência do que aconteceria do outro lado da margem.

Infelizmente, outros estudiosos já haviam descoberto o ponto X e, por entre mesas de campismo, minis a serem sorvidas e esgares de quase ódio, lá conseguimos chegar a um dos pontos alternativos previamente definidos (é treta mas fica bem no texto). Montada a parafernália fotográfica, lá conseguimos captar alguns dos momentos altos do fogo de artifício que tínhamos planeado, por entre alguns encontrões e cuidados redobrados para não pisar algum incauto.

O vadiar do amador – 8/9/2024

Old school.

A história tinha lugar nos Campos Elísios, bem no centro de Paris, e a hora marcada há muito que havia sido ultrapassada. O primeiro sentimento que lhe ocorreu foi largar tudo e voltar pelo caminho por onde havia chegado. Um telefonema e uma justificação não plausível (não lhe cheirou bem) depois e eis o casal de pretendentes a namorados a encontrar-se – presencialmente, e nessa qualidade, pela primeira vez. Ele não apreciava os óculos dela e, homem de respostas directas, disse-lhe que pareciam uma máscara de ski e que, apesar de estarem perante um inverno rigoroso, não havia previsão de neve ou abertura de pistas pelas grandes avenidas que se reuniam no Arco do Triunfo.

O primeiro beijo, já depois de efectuado o check-in, foi um momento de rara beleza e prazer. Sentados no sofá, virados de frente um para o outro, ele pediu-lhe para fechar os olhos e, narrando o que iria acontecer, segredou-lhe que ia dar um inocente (lol) beijo na orelha – algo que imediatamente fez e que terminou com uma trinquinha no lóbulo esquerdo. Depois, continuando a narrar, explicou que iria percorrer o caminho até aos lábios – algo que fez, com pequenos beijos, enquanto a mão esquerda massajava amorosamente a maçã do rosto do lado direito dela. Chegado aos lábios, e sabendo de antemão o valor sentimental do gesto, degustou-a e deixou-se degustar, enquanto fechava os olhos à vista do Arco do Triunfo, que se encontrava a uma centena de metros de distância, nas costas dela.

Ao ser interrogado, pelas autoridades locais e internacionais, declinou recordar-se desse acontecimento. Invocou a quinta emenda, muito embora lhe tivesse sido explicado que tal emenda não existia no direito francês…Ela pediu desculpa! Era tudo o que eles queriam ouvir…e decidiram começar de novo, utilizando o respeito mútuo como varinha mágica para qualquer tipo de conflito. Porque os bons momentos eram fenomenais mas os maus eram de uma imaturidade atroz.

Como funciona a memória – 26/7/2024

Céu nublado e calor.

Foi o único dia em que todos concordamos ir à praia: havia sol apesar das nuvens, o ar estava quente apesar de ser um país em que tal raramente acontece, acordamos todos com vestimentas de praia vestidas e queríamos ver a nossa escolha reconhecida!

A reunião teve lugar na enorme sala de estar, com todos reunidos nos dois sofás que ladeavam a mesa, café quente a chegar da secção da cozinha, olhares entre o atrevido e o receoso. As opiniões tão divididas quanto a quantidade de açúcar que cada um usava.

Sem consenso, mas com bom senso, fomos para a praia mais próxima de Cork que, por sua vez, aparecia no Google Maps como isolada e sem muita gente. Obviamente não era isolada e havia um pub na entrada da praia! Foram essas pints que salvaram o dia.

Um pouco como hoje – 25/7/2024

O horário de adolescente.

O acordar brutalmente cedo para devorar as notícias do dia anterior, a farda de verão constituída por tshirt, calções e xanatas, os óculos no lugar das lentes de contacto, a toalha de praia que fica ao fundo das escadas para uma rápida mudança de notícias por mergulhos, o sorriso que se cola a uma cara avermelhada pelo sol.

A chegada ao areal e o poder decidir onde ficar, o enxergar o vizinho mais próximo a uma distância que não me permite ouvir o eventual ruído que causem, o reunir tudo dentro do chapéu e o caminhar ensonado pela água que, já não te surpreende, até uma onda que pretendes surpreender.

A rápida revisão abaixo do equador, de maneira a não trazer areia desnecessariamente, o nivelamento do calção por uma linha imaginária. O alegre regresso pela areia, com as oscilações causadas pelas ilhas de areia que se formam na maré vaza, do sentires-te muito alto ao receio de teres caído na fossa das marianas, um beliscão dissimulado para verificar se os membros ainda não gelaram.

A toalha sacudida e enrolada no corpo, a temperatura que recupera a normalidade habitual. O deitar para um banho de sol rápido, umas folhas do “Invisível” do Paul, o regresso da abstração porque o corpo requer outro mergulho. O virar do frango, continuando a leitura e adiando o banho, umas valentes gargalhadas pelo modo como os personagens literários se expressam. O largar tudo, muito rapidamente, porque o canto do olho viu a onda perfeita para mergulhar de cabeça. A alegria de viver em contradição horária!

Manhã imersa e tarde também – 24/7/2024

Recebido de alguém que me conhece.

E o mar que tudo arranja…

Durante três anos sonhei com as ondas do mar caseiro; excepção feita a Lefkada, com ondas altas e excepcionalmente azuis claras a quebrarem na praia, o restante é constituído por ondas que mal cobrem o dedo mindinho. 

Hoje, pela manhã, tive a oportunidade de ter que caminhar para ir de encontro às ondas, mercê de uma maré baixa que coloca as ondas a cerca de cem metros de terra. 

Já não me lembrava de “ter que ir ao encontro das ondas”, mas a conjugação de caminhada e mergulho é uma vigorosa terapia. Numa espécie de biatlo, conseguimos reflectir na caminhada e deixar o mar levar as impurezas de pensamento acumuladas com o mergulho.

Repito hoje passos que com 18 anos fazia diariamente. Com o mesmo objectivo de outrora e, felizmente, com o mesmo resultado. 

A água que tudo lava – 23/7/2024

Cenário hipotético de um amor pleno.

Num mundo de interrogações e demasiadas perguntas para tão pouco tempo de respostas eis que, na tranquilidade das suas manhãs de leitura, numa esplanada de uma rua que só de propósito é que se encontra, surge o cumprimento de uma voz de outrora.

Não exige recurso ao arquivo de vozes porque o sentimentalismo de merda – um catalogador muito mais rápido do que o Google a indexar resultados – imediatamente avisa a mente de quem se trata. A auto-intitulada alfa surge no canto do olho e o que se segue é o mais intenso “staring contest” a que o mundo assistiu.

De um lado o ser supremo do sexo feminino, de acordo com a própria, e do outro um sentimental de merda que não pode ceder e se interroga porque está a ser cumprimentado: boa educação? Não pode ser porque foi saneado, numa reunião familiar de outrora, em que o compromisso de não mais interagir com ele (ou a simples menção do nome) ficou assinado (segundo a “verdade” dela, anyway).

Ela passa, os olhos não cedem e demoram a assimilar a imagem dela. Pôs mamas?! Interroga-se, enquanto nota que há algo novo nela. Corta o olhar, o que a fêmea alfa deve ter encarado como uma vitória, e emite um som de desaprovação – porque esperava mais de alguém tão alto na cadeia do amor-próprio (deve haver uma cadeia assim). 

Não se pode falar de uma tensão palpável porque ela é visível! Vê-se, sente-se, tudo! Um hino aos sentidos apurados. Volta o olhar para o jornal diário, enquanto sente que – não fora um amor-próprio demasiado exacerbado, a rainha do ego – ela até podia ser o amor de uma vida. Assim, é apenas vulgar.

Num planeta imaginário – 23/7/2024

A combater calores.

Adaptar ou readaptar.

O pé está na areia, o mergulho foi rápido e esfriou bastante o corpo quente, o queixo treme porque questiona que água fria é esta, o sorriso é aberto por poder estar a fazer algo tão simples quanto escrever este texto no telemóvel.

Enterras o pé mais profundamente na areia, começas a sentir a cara a ficar quente, perguntas se não será melhor colocar o chapéu mas, ao não responderes a ti próprio, ficas na dúvida. Soltas um suspiro aliviado quando constatas que há gente mais gordinha que tu.

Mascas a goma e relembras que já passaram dois meses desde o último cigarro, sentes a necessidade de graduar os óculos escuros, constatas que talvez sem eles a realidade seja mais clara. Observas uma criança que tenta encher a piscina, com expirações que ainda não superam o ar perdido entre elas, larga tudo e vai juntar-se aos pais para um mergulho.

O exercício de leveza de mente continua, traças mentalmente um trilho para a tarde de hoje e interrogas-te se a imaturidade de outrém é algo que possa ser superado. Não perdes muito tempo com interrogações e a certeza do trilho da tarde surge para abafar pensamentos que não te cabem a ti estar a ter.

Largas a toalha e vais dar outro mergulho. No esfriar é que está o ganho!!!!

O gelo da água como arrefecimento natural – 22/7/2024

Onze horas e meia de trabalho!

Saímos uns minutos mais cedo do que é habitual, chegamos ao primeiro café com a área de serviço ainda em modo nocturno, compramos os primeiros pertences fundamentais: a água e café.

Com um início de viagem por entre nevoeiro e neblinas matinais bem cerradas – até parecia inverno. Chegamos ao meio do caminho para a primeira montanha e tiramos as primeiras fotografias numa contraluz espectacular.

Continuamos a viagem, demos uns giros para recolher mais imagens, ligamos para o restaurante a tentar reservar o almoço – é domingo e, neste dia específico, há “profissionais” que reservam mesa mais rapidamente do que nós (provavelmente de uma semana para a seguinte) pelo que fomos obrigados a recorrer ao plano alternativo – a pizzaria de Gralheira. 

Com tempo ainda disponível, e com alguns pontos de interesse situados nas imediações do restaurante, fomos fotografar a vizinhança com um olho a observar o restaurante. Um ponto de água, uma ponte comunitária, as vielas e os becos que cercam o restaurante (onde a Sabrina é quem manda).

Arranjamos mesa, encomendamos vitela e, passados uns minutos, chegou o cozido à portuguesa, seguido de vitela assada no forno e, por último, um naco de vitela (trabalham por menu e cada cliente tem direito aos três pratos). Um copo (lol) de verde branco a acompanhar e um pudim de sobremesa fecharam o modesto almoço.

O regresso foi feito via serra da freita, paragem em Arouca (para umas castanhas e uma caminhada), captura de inúmeras libelinhas que ladeavam o trilho à beira rio. 

Foi um dia de temperatura quente, com vários trilhos percorridos – com o cheiro fresco dos cavalos a acompanhar, três castanhas comidas e um almoço numa pizzaria que só vende pizza aos incautos mal informados!

Pelos trilhos de Portugal – 21/7/2024

De costas voltadas.

Os caminhos de Portugal. 🎶🇵🇹

Um dia, estava eu a coçar a cabeça a tentar encontrar a configuração perfeita para tirar uma fotografia em modo manual, quando alguém me disse: de 15 em 15 dias, grosso modo, vou por aí fora tirar fotografias dos sítios por onde vou passando. Queres vir também?

O aprender a fotografar, como tanta coisa na vida, está na tentativa e erro. As decisões pobres que dão azo a decisões mais ricas, o constatar do que estamos a fazer mal e o rectificar até ficar melhor – num trilhar a caminho da perfeição. Embarquei na aventura e passei a acordar às 5:30 da manhã de domingo.

O acordar é feito com um sorriso e, antecipando o caminho a percorrer, revejo mentalmente erros anteriores que estragaram uma dada fotografia ou, pelo menos, lhe retiraram mérito qualitativo. O duche e pequeno-almoço são rotineiros como passo enorme rumo à saída de casa e início da aventura.

A atenção ao detalhe, o bicho que não vês mas cuja presença é denunciada por outro dos presentes, o ângulo que deves usar para obter um melhor efeito de luz, a revisão rápida no LED da máquina que confirma ou desmente o que achas que alcançaste. São domingos de ação, atenção ao detalhe, esforço físico no caminhar e, porque somos lusitanos, um brutal almoço!

Momentos de felicidade – 20/7/2024

Uma vida nova.

Muito semelhante ao que fazia, sempre que visitava uma nova ilha grega, consiste num despertar madrugador (tenho que agradecer a duas freiras o terem-me ensinado as virtudes de um início de dia tão especial), um mergulho salgado e o regresso a casa para um banho de mangueira que permita que o resto do dia decorra com um mínimo de tranquilidade.

Qual D. Sebastião, embrulhado numa mistura de calor e neblina, fiz o pequeno trajecto, dei o mergulho e tomei o retemperador banho de mangueira. A secagem é um misto de toalha de praia e toalha de banho, já sem areia, até atingir uma temperatura que permita o regresso ao café, para as notícias do dia anterior.

O trio café, queque e água a trazerem a tranquilidade a quem gosta desta rotina matinal – com menos café do que outrora mas com mais calor humano. Dois sorrisos a quem os merece e o habitual cumprimento a quem rotineiramente o devolve. A última página a dar o mote para outros afazeres, traseiro levantado para o cumprir de um novo capítulo, literalmente falando.

Manhãs imersas – 19/7/2024

Os banhos de mangueira.

Testados que foram os pares de sapatilhas existentes, e constatado que nenhum oferece proteção sem magoar na bolha rebentada, eis o humilde narrador remetido para uma tarde de sol, banhos de mangueira e sulfadiazina para acelerar a cicatrização.

Perdido nas palavras eternas do autor de Aracataca, com descrições capazes de nos mostrar os locais por palavras, por entre sorrisos e outras expressões de reconhecimento, eis-me a desfrutar de um belo aconchego caseiro.

O café quente, a água das pedras gelada, as palavras como abraços e as descrições como algo que pretendemos alcançar, a mente que vagueia e te obriga a concentrar para que não se desgoverne em sonhos que ainda te faltam concretizar.

O melro que se senta ao teu lado, percorre o pequeno muro de cimento e, após receber uma migalha de reconhecimento, parece pavonear-se em agradecimento. Um canto bonito e fora do normal antes da partida para um destino que é só dele.

Os pintassilgos que olham para ambos os lados, antes de buscarem a migalha, sempre atentos aos gatos vadios da vizinhança. Os gatos da vizinhança que usam os vasos como forma de iludirem as presas que pretendem alcançar.

Um mundo natural – 18/7/2024

O reconhecido.

O café na paz de uma cidade que desperta, a gentileza de quem nasceu e sabe trabalhar de manhã, o modo superior como prestam atenção a todos os detalhes de uma conversa sem que interiorizem, o sotaque como regresso ao maravilhoso passado de 2019.

Os parabéns aos pais do Bruno, as piadas sobre o Grémio, o FaceTime a ver o garoto mineiro-gaúcho que cresce a olhos vistos, a imprevisibilidade de quem pretende crescer sem ter que responder porquê, a saudade dos nossos tempos juntos e o recordar desse périplo sul-americano.

A preparação para a caminhada a visualizar o Fitzgerald Park, onde tantas vezes “trilhei” com as galochas Dunlop que haveria de perder no concerto de Guns and Roses (quem é que perde umas galochas num concerto na Irlanda????), o malandro casal que me faz recordar os tantos momentos felizes que passamos.

O longo abraço na despedida que, independentemente da distância, é sentido como presente. 

Saudades de Cork – 18/7/2024

O desconhecido.

Saído da estação e após uma boleia amiga, largado num trilho desconhecido e de sorriso aberto, a fazer um passo superior ao normal, uma ligeira dor abaixo do tendão, uma curva e a paragem para descobrir o porquê da irritação no pé, uma bolha que explode e mostra a carne fresca.

O continuar com um penso improvisado, o mesmo sorriso com os dentes rilhados, estou a meio do caminho pelo que é igual regressar ou continuar. O corte pelo meio da floresta, alguns animais que se afastam sem que eu faça questão de saber quais, um ponto de referência conhecido é visto ao longe e o sorriso abre para algo normal.

O regresso a casa para um curativo bem feito, uma bolha aberta para que todo o líquido possa sair. Um misto de emoções: um penso bem feito, uma convalescença em perspectiva, o sorriso pela conquista apesar de.

Amanhã será melhor – 17/7/2024

A novidade que não o é.

A intimidade entre um casal é, quanto a mim, primariamente definida pela força que ambos colocam na sua constituição: o saber viver para nós, o saber priorizar o nós, o ter um gosto enorme em contribuir para algo novo que é só nosso. 

O processo é demasiadamente fácil para que um ser racional falhe mas o mundo está cheio de exemplos falhados. A exclusividade, o acerto de duas personalidades, o respeito pelo sempre necessário tempo do outro, o carinho e a elevação de outra pessoa acima de nós mesmos pode colidir com personalidades narcisistas, ou sem maturidade suficiente para simplesmente ser de uma honestidade simples e confessar “não sou capaz de abdicar de mim em prol de nós” – que é a mais honesta expressão de não querer pactuar mas, ao mesmo tempo, respeitar suficientemente a outra pessoa para ser capaz de o confessar.

O mundo também está cheio de pessoas cobardes que, ao invés de constatarem as suas fraquezas em prol da sua superação, optam por atitudes bélicas e de desafio que jamais encontrarão um alvo igual para as praticar. Sim, é verdade, o mundo também está cheio de potenciais alvos, logo a cobardia pode ser assim escondida, desde que o alvo seja sempre diferente e a imaturidade permaneça como volante da vontade de viver desse ou dessa personagem, como algo reciclável e partilhável pela sociedade.

A ambição desmedida fez nascer os sentimentais de merda – sujeitos para quem a intimidade é o bem maior, que os torna cegos (excepto para verem, decorarem e enxergarem, com todo o encanto que possuem, a pessoa amada). Vivem com a fusão de dois corações num só e aceitam que a partilha do miocárdio seja a mais alta aspiração do seu relacionamento. Transformam a sua singularidade num pluralismo do casal que orgulhosamente ostentam, como os veteranos ostentam as medalhas das suas conquistas – com muito orgulho!

Não há neles discussões mas sim conversas em prol de consensos – sabendo sempre que o miocárdio só é musculado se ambos estiverem em constante equilíbrio na busca de um bem comum que não conhecem e que, potencialmente, poderão nunca alcançar, mas que nunca desistem de procurar – pelo bem de ambos. O coração aberto a outrem, como se de uma cirurgia de peito aberto se tratasse, com toda a fragilidade que o processo acarreta e toda a confiança nos dois envolvidos. É difícil, há quem passe uma vida inteira na tristeza de nunca o experimentar.

Arritmia de fim de tarde – 17/7/2024

A leitura.

Se há uma equipa vencedora, no meu ponto de vista, é a conjugação de um café com o jornal diário (o queque, com uvas passas, foi apenas o ceder a uma tentação matinal). O ter que andar pouco até ao destino, a vizinhança que mantém os mesmos horários – logo criam uma rotina para quem, muito tranquilamente e de maneira ainda ensonada, tenta colocar-se a par do estado do mundo.

As senhoras da limpeza que cantam e discutem, entre si, quem vai apanhar a pomba morta que jaz no passeio, o homem das louças que não falha a hora de abertura e, tendo sido colega de turma, também não falha o cumprimento diário. O pequeno ginásio que se prepara para a primeira aula, os pássaros que saltam para a mesa na procura de uma migalha do queque que ainda não tinha dado por perdida mas eles já tinham decidido que estava ganha.

A necessidade extra de uma água das pedras fresca, o sorriso da empregada do café – que sabe as histórias todas mas finge sempre que está apenas de passagem. A mulher da limpeza que discute com o homem das louças e, tirando os earphones, se regozija pelo facto de não ter que ouvir as respostas dele. Ambos sorrimos e, mais tarde e depois de termos explicado ao homem das louças o porquê, ele sorri connosco.

O fazer de propósito para não ver enquanto observo e o click da inteligência emocional a não conseguir sobrepor-se. O regresso às últimas páginas e a partida para o balneário de mais uma caminhada. A alegria de estar perdido, bem a sul do distrito, e tão bem encontrado comigo mesmo. Foi diferente.

As manhãs, enquanto início do dia. – 17/7/2024

A leitura.

Se há uma equipa vencedora, no meu ponto de vista, é a conjugação de um café com o jornal diário (o queque, com uvas passas, foi apenas o ceder a uma tentação matinal). O ter que andar pouco até ao destino, a vizinhança que mantém os mesmos horários – logo criam uma rotina para quem, muito tranquilamente e de maneira ainda ensonada, tenta colocar-se a par do estado do mundo.

As senhoras da limpeza que cantam e discutem, entre si, quem vai apanhar a pomba morta que jaz no passeio, o homem das louças que não falha a hora de abertura e, tendo sido colega de turma, também não falha o cumprimento diário. O pequeno ginásio que se prepara para a primeira aula, os pássaros que saltam para a mesa na procura de uma migalha do queque que ainda não tinha dado por perdida mas eles já tinham decidido que estava ganha.

A necessidade extra de uma água das pedras fresca, o sorriso da empregada do café – que sabe as histórias todas mas finge sempre que está apenas de passagem. A mulher da limpeza que discute com o homem das louças e, tirando os earphones, se regozija pelo facto de não ter que ouvir as respostas dele. Ambos sorrimos e, mais tarde e depois de termos explicado ao homem das louças o porquê, ele sorri connosco.

O fazer de propósito para não ver enquanto observo e o click da inteligência emocional a não conseguir sobrepor-se. O regresso às últimas páginas e a partida para o balneário de mais uma caminhada. A alegria de estar perdido, bem a sul do distrito, e tão bem encontrado comigo mesmo. Foi diferente.

As manhãs, enquanto início do dia. – 17/7/2024

A essência sem influência.

Era o fim de uma caminhada muito simples, do ponto mais a norte até ao ponto mais a sul. Sempre focado na areia e no mar – na capacidade que possuem de nunca serem (ou permanecerem) iguais. A constante mutação como sinónimo de uma existência – sem que a personalidade seja perdida e, pelo contrário, até seja celebrada e invejada. Uma paisagem em constante transformação, que ilude os menos atentos que até a ferem quando dizem que “está sempre igual” ou “é sempre a mesma coisa” – um claro sinal de que a visão está a precisar de estímulo ou carece de uma visita urgente ao oftalmologista. Parar, olhar e saborear a vista – como um prazer que nos permite recarregar toda uma hipotética bateria chamada mente.

Os inúmeros jardins escola ou ocupação de tempos livres – um nome horrível, como que impondo a necessidade de ocupar tempos livres! Como se, enquanto seres racionais, tivéssemos a necessidade de nos ser indicado o que fazer quando o tempo livre surge, como se não soubéssemos ensinar os nossos descendentes a ler um livro, a brincar, a divagar, a saber estar. Dizia eu, enquanto me distraí com o termo, que a praia estava com bastantes crianças que se divertiam com as actividades que tinham disponíveis. Dois grupos divertiam-se a jogar futebol, replicando um jogo imaginário e alguém sugeriu que o desempate fosse feito com recurso a grandes penalidades.

Alinhados em dois grupos de adversários distintos, com os respectivos guarda-redes selecionados, abraçados como se só unidos pudessem ultrapassar esta eliminatória imaginada, alguns com garrafas de água a imitar a imagem que a comunicação social nos traz. O primeiro a falhar imediatamente recebe um grito de “Grande João Félix!”, há celebrações e muitos sorrisos com a piada feita, reunem-se todos e, cochichando, combinam algo. Começam a correr todos juntos, agora que já não há adversários, e enquanto gritam “Vamos à água!!!!”, vejo a educadora – em absoluto pânico enquanto se levanta da toalha de praia, não acreditando no que ouviu ou não sabendo como deter aquela onda de entusiasmo – a começar a correr atrás deles que, entretanto, travam aquela massa humana e, virando-se em conjunto para a educadora, exclamam “Já não se pode brincar?!”, enquanto sorriem, com uma união tal, que apenas conseguem mais um sorriso para o grupo.

Eles ensinam a brincar – 13/7/2024

Dias de sol.

O acordar e descer das catacumbas para um jornal fresco em notícias do dia anterior, o primeiro café como pontapé emocional e inicial, o lento abrir dos olhos para uma luminosidade que ameaça ser quente, as xanatas que transmitem o frio de um chão que ainda não aqueceu, o casaco de desporto como forma de não renunciar ao verão mas protegendo da temperatura matinal.

A revisão da primeira página – com notícias gordas mas cujo conteúdo tenho que vasculhar no interior – a leitura atenta de uma última página – que sabemos não conter as últimas notícias mas que tem uma importância acrescida para quem a desenvolve. Um sorriso com a “tirinha cómica” e um descanso para contemplar o que me rodeia.

O sentir a tinta, que se cola a uns dedos com pelo menos três anos de saudade de a tactear, o parar para cheirar o conjunto – e olhar à volta para me certificar que não sou visto por alguém que possa testemunhar o gesto e, num qualquer tribunal popular, aferir da intimidade presenciada, levando a uma condenação por acto erótico em público. 

O dobrar da primeira folha – que define todas as futuras dobras desse mesmo jornal, a leitura do editorial, a nova dobra que salta a enorme publicidade da página 3. Um desfolhar por entre as agruras nacionais e estrangeiras, a falta de bom senso no mundo, a desgraça humana e uma réstia de esperança na humanidade.

Uma última dobra e volto ao fim, muito perto do início, que me catapulta para um duche e o preparar da mochila para o passeio da tarde que hoje será pela invicta cidade.

Dias sem chuva – 13/7/2024

Outrora, o nascer do sol.

Constatações.

É óbvio que vejo quem entra, como se o blogue tivesse um olho mágico idêntico ao das portas. Tratando-se de um sítio público, e não carecendo de privacidade, são todos bem vindos e que desfrutem a leitura tanto quanto eu desfruto enquanto escrevo.

As vantagens de nada existir para esconder, o prazer de partilhar o que crio, a vantagem de não querer saber se o público gosta ou não porque simplesmente escrevo para mim, como se tratasse de um diário para memória futura, sem que exista um juiz, julgamento, acusação e/ou defesa.

Numa espécie de papel, onde não tenho nada a provar, vão caindo umas palavras que, quando a sorte as bafeja, ficam ordenadas,  com um significado engraçado, quando muito. As letrinhas, como se fossem uma sopa, cozidas e ordenadas pela água fervida do acaso, numa mistura que só pretende saciar o autor.

Um papel que todos podem ler e imaginar o sentido sendo que o real significado se perde na imaginação de cada um dos leitores. Uma amálgama que visa preencher uma cárie inexistente e que apenas colmata a desvitalização que a imaginação julga existir. 

Um exercício do imaginário, que julgamos ser real mas que, quando aspirando a senti-lo com o tacto, constatamos que não é palpável, sem deixar de continuar a imaginar a sua existência. Aspirando a ser um deus no uso da palavra quando sabemos que ser mortais é o máximo a que podemos aspirar.

Como tu – 11/7/2024

Uma ementa variada.

O método do discurso.

Não usaria palavras – era um risco mas, como tinha vertigens e fazer queda livre estava fora de questão – seria o seu desporto radical desse dia. Não era o método Ludovico, que Kubrick deu ao mundo, mas uma alternativa muito mais hilariante. Não implicava qualquer coação física e, quando muito, seria apelidado de louco pela tentativa de impor ao mundo um novo alfabeto…de sorrisos.

Por cada gota de água da chuva teria que sorrir e, de cada vez que interrompesse o seu passo – nessa longa caminhada, que se quer sorridente, chamada vida – teria que exteriorizar a soma de todos os sorrisos dados no percurso. Tinha consciência (teria de facto?) das diferentes interpretações que esta nova realidade poderia trazer ao seu dia-a-dia mas, colocando o científico acima da maneira de ver de quem o rodeia, destemidamente avançou!

O dia era de aguaceiros pelo que, mais cedo ou mais tarde, teria a “aberta” desejada para colocar a teoria em prática! Assim que notou umas pingas, que timidamente pintavam o chão onde pousavam, vestiu o fato com todos os sensores e dirigiu-se a um café próximo. Um sorriso tímido primeiro mas, fruto do aumento da cadência da chuva, o atrevido assumiu o lugar do tímido e o cientista sorria agora – como um puto adolescente a quem deram a chave do primeiro carro.

Baralhava as pessoas com quem se cruzava enquanto ele próprio estava baralhado e, atingindo o café que tinha definido como objectivo, soltou uma sonora gargalhada. Espantou todos os presentes que, como saudação de volta, lhe devolveram sorrisos. A empregada de balcão, ainda esboçando um sorriso, perguntou “Um café e uma água das pedras?” e ele, com os lábios invertidos e a formar um C invertido a 90 graus, anuiu. Poderia ser esta a solução para a humanidade? – perguntava interiormente a parte da sua mente, logo interessada em capitalizar o processo. Sorriu com a imagem, sem que o lucro fosse o propósito.

Entretanto parou de chover – 10/7/2024

Selfie num espelho partido.

Dia encoberto.

Aproveitando o facto de ter a praia e o mar praticamente só para si, acompanhado de uma geleira com minis, muito gelo a cobri-las, e bastante sal como catalisador do processo. Com um velho iPod, completamente cheio de música dos anos 80 e 90, um livro do Gabo, um guarda-sol como forma de marcar território, factor 50, chapéu e os óculos escuros.

A toalha estendida debaixo do guarda-sol, o creme a besuntar o corpo já não tanto Danone, uns toques a afundar a areia, na procura da mais ergonómica das posições. O ruído das ondas misturado com acordes de heavy metal, o doce desfolhar da primeira página do livro. A necessidade de algo mais, o braço esticado a encontrar uma mini, a cena erótica entre a cápsula e o abre garrafas, o sorver de um gole.

As palavras que se bebem, a cerveja que se idolatra, a areia e o ruído do mar – ligeiramente metalizado com o som – que transmitem um grau de satisfação quase intimista – como se fosse um pecado deliciar-mo-nos assim em público. O virar da página, com todos os cuidados para não molhar a obra-prima, a pausa para apreciar a ondulação, sem que a aventura se desvaneça. 

A areia com que outrora brincamos enxotada do fundo da garrafa, a hidratação por cevada como meio de sobreviver onde a imaginação e as palavras do Gabo nos levam. O molhar o pé como se de um mergulho se tratasse, o choque térmico de quem se habituou aos inúmeros mares gregos. O sorriso com a recordação de outrora ao mesmo tempo que visualizamos a realidade do agora.

Encoberto mas possível – 9/7/2024

Dia encoberto.

Aproveitando o facto de ter a praia e o mar praticamente só para si, acompanhado de uma geleira com minis, muito gelo a cobri-las, e bastante sal como catalisador do processo. Com um velho iPod, completamente cheio de música dos anos 80 e 90, um livro do Gabo, um guarda-sol como forma de marcar território, factor 50, chapéu e os óculos escuros.

A toalha estendida debaixo do guarda-sol, o creme a besuntar o corpo já não tanto Danone, uns toques a afundar a areia, na procura da mais ergonómica das posições. O ruído das ondas misturado com acordes de heavy metal, o doce desfolhar da primeira página do livro. A necessidade de algo mais, o braço esticado a encontrar uma mini, a cena erótica entre a cápsula e o abre garrafas, o sorver de um gole.

As palavras que se bebem, a cerveja que se idolatra, a areia e o ruído do mar – ligeiramente metalizado com o som – que transmitem um grau de satisfação quase intimista – como se fosse um pecado deliciar-mo-nos assim em público. O virar da página, com todos os cuidados para não molhar a obra-prima, a pausa para apreciar a ondulação, sem que a aventura se desvaneça. 

A areia com que outrora brincamos enxotada do fundo da garrafa, a hidratação por cevada como meio de sobreviver onde a imaginação e as palavras do Gabo nos levam. O molhar o pé como se de um mergulho se tratasse, o choque térmico de quem se habituou aos inúmeros mares gregos. O sorriso com a recordação de outrora ao mesmo tempo que visualizamos a realidade do agora.

Encoberto mas possível – 9/7/2024

Palavras submersas, umas nas outras.

Inocentemente colocando palavras, entre ideias formadas por conjuntos de palavras, denominadas frases. Com o mesmo intuito de um agente secreto que, sem que ninguém o detecte, coloca uma arma secreta, pronta a executar o inimigo, sem que alguém sequer desconfie que ele esteve presente.

Com o mais real dos cenários a servir de ficção para, na realidade, atingir os fins a que se propôs. Imbuído de uma personalidade de 007, coadjuvado pelo melhor dos cientistas e das melhores ferramentas secretas que eles providenciam, dedilhando o teclado enquanto vai corando com o conteúdo que o ecrã vai revelando.

Dedilhando mais do que a mente pretende revelar e ressalvando as partes que definitivamente o exporiam mais do que é desejável – num misto de atentado ao pudor seguido de uma corrida para encontrar uma peça de roupa que esconda a nudez. Como se as frases que se formam fossem uma corrida desenfreada para uma meta quando o pretendido é o gozo de um passeio conjunto, sem que qualquer meta se aviste.

O abrandar como forma de sustentação, a leveza do discurso como força motriz de um diálogo tão subtil que, aquando do ponto final, até o narrador fica pasmado com a alta rotação atingida. Como se o ralenti fosse uma mudança engrenada e as palavras fizessem tudo deslocar, sem que o autor se movesse. A beleza da inércia!

Assim era a dinâmica – 8/7/2024

Como se nadasse sempre para jusante.

O amadorismo do fotógrafo.

Por vicissitudes várias antecipamos o habitual domingo de fotografia para sábado e, mercê de uma equipa de planeamento sempre atenta, decidimos que Ponte de Lima seria o destino. O habitual acordar às 5:45, com uma pequena dor de cabeça do verde branco do dia anterior, quiçá abatido pela eliminação da nossa equipa nacional. 

A correria matinal para estar pronto a tempo e horas, o escutar aquele ruído tão típico do meio de transporte, uma última verificação de que está tudo dentro da mochila, o sorriso de quem vai visitar a mais antiga vila de Portugal. A paragem na área de serviço – para café e hidratação – o duelo com uma máquina de café arcaica, os goles de água que dão um novo alento ao corpo do humilde narrador.

Ser dos primeiros a chegar a um parque de estacionamento vazio, a visão dos canonistas madrugadores, a necessidade de degustar uma iguaria local, o lento caminhar até ao local do primeiro duelo gastronómico. Duelo vencido, regresso ao local de partida, o primeiro olhar pela feira e a exploração de um trilho local. Enganado amigavelmente na distância percorrida no trilho, incursão na feira do cavalo.

A visão de umas cavalonas, éguas e cavalos, num contexto despreocupado e ainda ensonado. O constante fotografar de tudo, na procura da luz perfeita para a hora do dia. A passagem por um mercado anexo onde a venda nos remete para os mercados de outrora – os sons dos animais vivos, a variedade, a proximidade e o carinho – de quem compra e de quem vende – como superlativo de relações públicas.

O almoço antes das 12, num restaurante que enche logo após as doze badaladas que marcam o meio do dia, o saborear da gastronomia minhota entremeado com o delicioso néctar verde e branco, brutalmente fresquinho e borbulhando. O fotografar das ruas e vielas, dos jovens e velhinhos, as viúvas e os viúvos que as cortejam, os sorrisos dos locais que assim nos fazem sentir uma parte integrante daquele todo que, momentaneamente, também é nosso.

O regresso ao recinto dos concursos equestres, o cumprimentar uma Maria sempre bem disposta, o reencontrar um padrinho sempre de abraço apertado no acolhimento, o beijinho de saudade à Maria que o acompanha nesta aventura chamada vida. O coração que se enche com a surpresa, de alegria que bombeia o corpo inteiro, o continuar a procura incessante por novos motivos por fotografar, sabendo agora que somos parte de uma claque que torce por uma égua de dois anos.

Uma última volta pelo recinto, a imagem de quem exagerou na festa, o regresso ao caminho de volta a casa. Mais tarde, a informação que a égua foi a vencedora, já no conforto do lar, e o delinear de um futuro encontro, para fotografar, mas, acima de tudo, guardar na gaveta das boas memórias que a vida nos dá. 

Um coração cheio – 7/7/2024

Selfie equestre.

Os pretensos sinais.

As coincidências, que na vida acontecem amiúde, são por vezes encaradas como sinais do universo ou, por outras palavras, uma forma de “o todo em que vivemos” nos dar o pré anúncio de algo que vai acontecer. Seja na nossa condição de grande amigo do patrão do outro, acionista, ou apenas demasiado bem rodeado para se importar com minimalismos, de um qualquer dia, encara-se o destino dado sem qualquer receio.

Uma música que toca e recordas quem te levou a ver o concerto ao vivo, um sonho em que acordas com a plena consciência de ter a cabeça enfiada num buraco do qual não queres sair, o encarar a amizade de outrora que insiste para que visites uma nova esplanada onde ela se sinta mais à vontade. Tudo pequenos detalhes que, sem necessidade de serem somados, te dão a aritmética do que podes ter.

Como não possuis Spotify premium és obrigado a escutar a música, sorris perante a recordação do buraco de outrora e vais espreitar a esplanada, para verificares se realmente a imagem publicitada corresponde à realidade. Uma espécie de exercício físico, aliado ao reconhecimento de uma cidade cuja construção há muito que ultrapassou o suportável, cumprimentando os amigos de sempre, capazes de arranjar sempre mais uma mesa, de frente para a ação, como forma de demonstrar o apreço mútuo.

Foram duas horas a caminhar mas podiam ter sido muito mais. Acima do exercício físico está a vontade de ter uma imagem permanentemente actualizada de como a cidade evolui e algumas pessoas também.

Retalhos de uma manhã a andar – 4/7/2024

A minha ideia de um ser supremo…

Tal como no “O ABC do Amor”, do Woody Allen, também aqui existiriam pequenos seres, dentro do nosso corpo, permanentemente em alerta. Ao contrário do episódio em que tudo se cinge ao acto sexual, aqui a totalidade do corpo humano era constantemente monitorizada, internamente, aferindo todos os níveis e, imediatamente e em tempo real, descobrindo a cura para as maleitas que afectavam o paciente monitorizado – seríamos todos pacientes e estaríamos permanentemente a ser diagnosticados.

A alegria – expoente máximo na medição da nossa caminhada humana – seria o diapasão pelo qual todos afinaríamos (numa espécie de “The Truman Show”, onde toda a realidade é idealizada para ser a ficção do actor principal). Tudo giraria à volta da alegria de cada um dos indivíduos, sem que invejas, ciúmes, ganâncias ou outros sentimentos menores influenciassem o desfecho do alegre momento de cada um, individualmente. Uma espécie de socialismo social, em que ao invés da economia seria a alegria a base do Estado.

Não haveria mortes, acidentes ou qualquer outro tipo de problemas que pudessem colocar em causa a alegria do indivíduo ou do todo, num equilíbrio só ao alcance de um juiz que, alegremente e ciente do poder da alegria, julgaria improcedente qualquer tentativa de destabilização do alegre status quo. A empatia seria a moeda de troca, com cada indivíduo a ter um saldo ilimitado, e a saída de cena uma opção que cada um tomaria, assim que achasse que a sua passagem por cá já tinha chegado ao nirvana que interiormente havia idealizado.

E depois da partida? Mercê de toda a monitorização, e feito o reset da memória, voltaríamos a ser colocados num outro espaço paralelo, enquanto éramos celebrados neste. Certos de que a passagem por cá foi apenas a afinação para a passagem para lá. Isso sim, seria uma divindade a ser celebrada, aperfeiçoada constantemente e, com uma alegria imensa, a servir de inspiração para gerações vindouras e existentes.

Divindades – 2/7/2024

As pessoas mais belas da vida.

O abraço é longo e apertado e o beijo sentido e dado com carinho e saudade. O diálogo não é comprido e, no entanto, tudo é dito. A combinação é feita, por entre ameaças não bélicas, e sorrisos de dois personagens igualmente culpados por essa falha. As despedidas são curtas mas completas, porque as expressões faciais ameaçam ser toldadas pela humidade da beira-mar.

Uma caminhada que começa, sob a voz de incentivo de quem a termina, e o humilde narrador a limpar o cisco do olho que claramente afectou a visão. Um último olhar para o mar e a sua cadência – de quem ora chega ora parte, a constatação do cansaço da distância percorrida. A subida por ruas pouco habituais, evitando ruas imaturas, e a vontade de querer encontrar soluções para todos os que padecem de problemas.

O passo rápido até uma água das pedras fresca, sob o olhar atento da mesa do lado – que gentilmente cede um lenço de papel, para que as lentes dos óculos possam ser limpas das agruras da vida. A empatia na hora de agradecer e o “de nada”, retribuído pela criança presente na mesa, tão inocente perante tantas adversidades da vida.

Num domingo qualquer, sorrimos. – 30/6/2024

Uma insónia parva.

Acordar de madrugada e perceber a futilidade do porquê – seja um bom sonho, um pesadelo com uma psicopata ou apenas para urinar – é algo que sempre me aborreceu. Porque estraga a cadência do sono, interrompe o ronco, desfaz toda uma série de ações interligadas que, em última análise, pode ser encarada como um sono com stress – quando o que se pretende do sono é precisamente o pleno alheamento de todo e qualquer stress.

Uma vez acordado, e dada a elevada massa muscular que ultimamente se apegou a mim – como um animal órfão a uma família de acolhimento – resolvi ir passear essa dita massa muscular, na tentativa de minimizar o sentimento, e caminhar para que o órfão possa encontrar outro corpo avantajado que o acolha. A caminhada madrugadora, feita para norte e até a um farol conhecido, resultou no abate de algumas calorias, no longo caminho para o equilíbrio entre as que consumo e as que queimo.

Chegado ao ponto de partida, e imbuído de um espírito de atleta olímpico, resolvi continuar até ao bairro piscatório e ver se havia saída de peixe – esse espectáculo tão antigo quanto a própria cidade e que foi o ponto de partida para que as pessoas se aproximassem do mar (pelo menos um dos pontos de partida). Cumprimentos a um amigo de infância – daqueles raros mas que nos enchem o coração, sempre que nos vemos – e, sentado no muro, constatei que o processo já tinha tido lugar.

Um rápido olhar pelo que ainda havia disponível – tal como na feira de Espinho, a melhor hora para comprar é na abertura, a constatação de que não havia nada que me fizesse palpitar o miocárdio, eis-me a caminho de casa após uma lembrança fotográfica. A constatação de que tive sorte com a meteorologia e cheguei tão seco quanto saí. 

Das caminhadas da vida – 29/6/2024

Os clientes mais atentos.

O rissol de carne.

A conversa até decorria normalmente, com decoro, e o discurso era fluido e sem falhas. O balcão tinha apenas duas pessoas, e eu observava uma delas, sendo que uma era bem conhecida e a outra uma bonita desconhecida que eu, obviamente sem querer, observava: os gestos, os jeitos, a postura e maneira de falar, as palavras que usava e a entoação que colocava. Sim, poderia ser considerado um stalking visual, tal o detalhe do observador e o cuidado da observada.

A moral e os bons costumes impuseram-se e, disfarçadamente, obriguei os olhos a deambularem pela montra da padaria, sem desligar o stalking visual mas, como um jogador profissional, tentando fintar aquela com quem estamos a jogar, sem que se trate de um jogo. Chegada a minha vez de encomendar, e ciente de que precisava de respirar fundo antes de o fazer, dei a vez a quem estava atrás de mim que, com uma certa cara de gozo, ma devolveu. 

“Um rissol de carne com fiambre, bem aquecido!”, exclamei enquanto apontava para o mostruário – que não continha mais rissois, para além de ser um pedido bizarro demais para ser verdade. A bonita desconhecida sorriu – não sei se por ter o último rissol ou por ter detectado que eu tinha perdido o fio do raciocínio ali. A conhecida deu uma gargalhada e a empregada do balcão sorriu, pois tinha assistido, de uma posição privilegiada, a todo o processo. Sorrimos todos e eu pude, finalmente e de maneira consciente, encomendar um queque com uvas passas…

O fermento expande a massa – 28/6/2024

Costa Nova, dizem.

Caminhadas por aí.

A única semelhança entre elas é o chão de madeira que cede um pouco perante os noventa e sete quilos do humilde narrador. Hipoteticamente, e como forma de motivação, gosto de pensar que elas cedem perante a minha vontade de abater esses noventa e sete…mas isso sou eu, que sou muito de auto-motivação! Mais dez quilómetros percorridos, numa cidade nova, com uma longa viagem de comboio para a alcançar mas a justificar plenamente o esforço despendido!

Chegada a hora de testar a água do atlântico, e ciente da diferença de temperatura entre o mediterrâneo e o atlântico, eis o humilde narrador dividido entre o fugir da água, logo após o mergulho, ou trincar a língua e fingir que é tudo semelhante. Optei por uma das duas e é tudo que tenho a dizer sobre o mergulho! Até a temperatura do sol é diferente e o vento, sempre ele, dificulta a rápida secagem que se pretende mas não se alcança.

A caminhada até casa, por entre caras conhecidas, a relembrar que esta é realmente a minha cidade. Revigorante o mergulho, secagem e caminhada mas melhor ainda o duche quente e a barba que fiz desaparecer. Limpo, acima de tudo.

Não foi fácil…

A pacificação do indivíduo.

Num estudo nunca antes visto, com um número limitado de cobaias, carecendo de validação da comunidade científica, a hora de conhecer a criação aproximava-se. Olhando para a pipeta que continha o resultado, respirando fundo e sorrindo por antecipação, o cientista revelou os resultados do longo processo de pesquisa tendo em vista a certificação.

Havia algo de introvertido na maneira como ele interagia, sinais de arrogância e inveja e, acima de tudo, um ar de superioridade e pleno conhecimento que desafiava o mais incauto ou inteligente dos interlocutores. A imagem que transparecia era de alguém no pleno domínio de toda a realidade da experiência, um ser que não carecia de validação científica para algo que antecipara, uma certeza absoluta.

Estabeleceram um diálogo, tendo por tema o estacionamento tão mal efectuado pelo interlocutor, que suscitou um sorriso tímido como resposta – o carro impedia a entrada para uma garagem de estacionamento mas, tratando-se de algo rápido, um gesto tão comum quanto o café logo ao acordar. Houve aquele contacto visual cujo significado é fácil de perceber, um cumprimento com as mãos em forma de “isso não importa” e o sorriso que se abriu perante um diálogo que não haviam coreografado.

Foram uns segundos mas ainda houve tempo para perceber mais um sorriso, testemunhado com um olhar por cima do jornal diário, que se tornou na minha melhor notícia do dia, com a benesse de nem sequer ter sido publicado – excepto nas nossas mentes! E o dia fluiu com uma naturalidade flutuante, ousaria dizer…

Memórias de outra esplanada – 25/6/2024

Bem enquadrado.

A fénix do moço.

Não renascida – porque jamais pereceu – mas, quando muito, que voltou com uma atitude muito diferente do passado. Sim, parece-me a melhor forma de descrever o sentimento vigente.

Cheio de discussões estéreis sobre futebol – que nem chegam a ser conversas, porque o fanatismo prevalece sobre a realidade. Acima do limite de tolerância para temas que em nada engrandecem o conhecimento e que, pelo contrário, adormecem os participantes numa letargia de ignorância e necessidade de aceitação do grupo para sobreviver.

Reinventado, é a melhor forma de o descrever! Fazendo tábua rasa de tudo e partindo para novas experiências do zero absoluto. Dizendo para si, e interiorizando também, que nada possui e que tem o dom de poder escolher o que pretende conquistar. Escolhendo os atalhos da vida e evitando os buracos que aprendeu a detectar atempadamente, procurando novos conhecimentos partindo da doce ignorância, a tentativa e erro como passatempo para alcançar o gozo – bom, mau, ou assim-assim. 

A alegria de conhecer semelhantes, o amor de voltar a dialogar com a saudade, a lágrima de alegria no reencontro de quem nunca deixou de estar, simplesmente estar. A partilha de diálogos de outrora, brevemente interrompidos durante anos, retomados como se segundos tivessem passado. O colher das rotinas boas de outros tempos e o reconhecer de novas memórias que pretendem ser vividas. De braços abertos para o conhecimento e de atitude fechada para o simples pastar em rebanhos e campos estéreis de todo e qualquer tipo de conhecimento ou progresso.

Culpado da mudança? Só o autor. O porquê da mudança? Por uma qualidade de vida mais sã. Perspectivas? Abocanhar conhecimento com quem sabe divertir-se a fazê-lo, a vivê-lo e, acima de tudo, a senti-lo!

Um gajo de apetites estranhos – 25/6/2024

O pretenso fotógrafo.

A fénix do moço.

Não renascida – porque jamais pereceu – mas, quando muito, que voltou com uma atitude muito diferente do passado. Sim, parece-me a melhor forma de descrever o sentimento vigente.

Cheio de discussões estéreis sobre futebol – que nem chegam a ser conversas, porque o fanatismo prevalece sobre a realidade. Acima do limite de tolerância para temas que em nada engrandecem o conhecimento e que, pelo contrário, adormecem os participantes numa letargia de ignorância e necessidade de aceitação do grupo para sobreviver.

Reinventado, é a melhor forma de o descrever! Fazendo tábua rasa de tudo e partindo para novas experiências do zero absoluto. Dizendo para si, e interiorizando também, que nada possui e que tem o dom de poder escolher o que pretende conquistar. Escolhendo os atalhos da vida e evitando os buracos que aprendeu a detectar atempadamente, procurando novos conhecimentos partindo da doce ignorância, a tentativa e erro como passatempo para alcançar o gozo – bom, mau, ou assim-assim. 

A alegria de conhecer semelhantes, o amor de voltar a dialogar com a saudade, a lágrima de alegria no reencontro de quem nunca deixou de estar, simplesmente estar. A partilha de diálogos de outrora, brevemente interrompidos durante anos, retomados como se segundos tivessem passado. O colher das rotinas boas de outros tempos e o reconhecer de novas memórias que pretendem ser vividas. De braços abertos para o conhecimento e de atitude fechada para o simples pastar em rebanhos e campos estéreis de todo e qualquer tipo de conhecimento ou progresso.

Culpado da mudança? Só o autor. O porquê da mudança? Por uma qualidade de vida mais sã. Perspectivas? Abocanhar conhecimento com quem sabe divertir-se a fazê-lo, a vivê-lo e, acima de tudo, a senti-lo!

Um gajo de apetites estranhos – 25/6/2024

O pretenso fotógrafo.

A juíza.

Anda pródigo em reencontros este solstício de verão! A capacidade de reencontrar pessoas, tão fundamentais de outrora, tem assustado quem não está preparado para tanta azáfama social. 

Talvez se tenham passado uns 26 anos, mais um ou menos um, mas partilhamos uma história de amizade e vida quase comum, por inerências que não cabe aqui explicar. O cognome juíza porque ajuizava melhor do que os desajuizados que a rodeavam e, mercê do bom humor e experiência de vida que possuía, sabia sempre qual o melhor caminho que, enquanto rebanho que se mantinha junto, deveríamos seguir.

Nunca ordenando, porque era uma mulher de consensos estóicos (não sei se o conceito existe mas reclamo para mim a patente, caso não exista), mas sempre colocando em cima da mesa todas as opções e, racionalmente, explicando o raciocínio para chegarmos a cada uma das soluções sempre certas.

Não houve cumprimento mas uma saudação discreta – talvez porque a ausência assim o impusesse ou porque simplesmente não soubéssemos como reagir – mas o contacto visual permitiu aferir que nos reconhecemos, nos saudamos e continuamos com as nossas vidas, sem que qualquer emoção transparecesse. Sem dúvida que a atitude correcta, pois ela nunca foi capaz de algo incorrecto. 

Foi bom ver que continua bonita, fiel aos seus princípios e senhora de si mesma. Bem haja tribunal de Espinho!

Pelas ruas da cidade – 21/6/2024

Tropeções.

Andava o humilde narrador nas suas caminhadas – no caso em apreço entre a baixa e a foz do rio – quando, mercê de um desvio para evitar uma transeunte em sentido contrário, sentiu que tinha perdido o balanço do corpo. Sem controle sobre o destino, e graças a uma intervenção da transeunte, foi salvo do acidente que o destino havia programado para ele.

Ergueu a cabeça – que, até então, estava focada em ver qual seria o ponto de queda, e viu uma cara conhecida. Sorriu, porque entre eles sempre havia existido uma quantidade inigualável de sorrisos e alegria, e ouviu-a saudá-lo com a expressão de outrora: Hello crazy Portuguese!

Ainda não refeito da surpresa, e a tentar disfarçar tal facto, respondeu com o seu Hello crazy Russian! Sorriram e, com um receio que não era comum neles, abraçaram-se a medo. Olharam-se, profundamente nos olhos um do outro, e trocaram dois beijos como expressão de saudade entre eles. 

Uns metros à frente da Alfândega do Porto, num passeio que até é fácil de percorrer, o mais difícil aconteceu – curioso como o destino se impôs perante um obstáculo facilmente ultrapassável. Uma troca de palavras e contactos, toques ternos como recordação de outros tempos, o recuar até ao dia em que nos conhecemos e o dia em que tivemos de nos separar. A República da Irlanda como cenário de um amor entre um cidadão português e uma cidadã Russa, o poliglota e a cientista, o cozinheiro e a barista, o homem das caminhadas e a mulher do ioga…

Uma lágrima de amor escondida e a promessa de um contacto para muito em breve.

Tropeções de alegria – 20/6/2024

Dias desiguais da rotina.

Fruto da evolução natural das coisas, em que cada pequeno pedaço de família faz crescer um novo ramo que deriva daquele que fazes parte, eis-nos juntos para mais uma celebração. 

Os pais da outrora criança, que só me recordo como namorados desde que existo, a concederem a mão do ruivo mais novo a uma Carlota que lhe cativou o miocárdio.

Se ceder um ruivo custa então imagine-se a cedência de dois ruivos que, fruto da minha velhice, sempre recordarei com um sorriso que é a soma perfeita do amor dos progenitores (algo imutável que presencio com uma enorme alegria).

Como qualquer celebração, e esta não podia ser diferente, foi um exercício de alegria. O sorriso dos progenitores é agora visível em ambos os filhos e um certo excesso de baba – sobejamente justificado – é visível nos rostos da Teresa e do Pedro. Como se ambos os filhos estivessem tão só e apenas a repetir a aventura amorosa que tem sido protagonizada pelos pais – naturalmente enamorados e de mãos bem dadas e apertadas para superar qualquer adversidade.

A orvalhada afectou-me as costas – obrigando a que os meus dotes de dançarino de renome mundial ficassem por exibir – mas também temperou toda a cerimónia que, num misto de emoções desprovidas de horário, se prolongou até ao nascer do dia. Por entre enjoos – sempre atribuíveis a uma condução de montanha mais agressiva – fizemos adormecer alguns hectolitros com que nos fomos hidratando e, fruto da alegria vivida, deitámos-nos com o sentimento de que a festa continuava em sonhos. E assim será!

Do que me lembro, foi assim… – 16/6/2024

E a Carlota o António levou…🙌❤️

Peça por peça.

O banho tomado muito fora do horário habitual, dentes escovados entre a colocação e remoção do champô, corpinho bem ensaboado e superiormente raspado de impurezas, muita água corrente a levar todas as porcarias acumuladas desde o dia anterior.

Cuequinha e meias a condizer, etiquetas da lavandaria removidas da vestimenta, sapatos brasileiros a saírem à cena, sorriso de quem revê uma barba feita no barbeiro e constata que teria conseguido fazer bem melhor. O pêlo incómodo, que se nota perfeitamente ter uma personalidade narcisista, removido para não perturbar o fotógrafo de serviço.

Gravata com um nó soberbo, também graças ao corpinho perfeito que vem rodear, mais um Nicotinell para ajudar ao tranquilo contemplar da paisagem. Um outro casamento que passa e a constatação de que o Gabo foi a leitura ideal para te acompanhar. Um passeio junto ao local da cerimónia – com um ar de quem verifica os últimos detalhes, um panado como bucha para entreter até à hora da cerimónia.

Cheguei cedo demais – 15/6/2024

Vamos lá casar os noivos! 💪

Gripes e afins.

O corpo acorda estranho e teima em não comunicar-te o que com ele se passa; numa espécie de “fazer caixinha” esconde-se – como se tivesse vergonha – e aguarda que sejas tu a depreender o que se passa.

Meio desorientado, e com um corpo que parece pesar mais do que a realidade, compras o jornal e instalas-te no sítio habitual para uma tranquila leitura. Relembras o porquê de escolheres a esplanada assim que um ser entra e empesta o ambiente com um cheiro de coco mais vincado do que um coco real.

O café e a água aterram na mesa sem que haja necessidade de os pedir e a leitura faz-se de forma célere e bastante tranquila. Levantas o corpo e sentes cada osso do corpo a queixar-se, temes o pior e apertas o casaco apesar dos 22 graus. Pagamento feito e há que percorrer os cem metros até casa, numa saga que mais parece que estás a subir ao pico do Evereste.

Tirada a temperatura constatas que estás com uma valente gripe e que o melhor é curá-la, antes da próxima incursão na sociedade. Os olhos doem e concordam, o edredão cobre-te e partes para o sonho de dias de convalescença.

Foi só um friozinho nos pés – 3/6/2024

Faltou o chapéu…

Talvez por ser dia de feira semanal.

Depois de um domingo de doze horas de trabalho – a passear, a fotografar, a comer bem e a passar por caminhos municipais que nunca sonhei que um dia pudesse encontrar, eis que a cidade recebe a feira semanal. Talvez por querer continuar a trabalhar, no seguimento de um domingo de descanso intenso, fujo para os territórios de onde provém a maior parte dos clientes da feira e consigo encontrar a tão necessária qualidade de paz que a cidade não providencia. 

Ironicamente, ou talvez confirmando a decisão tomada, sou o único passageiro que sai do comboio e, após confirmar isso mesmo, dou início ao meu passeio de descanso produtivo, como resolvi apelidá-lo. O objectivo é não ter objectivo e simplesmente deambular pelo destino enquanto, com uma espécie de costela de turista, vou procurando motivos novos para fotografar. A beleza do processo é que me permite conhecer um destino novo enquanto descanso activamente. Fica a sugestão para quem quiser experimentar.

A aplicação vai indicando os quilómetros percorridos e os olhos e corpo vão aferindo o quanto querem continuar ou parar. É um processo democrático, em que racional e emocional definem juntos qual a ementa de cada um dos passeios, sem que dois percursos se repitam. Respira-se fundo, há enganos propositados, sorrisos perante algo novo que se encontra, desabafos perante algo menos cuidado com potencial para estar bem melhor. O processo é interno e não carece de validação externa, é um jogo de gozo puro – apenas e só!

É só quando o pôr-do-sol se aproxima que tudo pára: câmara no tripé, acerto o ISO, shutter e a abertura e aguardo o momento ideal para disparar uma série interminável de fotografias de maneira a poder escolher a perfeita, tal como o dia, que começa com o nascer do sol e acaba com ele a pôr-se. Uma delícia que não engorda!

Dos passeios que dou – 27/5/2024

Deslumbrado com a natureza.

Aquele domingo para conhecer o país.

De rotineiro pouco tem, salvo a periodicidade quinzenal, e o facto de o destino ser sempre diferente incute uma curiosidade que tira o sono com a perspectiva do que vais encontrar a seguir. A partida é feita quando a noite ainda está a terminar, para alguns, e o dia começa, para outros. Não é fácil encontrar locais abertos para as coisas triviais da semana – porque é domingo – mas as que encontras reúnem, no seu íntimo, detalhes que não descortinas na rotina de segunda a sábado.

A primeira paragem é feita num local de pão famoso – Padronelo – e o facto de não podermos homenagear as Clarinhas de Fão, como nas incursões anteriores, é trocado por umas tartes de chila da região que colmatam, logo a abrir, a saudade. Digeridas as tartes, e comido um pão tradicional, continuamos a descoberta da margem direita do Douro até “desaguarmos” na Régua que, mercê de uma festa local, estava com um trânsito caótico.

Por entre paragens – de observação e cliques fotográficos – prosseguimos para a Adega da Ti Palmira, em Almodafa, que nos presenteou com um maravilhoso bacalhau na brasa que recomendo vivamente a quem pretenda um bom almoço com uma vista deslumbrante (há que reservar antecipadamente). A digestão é feita em Ucanha, por entre pontes, rio e viúvas. O sol está bastante quente; ofereço-me um café e uma água fresca enquanto o companheiro de luta fotografa as belezas locais em tons de preto e branco.

Continuamos a regressar e, mercê de um telemóvel que não carregou telepaticamente, somos obrigados a recorrer a uma outra aplicação que nos indicou o caminho (?!) correcto. Imbuídos da certeza do que a aplicação indicava, e na falta de um céu que permitisse o uso do sextante que também não possuíamos, fomos dar a um caminho municipal cujo último uso parecia recuar ao tempo da ocupação romana. 

Sensivelmente a meio do caminho encontramos um senhor de idade que, num misto de espanto e pavor (por ver o seu refúgio descoberto) lá nos indicou o caminho de volta para a civilização. Sempre em redutoras, e cruzando os animais que pareciam igualmente espantados, voltamos a encontrar a N222 para chegarmos a casa.

Por entre pinheiros, maias, muitas cerejas (que só apetece comer), viúvas, ciclistas, paisagens naturais maravilhosas e uma gastronomia de fazer água na boca, cumprimos mais uma incursão no interior de um país que merece que o saibamos explorar muito mais e melhor. Um passeio que recompensa, por todos os detalhes que une, e que nos engrandece tanto quanto a melhor das viagens que já tenhamos feito!

A desbravar Portugal – 27/5/2024

Estágio motivacional.

O acordar cedo como passo fundamental para o total aproveitamento da jornada que se adivinha, o questionar o sonho como análise e transposição do subconsciente para o consciente, a interrogação com um sorriso envergonhado, a cara de satisfação de quem sabe ser possível mas prefere encarar como impossível e partir daí para o total conhecimento – numa espécie de analogia com o reconhecer a nossa ignorância como ponto de partida para o conhecimento.

O atravessar da pequena cidade enquanto recorda o tempo em que, acordado de madrugada, resolveu fazer o mesmo numa “pequena” cidade brasileira de um milhão de habitantes e, no regresso e quando já todos pensavam o pior, foi recebido pelos anfitriões com um misto de satisfação (está vivo!) e incredulidade (porque você fez isso? Fui comprar pão!)

O sentir o acompanhamento dos pássaros, do dia a despertar, do silêncio que o início de um novo dia providencia. Num passo de turista – a visualizar cada pequeno detalhe de uma cidade que tanto tem mudado – ouvindo o ruído do motor eléctrico do carro que transporta o pão, cumprimentando o condutor enquanto acelera o passo para poder comprar algum do pão quente que agora chega. 

O regresso já com o jornal do dia, o intensificar do ruído dos pássaros – será que me seguem por umas migalhas de pão? – o largar o pão em casa e ir para a esplanada da leitura. A leitura atenta dos acontecimentos passados, o esmiuçar das opiniões e o debate com a minha opinião. O alegre virar de página e a tinta nos dedos, o café curto numa chávena fria a evitar as lágrimas de quando a chávena vem escaldada.

O constatar e debelar de uma bolha que a caminhada de ontem me deixou, a nota mental para que o máximo de apoio seja feito com o pé oposto. O reconhecer que a imagem do sonho não desapareceu porque o consciente o impede. O sorriso maroto como expressão de liberdade total numa galáxia sonhada mas que é tão real quanto o primeiro gole de café.

Um profissional do bem sonhar – 25/5/2024

A abstração.

Começa por ser algo que, quando a experimentamos pela primeira vez, nos envergonha – o sentimento de ter estado ausente quando havia alguém ou algo presente. Brindado com frases como “Ouviste o que eu disse?” ou “Bem vindo de volta!” – apenas conseguimos constatar que estivemos ausentes. Com o passar do tempo, e sem necessidade de um esforço intenso, começa a ser algo a que se pode recorrer, sempre que necessário, e/ou por pura distracção.

A maturidade talvez esteja associada ao seu desenvolvimento (carece de estudo científico e eu não estou para aí virado) ou talvez seja apenas a capacidade que temos de viajar sem sair do lugar, não faço ideia. A única certeza que tenho é o quão reconfortante é e o quão saudável se torna – como se de uma droga se tratasse mas sem a necessidade de envolver narinas, pulmões ou veias. Uma espécie de homeopatia cerebral!

Trabalhado, de maneira a envolver o meio que te rodeia, é dos mais belos exercícios que podemos fazer: a mente vagueia, os olhos enxergam a paisagem, os pés conquistam o terreno. Enquanto exercitas o corpo, vais aliando imagens dos locais por onde passas, sendo que a tua mente só regressa desse vadiar intenso de abstração se algo realmente importante o justificar. Até sentes o retorno, como se abrisses um portátil e ele demorasse poucos segundos a estar num estado de prontidão total.

A profissionalização traz-nos a capacidade de o praticar sempre que queremos e, mercê desse nirvana do processo, sentimos o cérebro na sua totalidade – lá longe, durante os exercícios físicos necessários a quem pretende seguir a via profissional, e bem perto – sempre que somos obrigados a regressar ao mundo real. É o equivalente ao termos as férias anuais, para recuperar do esforço despendido durante o ano laboral.

A capacidade de interligar o alheamento a memórias é o degrau mais elevado desse conhecimento, apesar do nirvana do passo anterior. De cérebro alheado, abstraindo-nos de tudo e de todos, vamos recordando momentos realmente únicos que conquistamos. Limpos dos momentos anteriores ou posteriores, os neurónios focam-se no esplendor do que outrora sentiram, sem saber o que a eles conduziu, numa espécie de saborear a mais deliciosa refeição sem pensarmos em tudo o que conduziu a que aquela refeição específica fosse considerada para ser recordada no teu exercício de abstração…e assim sonhamos acordados.

Sou abstracto, está visto! – 22/5/2024

O céu, de onde caiem as estrelas.

Ainda e sempre a chuva.

Nadando entre as gotas de água, numa cidade qualquer longe de casa, sentindo o vigor de cada braçada e o ímpeto proporcionado, antagonizando os transeuntes que não sabem nadar e a quem falta a racionalidade para aprender, com um sorriso desmedido – que mistura um esgar de dor pelo esforço despendido e o orgulho pelo caminho ultrapassado.

Ciente de que não há sacos suficientes para recolher tantas fezes espalhadas pelo passeio da vida e certo de que, caso o número fosse suficiente, haveria um protesto social para que as fezes fossem autorizadas a permanecer, nesse mesmo passeio, até “reencarnarem” em algo que a ciência não prevê mas que mentes de merda antecipam – colocando o ónus posterior numa futura invenção da natureza, já de si cheia da convivência imposta com o ser humano.

Caminhando, por opção unilateral e obviamente própria, só. Observando o que fere a visão sem permitir que o comentário surja, desviando-se de obstáculos como um perseguido se desvia de uma perseguição policial, reclamando consigo – e só consigo – o quão degradado e podre o ambiente está, ouvindo mais um escarro enquanto acelera o passo para superar as adversidades.

Desaguando numa foz só sua, atracado à sua marina, com as águias soltas para não permitir a aproximação de quaisquer gaivotas, com o motor ao ralenti, verifica os cordames e desliga o motor, desce à cozinha e encontra um livro, sobe ao convés e, sentando-se no cadeirão com vista aberta para o mar, exclama “Agora vou navegar na leitura.” e parte, para uma galáxia distante, sem que o corpo abandone esta.

Regressa e olha-se no espelho, não reconhece o reflexo, interroga-o e só quando responde a si próprio constata que voltou uma pessoa diferente. Sorri, num abraço fraterno com a imagem reflectida.

Chuva na moleirinha – 21/5/2024

Oceano Atlântico.

Os pássaros.

Sentado na sua cadeira, na varanda exterior existente na traseira da casa, pensava. Olhava cada pássaro que ali pousava, para abastecer-se de uma migalha ou outra de pão, e interrogava-se sobre como seria ser um pássaro. Em jeito de inveja, pensou no quão gratificante deve ser ter a possibilidade de voar e conhecer novos caminhos, lugares, cidades, mundos. Replicar aquelas viagens pela Grécia, Brasil, Argentina e atravessar o país, com uma vontade enorme de viver a vida de um local, muito embora não passasse de um turista com apetência para viagens solitárias – sem destino planeado, sem rumo, só dizendo que tinha errado no caminho se a estrada fosse sem saída e, até nesses momentos, saía do carro para fotografar o momento para mais tarde recordar e reconhecer a beleza de só ter parado por impossibilidade de seguir. A possibilidade de ser surpreendido, como aquando da viagem através do Peloponeso, em que o dono do restaurante onde parei se recusou a servir-me e me convidou para a mesa onde todos almoçavam, após o serviço de almoços ter terminado. Momento único que, para sempre, guardarei como sinal da elevada simpatia e boa disposição do povo helénico.

Imagino-me a voltar à aerogare de Buenos Aires, a voltar a ver o pôr do sol sobre o Rio de la Plata, a bater as asas até à Antárctida – com o devido cuidado e respeito pela fauna local (para não ser comido), por entre pinguins e albatrozes, a voar acima da Passagem de Drake – fotografando, com visão de falcão, todo o poder do mar daquele estreito – a observar a maneira de ser e de agir de cada um dos pinguins – individualmente, num esforço por me fartar – para, logo depois, voar até à África do Sul e visitar a Estie – não correndo o perigo de ser reconhecido mas sem deixar de lhe esboçar um sorriso. Provavelmente fazendo uma escala em Madagáscar, para um encontro – ao mais alto nível – com o Rei Juliano e os seus descendentes, voando depois até ao Bazaruto, onde pousaria, no topo da duna com vista para o Índico e para o lago dos crocodilos, apenas apreciando a beleza da natureza. Partiria, assim que saciasse o desejo pela beleza local, rumo ao Kilimanjaro, para respirar fundo o ar da montanha. Sentiria o local até sentir nas penas o frio. A etapa asiática começaria aí, já abastecido de um farnel que me permitisse sobreviver no continente da comida estranha. 

Mais pesado com o farnel, mas igualmente motivado, só aterraria no ponto mais alto da Praça Vermelha a deliciar-me com a vista. Percorreria, num ritmo frenético, todo o território russo – do mar do norte até Vladivostok – a tentar extrair o máximo da imensidão de beleza que o país tem. Com muito cuidado, desceria para Sul e visitaria a China, o caminho de Ho Chi Minh, sempre apreciando a vastidão dos arrozais e a beleza dos jardins, plantas e cores. Evitaria passar muito tempo nos territórios mais marcados pelo belicismo, sem deixar de apreciar a arte persa e a beleza dos seus territórios; seria uma circunferência enorme em voos, preparando a passagem para a América do Norte, via Alasca, onde faria questão de conhecer toda a beleza branca – de Este para Oeste. Os parques nacionais americanos seriam todos esmiuçados e aterraria no cimo da Golden Gate. Apontaria então o bico para a Nova Zelândia e Austrália onde embarcaria numa excursão privada de um só pássaro para conhecer esse maravilhoso continente. Seria assim que bateria as minhas asas, como se fosse uma auto caravana voadora, com um apetite voraz por ver, viver e fotografar sem que nada fosse publicado, seria o meu voo secreto. E tu, também tens segredos?

Se eu tivesse asas – 18/5/2024

Voos rasantes.

O carregador da bateria.

Havia passado bastante tempo, desde a última carga, mas a verdade é que o processo tinha tido sempre contratempos – ora o carregador tinha oscilações na corrente, ora o tempo de carga não era o anunciado, ora a reserva não era cumprida conforme havia sido contratualizada. O carregador, apesar de ser o mais apetecível (por uma série de detalhes que o tornavam único), tornou-se um descarregador face aos inúmeros problemas que causava. Tinha características únicas, no que numa vida, apelidaríamos de parceiro ideal mas, apesar das inúmeras virtudes, teimava em comportar-se de forma a trair o princípio pelo qual existia, no que numa vida, chamaríamos de auto-sabotagem. Parecia querer ter vida própria e jamais ser cooperante.

Chegado a casa, e ciente da necessidade de recarregar as energias, optou pela sua tomada de sempre – no fundo da cama, com a extensão a permitir que continuasse a escrever – a parceira ideal que, apesar de não permitir que transitasse, lhe dava a carga necessária – com o complemento proximidade e sem a azáfama social de um carregador inquinado. O correspondente, na vida, ao “mais vale só que mal acompanhado” que, no sentido que para ele fazia, correspondia a tempos de reflexão e escrita. Com o sol a aquecer-lhe os pés, com a chuva a despertar a preguiça, estava um devoto na arte de retemperar-se – não que se obrigasse a tal, mas tão só e apenas porque só totalmente energizado é que fazia sentido embarcar em novas aventuras.

Desligado o carregador sentimental, e tendo transferido a energia para o lado intelectual, virou-se para a escrita de uma aventura que, apesar de descrever um cenário fictício, tinha muito do que era a sua própria vida. O azul e branco grego, os jogos de poker apoiado pela Stars and Stripes, o Vic e a Union Jack, a Ordem e Progresso com aquele mês maravilhoso, as cataratas e os estádios, a Rússia e o Eddie Vedder, a África do Sul e a melhor viagem de autocarro de uma vida, o amor de um casal recém-casado, a sorte de aterrar num aeroporto no dia anterior a um atentado. Momentos da vida ficcionados para esconder identidades mas não factos.

O plano era descansar tanto quanto um profissional do descanso ousaria fazer e, sentindo-se a caminho da profissionalização, sorriu com o quão bom tem sido este caminho de amor próprio.

O “narcisismo” de nos sentimos bem – 15/5/2024

O eterno carregador energético.

Respirar fundo.

Rodeado de verde, com um belo curso de água a passar frente a mim, levantando a cabeça para ver para onde ela se dirige. Ao fundo, num vale que nesta altura é verde e amarelo (das maias), vejo o grande rio que a água forma e, rodeado por algumas casas, percebo a sua real dimensão. Não que precisasse das casas para aferir a grandeza do rio, mas tão só porque as casas permitem, na sua pequenez na escala visível, melhor dimensionar a grandeza do rio, no seu todo. 

Sinto-me pequeno na escala e respiro profundamente, até me sentir gigante por ter a oportunidade de visualizar a obra de arte que me rodeia. O olho que tudo descortina reparte a imagem do todo em pequenos pedaços de beleza e o coração parece reagir com um batimento extra (ou sou cardíaco ou um emocional de merda). Fotografo o que vejo, revejo a imagem no ecrã da máquina fotográfica, apenas para constatar que lhe falta o sentimento.

A tentativa de aprisionar a paisagem fica aquém do que em mim ela provoca. Utilizo o Google, para tentar encontrar uma máquina que entenda o sentimento, e os resultados não correspondem à expectativa. Tento outros motores de busca mas os resultados são igualmente frustrantes…não há um produto, com inteligência artificial ou sem ela, que capte sentimentos. Bolas, pensei, sem conter um sorriso interior pelo simples facto de ser humano e conseguir obter um retorno emocional imediato do que visualizo.

A sorte de termos belas paisagens – 14/5/2024

Tenho que fazer uma dieta!

Os pretensos fotógrafos.

O planeamento começa no dia anterior e, rodeados de mapas de locais a visitar, estudam-se os melhores pontos de entrada, os melhores trilhos, as horas ideais em termos de luz. Tal como Napoleão, sabemos onde as melhores batalhas se vão travar, onde podemos encontrar munições, o local das trincheiras mais fortes. 🫣

Obviamente os mapas são, na realidade, um lanche idealizado por um dos fotógrafos, os pontos a visitar são a junção das memórias dos personagens e o cenário bélico não passa de uma subtil referência aos melhores locais para salivar e comprovar a maravilhosa gastronomia local. 🤭

Sete da manhã e já estamos a caminho, atravessamos a porta do parque uma hora e meia depois, as primeiras fotografias são tiradas com os telemóveis. Outra paragem, abre-se a mala do carro, as máquinas fotográficas aparecem como ferramenta fundamental. “Dá-se tiros”, expressão usada entre os que compõem a excursão, recebo apoio para obter os melhores ângulos de luz, reunimos todos sempre que alguém encontra algo diferente. 👌

Há pessoas que descansam de maneira diferente mas, para mim, este é o oxigénio que me limpa os pulmões da vida! Com a natureza no seu esplendor, em boa companhia e com camaradagem, com feijoada e bacalhau e um “ligeiro” pudim de dois andares que complementa a refeição. 🙌

Retalhos da vida de um eterno amador – 12/5/2024

A melhor pessoa do mundo.

A tarefa era simples e requeria que eu atravessasse a rua e entregasse uma bola de plástico aos alunos que com ela jogavam. O trânsito era semelhante aos finais dos anos 80 e só um carro circulava, ainda longe.

A bola veio-me parar aos pés e, consciente dos meus dotes futebolísticos, peguei nela com a mão esquerda. Após notar que era de plástico, apertei-a e, tranquilamente e com tempo, dirigi-me a uma multidão que me indicava o caminho a seguir.

Vários braços ao alto, pedindo que a bola lhes fosse entregue, o que me fez recuar até aos anos 70 e perguntar “Agora pode-se jogar à bola?”. Uma jovem respondeu que era óbvio que sim e eu devo ter feito uma cara de espanto. 

Afirmei que, no meu tempo, tal não era possível e ela, de resposta rápida e racional, disse que eu devia ser do “antes do 25 de Abril”. Devolvi a bola e escutei um “Você é a melhor pessoa do mundo!”. Sorri, com a consciência de quem sabe que tal não é verdade, mas não deixei de responder “Aquela foi a minha sala de aula.”

Parti, com a consciência de dever cumprido, e ainda consegui ouvir o grupo gritar “Muito obrigado!!!!” Não foi a mais hercúlea tarefa da vida mas os agradecimentos fizeram-me ter confiança nas gerações futuras!

Hidratado e contente – 8/5/2024

A esplanada das folhas.

A vista é para a estrada de uma vizinhança amplamente conhecida e a sombra provém de uma das poucas árvores poupadas pela besta quadrada que outrora presidiu aos destinos da cidade, os cumprimentos surgem naturalmente, o empregado de mesa adivinha o teu pedido. Há uma cliente que ajuda na gestão – levantando a louça e emitindo a sua sonora opinião acerca dos clientes que a deixam na mesa (a louça, não a cliente), assim que os clientes abandonam o local. Adoro, na minha mesquinhez humana, esses momentos: a honestidade vem à tona e arrisco – propositadamente – deixar a louça, pelo simples prazer de mais tarde ter que ouvir as considerações que teceu nas minhas costas.

Após ver o City of Angels, uma vez mais, consegui finalmente perceber que a biblioteca é em São Francisco e coloquei na agenda “a visitar”. Há algo de enigmático naquelas varandas viradas para a entrada – de arquitectura tão semelhante ao MOMA, mas com uma conotação muito mais interessante, porque profundamente sentimental. Já consigo ver o filme com um sorriso, com um sentimento alegre e profundo, de quem sabe que há realidades que extravasam o imaginário das películas. Não digo que foi o que o doutor receitou mas encaixou e encantou, neste momento específico da vida.

Sempre a evitar multidões e a delinear novos percursos para trilhar. Não com um sentido de ter que cumprir mas com um sorriso aberto de quem tem a possibilidade de os caminhar e, de forma utópica, conquistar. Deixando os olhos desfrutar para, de seguida, tentar com a câmara fotográfica captar – um alegre amador na arte da fotografia, almejando obter a minha percepção do que me rodeia, sem que qualquer valorização obtenha ou sequer a busque. Deitado, com os pés a apanhar sol nas meias, absorvendo uma temperatura que não é a real mas que entretém, num misto quente de adormecimento e satisfação.

Sonhos de uma tarde de primavera – 6/5/2024

A inveja boa.

Sempre foi um tema de conversa entre nós porque somos um grupo de pessoas que sabe debater e obter conhecimento do resultado dessas conversas. A inveja boa traduz-se no querer copiar do modelo de outrém algo que achamos melhorará o nosso, era assim que o víamos e vemos. Afirmar gostar tanto de algo que só conseguimos visualizar o nosso futuro com esse algo incluído nele.

Não conhecia o recém-nascido, precisamente porque é recente, e conhecê-lo foi o conseguir destrinçar o melhor de cada um dos progenitores – uma alegria imensa, porque ambos possuem virtudes incomparáveis que tanto me ensinaram. O jeito de viver, a observação atenta de tudo o que o rodeia, o falar sozinho ao invés de se queixar, o sorriso muito lindo e aberto para com todos os que com ele interagem. Brilhante a forma como, em apenas cinco meses, já visualizamos um pequeno adulto em construção.

De coração cheio pela visita, tentando sempre não pisar nenhuma mina no terreno em que o dia-a-dia se desenrola, temendo que algo pudesse, de alguma forma ou feitio, não estar à altura do quanto significam para mim, mostrando um pouco da cidade que, para os visitantes, é demasiado pequena para sequer se chamar cidade. Partilhando segredos que só intimamente podem ser revelados, ouvindo com atenção os detalhes a que um recém nascido obriga.

Uma lágrima escorrendo na partida, escondida por uma chuva que teimava em cair, um orgulho enorme pela sorte que o mundo providenciou na oportunidade de vos ter conhecido. Obrigado trio maravilha, voltem sempre!!!

A saudade é o sonho do reencontro – 5/5/2024

Vamos almoçar.

O convite era inocente e despido de segundos sentidos – como as pessoas honestas tratam, nesta vida – e a resposta não surpreendeu ninguém! “Claro que sim, vamos nisso!” Obviamente, não fazia a mínima ideia onde ficava Pitões das Júnias, mas o detalhe era irrelevante! Havia um convite para almoçar e um almoço não se recusa!

O despertador tocou às 5 e meia da manhã e ainda não havia luz natural. O duche foi tomado no maior silêncio e os panados do dia anterior colocados nos pães que descongelaram pelo caminho (a “bucha” da manhã), dada a hora de inicio das “hostilidades” do dia. A partida foi feita com os primeiros raios de sol sobre a cidade e, assim que entramos na CREP, substituídos por um nevoeiro cerrado…aquilo prometia!

Chegados a Chaves, e mercê de um erro imperdoável, não compramos uns pastéis locais (daquelas coisas que nos perseguem até ao fim dos nossos dias). Saímos para umas fotografias rápidas e partimos em direção a Vilar de Perdizes. Imbuídos de um espírito de sacrifício (que não envolve animais, entenda-se) percorremos a distância sem mais demoras ou paragens.

Chegados ao local de culto do oculto eis que ainda se sente no ar o sangue do dia anterior – tratando-se de um domingo, equivale a dizer que ainda corre no ar um aroma de cerveja morna, das hostilidades tardias do dia anterior. Prosseguimos, com cuidado…recolhemos provas fotográficas, tivemos diálogo a requerer linguagem gestual, procuramos os melhores planos para capturar a beleza do local.

Partimos, rumo ao restaurante Casa do Preto, comemos que nem abades e demos uma enorme volta fotográfica, para melhor digerir a “singela” refeição. Invadimos Espanha, com o propósito pacífico de fotografar os melhores momentos, reentrando em Portugal, pelo Lindoso, com o sentimento fotográfico cumprido! Mencionei a falha gastronómica cometida em Chaves e imediatamente surgiu a alternativa pastéis de Fão (clarinhas, para os mais íntimos).

Chegados, de barriga cheia, mas ameaçando devolver os pastéis já digeridos por excesso de açúcar em pó! Vivos, cansados, com um sorriso que espelhava o sentimento de dever cumprido!

Pelos caminhos de Portugal – 29/4/2024

As pessoas belas da minha vida.

O acordar cedo, para evitar a confusão esperada, o encontro a tempo e horas e a união de vontades, o abraço matinal – tão duradouro quanto tudo o que nos une, a partida rumo ao que esperamos seja o definir de um novo ciclo para o clube a que pertencemos.

O comboio como meio de transporte, o Alameda como WC público escolhido, a mensagem enviada para o grupo de primos para uma primeira tentativa de tocar o reunir para o acto eleitoral. Estivemos todos – e viva as caras novas!!!

A oportunidade de ser empurrado para uma pessoa com tantos pontos comuns, sem drama, com uma personalidade e maturidade de adulta, o gaguejo nervoso como resposta, o rosa das bochechas alterado, o filho – a gozar com a situação – ri-se, com um piscar de olho cúmplice.

A volta para a ruralidade, o desmobilizar ao cimo da rua, o coração que treme. Um arrepio na espinha, palpitações que parecem incomodar os transeuntes, a vontade de dialogar mais. O telefonema do primo, que intermediou as “hostilidades”, a preciosa indicação sobre onde estaremos juntos novamente.

Um dia ímpar, em família – 27/4/2024

Dia da liberdade.

Dizem que acordei chateado e que terei pedido silêncio, para poder dormir. Há uma névoa, com pequenos detalhes que recordo desses tempos: a sala cheia, Chico Buarque a tocar, discretamente no gira-discos, ouvidos colados ao velhinho (já na altura) Blaupunkt de válvulas, a televisão a preto e branco que não acompanhava a velocidade do rádio (ver para crer), o que causava apreensão entre a alegria que já se vivia.

Disseram-me para não me preocupar com o dia seguinte “de escola” porque a história estava a ser reescrita, alguém – recentemente – me recordou essa história bem como o contentamento que o meu pai, maioritariamente reservado em termos políticos, agora exibia. 

Relembro, muito mais facilmente, os momentos de confraternização que se seguiram, os comícios em pavilhões, as férias na Fuzeta – rodeado de tantos ilustres que haviam participado activamente na revolução, o sentar a observar e questionar o que seria uma revolução, muito embora já agradecido por todas as voltas que demos pelo país. Nesse aspecto, senti mudança, liberdade sob a forma de as pessoas agora poderem estar, conversar abertamente e celebrarem esse facto, apenas estando presentes.

Mais tarde na vida tive a oportunidade de conhecer ainda mais ilustres – mercê da militância na Juventude Socialista – que olhava e idolatrava, pela coragem sem temor, pela ousadia de pensar livremente, pelo sorriso que ostentavam – como se um sorriso livre fosse a maior riqueza do ser humano. Talvez seja!

Venham muitos mais 50’s!!!!

É a ideia que tenho, preservo e celebro – 25/4/2024

As duas últimas covas.

A cerimónia estava marcada para o início da tarde mas, mercê de uma profissão com imponderáveis temporais, foi adiada uns 30 minutos – tempo suficiente para um café e um escovar de dentes. 

De botins colocados, e chegada a hora marcada, eis-me deitado, numa confortável cadeira gerida pela doutora responsável. Recordamos histórias da nossa geração – uma espécie de anestesia antes da real anestesia e, quando dou por mim, o queixo do lado direito já não dá sinal de vida.

Raspa-se, broca-se, limpa-se, aspira-se, seca-se, insere-se massa, seca-se novamente, até a cova estar novamente coberta e livre da cárie que, embora pequena, podia vir a dar problemas.

Mais umas histórias recordadas, mais umas gargalhadas trocadas, uns sorrisos como forma de recordar e demonstrar carinho por momentos ímpares das nossas vidas.

Beijinhos de despedida, agradecimento por todo o empenho no trabalho feito e eis-me, de queixo direto caído, mas sorridente como sempre.

A cáries removidas não se olha o custo – 24/4/2024

A excelência do dia.

O rever a melhor amiga, o conhecer um novo sujeito, o capturar a imagem de um melro a cantar, o dar miminhos a um orelhudo que só conhecia de vista.

O ajudar o melhor amigo, ouvir as aventuras mais recentes, sentir o amor por algo herdado. A leitura comum, a troca de impressões sobre uma aventura muito arriscada, que nos é descrita pelo grande Colombiano.

A confirmação do que não era uma dúvida, o ignorar de um ser abjecto, o foco na andorinha que passa. 

O melro que te persegue, a rôla que te saúda em busca de uma côdea de alimento, os gatos que surgem a perseguir o cheiro do peixe acabado de pescar.

Dias de natureza – 23/4/2024

O método.

Busca certezas dentro de ti e, assim que as alcances, batalha para as tornar a tua realidade. Se envolver mais pessoas, busca a certeza de que é a pessoa cuja tua certeza determinou e, imbuído dessa tua certeza, abre o teu coração e tenta ser a certeza desse outrém. Não é científico porque é emocional, não é uma certeza porque envolve mais do que apenas a tua certeza mas, uma vez entregue o coração a essa tua certeza, estarás a concretizar uma certeza tua que, caso seja correspondida, será a mais bela certeza a que podes aspirar.

Metodologia falível mas inspiradora – 22/4/2024

Dia de fé, dizem.

O duche na madrugada da casa, enquanto os outros dormem, pé ante pé, com cuidados redobrados para não incomodar as que ainda descansam. 

A roupa de domingo, tão semelhante à dos restantes dias da semana, a curta caminhada até ao jornal mais próximo. A leitura com acompanhamento, a nata, o café e a água das pedras brutalmente gelada.

Os habituais que chegam, a loura que passa e cumprimenta. O olhar medido, após observação atenta, os dois detalhes ondulantes que ainda não constam no acompanhamento. O suplemento separado, após uma rápida olhadela pelos alugueres humanos dos classificados.

A análise das notícias, mais uns cumprimentos, um amigo de sempre que passa e cumprimenta com umas efusivas pancadinhas no ombro direito. Dialogamos sobre o nosso bem estar, refiro que só uma inflamação no ombro direito me aflige, sorrimos perante a inevitabilidade do cumprimento recebido “Como poderias saber?”, e sorrimos ainda mais quando recordamos onde nos conhecemos.

A mãe que perde a paciência com o filho que teimou em pegar na chávena antes da aprovação da progenitora, o filho que concorda que sempre foi assim e que realmente se precipitou, o azeiteiro que acelera na sua moto barulhenta, os carros que insistem em acelerar quando o peão se apressa para atravessar a passadeira.

As passadeiras que obrigam a um desvio do passeio para acedermos a elas e buscarmos a prioridade que o peão merece, o parolo que buzina para chamar alguém do prédio em frente. As andorinhas que cativam algumas migalhas perdidas no chão, as gaivotas que sobrevoam e observam com inveja. O canto do melro que encanta a primeira trinca na nata, a última página do jornal que te indica que é tempo de voltar.

Domingos, numa cidade qualquer – 21/4/2024

A audácia de um casal.

Adorava que existisse uma disciplina, curso superior ou técnico profissional, que abordasse o sexo feminino. Um curso intensivo – e talvez interminável – que percorresse todos os níveis da mente feminina: a forma como posiciona os cinco sentidos, como exterioriza emoções, como as interioriza também, a forma como age perante obstáculos e como se propõe superá-los.

Numa qualquer instituição de ensino, no cimo de uma montanha, com uma vista de trezentos e sessenta graus que permitisse todo um relaxamento visual, em regime de internato, e só com dois voluntários. Uma espécie de Marvão – em termos de beleza circundante – com apenas uma “case study” e sendo eu o único aluno. 

Voluntariamente deitada numa cama de rede, erguida no ponto mais alto da aldeia, o objecto de estudo seria sujeito ao que os anglo-saxões designam por “Full Disclosure”. Num diálogo tão privado quanto a altura o permite, um despir de todos os detalhes fundamentais para plantar e fazer crescer uma árvore chamada intimidade.

Esgrimindo diferenças e apelidando-as de personalidade própria, aproximando pontos de vista comuns e apelidando-os de benesses para o nosso futuro. Num contexto de abertura total, como se fôssemos católicos e quiséssemos a absolvição, uma confissão total de quem somos e o que procuramos.

O exame final seria a prova de fogo e só juntos poderíamos aspirar a concluir o curso. De olhos nos olhos, e só podendo recorrer à inteligência emocional, a mesma frase teria que ser proferida em simultâneo. A nota final começaria então a ser construída sob o nome de futuro comum. Deixo-te o ónus do contacto, porque sou apenas o estudante e não faço ideia em que ponto do percurso académico estás. 😘

“I love the rain – it washes memories off the sidewalk of life.” – 20/4/2024

Do amor próprio ao outro.

Como se partisse da douta ignorância para o conhecimento – desaparece para outro lugar no mundo, começa um exercício de introspecção, anda muitos quilómetros por dia, chega ao conhecimento das pequenas coisas que lhe agradam profundamente. Canta enquanto caminha (baixinho ou para dentro, de maneira a não perturbar a natureza que o rodeia), sorri de volta aos seres “loucos” que ainda sorriem nos dias de hoje, cumprimenta desconhecidos como resposta ao cumprimento que deles recebe.

Poder-se-á afirmar que não segue os padrões lógicos de comportamento dos demais, que destoa na maneira de ser e de agir, que tem um temperamento desigual quando confrontado com situações vulgares e com respostas universais que não toleram desvios, que caminha como se as regras da sociedade não se aplicassem a ele – não que “quebre” as regras ou aja de maneira ilegal, mas tão só e apenas porque é desigual, questiona porque quer aprender opiniões diferentes mas, estando as respostas universalmente impostas, é visto como bizarro.

Continua a trilhar o seu caminho, ciente das suas virtudes e defeitos, carente de acumular mais conhecimento – o mais abrangente possível, procurando debater com o maior número de cenários diferentes que consiga reunir, tentando absorver o maior número de opiniões que estimulem o auto-debate a que se dedicará assim que o tempo o permita. Ouve da direita à esquerda, tem muita sorte com as individualidades em quem “tropeça” na vida, é carente de leitura tanto quanto de comida, gosta de pensar sozinho de maneira a melhor poder questionar-se, sorri sempre que um dia novo nasce.

Que nunca deixemos de viver – 19/4/2024

Da necessidade ao engenho.

Após três meses de Portugal, e copiando o modelo grego, tenho aumentado bastante as distâncias percorridas sem afectar o bem estar que as mesmas providenciam. Tirando o salto para cima de uma pedra, que doeu como tudo, os passeios têm combinado um misto de emoções: cultura, exercício (obviamente), reencontros, o espanto com alguma arquitectura, a abstinência, o culto por certas cidades, o gozo de poder desfrutar sem horários.

Seja com máquina fotográfica ou sem ela, seja com a malta da fotografia, seja com a malta da pesca, seja com malta anónima, os cantos do país vão sendo descobertos ou redescobertos, esquecendo-me até de visitar a família, quando por algumas localidades passo. A respiração é funda e complementa o bem estar geral. Três pares de sapatilhas, todos igualmente gastos, as T-shirts com décadas de uso, os calções rotos mas sempre na mochila.

Praias novas mas também a habitual, rios novos mas também o habitual, pessoas novas e um grupo muito restrito de amigos de infância. Tertúlias novas, assuntos diferentes, uma fuga ideal ao marasmo que é o reino das discussões futebolísticas. Muitos livros novos, muitos créditos no cartão da Wook, muitas ideias para novos contos a submeter à Chiado Books. Um novo personagem reinventado do velho, muito mais despreocupado e muito menos disponível para perdas de tempo (esse único bem escasso de que dispomos na vida).

Tem sido a mais bela aventura de uma vida, com o prémio diário de ser pai de um jovem muito ímpar na capacidade de conquista, e que contamina todos os que o rodeiam. Um brinde ao nosso tempo na Terra!

Da satisfação – 18/4/2024

Convalescença.

Depois do exagero da caminhada, depois do esforço físico descomunal, depois de repôr calorias, depois de sorrir por ter adiantado mais uns quilómetros, eis o descanso merecido. O Parque da Cidade continua muito igual ao que era (quando lá morava) e os trilhos existentes são exactamente os mesmos. A malta do Regado presente, a troca de impressões a colocar-nos em dia, o prazer das coisas simples da vida.

Obviamente a francesinha foi o almoço, dois finos o complemento mas, o mais importante, foi o convívio – estar com os vizinhos amigos de outrora, que tão frequentemente aparecem por cá, celebrar as histórias antigas enquanto criamos múltiplas histórias novas. A esplanada do Zé, as batatas fritas de complemento, a cerveja estupidamente gelada. Os abraços duradouros, os olhares de espanto, o amargo da partida.

Caminhar pelo Porto é muito reconfortante porque permite um conjunto de coisas através de uma simples caminhada: o exercício no parque, a cultura em Serralves, o mar na Foz, a confusão na Baixa. Sorrio agora a constatar que nunca mais me lembrei de comprar as sapatilhas e que voltei muito mais pesado do que quando parti: o peso do exercício, da comida, do conforto por rever velhos amigos. Não é uma dieta que algum dia queira fazer!

Por aí, a receber e dar – 18/4/2024

Tropelias do imaginário.

“Dás-me licença que te cumprimente?”, assim começava o monólogo da imaginação dele. “Miúdo de muito pensar, muito sonhar, demasiado imaginar mas pouco concretizar.” – isto dava uma óptima inscrição numa lápide (e ri-se). Ri-se porque tem muito capital de egoísmo como reserva – um egoísmo que não magoa ninguém mas que o impede de ser magoado (outrora chamou-lhe “Reserva Estratégica Pessoal”, mas achou que patentear o conceito era demasiado atrevido e outros poderiam usufruir dele – obviamente, com o seu sarcasmo habitual, afirmou “É a invenção que deixo ao mundo.”, sorriu e esqueceu a ideia sem deixar de praticar o conceito).

Numa cabeça que fervilha de saudade, num corpo que transpira por antecipação, nuns membros que se intimidam com toda a emoção – como uma espécie de jogo de tabuleiro em que o dado define todo o progresso ou retrocesso, recorda cada bocadinho – porque uma manta de retalhos consegue unir tanto, em tão pouco espaço – acima de tudo, recorda a maneira peculiar como era chamado – algo que sempre teve o poder de o fazer parar (gelar, já que estamos a ser honestos) e encarar a amada,  com a mesma cara que os cachorrinhos abandonados fazem, quando os donos adoptivos os tentam encontrar – uma cara desprovida de tudo, menos atenção, num misto de amor, alegria, subserviência amorosa e total disponibilidade, sempre num contexto livre.

Pode o sonho condicionar a realidade? De que forma é possível sonhar e, poucas horas depois, enfrentar o sonho? Os movimentos sonhados são agora reais, a voz – escutada ao longe – é agora audível, os meus olhos podem agora procurar os dela. É todo um jogo de apetites: apetece-me isto e aquilo e aqueloutro, com uma fome voraz, mas sem os utensílios de coragem necessários para que a refeição gourmet realmente aconteça. Provavelmente, será o passo intermédio entre o sonho e a realidade: os couverts!

Monólogos do humilde narrador – 16/4/2024

A hidratação como parte fundamental da vida.

Pontos de vista…

Ao longe parecias ser tu e, à medida que aquele corpo escultural se aproximava, a minha confiança esvaía-se e diluía-se na imagem colossal que os meus olhos tinham dificuldade em transmitir ao cérebro. Num samba, entre os neurónios e as sinapses, dava-me conta que havia uma pausa – como se eles retivessem a imagem, retocassem detalhes como o ruído da imagem e o ângulo com que a luz em ti incidia.

Havia demasiadas coincidências para que não fosse verdade! Coloquei os óculos, tirei os óculos, fingi ter um cisco no olho, tentei assegurar-me que nenhuma pestana interferiria com o campo de visão, apeteceu-me roubar óculos alheios para certificar-me do óbvio, passei ambas as mãos pela cara, de maneira a assegurar que estava tudo vivo na cara e funcional para a inevitável aproximação.

Sentia-me quente e culpava as alterações climáticas, sentia-me desidratado e culpava-me por não ter água das pedras de reserva. Sentia-me num deserto de ideias e tu eras o oásis que se aproximava a passos largos, belisquei-me – discretamente – apenas para concluir que a realidade era clara e inequívoca, sentia-me encurralado e desejoso da “tortura” da tua presença.

Depois bati com o pé no fundo da cama e constatei que tudo não passava de um sonho…

Hidratem-se que a primavera é sedenta de aventuras – 5/4/2023

A batalha de uma vida.

De um lado – pesando uns valentes quilos cujo valor exacto prefere não revelar – estava o humilde narrador e do outro lado – com um peso ainda por apurar – um habitante do Atlântico que lutava por permanecer no seu lar e continuar a sua modesta vida, comendo umas tapas aquáticas, aqui e ali, evitando as mais brilhantes – que os peixes anciãos diziam “ser de morte”.

Entre os dois havia um pedaço de oceano e nenhum dos dois se encontrava disposto a ceder – o humilde narrador pretendia que o mar providenciasse uma refeição enquanto que a refeição pretendida lutava pela sua vida. Houve puxões, numa espécie de braço de ferro que só os profissionais da pesca entenderão, houve avanços e recuos – intercalados por lágrimas de esforço de ambos os lados, houve gritos de auto incentivo – sob a forma de borbulhas que saiam das guelras ou a plenos pulmões de um pescador que não cederia ao bicho.

No final, qual Highlander do mundo da pesca, só um poderia vencer. Apesar de não nos encontrarmos na Escócia o sentimento era frio entre ambos e, após um último esforço de parte a parte, só um venceu!

A imaginação de um peixe – 3/4/2023

Sentimentalismo premeditado.

A expressão, claramente emprestada pelo maior autor Colombiano que li (até hoje e que dificilmente será destronado, porque sou eu quem decide), resume o belo dia de hoje. 

Uma bela caminhada entre a Baixa e a Foz, sem que fosse São João e o humilde narrador estivesse ébrio a caminho da praia, por entre uma neblina que teimava em não levantar, causando um efeito tão retemperador quanto a imagem mental de sentirmos cada ossinho do corpo. Um pequeno intervalo para o café e a água das pedras, os olhos constantemente desviados para tudo o que me rodeava, um passo de cinquentão – armado em gajo que gosta muito de caminhar (o que até é um facto), mochila com uma bela máquina fotográfica para recolher os momentos mais inesperados ou sensibilizadores.

Um repasto na companhia de três Portistas – nervosos, como sempre, em noite de jornada europeia. O lagarto presente lá nos impôs uma conferência de imprensa do clube dele o que nos obrigou a despender uns minutos a explicar-lhe a história do clube dele, sobretudo em termos de conquistas europeias (é sempre bom e recompensador enviarmos uma criança para casa com mais perguntas – e mais profundas – do que quando chegou. A educação é um processo sem fim!)

Conversa amiga e saudável, comida tão maravilhosa quanto o sentimento que nos une, gargalhadas honestas e de encher o fôlego de um oxigénio amoroso, por algo que ainda decorre mas do qual já sentimos saudades. Água fresca a repor a desidratação da caminhada, o cigarro que surge depois do café. 

Tradicionalmente, a visita à madrinha é um evento para o qual vestimos a nossa melhor roupinha e cuidamos da linguagem, enquanto a visita decorre. Mas, há muitos anos que ultrapassamos a tradição e o casual surge como a melhor forma de estarmos juntos. 

Muita saudade, muito amor e a certeza de que não carecia de que, realmente, tenho muita sorte da família que tenho – todos com as nossas virtudes e defeitos mas sempre prontos a corrigir tudo e todos, por entre gargalhadas e o amor que nos une.

Obrigado madrinha, é sempre indescritível o sentimento com que daí saio.

Singela homenagem a um casal maravilhoso com um neto impecável (apesar de sportinguista). – 21/2/2024

Também me agradas.

A distância, essa meretriz que tantas manifestações de afecto reduz, era substancial e o grau de desconhecimento – enorme – era apenas mais uma desculpa para te manteres afastado, amorosamente cobarde. Havia uma enorme cumplicidade de gostos – alguns manifestados por mensagens,  sem outro nexo que não fosse o simples “paquerar” – provocar (alguém) amorosamente, demonstrar interesse amoroso por – de acordo com a definição brasileira da palavra ou, de uma maneira mais portuguesa – o mostrar interesse em.

A distância reduziu-se mas a ousadia manteve-se – entre o ousado e o auto renegado – num tabuleiro imaginário em que não fazes a mínima ideia de qual a “jogada” do adversário. Verdade seja dita: havia algumas jogadas que conseguias visualizar e, numa antecipação típica de grande mestre de xadrez (que nunca jogaste), corrias (num sentido figurado pois o que adoras é andar, vaguear sem destino) na direção oposta. Numa analogia em que, figurativamente, te apetecia fazer festinhas, acariciar, conversar sem que horários houvesse e, na realidade, estivesses no extremo oposto a ler, nas margens de uma qualquer ria, rodeado de desconhecidos.

Armado em aprendiz de prisioneiro de imagens, esquecendo metade do material, caminhas com uma ideia na cabeça – como se fosse uma melga que quisesses que te picasse. Obrigas-te a parar, num pedaço de relva protegido do sol, sacas do antídoto da mochila e mergulhas a mente na leitura. Sorris, enquanto o cérebro vagueia ao sabor do mestre Gabriel García Márquez, para apenas constatar que, inevitavelmente, quem viaja contigo é ela…

Overdose de ovos moles – 18/2/2024

Os que mais amo.

Entre a obrigação e o querer vão sentimentos distintos. A obrigação é o correspondente ao “picar o ponto” – algo rotineiro, insosso, com presença mas sem algo que o poderia transformar em querer. Uma obrigação que não é natural, espontânea, real – uma espécie de reunião de actores e actrizes que seguem um guião desprovido de realidade, interesse, emoção – face a uma audiência que, provida de alguma cultura e mundo, desfaz a peça que perante si se desenrola – como um profissional de poker, a enfrentar um qualquer macho-alfa, desprovido da realidade e assente numa confiança total nos seus dotes de actor amador – tal a distopia que alimenta os seus egos (sim, no plural).

Rever primos, num ambiente tão simples e rotineiro como outrora, é um recuar no tempo. Um tempo que te traz a confirmação de que, felizmente, o tempo e o dinheiro – bem como toda a evolução familiar, de então até ao reencontro, não afecta minimamente os que são bem formados. O background familiar – pedra basilar a partir da qual se espera que progridamos – impede todo e qualquer retrocesso e dei por mim a ser mimado de vários ângulos. O bife foi encomendado por um, a água foi-me servida por outro, o diálogo fluiu como se aquela fosse a nossa rotina.

Muito embora a refeição fosse o que eu havia sonhado – demasiadas vezes numa Grécia que não se pauta pelo consumo de carne de vaca, devo confessar que a companhia é o condimento fundamental para que o miocárdio grite de alegria pela felicidade que sente. As tostinhas escondidas pelo bife, as batatas fritas redondas e fininhas, o cantinho de arroz branco e o esparregado, com o verde de esperança, foram o orgasmo gastronómico com que a minha imaginação me vinha torturando. Estamos mais velhos, com a mesma boa disposição face às adversidades, os abraços são iguais e a disponibilidade é total, de uns para os outros.

Posso não ter a família ideal mas devo confessar que estamos muito perto de o ser – com as nossas virtudes e defeitos, com a nossa solidariedade e compaixão. Foi um excelente almoço!

Porque nem sempre é só uma refeição – 6/2/2024

Um espantalho amigo.

Coisas que nunca mudam…

Ao contrário das pessoas, incapazes de uma mudança que afecte o status quo, os locais trazem-nos um resumo de todas as vicissitudes – sobretudo sendo nortenhas.

– Esqueci-me da pasta, com testes por corrigir, em São Bento…(diz uma utente do metro)

– Tem dinheiro?, pergunta o meu vizinho de viagem.

– Não, só os testes por corrigir…

– Então não se preocupe que vão lá estar. No Porto ninguém corrige testes de borla…

Tinha saudades da empatia nortenha!!!! 💪💙

Percorri demasiados quilómetros, com o sorriso parvo e ritmo de sempre. Troquei a Acrópole pela Rua de Trinta e Um de Janeiro e, muito embora não a tenha subido, prestei-lhe a devida homenagem. Visitei ruas que já foram parte do meu dia-a-dia e conheci pessoas maravilhosamente belas – não só no profissionalismo mas também na arte de bem servir o cliente.

Confirmei o que não queria confirmar e apreciei um belo prego no prato, visitei o “meu” emblemático Tamisa e os meus ouvidos viram restituído o sentido apurado para o bom humor portuense. Senti um valente vibrar, ao passar no Pérola Negra, mas deve ter sido um espasmo da imaginação – pois a referida casa estava fechada. Andei na rua, em cima de paralelos, para sentir o chão da Invicta e ouvi a retórica dos transeuntes – num sorver de saudade imaginativa que se transformou em realidade.

Não passei muito tempo na cidade – a Baixa parece um estaleiro a céu aberto – mas senti um sentimento de justiça – por finalmente haver dinheiro para a obra. Não disse um único palavrão mas escutei imensos, não chorei de saudade mas, a ter acontecido, jamais o revelaria.

De pernas cansadas e ao alto, só me apetece exclamar, bem alto, “é uma cidade que tenho em mim entranhada!” mas, fruto do lado racional, limitei-me a apreciar – com um olhar mais voraz do que qualquer turista – todos os detalhes da cidade que, a mim, fortalece o coração (incrível como o racional se dilui num belo emocional).

Agradas-me Invicta, todos os dias! Obrigado pelo homicídio de saudade que hoje me concedeste. Bem haja.

Avenida dos Aliados e o humilde narrador. 🇵🇹

Palavras desencontradas.

Ao escrever um texto, num conjunto de palavras que, de início, só para ti fazem sentido, deparas-te com imperfeições, desilusões e ilusões. A beleza do retoque permite, não só mas também, apreciar a linha de pensamento que trilhaste e, se bem que cries um novo ciclo a partir da amálgama inicial, sabes bem que o resultado final não existiria sem que as imperfeições fossem corrigidas.

Não é tentativa e erro mas sim o escrever “ao correr da pena” – por mim traduzido – corresponde ao despejar de tudo o que a mente imagina, mas sabendo de antemão que uma revisão providenciará algo mais perfeito do que apenas a soma das palavras. Como se dissesses tudo o que tens a dizer mas, na impossibilidade de ser directo, o corrigisses com a educação recebida e suavizasses o resultado final.

O ficheiro começa em branco e o título fica para o final. O turbilhão imaginativo toma conta da tela e, qual pintor “enraivecidamente comandado”, palavras soltas chegam ao cérebro que comanda o teclado e, com um sorriso na cara, vês a composição a tomar forma. Não ligas a erros, acentuação ou gramática – pois sabes que a revisão final permitirá eliminar as toxinas do texto. Uma pintura inicial é apreciada pelo autor que, nessa altura, já está a pensar no resultado final – que em nada se assemelha a tal pintura inicial.

Recordas o objetivo inicial, enquanto revês o conjunto de frases que agora compõem o rascunho, cortas palavras, acrescentas pontuação e tentas mudar o tom – para que fique de acordo com o anteriormente revisto. Lês, relês e, sabendo de antemão que a perfeição é inalcançável, dás a tarefa por terminada. Talvez o sentido seja agora diferente, afirmas tu mas, relendo mais uma vez, constatas que o final corresponde ao inicialmente pensado, agora embelezado por regras que fazem o texto fazer sentido. Ou talvez só faça sentido para ti mas, acima de tudo, escreves para ti – tornando assim redundante saber se mais alguém aprecia.

A tela imaginária coberta por letras ordenadas em frases – 12/1/2024

Será doença ou sanidade plena?

Que se sofre por antecipação, que se torna uma realidade permanente, no teu sonho. O corpo e mente totalmente projectados no futuro, apenas e só porque a vista pretende enxergar o que sempre consideraste como “a tua terra”.

A família faz questão de estar presente e, o “convidado”, sente um calor imenso que já quase não reconhecia – por falta de prática, por falta de visão ou, como interiormente ele pulsava e uma voz associada lhe dizia “por falta da presença efectiva e próxima.”

Fazia um esforço enorme por conter manifestações de júbilo que, eventualmente, poderiam revelar e desnudar todos os sentimentos internos. Engolia em seco, como forma de agradecer a todos os que estavam presentes.

Vertia lágrimas de felicidade, derramadas internamente, sem deixar transparecer o atentado ao pudor que poderiam constituir – caso o secretismo fosse descoberto. O sorriso – sobejamente revelador – mostrava o quanto cada um dos presentes o tocava, sentimentalmente.

Por um longo momento, o humilde narrador pareceu ter uma “Out-of-body experience” e, observando todo o cenário a uma distância imaginária e próxima, exclamou “É deveras reconfortante estar em casa.” E, de volta ao mundo real, sorriu, para todos os presentes que, um por um, lhe foram retribuindo o carinho.

De Atenas a Espinho, por um caminho de carinho. – 9/1/2024

We can laugh about feelings!

The breakfast club

Semelhanças com os salões de sábado são nulas – excepção feita a todas as ameaças que são proferidas, numa demonstração clara da pedagogia de outrora (assente, maioritariamente, em disciplina sob a forma de cana – que mais se assemelhava a sentir um raio a embater nas pernas).

Não havia paizinhos a levar os meninos ao colégio e, elementos do sexo feminino, só atravessando a N1 (uma combinação entre tensão (sem o n) e risco de morte (atravessar a principal via de trânsito, na altura, do país).

A camioneta das 8:15, chegada ao colégio às nove. Entrar por uma porta principal que nunca utilizavas para, num passo semelhante a um prisioneiro de guerra a quem é negada a Convenção de Genebra, subires ao segundo andar. Uns calafrios, ao seres reconhecido por uns internos convidados a passar o fim de semana no colégio (obviamente como prémio de bom comportamento…), olhares solidários na preparação para o início da pena.

Não há fila para o croissant, os corredores estão silenciosos, o prefeito marca, no quadro de ardósia, a hora de saída com um gigantesco 13 (como se não soubéssemos ou não tivéssemos relógio). Saltam os livros da mochila, abre-se numa página qualquer, coloca-se o olhar perdido – no pouco que se consegue observar – começam-se a contar os segundos…

Camioneta de volta pelas 13:15 para uma chegada a Espinho pelas 14. Começava então o fim de semana…

Greece 🇬🇷

O teoria do golpe de estado do P.R.R. – Esta é uma obra de ficção, qualquer semelhança com nomes, pessoas, factos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.

Pela primeira vez na história do país, Portugal vai receber um montante nunca antes visto, para aplicar no desenvolvimento económico. De um lado, o governo democraticamente eleito, com o selo de aprovação de uma maioria absoluta e, do outro, uma panóplia de pessoas, camufladas em partidos políticos, dispostas a tudo – por um quinhão do imenso bolo.

Conjectura-se, sempre sob pretexto do “melhor interesse de Portugal e dos Portugueses”, a maneira mais rápida e viável para aceder a uma parte do bolo – o relógio não pára e, a cada tique-taque, o chantilly parece desaparecer, na ilusão criada pela imaginação dos envolvidos. Alguém vai começar a partir o bolo e urge termos um lugar à mesa!

Alguém sugere contornar o status quo e utilizar a PSP, sob pretexto da confidencialidade (que se dane a reputação da PJ; aproveita-se o processo para colocar três instituições em cheque! – Ministério Público, Procuradoria Geral da República e PJ) e começam a ver-se mãos a serem esfregadas, de contentamento! “Isto faz-se!”, exclama um dos presentes, que invocou o segredo de justiça, para não ser aqui identificado.

O número 1 disponibiliza os seus meios audiovisuais ao partido e a campanha começa, no século XXI, marcado por demasiadas notícias que, após a sua publicação, provaram ser falsas. Nunca um partido político teve tanto apoio dos media em Portugal…

Um último parágrafo, numa publicação online da Procuradoria Geral da República, menciona:
“no decurso das investigações surgiu (…) o conhecimento da invocação por suspeitos do nome e da autoridade do Primeiro-Ministro e da sua intervenção para desbloquear procedimentos no contexto suprarreferido” – uma suspeita sobre a actuação do primeiro-ministro que pode preconizar corrupção! Assim começava o dia, com uma série de buscas, efectuadas em diversas localizações, incluindo a residência oficial do primeiro-ministro. Uma humilhação para os envolvidos que, actuando em nome do país, tornam a humilhação nacional.

“As instituições funcionam.”, abrem os jornais. Curiosamente, não são as instituições do costume – e previstas para o efeito – mas uma excepção, criada “pela confidencialidade necessária ao processo”! (Um prego na reputação da PJ, cuja legitimidade é arrastada pelo “sucesso da operação”!). Houve sucesso? Qual era/é o objectivo da operação? Se a PJ não funciona, prendam-se os culpados…?

Conclusão: se o Ministério Público não conseguir engavetar o ex primeiro-ministro, estaremos perante um golpe de estado…com uma PJ diminuída e um Ministério Público/Procuradoria Geral da República desprovidos de competência! E isso é muito perigoso…normalmente o prenúncio de autocracias!

O humilde narrador frente ao monte Acrópole.

O surreal é rotina na Grécia.

Hoje é dia de linha verde e, ao contrário do normal, revês as caras que pertencem ao “teu” horário, na linha que liga o mar (Piraeus) à montanha (Kifissia). Instalado na primeira carruagem – faço o máximo de tarefas a dormitar, até chegar ao emprego – rodeado de gregas que abanam os leques que, por esta altura, são mais uma arma no combate ao calor pirolítico que se instalou na capital grega.

A instalação sonora vai avisando os utentes – mind the gap, stay away from the doors, etc…de repente, ao sair de Omonia, ouve-se o anúncio de Viktoria, Attiki, fim da linha e por favor desembarque porque a composição está avariada e vai ser substituída (é mato, o número de vezes que acontece). Olhamos todos, uns para os outros, e saímos todos do metro, num belo gesto sincronizado, na estação de Viktoria.

Imaginem, por favor, uma estação onde o metro chega e, ao contrário do habitual, todos abandonam a composição enquanto explicam aos que estão na plataforma o que ouviram. Ouve-se uma porta a abrir e todos olhamos na direção do maquinista que, para espanto nosso, se ri, de gargalhada aberta que não lhe permite falar, ele quase chora…

Qual professora primária, ele afasta-se um pouco mais para o centro da plataforma e, por entre lágrimas de alegria, exclama algo em grego…não em tom de desculpa (um grego não comete erros) mas sim num tom autoritário. A mulher ao meu lado começa a caminhar para dentro do metro e eu sigo-a. Ela explica, assim que nos instalamos novamente, que o maquinista ordenou: o facto de termos a instalação sonora avariada não nos impede de chegar ao destino! Importam-se de voltar a entrar?

Percebem agora como tudo flui neste país? Sempre com uma gargalhada…😂

Humilde narrador esfria a moleirinha com um freddo expresso!

Esplanando…

O sítio tornou-se o do costume e, sentado na mesa habitual, vou trincando o lanche encomendado. A Coca-Cola vem, erradamente, com um zero mas o erro é imediatamente corrigido e a empregada de mesa condenada a beber a dita, no refúgio seguro dela, mas que é bem visível da esplanada.

As motos de baixa cilindrada que fazem mais ruído do que os topos de gama, as conversas de trânsito – algo que pode sempre resvalar, as pessoas que se benzem quando o sino da igreja soa. Os grupos que bebem cervejas frente aos grupos que conversam, os telemóveis como alienamento permanente.

O Kiosk, frontalmente colocado, em permanente rebuliço – a servir todos os que buscam “as falhas” a caminho de casa, os casais que tentam distrair os bebés do calor, os namorados que discutem o dia que agora começa a acabar. O Lenny Kravitz que grita que quer “Fly away”, as pessoas que se abanam – numa infrutífera tentativa de se manterem frescas.

O toldo da esplanada é entretanto aberto e o humilde narrador tenta descortinar de onde chega toda esta “nova luminosidade”, a empregada de mesa que sorri – ao descortinar a procura do narrador e responde com um gesto que demonstra que é ela que está a gerir o processo, mostrando o comando do toldo.

Uma escultural grega que chega – obrigando a um discreto, mas muito forte, empurrar do queixo caído que, aproveitando a distração do dono, coloca a nu toda a indiscrição da situação. Limpados os resíduos do salivar intenso e já recomposto de mais um monumento ambulante que não conhecias. Toca o telemóvel e respondes com toda a segurança: estou em casa, a ouvir música. Pagas a conta e corres para casa!

A maratona nasceu aqui perto – 28/6/2023

Tarde de calor.

O dia de trabalho passou sem que desses por isso e o duche frio disciplinou a moleirinha de volta ao mundo terrestre. A tosta mista na esplanada, de perna suada alçada, a Coca-Cola como refrigerante obrigatório, a água que fugiu num trago.

Música de fundo, ligeira quanto a brisa, duas beldades na mesa do lado, uma trinca como início das hostilidades; na tosta, entenda-se! O Sultans of swing salta nas colunas, conduzindo a uma reflexão pelos muitos momentos em que escutaste a música.

Recordas a frase cómica que ontem, antes do concerto, ouviste um ilustre desconhecido americano proferir “who the fuck wants to see an 80’s rock band playing in an Ancient Greek theater?”…descobri depois que era um dos teclistas do grupo! 😂👌

De sorriso em sorriso, sem roubar sorrisos alheios. Saltando de dia para dia, sem sucumbir ao calor. Sempre munido de uma garrafa de água, mantendo o esbelto corpo hidratado. Eu devia ter nascido grego e ter navegado…

A golden hour a cair, as luzes dos carros pressentem-se agora – apesar de sempre terem estado lá, pessoas que correm entre outras que, muito calmamente, observam as montras – o caos ordeiro, tanto no passeio como na estrada. Ao longe, os peões que correm na passadeira – enquanto se benzem – face a uma igreja com que se deparam.

As cores desbotadas – que se fixam perfeitamente, assim que colocas os óculos, uma brisa de 9 Km/h que a app de meteorologia afirma tornar os 30 em 31. As laranjeiras que dão a frescura a toda uma cidade, as pessoas que a animam, os animais que a habitam – com mais direitos adquiridos que muitos humanos, as luzes das farmácias que se acendem para uma eventual emergência. As famílias com o passo descoordenado, conforme o filho por que são responsáveis.

Por vezes reparas em detalhes…23/6/2023

Inspirar sorrindo, bom exercício! 👌

Atenas, pelos meus olhos.

O calor chegou, e trouxe com ele a habitual adaptação da indumentária, o que – dado que estamos na Grécia – equivale a um desfile de monumentos históricos (porque imediatamente te ocorre ser um ombro amigo e ouvir todas as histórias, obedientemente), em trajes minimalistas, qual tela branca, por pintar, que clama por ser coberta por uma pluralidade de cores. Não nasci pintor, e não tenho a mínima veia para a arte, mas sei apreciar!

Imaginem um cérebro que, tirando proveito da rotina do caminho para o emprego, aproveita para deambular e apreciar “as bistas”, como se diz na minha terra. Equiparem a imagem dessa rotina à mais bela obra de arte que o vosso coração guarda e, mesmo assim, talvez não estejamos, ambos, sincronizados. Curioso, como o gosto por arte pode ser diversificado: o que é que nos conquista na arte? Porque não discutimos com ela mas sobre ela? Talvez seja precisamente esse facto que a torna tão bela…

As caras envergonhadas, as gatas assanhadas, os decotes suados, as saias que são curtas pela anca – mas que elas teimam em puxar para baixo. Os saloios e os olhares fotográficos, os encontrões do metro, o acaso da conversa, a coincidência de irmos ao mesmo concerto, a ousadia do trocar contactos, a notificação dos familiares mais próximos…

Vai começar o verão – 20/6/2023.

Dias de Atenas…parte CXL…😂

O despertar e o lento interiorizar o quão bem dormiste…acenas a ti próprio um sinal de concordância, após visualizar umas preguiçosas 8:30 no despertador – para quem habitualmente acorda às 5, há que celebrar estes eventos.

Sonhaste, e dás um sorriso envergonhado, assim que te ocorre o porquê de um sono tão retemperador. Olhas-te ao espelho, ciente de que não podes estar envergonhado contigo mesmo, isso não acontece…

Talvez o amadurecimento da vida traga estas mudanças de comportamento! Sei que havia duas covas que havia que transpor, após um galanteio mal dissimulado, e uma pergunta que havia que fazer. A pergunta libertava e soltava o humilde narrador para a tarefa seguinte.

Talvez tenha havido alguma palpação, para um duplo sentido de estímulo e a celebração da conquista daquelas duas adversárias, com tanto de ameaçador quanto erótico. Recordar, com saudade, que a louça ficou por lavar; apesar de bem esfregada, a gordura não se libertava e houve necessidade de recorrer a um desengordurante original, o sentimento de pleno a preencher os dotes de lavador de pratos do vosso humilde narrador…

Devaneio matinal, sonho…18/6/2023

O futebol na Grécia.

Sorrio, com um sarcasmo interior que até tenho que conter os espasmos musculares de satisfação plena, quando lhes respondo “Não dá mesmo, tenho cenas combinadas que me é impossível cancelar.” E assim tenho sido feliz ( bem sei que sou um egoista exacerbado nessa procura mas, afinal, a minha felicidade merece essa devoção!)

Recordo, sem saudade, o dia em que a curiosidade se apoderou de mim e, num misto de procura, loucura e estoicismo, embarquei na caravana dos vencedores do passatempo. Faço aqui uma pausa, para reler o escrito, e constatar que a frase anterior é muito típica do vosso humilde narrador; sendo que, normalmente, a saudade existe! Adiante, onde íamos? Sim, na caravana dos vencedores do passatempo da empresa, no camarote, com cozinha aberta.

O inverno estava a chegar, e a promessa de um jogo de futebol em que o campeão nacional estava envolvido, prometia o tipo de aventura de que normalmente um expatriado não usufrui – jantar incluído, bar aberto, umas esculturas ambulantes a servirem-nos…um jogo de futebol ao vivo, em que elas servem os comes (um ideal machista internacional que fui obrigado a usufruir de).

Estava na primeira fila, com um prato preenchido com um misto de carnes brancas e porco, ladeados por um Tzaziki maravilhoso. Os cumprimentos das equipas, umas músicas que não conheço (era o hino do visitado), começa o jogo.

Da imaginação fértil – 2/6/2023

Final score: 1-0

O decatlo como analogia da vida.

Na infância e adolescência temos os sprints em busca do conhecimento – corremos curtas distâncias na ânsia de obter as respostas que esclarecem as perguntas que constantemente nos assolam. Tudo é novo, tudo pode ser experimentado e o risco é algo que nem sequer cruza o nosso pensamento. Somos apelidados de putos – sem que o arrojo seja considerado, de imaturos – porque a experiência de vida carece de erros para providenciar certezas, de pessoas em fase de crescimento – uma analogia aos países em vias de desenvolvimento que desmotiva, face a uma evolução que não vemos esses países atingirem – ficaremos assim para sempre? Em vias de desenvolvimento? Podemos aspirar a ser um país desenvolvido? É a questão que nos colocamos, na certeza de nunca desistir em tão curta etapa! É assim que vejo a competição de abertura, com a corrida dos 100 metros.

O salto em comprimento acompanha-nos pela vida fora e mais não é do que um método alternativo para cobrir a distância que nos separa do objectivo – com a virtude de nos permitir saltar para mais longe, se queremos evitar um obstáculo, ou mais perto, se o objectivo é abraçar não um obstáculo mas uma qualquer fonte do nosso prazer interior.

O lançamento de peso é constante nas nossas vidas e mais não é do que o equilíbrio em que nos pesamos e nos sentimos bem – num mundo perfeito, sem pretensos magros ou gordos, em que gerimos o nosso peso no grau de satisfação interior que ele nos dá – num menosprezo total pelo que os outros pensam! Só tu interessas; porque no fim não há céu que nos acolha ou inferno que nos mantenha quentinhos!

O salto em altura é o crescimento – a constante que nos acompanha até ao final da vida, pois o conhecimento foi feito para crescer incessantemente. Como um alpinista, que escala cada nova montanha com uma atenção redobrada, nunca confiando na solidez providenciada pela natureza e sempre atento a toda a pequena indicação de gelo – num misto de deslumbramento e satisfação, de cada vez que sobe um socalco!

Os 400 metros que encerram o primeiro dia são o primeiro ensaio no percorrer de longas distâncias – após os 100 metros, quem não se diverte com uma volta completa ao estádio? A transição do final da adolescência para a vida adulta, passos de afirmação com muita confiança, planos elaborados com maior morosidade e atenção ao detalhe, os tempos em que és um pouco burguês até…

Os 110 metros barreiras, que abrem o segundo dia, são a representação de todos os obstáculos, alguns inertes incluídos, com que nos vamos deparar: alguns iremos superar, tropeçar noutros e, muito provavelmente, hesitar demasiado nos terceiros. Uma explicação sobre como superar obstáculos voando acima deles!

O lançamento do disco é toda a música que nos embala neste processo denominado vida. De diapasão na mão, numa procura constante pelo acorde perfeito. O aceitar sugestões de novos sons, enquanto mostras o que achas ser o valor do que ouves. As pessoas que nos davam acesso a uma cave, os amigos que aí colocavam música, a recordação de todos os copos cravados – com a dor da lembrança de todos os que tiveste que pagar. Uma melodia como símbolo de um porto seguro!

O salto com vara mais não é do que a superação com a ajuda certa. O acessório como elemento fundamental para a superação – numa simbiose tão perfeita que alguns homens jamais a conseguem superar (correndo o risco, segundo a sabedoria popular, de ficar cegos) e algumas mulheres são suspeitas, dado o exagerado consumo de energia eléctrica.

O lançamento do dardo são todas as paixões que tivemos, as reais, aquelas em que somos obrigados a “deter” o nosso coração e a interrogá-lo quanto às arritmias cardíacas de que passa a padecer. A submissão ao Cupido que, invariavelmente, nos apanha distraídos, na curva.

Os 1500 metros são o puro gozo com que desfrutamos da vida, o sentido de longo versus o que já conquistamos – em termos de “armas” para estarmos sempre acompanhados de um sorriso que, não sendo idiota, parece – mas esse é apenas o meu ponto de vista…

Bom exercício!

Foi que nem coelhos…💙

Por entre uma corrida, “contra” o caótico trânsito Ateniense – agravado pelo facto de ser sexta-feira e uma maioria se deslocar até a uma qualquer ilha ou local de nascimento – eis o vosso humilde narrador a chegar atrasado ao início do desafio. Sim, havíamos sido desafiados e, como povo conquistador que somos, fomos, vimos e conquistamos! Não uma repetição da reconquista errónea de outrora, mas tão só e apenas uma celebração que temos como habitual, no nosso calendário desportivo.

Ouvir os comentadores desportivos a usar “massacre”, “banho de bola”, “domínio avassalador”, “uma ocasião de golo em 90 minutos”, “não foi o habitual porque o Futebol Clube do Porto não deixou” deixou-me com a habitual lágrima de emoção Portista. Belisquei-me, era mesmo na SIC.

Coisas que brotam nos primeiros anos (apesar de viver em frente ao estádio de umas designadas Panteras), as recordações de uma coleção de caixas de fósforos com Campeões Nacionais como o Gabriel, Fonseca, Freitas, Murça, Rodolfo, António Oliveira…a praça Velasquez cheia de carros abandonados (a prioridade era o jogo), a varanda de onde se via a arquibancada, o sair de casa a implicar pegar em carros – num esforço bem coordenado sob a voz de “1, 2, para o lado). Subir ao primeiro andar do 147 implicava um refúgio sempre seguro! Ponto de encontro obrigatório, seguido do fino no café Velasquez e a partida para o estádio – tudo é mágico, quando se fala de recordações de infância. Vi o Futebol Clube do Porto vencer, debaixo de todos os climas imagináveis, com vários cenários de lágrimas de alegria a tomarem a dianteira, vivi algumas amarguras – em que questionamos a nossa existência face a um empate ou, livre-nos o Papa Jorge Nuno, uma derrota. Cresci numa família Portista, ao vivo vi-os ganhar em três ocasiões, várias vezes questionei o cardiologista quanto à cor do sangue que em mim pulsava.

Entrei em casa, com o jogo a decorrer, e constatei que já fechávamos muito bem (sou apologista do fazer crescer uma equipa da defesa para o ataque). Instalei-me no sofá e assisti a um massacre em que só faltou a bolinha encarnada, no canto superior direito do ecrã! É verdade que extravasei a minha alegria, numa Atenas que deve ter-me julgado como terrorista que merecia ser escutado (não fosse eu começar a gritar por deuses, aos quais normalmente se segue uma explosão – são um povo atento). Ninguém deve ter percebido os gritos, o vocabulário profundo, as lágrimas de alegria que faziam ruído…

É giro viver fora do país – 8/4/2023

Palavras que se abraçam.

Soltas – como se a liberdade só pudesse ser explicada por elas, sinónimas – numa deliciosa harmonia de significados tão iguais, antónimas – numa bela dança de opostos, maiúsculas – armadas de uma maturidade típica dos começos, minúsculas – como que pequenos anões que são fundamentais para a tela final, acentuadas – a típica nobreza, cedilhadas – a recordação de outrora, em que a cedilha parecia algo tão esquisito quanto os caracteres chineses.

Rodeadas pela pontuação – num exercício tão vezes falhado, com os pontos que impõem um final, vírgulas que implicam uma pausa e a imaginação constante como agregador de um processo que a ciência não explica. Façamos um parágrafo! Ou um ponto final e continuamos com o mesmo assunto? Talvez apenas uma longa vírgula, que nos permita saltar para o próximo parágrafo e dissertar sobre algo diferente, como o relato de um pouco do que é o quotidiano grego? Vamos nisso!

Se chegaste até aqui mais vale continuares até ao final. Imagina um pequeno troço, para o qual ninguém estava preparado, em que nos é dada a oportunidade de lermos algo que nunca tínhamos lido: o suor da antecipação, a taquicardia por cada letra abraçada, numa palavra que encaixa bem, vá, num enorme puzzle que, quando completo, até sugere uma exclamação! E sim, procuro sempre a exclamação, como forma de bem estar comigo próprio (a cena narcisista 😂).

É algo muito recompensador! Olhar para uma conjugação de esforços de palavras, colocado aleatoriamente num processador de texto muito simples, olhando em volta e constatando que…cheguei! Estou na minha paragem!

https://www.atlasobscura.com/places/dromeas

Momentos engraçados de um país apaixonante.

A sexta-feira, por falta de planeamento ou insónias (selecionar o que preferir), fugiu a uma rotina que existe – porque foi outrora delineada – mas que jamais teve existência prática. Há vários alarmes: 7, 7:30, 8, 8:15, com diferentes títulos: água quente, mexe-te, põe-te a andar, last call motherfucker – para um verdadeiro grito que me empurre para os transportes públicos.

Cheguei cedo demais ao autocarro e, daqui até Fix, viajei sozinho, no canto esquerdo do autocarro (em cima do motor, o assento mais quente do autocarro – não só pela minha presença…). Após Fix fiquei com um mastodonte do lado direito e o autocarro cheio. Arrancamos, não se esqueçam que a porta é o local de eleição para o utente grego, independentemente da paragem em que vão sair (obviamente um “case study” que a comunidade cientifica deveria investigar), e uma senhora, entre outros, resolveu validar o bilhete. Encostou o papel plastificado na máquina de validação e ouviu-se um som semelhante a um traque. Olhou para os que a rodeavam e eu sorria, porque ainda recordava o som engraçado da máquina ao não aceitar o bilhete. Passado uns minutos, testou novamente o bilhete e um novo traque surgiu (as probabilidades de aparecer um fiscal são baixas, mas acontece). A viagem prosseguiu tranquilamente até ao destino.

Há uma caminhada, de cerca de dez minutos, que separam a paragem de autocarro e a empresa. Um exercício físico diário a que me obrigo, saindo na paragem “antiga” quando existem paragens mais próximas.

O supermercado fica no meu caminho e, pedido o café no balcão do lado direito da entrada, sigo para o croissant quente, que fica já dentro do supermercado mas pode ser pago na caixa da cafeteria.

Foi ao voltar, com o croissant e aguardando o café pronto, que reparei que ela estava agora no primeiro lugar da caixa (a opção era ser segundo). Olhei-a, ela olhou-me e eu tomei a segunda posição como o meu novo lugar na fila. Abanava um saco plástico transparente que deixava ver o vapor de um croissant que almejava ser trincado.

Ela olhou-me novamente, do contacto visual aos olhos dela a percorrerem o meu corpo e, ao nível da anca, a pararem. Assim que me apercebi dos olhos esfomeados dela, tomei a única decisão sensata que qualquer homem na minha posição tomaria: escondi o croissant atrás de mim. Sorrimos, com os olhos ainda colados, e não ouvimos a senhora do café a perguntar o que queríamos. Fui indigno da minha educação “nos melhores colégios suíços” e respondi “freddo expresso sketo” e, apercebendo-me da minha indelicadeza, expliquei por gestos que ela era , de facto, a primeira da fila. Ela agradeceu-me com um olhar perdoador, eu anui a que ela fosse buscar croissants sem perder o lugar na fila.

Despedimo-nos, de uma forma pouco convencional para quem acaba de se conhecer, com o encontro marcado para um outro pequeno-almoço no futuro.

Loucuras rotineiras.

Deambulava pela rua, com o queixo demasiado levantado e os olhos num constante varrimento do que o rodeava, alheado na sua rotina de tudo ver – detendo-se, se a necessidade de ver melhor o detivesse – ou armado em hiker profissional, caso a vista já estivesse em memória – admitindo algumas paragens, para a actualição e substituição do backup anterior.

O calçado era limitado a três pares de sapatilhas – mesma marca, mesmo modelo, cores diferentes e um par de botas – mais cobertos de pó de falta de uso do que propriamente as solas gastas, de tanto uso. As meias eram todas pretas, num último suspiro anarquista, e as “coquilhas”, um objecto privado só ao alcance da urologista e de algumas, agora ilustres, beldades femininas não podem aqui ser expostos, sob pena de um atentado ao pudor cibernético (desconfio que não haveria “largura de banda 😂😂😂)!

O corpo, objecto de um estudo científico que decorre desde o dia da chegada, ganha uma dimensão que desperta a obrigatoriedade mental de andar, muito, galgar, ser “cavalar” na conquista de quilómetros, debaixo das solas. Com o espírito de um comandante de avião só quer acumular quilómetros de voo, tal a visualização mental que faz no aquecimento. Sorri, enquanto uma laranja cai sobre um tejadilho “mole” e o som sai com um tom cómico.

Perguntam-lhe como é que consegue viver despreocupado assim e ele, sem que a pergunta acabe, já está a responder “como é que consegues viver preocupada assim?!” Sorriram e observaram o espaço que os rodeava e, terminado o exercício, foram juntos em direção ao pôr-do-sol, que distava uns quilómetros valentes do local onde se encontravam.

Final do dia – 15/3/2023

Sonho de uma manhã de inverno.

Nunca acreditei no sobrenatural mas, depois de ter visto a beldade grega a subir para o autocarro, confesso que há algo endeusado nela. Enquanto aguardamos para virar para Sigrou, consigo um olhar de soslaio, por cima do oligofrénico que se sentou à minha esquerda.

É alta, calça um número grande (provavelmente para suster toda aquela beleza), tem um sorriso discreto que, muito provavelmente, até um cego faz sorrir. O inevitável cabelo encaracolado, uns olhos profundos, de um azul capaz de se confundir (novatos talvez) com a mais bela imagem do mar Mediterrâneo! O ruivo despenteado, enrolada num casaco perfeito para o dia de hoje – de um verde de esperança que reforça toda a convicção na raça humana!

Esperança!, grita a voz humorística da tua mente. Respondes com um “enquanto há vida!”, e sorris – perante o olhar alucinado do gajo que está ao teu lado! Apetece-te cochichar ao ouvido do gajo e, com um tom de Charles Manson, dizeres “You picked the wrong day to seat by my side!”, assim, enigmático mas com um desejo profundo que a paragem dele chegue!

Ela, entretanto, sorve mais um pouco do freddo expresso e o sorriso natural dela parece derreter o gelo do café – tornando-o ainda mais saboroso. A segurança envergonhada da beleza que possui é directamente proporcional à beleza que efectivamente magnetiza quem a pode apreciar! Se fosse de gesso certamente estaria num museu mas, tratando-se de um ser humano, está apenas sorridente, divertida e a pensar em toda a beleza que uma sexta-feira pode conter!

Ela já se apercebeu que as travagens do autocarro são por mim aproveitadas e, tirando partido do embalo, aproveito para arriscar o torcicolo, olhando para a esquerda! Curioso como, visto por quem não conhece o contexto, a cena pode ser hilariante: autocarro trava, a inércia actua e olhamos um para o outro.

Tão infantil quanto outrora – 3/3/2023

Os sons de Atenas

Há uma parafernália de sons, radicalmente opostos mas complementares na beleza sonora que irradiam, capazes de exercitar em nós um conjunto de novas sensações.

Tem sido, quase sempre, bastante recompensador recordar: o azeiteiro, de carro rebaixado e vidros escuros, é quem normalmente fecha a noite. Numa espécie de exibicionismo de mau gosto (devia ser punível), que vai da vestimenta até ao modo como tenta atrair a atenção de uma vizinhança mais focada na intimidade familiar. Do escape de rendimento a uma seleção musical que quase faz regurgitar.

Antes de caíres no sono nocturno, e quando já estás afectado por ele, ainda consegues ouvir uma ou outra laranja que, caindo da laranjeira, faz um som bastante engraçado ao embater no metal dos carros estacionados. Mais engraçado se torna quando a laranja salta, após o embate, num equivalente sonoro ao conseguir fazer uma pedra chapinhar inúmeras vezes.

O adormecer profundo está normalmente associado ao som das tampas dos contadores de água – são tampas metálicas, de aproximadamente 50x50cm, que estão no passeio público, frente ao prédio a que dizem respeito. Entendam as diferenças: nós temos contadores de água e luz dentro do prédio e, na Grécia, as tampas da água é onde está o contador do consumo, os contadores da luz estão na sub-cave, onde também está o enorme radiador a óleo que aquece as partes comuns do edifício. A sub-cave é um local digno de um filme do Stephen King: teias de aranha, uma corrente de ar inexplicável, escuro – mesmo com as luzes acesas, arrepiante – no sentido em que os pêlos em pé só perdem a potência quando se voltam a sentir confortáveis e longe dali.

O despertar varia, consoante os artistas disponíveis: pode ser a repetição da laranja, o azeiteiro que se atrasou no regresso a casa ou, o meu preferido, quando começam os diálogos junto da padaria em frente ao prédio (é sinal que já abriu e, abrindo as janelas, consigo “roubar” algum do cheiro a pão quente. Livrei-me da aprendiz de flautista (de quem até os ratos fugiam, numa espécie de “Hamelín”, ao contrário!), ouço agora ópera – de um vizinho velhinho que gosta de exibir o seu bom gosto musical, por vezes o vizinho do acordeão aparece. Anteriormente era o reunir dos pássaros que te despertava – reuniam-se todos no prédio em frente ao meu e, assim que o sol nascia, partiam para os seus diferentes destinos. Poucos minutos depois eram substituídos pelos papagaios dos jardins nacionais que, amantes de desportos radicais, voavam por entre as árvores.

Também é bom ouvir-te Atenas – 26/2/2023

O bife de vaca.

Não é um prato tradicional grego e, caso optes por encomendar um bife de vaca e estejas acompanhado de um cidadão grego, ele (ou ela) dir-te-ão quão perigoso é. Tratando-se de algo invulgar – na Grécia come-se, sobretudo, carne de porco e frango. A vitela também faz parte da ementa mas, porque menos consumida, também é um prato de risco – excepção feita às tavernas, onde a comida é fresca e raramente é de risco.

Segundo dia de cama, com uma intoxicação alimentar brutal, que me fez passar a noite a expelir líquidos pelos vários canais possíveis. Obviamente só há um culpado – eu. Assumo a fraqueza que me acudiu, sabendo os riscos que corria, sobretudo porque já passei pelo mesmo em casa – chegar, num dia de verão com luz do dia até às 22, grelhar um bife e, imediatamente, ficar de cama!

Não foi gula, não foi extravagância (um bife de vaca tem um preço que começa nos 12-15 euros e que, dependendo da denominação do local onde se consome, pode encarecer bastante) – um ex-café, redenominado gastro bar (ou qualquer outra denominação azeiteira) consegue inflacionar o produto, sem que a qualidade acompanhe! Pagas o “conceito”, chegas a casa, vomitas o conceito, obras o conceito, expeles o conceito – até o estómago começar a dar mostras de conseguir suster.

Ligas para o amigo de sempre que, inevitavelmente, te recorda o número de vezes em que o prato inicialmente escolhido, acabou por não ser o da encomenda final. Recordas episódios passados – em que a luz faltava em Atenas, durante o horário laboral, e tu chegavas a casa e, sem demora, esvaziavas o congelador, tudo directamente para o lixo!

Agora, que as partes baixas do aparelho digestivo começam a conseguir suster, esboças um sorriso – numa cara pálida que caminha para a normalidade.

Que vómito de noite – 6/1/2023

Pôr do sol, estádio olímpico, Marousi.

Resoluções do ano velho.

A parte do orgulhoso descobridor:

Agora, que já ultrapassaste os 10% de ilhas habitadas – Aegina, Kea, Hydra, Zakynthos (Zante), Rhodes, Santorini, Amorgos, Naxos, Milos, Lefkada, Kefalonia, Skorpios, Ithaca, Meganisi, Madouri, Evia (Euboea) – começas a planear as visitas de 2023! Será num“trilho” repetido – mas com mais detalhe para dispensar.

Paros e Koufonissia? Certamente! Há aquela necessidade de – como se de um daltónico se tratasse – ver cores diferentes, num caminho marítimo que termina em Amorgos! O processo de acostumar os olhinhos ao deslumbramento é moroso e convém que seja gradual, para bem dos músculos do queixo que, habituado a ceder ao espanto com um deslocamento vertical, pode gradualmente fortalecer-se para as aventuras que se avizinham!

A parte do orgulhoso observador:

Falemos dos transportes públicos na Grécia! Leiam atentamente porque eu, como dizia o outro, não duro sempre!

O lugar mais cobiçado, nos transportes públicos gregos, é junto à porta! Não me perguntem porquê, confunde-me tanto como a vocês. Um exemplo? Entras no metro, autocarro ou comboio e, caso não estejas atento, o cidadão da frente trava e tu bates directamente nele/a (isto são lições que proveem da Grécia antiga e são transmitidas de geração em geração!!!!). O ser humano entrou no transporte público, viu uma oportunidade de viajar como VIP, e não hesitou em travar a fundo para o conquistar! Ainda bem que nos aviões vamos todos sentados…😬

Novo ano, novo IKA? Vê-se logo que não me conheces… – 1/1/2023

O humilde narrador a descer ao mais profundo de Atenas.

Transportes públicos.

Não tinha nada para ser especial ou diferente de uma normal ligação do ponto A ao ponto B. É verdade que levantamos voo com cerca de trinta minutos de atraso, o que nos concedeu tempo suficiente para nos conhecermos. Marialena, Henrique…how are you? e o questionário habitual de sondagem de opinião.

Nem o facto de já só haver menu vegetariano afastou o vosso humilde narrador da conversa. Moramos em cidades separadas, temos gostos muito semelhantes e a linha de pensamento muito alinhada, numa espécie de acorde perfeito que enfeitiça ambos os envolvidos. De mão dada, por causa da turbulência e não com qualquer conotação amorosa (pelo menos admitida pelos envolvidos), decidimos ser amigos e, sem que qualquer troca de contactos tenha ocorrido, despedimo-nos com um “até um dia destes”, tendo ela acrescentado: estou certa que acontecerá!

Curioso como uma novidade pode começar com um “this shithole?” mútuo. Agora vou ter que ir a Thessaloniki, numa aposta cega num encontro inesperado. Haja loucura e tempo para nos divertirmos com ela. Cheers!

Monastiraki, de manhã cedo. 🇬🇷

Passeiozinho.

O voo de ida foi uma batalha para obter mas, após aquela pesquisa profunda, entre todas as apps possíveis e imaginárias, eis o vosso humilde narrador a conseguir sacar um bilhete a bom preço (obviamente o voo de volta não era só até Atenas, já que segue amanhã para Istambul, mas eu já não irei nele…usufruindo de um bilhete de volta de 91 euros)! 😉😬

O objectivo era dar dois abraços mas, mercê das circunstâncias, acabei por trocar abraços com quase todas as duas famílias que a mim se reuniram. O dia de chegada como celebração e, no segundo dia, a continuação da exploração da cidade – 43 quilómetros em dois dias! 👌 Sem quaisquer bolhas visíveis, após análise cuidada, já em Atenas.

Um paraíso de bom gosto, com a sua dose equilibrada de parolices típicas do ambiente, construção divinal – numa peça harmoniosa em que todas as partes integrantes nos fazem sorrir, de satisfação – pela bela maneira como encaixam e aumentam o volume de construção, como se de uma tela se tratasse. Uma harmonia quase divina, na fluidez do trânsito de bicicletas, aqui e ali interrompidas por discussões em que ambos partilham as culpas – traços de personalidade civilizada. 😍

Não só eles souberam conquistar terra ao mar como também o fizeram com muito bom gosto. 👍 A voltar, muito em breve!!! 🔜

O fim da maratona, antes de embarcar. 🇳🇱

Detalhes da vida de uma viagem.

Há algo de mágico na maneira como pisam o chão – como se o chão se tornasse no anfitrião perfeito, perante tanta beleza emocional. Os pés parecem gravitar, antes de tocar o solo – num movimento de perícia semelhante à recuperação de um foguetão da Falcon X. Ondulam, não andam! Num Mediterrâneo de temperatura perfeita e paisagens sem igual.

Saiu do metro, de encontro à mãe (que já aguardava na plataforma), num passo tão lento que, caso quiséssemos simular o movimento em câmara lenta, não haveria disponibilidade de velocidade tão lenta. Não confundir lentidão com laxismo! Enquanto se preparava para sair, ela focou o alvo e deu um festival de emoção gestual que, somente a ideia, me faz arrepiar os pelos que ainda detenho.

Agora, que já tudo passou, posso dizer que ela teve um gesto simpático para comigo…olhou, marcou, pavoneou e partiu. Obviamente poderia escrever uma trilogia sobre o momento mas, por agora, vou desfrutar da conversa com ela!

Escala em Sofia, Bulgária 🇧🇬

Outono

Há folhas caídas e assam-se castanhas na rua (algo muito cómico, quando comparado com o método português do fogareiro), estão 22 graus e há corajosos na praia (com potencial para criar um bom ajuntamento de carros, no retorno à capital).

As tabernas estão cheias e o cheiro a vitela estufada com ervilhas consegue embriagar o teu palato estomacal, os degraus estão secos e bem seguros, pelo que os chinelos foram uma boa opção, no que a locomoção diz respeito. Olham-te porque estás com a habitual indumentária, cumprimentam-te porque te reconhecem nessa mesma indumentária.

Cumpres os teus rituais sociais e sobes a rua, acompanhado do teu Freddo e dos biscoitos do Veneti. Observas tudo o que te rodeia, como método de estimular a mente enquanto mecanicamente regressas a casa. Vês as diferenças nos prédios da vizinhança, cumprimentas as velhinhas na janela ou varanda, ouves a música de uma flauta, ao longe – questionas-te se vais obedecer à flauta, numa fábula rápida que te cruza o raciocínio.

Cedeste, quando passaste por outra taberna, e agora aqui estamos – a dizer bem do saganaki, das batatas fritas, da vitela estufada…por vezes é bom ceder emocionalmente! É o mais racional a fazer…

O humilde narrador a passear por Atenas.

O músculo comanda a vida.

Foi uma promessa secreta, ou com o pretensiosismo de o ser. Uma jura solitária, profunda, com o valor de honra, caso pretendam obter uma escala de valores. Um pacto de tal maneira sólido que não haviam ainda inventado um antídoto para a sua solidez.

Assim que o combinado e acordado foi colocado em prática eis que os resultados imediatamente começaram a surgir – como se o escondido pudesse ser mais forte por simplesmente ignorar a nossa presença ou, melhor ainda, tendo a certeza da nossa ausência.

Há a certeza de uma melhor saúde, menor emoção mas muito mais serenidade, no global, daquilo que é a vida em sociedade. É verdade que nunca deixo de espreitar o desenvolvimento, sempre após o acontecimento mais próximo, mas com um carácter meramente informativo, onde quase diria: não existe emoção.

Os dias passam, acontecimentos são superados com enorme elevação e distinção, acabas por ser informado sem que tenhas feito um esforço para isso. Sentes um enorme orgulho interior, que guardas para ti – num exercício de inveja. Aplaudes, enquanto sozinho e sem testemunhas, e continuas a cumprir.

Assim são os dias de jogo do Futebol Clube do Porto…💙

Cachecol da final da Taça UEFA * 21 de Maio de 2003 * (Futebol Clube do Porto 3 – Celtic Glasgow 2)

Dias preenchidos

As sextas-feiras possuem, no seu núcleo, uma aura de boa disposição que se alarga ou retrai, conforme o dia decorre. Em Atenas, tal significa que tanto podes acordar com um dos milhares de sinos de igrejas que te rodeiam ou continuar o teu sono, até que algum pássaro – obviamente aterrado junto à tua janela – comece a canção que definirá a sua tarde.

Saída de casa, a vizinha passeia o cão, a passagem obrigatória pelo contentor do lixo. Um barulho estranho, uma velhinha que me estica a mão, enquanto me deseja bom dia. Pergunto, em grego, se fala inglês, uma vez que o meu grego é limitado (estou na fase do “só sei que nada sei”). Para minha surpresa (e agora também para espanto dos 7,753 biliões de subscritores deste blogue) a conversa continuou em inglês! E o inglês da senhora é brilhante!

É a senhora que alimenta os rafeiros da vizinhança. Atenas tem cerca de 4 milhões de cães e gatos de rua e, quando o governo propôs um programa de esterilização, todos os veterinários do país entraram em greve. Imagine-se um grego sem acesso ao veterinário! Há tantos animais domésticos quanto população logo, basta imaginar.

Enquanto a senhora conversava sobre os gatos, cumprimentou a vizinha com o cão e eu também, continuei a ouvir a explicação sobre o método utilizado para alimentar a gataria toda da vizinhança. Havia o sentimento de estar a ser flanqueado e, rodando a cabeça, apercebo-me que estou rodeado de uns 20 gatos (ninjas, que nem um ruído fizeram com aquelas pantufas calçadas). Ela sorri, perante o meu espanto, e exclama, com orgulho grego “São os meus meninos, eles reconhecem-me”. Ambos sorrimos, enquanto os ninjas começam a miar “despachem lá a conversa que nós estamos com fome”!

Despedimo-nos, com o sentimento que nos voltaremos a encontrar. Entretanto, no cimo das escadas, está a equipa de jardinagem que cumprimento – da última vez tive que ouvir 15 minutos com o homem a explicar-me que o 15 de Agosto era dia da Madonna…e eu, inculto, nem sabia que uma estrela pop dava direito a feriado…

Aquele abraço!

Domingo de sol

A aguardar que os vizinhos de outrora voltem a Atenas, para um jantar de convívio e celebração, como só eles sabem gerar. De livro aberto e sol no corpo, eis o vosso humilde narrador a relaxar, no último dia do fim de semana.

É aquele sol, com a temperatura do equador mas sem a humidade, com o brilho do verão mas somente a energia do outono, a abrilhantar sem magoar, a acompanhar sempre solidariamente – como um verdadeiro companheiro de aventuras.

Hidratando constantemente, até um cúmulo de me sentir uma picota humana que, gota após gota, se vê transformado num intermediário humano entre a fonte e a sanita. De cabeça enfiada na leitura despede-se de ti, com um abraço apertado.

A serenidade celebra-se!

Domingo de oração – 9/10/2022

Na plenitude do ser jaz a sua essência!

Primeiro apelidei-a de primata emocional mas, com o passar do tempo, apercebi-me que havia uma só vontade, em termos emocionais, que era precisamente nunca evoluir! Uma opção voluntária ou induzida, num ambiente em que o rebanho é a forma comum de sociabilização. Como se de um filme se tratasse: de ficção científica, em que o sentimento é reprimido e ilegal.

O lado cientista tentava decifrar a fórmula científica que poderia levar a que algo se afastasse, voluntariamente, do Nirvana emocional – mas a comunidade científica mundial não acreditava que existisse prova de que alguém conseguisse, voluntariamente, repelir sentimentos e, como tal, o objecto de pesquisa caiu no esquecimento.

Testemunhas anónimas deixavam o seu testemunho, de momentos de pleno sentimento e as diferentes formas de expressão que haviam assumido para cada uma delas. Era como um livro, básico e de escola primária, em que o público tentava que o primata aprendesse, mas os ensinamentos da república das bananas prevaleciam sempre. A comunidade científica internacional tentava agora um derradeiro plano: a criação de uma rotina, na mente do primata, de maneira a que as emoções fossem estimuladas diariamente. Teletrabalho, obviamente! A uma distância segura e sem contacto! Tal era a esperança depositada no projecto!!!

Diário de bordo

Em Evia, de pés ao alto sobre o varão da varanda, de olhar perdido na beleza do horizonte. Vinte e nove horas e meia a guiar, de queixo caído na maioria dos trajectos, de corpo salgado na totalidade das paragens – tão belas e recompensadoras as previstas e as imprevistas.

Vi inúmeros tons diferentes de água, conforme a luz nela incide, abrandei a velocidade para deixar passar ursos (quando, na vida real, devemos sempre acelerar, bem sei), ajudei um cágado a atravessar a estrada, andei misturado com o povo numa típica excursão à praia.

Saltei do topo de um barco para o “azul profundo”, com os seus vinte e sete graus de temperatura e tão transparente quanto a água da piscina. Arrisquei ficar sem gasolina, encontrei desconhecidos que já não o são. Conheci o sempre imprevisível carácter Grego, almocei com os donos de uma taverna.

Nadei como se fosse um puto e talvez tenha sido esse puto o que fez tudo isto – com um sorriso aberto, lágrimas de satisfação e alegria, um coração que parece expandir, após o inspirar obrigatório de quem suspira enquanto escreve o que se passou com uma vontade enorme de voltar a repetir, com mais tempo em cada etapa.

Não sei o que procuras, mas a Grécia tem. 🇬🇷❤️

O Rei a caminho da coroação 😂

Primavera vigorosa

Não sei se é um acto de autoflagelação ou apenas diferentes manifestações de força: se por um lado a neve destruiu grande parte das árvores fracas da rua, por outro ei-las que brotam com o dobro da força, no mínimo, que eu não sou gajo para ir lá medir…a olho, carecendo de certificação científica, vá…

Onde jaziam tocos do que outrora haviam sido árvores, olhando sem esforço, vemos agora um vigoroso tronco bébé que, claramente, não precisa de cuidados maternos. – Tens um futuro brilhante, trocamos hoje impressões. Infelizmente, talvez fruto da idade, não obtive resposta mas, o que a vista deslumbrava, era prova suficiente!

Cores, muitas! 🇬🇷❤️

Retrato ou autorretrato?

É com um sol quente, enquanto bate na cara, que vos escrevo. Com uma montanha branca, no meu lado esquerdo e uma cidade a derreter, no meu lado direito – um bom retrato da beleza da vida que, de um lado, possui montanhas – que ora estão escaldantes ora estão geladas e, do outro, mostra as consequências, a aprendizagem, a maturidade do processo.

Ambos os pés em cima do corrimão da varanda do quinto andar, uma Coca-Cola fresca e uma boa leitura em perspectiva – eis um bom domingo, por entre momentos de saltimbanco, à mercê de nuvens frias e teimosas que teimam em nublar o maravilhoso sol que, por entre elas, nos vai piscando uns raios solares de incentivo.

O quarto é virado para trás (um luxo, numa capital onde vive mais de metade da população do país) e o despertar é natural…ora com o inconfundível ruído do vento a passar nos suportes dos toldos que, ao oscilar, criam uma melodia diferente de cada vez, ora com um pássaro que aproveita para se lavar, numa concentração de água que habitualmente aí existe,

A vizinhança é espectacular e consigo ter sol no apartamento durante o dia inteiro…bravo, como se celebra por cá. Tudo existe num raio de 250 metros e o centro está a cinco minutos de distância! Este momento de felicidade é uma conjugação de tudo o que anteriormente foi enumerado, num contexto de coração saudosista. De quê? Não sei…vou continuar a procurar!

O que é estar cansado?

É não ter dormido, num misto de antecipação e por força de uns eventuais berros, em norueguês, de um hipotético colega de casa, enquanto matava adversários num cenário virtual? É estar tão sedento, que o saciar a sede se sobrepõe ao efeito habitual dos cafés da manhã? Não faço ideia…

A viagem passa como o dia de casamento: muito rápido, mal tens tempo de abraçar todos, já é a hora da despedida…um piscar de olhos e estávamos em Páros e, eu que já conheço o caminho, sei que depois são 45 minutos…que são percorridos com o vosso humilde narrador a esfregar as mãos de contentamento por, finalmente, ir pisar esta terra!

Fui o primeiro a sair do barco (porque tinha um camião encostado à bunda e, com estímulos desses, eu fujo), sem qualquer comparação com o parolo que se levanta assim que o avião aterra, e meti uma primeira velocidade curta, logo seguida de uma segunda e a mudança do aspecto visual exterior de “turista” para “desconhecido que tem um passo decidido pelo que deve conhecer a ilha”. Qual Batman, rindo às gargalhadas por dentro, parei no que me pareceu um local de culto dos locais. Pedi um freddo expresso sem açúcar e contemplei o mar, enquanto um suspiro se soltava de mim…exactamente assim, como se eu observasse um suspiro de satisfação que se afastava de mim.

A menina do café depressa descobre quem sou, já que a amiga é quem trabalha na recepção do hotel onde vou ficar e, fruto dessa feliz coincidência, vêm-me buscar. Sou obrigado a retirar o pé da água quente do mar para conhecer o hotel que é a 100 metros de distância…

Pouso tudo, tomo um duche e saio para me perder – algo fundamental para mim, assim que chego a um local diferente (obviamente não se aplica nas viagens no continente africano, sobretudo no Krüger National Park…como o “outro”!). A praia é interligada a outras praias, de ambos os lados. O sol está a descer e há que capturar o momento – primeiro com a mente e depois com o telemóvel. Perdido vou fotografando o caminho, sem deixar de espreitar o pôr-do-sol que se prepara…

O sol já se pôs, o jantar estava maravilhoso e o iogurte de sobremesa foi o gesto desafiador para um passeio pela beira-mar…

É bom viver na Grécia. Amo! – 6/12/2021

6th December 2021 – Naxos –
Agios Georgios Beach

Perdido em sonhos

Como se de uma feira popular se tratasse, os caracóis são a montanha russa perfeita para os meus olhos se regalarem; são inúmeros os caminhos que eles percorrem e, com a ajuda da natureza, já os vi ondular – de uma forma tão ousada que, pela primeira vez na vida, exclamei: estes cabelos intimidam-me…ao ponto de eu desejar que os meus olhos não me traiam! Mas eles, cobardemente apaixonados pela emoção do que presenciam, imediatamente fixam-se na forma perfeita de uns lábios que, em detalhe, parecem ansiar pelos meus!

Sobejamente traído por todo o bem estar da situação, ciente – tal como um espião, um qualquer agente duplo num qualquer país do mundo – de ter sido desmascarado, de sorriso inocentemente apaixonado no rosto, de pensamento completamente arrebatado pelo sentimento, a dar uma boa inspiradela, antes de voltar a fixar-me naqueles lábios tão bem definidos, tão carentes dos meus, tão traídos pela vida própria que possuem, aquando observados!

Observo as linhas das orelhas, num planeamento minucioso do melhor ângulo para as saborear, prevejo a ponta do nariz húmida – como início de uma brincadeira com comichão, o pescoço está totalmente reconhecido e, após análise dos dados apurados, o ponto de união de ambos os corpos perfeitamente apurado – num ângulo que permite a troca de mimos enquanto encaixado em outrem.

Os ombros não serão suficientes para suster o ímpeto, e também não serão poupados a uma apurada análise de sensibilidade! Já o peito despido, dita o decoro, obriga-nos a saltar a descrição para o umbigo – uma covinha amorosa, sabiamente colocada numa barriguinha perfeita.

As coxas percorridas pelas pontas dos dedos, como um sonar humano que reage ao toque, os corpos totalmente rendidos, um no outro!

De garras afiadas

Chegou pela esquerda e vimo-nos! Mas fingimos não ter visto – num jogo de fingimento que nasceu nos tempos mais antigos da civilização. Continuamos a olhar-nos, mas desta vez já com uma audiência de espectadores casuais que mais pareciam esfomeados do que propriamente predispostos a aprofundar conhecimento. Indiferentes a tudo e a todos acabamos na mesma mesa…por vicissitudes várias da noite talvez se tenham até beijado mas, arrolado como testemunha, o kiosk nada confessou!

Talvez a conversa fosse interessante para ambos ou talvez fosse apenas uma noite de verão na Boavista mas, por momentos, senti paixão pelo sentido que tudo fazia naquela conversa! Continuamos a partilha de informação e sorrimos das incoerências que faziam tudo ser coerente, do diálogo fluido que parecia ter décadas de entrosamento, das gargalhadas sincronizadas que parecíamos ter inventado.

Era como uma brisa agradável numa noite de verão Ateniense – refrescava-me a mente ao mesmo tempo que a visão turvava, arrefecia-me o corpo ao mesmo tempo que ele aquecia, enchia-me o coração ao mesmo tempo que ele pulsava!

Sonho de uma noite de verão – 2/9/2021

O despertar do sonhar acordado chama-se realidade

A expressão muda e, apesar do peito cheio de um bem-estar sem igual, já sentes a nostalgia da ilha – as noites mal dormidas a pensar, enquanto ao longe escutavas música inglesa pela noite dentro, os caminhos que percorreste, os saltos que deste face a cobras e lagartos tão rápidos que só a atenção permanente te permitiram detectar, a felicidade de poder percorrer caminhos com que sempre sonhei e a alegria permanentemente presente.

Alheado de copos, muito embrenhado no café e na água, a sede de querer conhecer tudo enquanto sentias que não tinhas conhecido nada, a vontade de tudo conquistar sem em nada tocar. O sorriso sonoro que, por momentos muito breves, te envergonhava a ser compreendido por quem te rodeia, porque o entendem. O caminhar altivo a identificar a tua vontade de fazeres esta descoberta sozinho – sem quaisquer aborrecimentos excepto tu próprio que jamais te aborreces sozinho.

A chegada ao porto de partida a ser feita pela obrigatória passagem pelo caixote do lixo onde ontem desmarcaste as provas de que havias fumado dentro do carro – recordaste o ar dançante com que saíste do carro, ao som de Peter Tosh, e o quão reconfortante foi esse momento que antecedeu a tensão normal anterior à entrega do carro alugado (há sempre algo mal quando fazes a entrega mas, com seguro contra todos os riscos, é só entregar as chaves).

Até já pensas em deixar de fumar…num devaneio típico da meia-idade! Como se, em vez de investir num cabriolet, resolvesses investir em ti….Sentes alguma vergonha pelo que sentes interiormente pois parece que roubas felicidade quando, na realidade, ela vive dentro de ti. Percebes novamente que não precisas de ninguém para ser feliz mas interrogaste-te se a felicidade não seria maior – sabes a resposta mas não a revelas ao mundo….és um egoísta no que à tua felicidade diz respeito!

E ao chegar ao porto de Katapola recebes um email com boas notícias….podia ser melhor? O futuro a mim pertence!

Até já Amorgos.

Mixed feelings

Dia de entregar o carro – começa a alavancagem de emoções…fazes força e recordas tudo com saudade. Sorris quando recordas o bifteki da ilha que é tão pujante quanto uma feijoada portuguesa – obviamente o facto de acompanhares com tzaziki não ajudou muito na dieta imaginária que te esqueces sempre de colocar em prática!

Que belas férias, afirmas! Com a noção perfeita de que agora és refém do autocarro! Revês mentalmente as praias, o poder teres o teu espaço e tempo, as pedras e os tombos, o escaldão e o hidratante, as três cervejas que custaram €14….dás uma sonora gargalhada naquela que é, por estes dias, a tua padaria de eleição!

Sorves mais um pouco de freddo cappuccino sketo e, enquanto o saboreias, recordas as noites muito bem dormidas, o candeeiro que quase partiste – como um soldado descontrolado, armado de toalha molhada, a tentar matar o inimigo – um mosquito que fazia voos rasantes na tua orelha. Como um Zero japonês, que apostava a vida no alvo, também ele sucumbiu à batalha!

Constatas que já deixaste um pedacinho do coração na Fuzeta e na Oura, enquanto criança. Sabes que África ficou com um pedaço talvez maior – sendo a única porta entreaberta que deixaste, a nível sentimental. O Brasil, superiormente mostrado por dois amigos para a vida conquistou mais um pouco e, quando julgavas que te tinhas tratado, e estavas imune a sentimentalismos, eis que voltas à Grécia para mais uma jornada de pura beleza e dedicação!

De todas as minhas imperfeições talvez essa seja a melhor! Pelo menos é a que mais aprecio – o sentir um oxigénio que amas a entrar, o coração a trepidar de alegria, a emoção da vista na curva seguinte, a sede de aprender, ver e saber perfeitamente o que é amar!

Devaneios matinais – 26/8/2021

A melancia

É a fruta preferida dos praticantes de tiro, sobretudo nos Estados Unidos da América, pelas semelhanças com o corpo humano (o que diz bastante sobre o povo que constituiu esse país e sobre nós, enquanto seres humanos, que não passamos de uma enorme percentagem de água que possui raciocínio)! Sendo ambicioso, vá, porque certamente há exemplos que claramente já deixaram que ambos se diluíssem!

E porque é de calor que se fala – pelo menos por aqui – anuncio desde já a chegada dos 40 graus, para os próximos dias. Como não pretendo fazer parte do grupo das melancias, vou arriscar e não fumar durante os picos de calor. Já passamos pelos 39, duas vezes, mas numa das ocasiões eu estava na frescura de Meteora, muito longe do epicentro do calor e rodeado de uma frescura de montanha, enquanto subia por caminhos endeusados (dizem) e dava por mim com um joelho brutalmente dorido! Um sinal das trevas, claro está…

São dias de cansaço extremo, sobretudo devido ao calor e independentemente da quantidade de água ingerida. Um corrupio constante para o chuveiro para, com a água gelada, obrigar o corpo a descer a temperatura! Não levo toalha porque o simples trânsito entre o final do chuveiro e o quarto permite que o corpo seque e estou pronto para o chuveiro seguinte. Devo andar com um sorriso parvo na cara mas, quem conhece, sabe o que tal sorriso significa…estou em casa!!!!

Devaneios de uma noite quente, mais uma! – 30/6/2021

Final de tarde.

Começou inocentemente, como as coisas simples e bonitas da vida começam, mas depressa o sumo de cevada começou a libertar os presentes para um final de tarde de maravilhoso convívio, boa conversa e muitas gargalhadas.

A ausência do contacto, ou de convívio, expressão usada pelo patrão, talvez tenha contribuído mas a qualidade dos presentes era muito mais do que qualquer planeamento poderia reunir! Havia calor, saudade, carinho mas, acima de tudo, uma saudade enorme de celebrar de copo na mão, de dar gargalhadas sonoras e saudáveis.

Até o inquilino e amigo passou e deu o seu aval ao festim saudosista que no Bombar se desenrolava. Fomos putos saudáveis, num excelente final de tarde que, posteriormente e fruto do calção molhado, degenerou em resfriado bem chato de afastar – nada que a receita do mano não cure mas que me chumbou em sonos profundos dois dias seguidos!

Poder-se-ia dizer que houve de tudo um pouco – numa clara alusão ao contributo de cada um – mas seria redutor tendo em conta que só o conjunto fez o sucesso do convívio. Até o espanhol, agora residente português, compareceu para os habituais amendoins…

Foi como voltar a Buenos Aires, abraçar o Aníbal e a sua família e recordar que a amizade pode sempre acontecer…até no táxi de um Peronista que, indo buscar um cliente ao hotel mais capitalista, se surpreendeu por ele não ser tão capitalista quanto o hotel!

Memórias de um final de tarde maravilhoso – 9/4/2021

“Apenas” um pôr do Sol

De costas direitas e bem firmes, de indumentária leve – mas com o obrigatório aconchego da camisola de Verão para a humidade noturna, de passo típico de despreocupação, os sorrisos a ultrapassarem a cadência da locomoção. 

Descendo os escassos metros que separam a casa da praia, a trocarem impressões sobre o dia que ainda não havia acabado, idealizando projectos concretos para os dias que virão. Subitamente, no final da rua, deparam-se com o Sol a preparar o palco para a sua despedida diária e, ambos, deixam o queixo cair e concordam que o espectáculo tem que ser visto.

Nascidos numa terra de pescadores e separados por escassos anos, recordam o ano de 1988, quando se conheceram. Detalhes muito turvos em relação a detalhes de 1988 mas a visão muito apurada para o show mágico que tinham decidido assistir. Como locais que são, meteram os pés na areia e sentaram-se na última “fatia” de areia que não estava húmida – uma espécie de palco só nosso, de vista desimpedida e na companhia dos profissionais da praia.

As mãos escondidas pela areia procuravam o contacto um do outro e foi certamente o GPS emocional que as ligou. E foi assim, de mão dada coberta pela areia, que presenciaram o maior espectáculo do Mundo. Uns profissionais a sair da água enquanto outros profissionais se dedicavam à procura do melhor local para lançar o anzol.

Fisgados, primeiro no Sol e depois nos olhos um do outro, saudaram o pôr do Sol com um valente beijo. Ele ergueu-se primeiro e esticou a mão para que ela o pudesse fazer. De passos suaves na areia retomaram o caminho do melhor arroz de polvo do Mundo e nem os amigos de longa data com que se depararam poderiam explicar o porquê daqueles sorrisos tão abertos e cúmplices. Nada haviam roubado mas estavam condenados a amar-se…a mais bela pena a que um ser humano pode ser condenado!

(Original de 2 de Agosto de 2019)

Turbulência

Sentado no lugar 1A, já ouvi o “cross-check” e as instruções no caso de emergência – basicamente, ouvi a hospedeira explicar que, caso dê merda e houver tempo, devemos seguir as recomendações dela…A mulher do 1B tem a mão esquerda cravada no apoio de cotovelo que separa os nossos lugares e olha para mim com um ar de medo profundo – há uma união de sentimentos no receio mas acalmo-a dizendo que estas coisas raramente têm acidentes o que, numa semana com mais um acidente aéreo, não inspira grande confiança…

O plano de ataque está definido, o plano de voo á muito que foi aprovado e o destino pertence a uma conjugação de factores naturais que não convém desafiar. “Clear to take off” e posicionamo-nos na pista, prontos para largar…motores a fundo, travões também e, após o soltar dos travões, eis que o nosso avião ganha altura ruma aos céus…onde aquelas rodas vão pousar é algo que só à nossa imaginação pertence…

Irlanda

18 de Março de 2017. Foi esse o dia em que aterrei em Cork e comecei a fase irlandesa da minha vida. 2 anos, 5 dias…recordo que marquei a viagem para chegar – propositadamente – após a festa nacional, o ‎Saint Patrick’s Day. Uma decisão corajosa de quem vinha de uma série de festas de despedida – algumas a superar o nível de alguns dos filmes da trilogia ressaca – que me fazia sempre recordar a máxima “Poupa o teu fígado!”.

Era um dia nublado e chuvoso aquele em que cheguei. A natureza, de um verde insuperável, dava esperança ao humilde narrador de que talvez houvesse um dia em que se pudesse (eventualmente) até fazer praia…era, obviamente, a visão deturpada pelo cansaço da viagem que teve que ser feita com escala em Londres. Mas sim, consegui um dia ir à praia na Irlanda e farei questão, caso a situação ocorra, de contar aos meus netos para que nunca façam merdas desse tipo!!!!!!

Trocas de casa, pessoas novas conhecidas e acarinhadas, pessoas novas conhecidas e remetidas ao esquecimento, sorrisos, gritos de luta e incentivo e, ultimamente, uma vista muito mais sorridente. Tal como o rio, que nos serve de imagem diária para quem frequenta uma sala completamente rodeada de vidro, também a vida flui naturalmente – talvez não para o rio que desejamos, mas há que fazer o melhor com o que vamos encontrando nas margens ou procurar sítios mais distantes para buscar o pão.

E que rico pão…vivemos a uns 100 metros de uma padaria francesa fabulosa (na Irlanda consome-se mais o nosso pão de forma pelo que a padaria, enquanto estabelecimento, é um conceito quase não existente para eles) na qual os produtos que estão expostos são de fazer babar o mais bem-educado dos meninos de um qualquer colégio particular em Portugal.

Olhos bem abertos na constante procura de mais ver; uma procura constante por novos pequenos nadas que vão surgindo e que urge apreciar. Um lugar quase cativo no autocarro e a construção de uma nova “seita” no fundo do mesmo. Gargalhadas com humores semelhantes, gargalhadas com humores diferentes.

Trocas de olhar e sorrisos constantes, condutores demasiado expeditos e recém-encartados ao volante. Viagens de pura adrenalina versus sermos ultrapassados por caracóis. E, lentamente, conhecendo….

Sempre na luta…

Nunca fomentamos a nossa relação pela exigência no contacto mas percebo que exijas mais de mim do que presentemente te tenho dado. Ando egoísta, talvez seja isso! Mais relaxado, mais dado a tarefas caseiras, mais dado a gargalhadas com os que mais gosto.

Livrei-me do velho portátil e teclo-te agora de um modelo novo. Nem percebo como deixei algo chegar a tão velho mas, por vezes, deixamos coisas envelhecer ao nosso lado sem que exista mérito para que tal aconteça. Não mais voltará a acontecer: mereces que as novas criações provenham de um modelo ao teu nível! E assim será, doravante.

Continuamos a curtir a nossa casa, em frente ao rio, com uns endiabrados (de bons) brunches aos domingos. Vamos usando os sábados para ir conhecendo novos locais para o pequeno-almoço tardio mas os domingos são nossos!!!! A nossa varanda tornou-se o nosso local de culto e o rio, constantemente a fluir em direcção ao mar, a minha alegoria para largar palavras velhas e usar um diálogo novo!

Acusam-me de evitar-te! Que desabafo demasiado contigo, que as pessoas que interessam – só essas existem – são sempre as segundas a saber do que se passa. Acho que são ciúmes, más línguas ou apenas uma forma amorosa de expressarem o seu gosto pelos escritos passados. Mas, tal como na bolsa, lucros passados não são garantia de lucros futuros e, com os escritos antigos, é precisamente a mesma coisa.

Vou começar a natação, assim que consiga atravessar os 20 metros que me separam entre a porta de casa e a piscina do hotel. Com trezentos euros anuais tenho acesso a tudo o que se passa na piscina e, qualquer dia, lá estarei com os velhinhos todos a fazer hidroginástica!

Passos pequenos mas muito seguros. Fevereiro de 2019.

Férias

Havia muito tempo que mentalmente estavam planeadas! Uma espécie – para não usar a palavra “tipo” – de descanso do guerreiro que mais não é do que levar o guerreiro a prestar vassalagem ao Sol.

Partir do aeroporto de Cork assemelha-se, em muito, a partir do aeroporto de São Tomé: as máquinas são ligadas para inspeccionar as bagagens, há muitos sorrisos – por parte dos passageiros que sabem que vão evoluir, pelo menos, uns 20 graus centígrados em termos de temperatura, a boa disposição impera e contagia!

Voo tranquilo, apesar da histérica que seguia a meu lado e que, a cada pedaço de turbulência, se agarrava a mim…fosse a Claudia Maria Schiffer e a história teria sido diferente! Sem turbulência, claro está! A chegada foi tardia e as primeiras impressões de uma semelhança brutal com a Gran Canaria – entre a Playa del Ingles e a Playa de Las Americas há semelhanças tão incontornáveis quanto a relação de vizinhança das 2 ilhas!

Dias passados maioritariamente entre o Papagayo e a praia! Papagayo para hidratar e a praia para plena satisfação da necessidade vital para quem nasceu tão perto do mar! A temperatura da água não seria a ideal – de acordo com os padrões Gregos – mas, para um Espinhense habituado a estas lides…estava fresca!

Festejamos a amizade Luso-Helénica, em todos os momentos em que pudemos estar juntos, e descobrimos que temos maneiras de ser bastante idênticas – sempre sem afectar a amizade ou respeito que nos unem.

Maravilhoso voo de volta para Cork – que estava 21 graus abaixo da temperatura da ilha – e o tabaco a ser capturado na fronteira, por um troglodita da alfândega (que não a discoteca em Caminha….antes fosse!!!!) que só exclamava que a Espanha nunca tinha pertencido à União Europeia! Um intelectual, claro está!

Após pedir uma qualquer declaração, atestando que o tabaco tinha sido apreendido, resolvi dar meia volta e seguir para casa – onde me esperava uma mudança para o apartamento novo!

A ironia da vida é agora tentar perceber como é que 4 dias apenas te colocam na cara um sorriso tão duradouro….

Aquele abraço.

A calma ou acalma…eis a questão.

Prometeste-te (sim, está bem escrito…prometes a ti próprio) um fim de semana tranquilo, cumprindo somente a tradição habitual do brunch e pouco mais. Compras só algumas Super-Bock para acompanhar e sabes que o fim de semana vai ser de descanso.

Se a sexta-feira foi de música, amendoins e Super-Bock, enjaulado entre as quatro paredes da casa do Altus que te permitem vencer o frio, já o mesmo não se pode dizer dos dias seguintes…viver com Brasileiros é um samba constante!

Não só a Super-Bock desapareceu como o frigorífico apareceu cheio de Heineken!

Um homem nunca se deixa derrotar e, por entre uns hambúrgueres maravilhosamente confeccionados, a Heineken foi escorregando pelo esófago. Acho que tanto o sábado como o domingo foram momentos ímpares de confraternização, gargalhadas – com e sem sentido – e uma dor de cabeça no dia seguinte.

O que tem realmente piada na casa é o facto de conseguirmos sempre mais uma gargalhada, mais um sorriso, mais uma situação inesperada – com que todos nos rimos – sem atrapalhar a harmonia diária.

Amor é…cafeína!

Sentado no sofá e refém da sua caneca de café. Mentalmente analisando a evolução do percurso: começou num pequeno curto pela manhã, evoluiu para dois curtos pela manhã para, finalmente, voltar ao conforto da cafeteira de sempre – a quantidade ideal, o aroma possível para a tecnologia utilizada, a temperatura ideal!

Revê os emails recebidos, analisa cada proposta como uma oportunidade de ir conhecer outras paragens, responde no messenger e sorri. Ainda não está funcional e a audácia leva-o a uma segunda cafeteira de café. Recorda a combinação que fizeram na casa e, caso tudo corra bem, em breve terão uma máquina de café para todos!

Liga a TV e acompanha o pequeno-almoço das várias emissoras: os programas simples feitos para uma audiência fácil de cativar e ainda mais fácil de manipular. Muda para a CNN e dá de caras com o Jim Acosta, de sorriso renovado, que me dá as últimas notícias da Casa Branca.

Levanta-se do sofá, desliga a TV e chega à conclusão inicial: deveria haver uma fórmula mágica que, analisando o estado do paciente, indicasse imediatamente a dose de café necessária para o equilíbrio diário! Ora….aí está uma invenção digna e capaz de gerar lucros por muitas gerações.

Está frio, exclama enquanto abre a porta para sair de casa! A diferença de temperatura entre o interior e o exterior é elevada e o choque térmico leva-o a bater a porta, ficando dentro de casa!

Devaneios matinais de quem precisa de um edredão eléctrico para se deslocar…

Um brinde a uma vida nova!

Se me perguntasses como viver um sonho eu respondia: entra com o pé que te apetecer, distribui as coisas como o consenso dos habitantes o ditar, faz uma primeira refeição de sonho, lavem a louça juntas, sentem-se no sofá a digerir à volta de um bom jogo de caixa dos antigos…chamem-lhe o baptismo, se quiserem!

Como não perguntaste…também não te conto! 😉 Ahahahahahahah. Apenas feliz, sabendo que estás bem! Medos, receios e afins não constam nas tuas batalhas passadas e certamente não ousarão marcar presença na vida presente e futura! Ri, despropositadamente, e espalha essa “virose” por todos os habitantes. Estabeleçam consensos, distribuam tarefas, criem laços de equipa e vivam sem imaginar o gozo que é a vossa vida!

Na mesma situação eu recordo que dei uma festa para todos os meus vizinhos – não, não conhecia nenhum! A casa acabou de pantanas mas a surpresa maior estava reservada para o dia seguinte quando, saídos do nada, todos os convidados do dia anterior se apresentaram para ajudar na faxina!

A vida está cheia de feitos inesperados e tu és o mais bonito que me aconteceu!

Perdi a vergonha…

Ainda caíam gotas dela….notava-se que estava a precisar de descanso mas a hora era de acção e o descanso passou para um segundo plano.

Toquei-lhe com a gentileza possível de quem toca algo húmido e a precisar de repouso. A minha mão rodeou-a e apertei-a um pouco para que não me fugisse.

Coloquei aquilo que ela gosta bem dentro dela e fiz uma ligeira pressão para ter a certeza que estava conforme fui ensinado. Sim, estava.

Aqueci-a até obter dela os primeiros acordes de sucesso. Assim que ouvi a sua manifestação de dever cumprido, imediatamente peguei nela e, manipulando-a cuidadosamente, virei-a!

É um prazer diário. Adoro a minha máquina de café!

Lágrimas de emoção

Que grande alegria me deste…

É verdade, não devemos nunca ficar alegres com a tristeza alheia. Sim, eu sei. Tratando-se de uma batalha pela felicidade, não sinto que esteja alegre com tristeza alguma! Quando se batalha por algo, da forma – pausada mas racional – como o fazes, só posso estar alegre por ter-te perto de mim.

Falaste do meu coração como se o conhecesses. Muito provavelmente porque ele tem a estranha mania de controlar as minhas acções românticas e, após as suas acções, sai de fininho – rindo como o Muttley. Não que se ria do sentimento mas apenas se ri de satisfação por estar mais perto de um coração semelhante.

Nem só de semelhanças é feita a vida mas, e aqui dou um voto de louvor a nós os dois, que nós temos tido a nossa dose de semelhanças…não há como negá-lo. Somos o fruto de uma série de coincidências que nos colocou no caminho um do outro. A mais bela série de coincidências, ousaria dizer.

O teu texto de hoje tem tudo o que eu gostaria de receber de ti: honestidade, pragmatismo, receio…acima de tudo, tem uma dose de força tua para enfrentares as adversidades com que te deparares.

Quero poder dizer-te ao ouvido palavras que nunca te escreverei mas que ousarei tentar fazer-te sentir, sempre!

Mais do que um beijo, o maior abraço amoroso do mundo!

Rubores que espalham por aí…

A cara, linda como sempre, aparece no canto superior direito acompanhada de uma bola verde à sua direita. Respiro fundo, trocamos breves impressões e a cara linda e a bola verde cedem o lugar a outros que continuam ligados. 😦

Questionas-te se faz sentido ficar corado perante uma imagem que aparece e desaparece…são questões que te são respondidas de dentro para fora e, sem dares conta que estás com o teu sorriso traquinas (sorriso traquinas é uma marca registada por mim e qualquer utilização requer autorização prévia). 🙂

Conheces o sorriso traquinas e sabes demasiado bem o que ele significa para ti. Não dominas os momentos em que ele aparece mas é algo que sabes que estar a acontecer pois começas quase a fumegar das faces coradas. Sabes perfeitamente que colocar uma cara de quem acabou de ser bafejado pela fuligem de uma locomotiva não é a melhor maneira de disfarçar o que sentes. Nunca disfarçaste nada, não comeces agora! Diz-te o Zé… 🙂 🙂

Apresento-vos o Zé! Provavelmente já tinham lido algo sobre ele mas hoje eu apresento-o à sociedade. Não vai debutar no Ateneu Comercial do Porto mas as redes socias, blogs e afins parecem-me um cenário muito mais digno de iniciar a sua vida em sociedade!

O Zé, indivíduo de uns quarenta e qualquer coisa anos de idade, é o mais assertivo dos seres sem existẽncia física! Dá-te conselhos que não acatas, dá-te sugestões que raramente segues mas, acima de tudo, é o teu maior confidente – aquele tipo de pessoa que, apesar de apresentarmos à sociedade, sabemos que colocamos a nossa vida nas mãos dele (se ele as tivesse).

Aquela vozinha, no fundo da tua cabeça, que sempre te incentivou quanto te faltava incentivo, sempre te empurrou quando não querias andar, obrigou-te a correr quando querias descansar. Obrigado Zé! 🙂

Alinhamento de linguagem

Numa galáxia perto de si, a apenas alguns milhões de anos-luz, os sujeitinhos locais argumentavam sobre qual a melhor maneira de comunicar. Os sons que emitiam não formavam uma linguagem perceptível por ambos e as faces alteradas pela cor da emoção não disfarçavam o sentimento.

De um lado o macho, sem quaisquer pretensões alfa (nunca é demais salientar), abanava o seu corpo – numa espécie de dança inventada para o efeito: corpo muito atabalhoado no movimento, face corada pela falta de movimento natural mas cheio de convicção que o objectivo da dança seria alcançado. Do outro lado a donzela – a face linda que ele havia memorizado havia tantos anos, os olhos concisos e mordazes, a face dourada aos olhos de quem a olhava, o sorriso escondido pela face obrigada a estar séria.

Ao tocar na mão dela – talvez porque fosse a primeira vez que o faziam com o sentimento presente – estremeceu. Ela perguntou-lhe se ele estava nervoso e ele, quase a hiperventilar e desesperadamente procurando um saco para repôr o ritmo respiratório normal, respondeu que estava “apenas” emocionado…(ele era mentiroso nas situações em que sabia que seria imediatamente apanhado).

Para quem olhava ao longe eles nitidamente pareciam alinhados mas, para ambos, eles estavam apenas sintonizados numa mesma onda, obviamente larga, mas a maré ora enchia ora vazava. Era na praia-mar que estavam mais juntos – quando percorriam a areia do conhecimento que pretendiam ter um do outro e, ora molhando o pé na água salgada e fria ora voltando à areia, debatiam o que os separava.

Foi no debater o que os separava que descobriram o que os unia…e foram felizes para sempre!

The end.

Sem rotina

O Zé lutava contra os pontos finais. O máximo que ele algum dia arriscou foi um ponto e vírgula que, posteriormente, substituiu por reticências. Nunca mais voltou ao assunto, olhou à volta e viu que o mundo continuava alegre e pronto a abraçá-lo. Abraçou-o de volta e submergiu no seu novo mundo.

Foi a busca de abraços que o levou a uma pausa que não havia programado. Recordava aquela conversa,  no muro das Sereias, como se haviam encontrado, as vicissitudes do encontro e a que agora se tornou a “habitual espia” – que rondava como um perdigueiro que sente o odor da presa mas anda perdida na procura para a entregar ao dono.

Se havia algo que eu notava no Zé era a grande evolução em termos de inteligência emocional – ele não sabia a quem atribuir o mérito e eu ousei perguntar-lhe se o facto de se ter rodeado dos melhores e ter tido as ervas daninhas afastadas não teria contribuído para o belo prado verdejante em que a sua vida se tornara. Ficou no ar, como pergunta retórica, pois o Zé é um homem de poucas respostas…

O Zé olhou-me nos olhos e disse: arrisquei uma vírgula! A cara estava corada e, em termos de Zé, isso significa que a vírgula tinha sido deliberadamente colocada para sugerir o que lhe ia no pensamento. Não se desculpou com o uso da vírgula pois sabia que o diálogo, em que a havia usado, era com a escolha pessoal dele.

Arrisquei perguntar ao Zé…é mútuo? O Zé mudou de expressão e, com cara de garoto que se sente encurralado por uma sugestão que pode ser a verdade, confessou: não sei. Queria que fosse, disse. Faço o que posso para que seja mas temo demasiado o que possa ser. Temes?, perguntei eu. Não, respondeu-me o Zé, com as bochechas ainda ruborizadas…

O Zé aproximou-se do meu ouvido e segredou-me: sempre gostei dela! Daquelas linhas artísticas que ela tem, do dom linguístico que aplica de cada vez que se expressa, da sua maneira de agir e de pensar. Subiu o tom de voz para dizer: isto dura desde os 17 anos…haverá cura? – perguntou como se estivesse perante uma pandemia em que ele é a única real vítima.

Zé, perguntei com um tom de quem precisa de saber a verdade para continuar a conversa de amigos: porque achas que se trata de uma doença se tu tens a vacina…tudo o que tens que fazer é perguntar-lhe! O Zé assimilou a resposta – ou fingiu assimilar porque este homem já sabe as respostas às perguntas que coloca – olhou-me nos olhos e disse-me: é bom ter-te como amigo porque permites que a conversa flua sem que todas as respostas estejam presentes…

Levantou-se, deu-me um abraço e, quando já caminhava para casa, voltou-se para trás e exclamou: um dia vamo-nos rir disto! Sorri-lhe de volta e percebi que a vírgula não tinha sido usada como pausa mas como catalizador…o Zé havia sido directo e tinha agora um pretenso receio da sua acção.

Foi com uma sonora gargalhada que reagimos ao “um dia vamo-nos rir disto”! Já passamos por tanto juntos que os segredos de um não passavam, para o outro, de um intervalo de tempo em que toda a história seria revelada…

Regras da natureza…

Dia de celebração, de contentamento, de Super-Bock, de tempestade e de muita televisão. Porquê? Porque agora o menino “Callum” está a atravessar a cidade de Cork – ventos estupidamente fortes, chuva de toda e qualquer direcção, frio, algumas enchentes na cidade e um mal estar…

Enquanto Irlandês herdado temporariamente pela República da Irlanda, telefonei para o Off Licence e reservei oito Super-Bocks para o fim de semana (4 litros de cerveja para entreter estes dias de reclusão). Preso em casa mas com a mente solta a navegar por ideias que nem sempre ouso escrever, gritos que não vou dar e abraços que, estando em stock, terei que entregar.

Após ter passado o dia de ontem a desfilar o casaco novo pela herdade de Altus, hoje é dia de melhorar as prestações no Fortnite! Começar uns treinos após o jantar, pausa para uma trinca rápida e de volta ao treino. O gozo inerente ao já não conseguir jogar o que outrora jogava e ver outros, com a idade que outrora tive, a darem verdadeiras lições de como jogar o jogo.

A vida é igual…mas real e sem armas! Combate-se com o coração…

Palavras proibidas

des·ma·me

(derivação regressiva de desmamar)

substantivo masculino

  1. Acto ou efeito de desmamar.
  2. Época em que deixa de haver amamentação.

“desmame”, in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, https://dicionario.priberam.org/desmame [consultado em 20-09-2018].

Talvez uma palavra a ser censurada do dicionário português! Trata-se de um acto violento – para ambos os sexos – e o seu uso deveria assentar numa autorização prévia de um qualquer organismo público que supervisionasse a sua utilização.

O homem nasce e agarra-se às mamas para sobreviver, quando muito ainda tem direito a um suplemento – já fora da mama – mas enganado por objectos que apenas simulam o mamilo. Assim, desde tenra idade o recém-nascido habitua-se à ideia que a mama é fonte de alimento. Precisa delas para sobreviver, para se desenvolver e crescer. A natureza humana sobrepõe-se a qualquer preconceito e a Mãe alimenta o filho(a) em qualquer ocasião em que tal seja necessário.

O fascínio, todavia, não termina por aí e, apesar de um hiato de tempo em que o outrora recém-nascido esquece a beleza da sua fonte de energia, depressa as protuberâncias femininas voltam a fazer parte do quotidiano do adolescente. Deixam de ver a fonte de energia de uma forma para a passarem a ver como fonte de energia para actos mais apaixonantes, não tão recompensadores energeticamente – bem pelo contrário – mas demasiado recompensadores de outras formas e feitios (porque a beleza provém também da diversidade existente).

Existem as ameaçadoras – que gritam por alguma acção no perímetro delas, existem as sensíveis – que se exaltam quando “sofrem” um afecto mais enérgico, existem as ultra sensíveis – que clamam que qualquer tipo de acção que interrompa o status quo é passível de conduzir a algo mais (eu, pessoalmente, designo estas por falsos positivos).

Existem de vários tamanhos e feitios e é isso que talvez conduza a que o homem não resista a olhar – o homem tem esse gesto não como voyeur mas porque apenas pretende saber em que pasta do seu arquivo deverá colocar a memória do que acabou de visualizar. O homem, como ser estudioso que é, procura o maior número de modelos de maneira a produzir um catálogo que possa passar a gerações futuras, numa procura insaciável (belo termo) pelo par perfeito.

Curioso é constatar que é um trabalho que nunca acaba! Saúdo os homens que todos os dias saem de casa – quais columbófilos – na procura da melhor ave. Umas voam, outras são estáticas mas, acima de tudo, todas nos deixam recordações.

Amanhã falamos de traseiros…

Criar algo simples…

O simples Porto-> Faro e Faro-> Porto transforma-se num Porto-> Amesterdão e Amesterdão-> Dublin. Assim começou o domingo de retorno a Cork…voo cancelado e a opção a não ser a melhor mas a possível. A KLM dá-me a protecção de preço e o voo passa a ser Porto-> Madrid e Madrid-> Dublin…menos mal mas ainda tens 3 horas e meia de autocarro entre o aterrar em Dublin e chegares a casa em Cork. O voo ideal, marcado com meses de antecedência, por uns míseros EUR 92 transforma-se numa saga de EUR 260 e mais EUR 20 para o autocarro…ninguém merece mas a Ryanair faz questão de dar estas “ofertas”.

Chegas a Madrid e tens 20 minutos para apanhar o Madrid-> Dublin, o joelho cede quando começas a tentar um passo mais acelerado e, graças ao feliz encontro com o homem do carrinho de golfe – que apoia os menos válidos (o trocadilho aqui aplia-se porque em espanhol se diz mesmo assim) – que te leva à porta H4 quando o relógio assinala as 15:55 (hora de partida do voo). Cais no lugar do meio e só acordas em Dublin…haja algo de bom na viagem de regresso! Chegado a Dublin eis que a Aircouch está a minutos de chegar e tu já tens bilhete para as 3 horas e meia seguintes…chegas a casa às 23 horas quando tinhas tudo previsto para ter chegado às 15:30 a Cork!

Sentes diferentes vazios…um porque é a tua amizade mais próxima e merece todo o carinho e atenção do mundo, outro porque não deste continuidade a algo que gostavas que tivesse continuidade e um último porque uma viagem que deveria ter sido tranquila se tornou em algo tão atribulado. Levantas o nariz e enfrentas as adversidades! Verificas o email e vês que recebeste uma notificação com os nomes das tempestades para 2018/19 e exclamas “voltei, já tenho informação privilegiada para enfrentar o clima!” Sorrio mas não é um sorriso de felicidade…é apenas uma exclamação sob a forma de sorriso, talvez tenha sido um suspiro…quem sabe? 

De volta à cidade e pronto para as vicissitudes da semana irlandesa. Haja virtuosismo e boa disposição!!!! Até já!

Maldita pontuação…

Ela falava com pontos finais e de exclamação e eu respondia com pontos e vírgulas e interrogações. Semelhante a um interrogatório dos tempos da Gestapo, o suposto espião desviava-se das questões mais pertinentes (soariam a acusações?) sem nunca colocar um final na cadência do diálogo: como se se tratasse de um sádico, que adora aquecer debaixo do holofote potente dirigido aos seus olhos.

Ela fazia analogias e ele teorizava sobre ambos os lados a serem comparados. Ela fazia parágrafos e ele abandonou a pontuação e, ao melhor estilo de Saramago, perguntou-lhe se ela seria a Pilar del Río dele…A pergunta devia ser retórica, sem que o autor se apercebesse, pois recebeu como resposta mais uma série de pontos finais.

Ele lutava por vírgulas, pontos e vírgulas, reticências e ela respondia-lhe com pontos finais, pontos de exclamação e parágrafos. Parágrafos sem que houvesse qualquer discurso directo de seguida, apenas soando a uma pausa no diálogo imposta pelo bom senso feminino.

Falaram de tudo sem nunca aprofundar nada e, no final, ficaram com a sensação que poderiam ter aprofundado tudo sem falar quase nada. Talvez não seja a distância que os separa mas apenas e só as diferentes maneiras que usam para pontuar as frases…

Uma ida a casa…

O reencontro com o meu descendente foi tão recompensador quanto o reencontro entre dois melhores amigos. Obviamente que me perguntou se a prenda de aniversário da Mãe tinha chegado e eu entreguei-lha…fugiu para um canto para testar o seu novo som e era vê-lo colocar o polegar ao alto para me informar que estava de acordo com as expectativas.

Na primeira noite ainda corri para o cantinho húmido do costume: Jorge a dar o seu melhor, Fellaini a rasgar com o seu rock alternativo todo e a Super-Bock a saltar geladinha. Recordo-me apenas que optei por não sair de dentro do Bombar e ter optado por ficar a delirar – sim, delirar – com todo o metal com que o Fellaini nos brindou – até Wolfmother nos entreteve! Eram 2 da manhã quando cheguei e a polícia acabou com a festa por volta das 3 e meia – o que acabou por resultar muito bem porque me permitiu passar pela padaria e engordar mais um pouco!

No dia seguinte corri para o porto seguro de sempre onde a mãe adoptiva estava com o seu filho e a minha melhor amiga. Abraçamo-nos como sempre e retomamos a conversa onde a tínhamos deixado: não havia novidades que eu não soubesse mas apenas uma necessidade de reforçar o apoio a quem mais significou e significa – sempre – em termos de amizade, dedicação e carinho. És insuperável na tua maneira de seres minha amiga, Obrigado!

O inesperado serviu para darmos uma lição de amizade a todos os que nos rodeiam e, mais uma vez, superamos a “prova” com distinção. Num momento infeliz houve uma equipa de amigos que conseguiu, com toda a naturalidade do mundo, proteger uma pessoa que sempre nos disse e diz tanto, ensinou e ensina tanto, dedicou e dedica tanto tempo. Há amizades insuperáveis e esta é e será sempre a minha.

Sei que estás em boas mãos pois vi o quanto todos queremos o teu bem e quanto naturalmente damos para que tal aconteça! Nunca conseguiremos ser tão completos quanto tu és mas sempre te serviremos com a mesma dedicação com que nos ensinaste e estamos sempre aqui para ti! Mereces todo o bem do mundo.

Muitas vezes, ao longo da minha vida, conseguiste milagres: roubei-te uma amiga com quem casei e de quem sou um grande amigo, mostraste-me sempre um sentido mais amplo e calmo das coisas e das pessoas, és e sempre serás a minha inspiração para o que de mais belo há no mundo – uma das raras pessoas que existem no mundo capaz de o fazer e que eu, cedo na vida, tive a sorte de ter encontrado. Sempre juntos!

Obrigado a todos pelos bons momentos e pela forma como juntos superamos os momentos menos felizes nesta curta passagem por Espinho. Vocês mostraram-me que a união faz a força e que grande força nós somos!

Um grande abraço a partir de Cork.

Sempre lindas

Mudei o ângulo em que tinha a cadeira e observei ambas. Havia uma expressão comum nas duas: eram lutadoras como eu nunca havia visto na vida real, estavam numa pose de descanso, mas descortinava-se nas suas faces as chagas das batalhas e o olhar pensava no fim da guerra sem nunca descurar que a batalha seguinte estava a minutos de distância.

A soma de anos de amizade comigo aproxima-se de 100 e eu, um pouco afastado mentalmente da conversa, só pensava nas voltas que a vida realmente dá. Haviam concretizado os seus sonhos, mas com grandes custos. São mulheres com ideais muito semelhantes aos meus e não demorou muito até que eu fosse criticado por outrora me ter misturado com gente sem ideais.

Adoro ambas num sentido completamente diferente: de um lado a melhor amiga que nasceu comigo e, do outro, a primeira paixão que nunca deixou de me fazer corar sempre que a vejo. Sinto-me um puto reguila quando estamos juntos – não pelas traquinices da juventude, mas pela sorte que tenho por tê-las perto de mim. Fico com a mesma cara de um recém-nascido após a primeira gargalhada…quando o bebé tem o primeiro sorriso e, porque talvez tenha gostado da sensação que o sorriso lhe provocou, o repete vezes sem conta.

Adorava poder conceder a ambas tudo o que desejassem – mesmo se eu não estivesse incluído – pelo simples prazer de voltar a ver os sorrisos de outrora nas faces delas. Abertos, sonoros, vindos do mais profundo de dentro delas e de fazer as multidões corar de inveja.

Não tendo o dom de mudar as coisas eu aproveito para passar o meu tempo com elas: as palavras são ditas com mais facilidade que os actos, disse-lhes. Todos temos uma maturidade diferente de quando crescemos juntos, aceitamos partes do destino sem nunca deixar de o enfrentar, rimos com a consciência de que o minuto seguinte poderá ser de lágrimas mas nunca deixaremos de ser o que sempre fomos: bons amigos.

Adoro-vos! E esse sentimento nunca deixarei que mude.

Como momentos simples podem ser tão saborosos.

Havia muito tempo que o Zé não se cruzava com esta amiga para quem se dirigia agora. De facto, o Zé não tinha a certeza de ser considerado um amigo, mas acima de tudo, ele sabia que ela é das caras mais bonitas da sua vizinhança. Ele nunca a havia esquecido; bem pelo contrário, ele recordava-se amiúde dela.

Haviam confidenciado detalhes das suas vidas e, de alguma maneira, haviam-se ajudado mutuamente. Havia, pelo menos, um carinho implícito nas palavras que haviam trocado. Trajado de desconhecido, na visão que ele imaginava que a amiga tivesse, ele caminhou ao encontro dela. Havia borboletas no estômago, recordações muito vagas na sua mente, mas também muita coragem no querer – de facto – estar com a amiga em questão.

A coragem misturava-se com a cobardia e a coragem ganhou. Saiu de casa, caminhou pela rua abaixo e chegou ao destino sem que conseguisse encontrar a amiga que o fazia mexer nesse início de tarde. Fazia muito calor, mas o Zé – homem outrora sediado na cidade de Atenas – sabia bem superar as agruras do calor extremo. Havia descartado a camisa de algodão ateniense em prol de uma camisa mais clara e em tons azuis que combinavam com os calções de banho azuis que trajava. As sandálias eram as habituais Havaianas a que se havia rendido aquando da sua passagem pela Grécia.

Encontrou um amigo de longa data, que o chamou, para logo de seguida encontrar um outro. Pensou estar, de certa maneira, cercado por testemunhas, mas, calmamente, percorreu mentalmente todo o percurso e rapidamente chegou à conclusão que estaria mais perto de um ataque de pânico do que propriamente cercado.

Ela chegou, ele despediu-se do amigo e partiu com ela. Trocaram palavras simples, mas acerca de um assunto complexo. Sentaram-se no muro da praia que outrora foi sua e aprofundaram o diálogo. Não havia nada de romântico no que falavam e o tema era absurdamente oposto a qualquer romantismo. O Zé olhava mais para ela do que escutava a conversa. O Zé estava claramente ofuscado pela beleza que havia diante dele.

Decidem trocar de local e caminham pela cidade acima. São dois seres que gostam da sua cidade e ele leva-a até à rua que a conduzirá até ao supermercado onde faz as suas compras. Abandona-a no meio de uma feira de usados, após ter indicado o caminho correcto, e desce para casa. Olha para trás duas vezes e questiona-se sobre o que aconteceu. Não sabe a resposta e não sabe sequer se havia essa pergunta.

Interroga-se agora em casa e decidiu ligar-me. O Zé tem sempre prioridade no meu atendimento e, juntos, debatemos o tema. O Zé acha que não é nada e eu acho que pode ser tudo. Estamos em extremos opostos em termos do que achamos que a situação é.

O Zé adormece no sofá e eu vejo o sorriso dele a abrir enquanto vai perdendo a luta com o sono. Eu já vi o Zé assim.…ele está com dúvidas, mas feliz.

A amizade celebra-se!

Passei toda a minha vida sempre com uma amizade que designei como sendo a melhor. Melhor porque é superior em tudo: na bondade, na presença, na cooperação, na partilha de momentos únicos, nas gargalhadas que ainda hoje demos, no medo e receio que tínhamos com desafios que enfrentamos, na praia e no campo, no mar e na terra. Este bem poderia transformar-se o maior parágrafo alguma vez escrito se eu fosse enumerar todas as tuas virtudes! Não o farei porque é a intimidade da nossa amizade que prevalecerá – contra tudo e contra todos.

Não tenho a receita mágica para te devolver todas as forças de que precisas, mas dou-te toda a minha força para que triunfes…sempre! Sempre foi assim e sempre será! Essa é uma certeza que terás que viver sempre com.

Num mundo perfeito jamais te terias cruzado com as adversidades com que te cruzaste e que eu presenciei. Num mundo perfeito o povo ansiaria por ser como tu, trabalharia para conseguir tanto como tu sem nada pedir em troca. Num mundo perfeito tu irias sentir-te envergonhada com todo o reconhecimento que te seria dispensado, mas, como tens a certeza do teu valor, saberias superar o reconhecimento para, como sempre o fazes, superar-te cada vez mais.

Vejo-te como o desenho perfeito da amizade – sem qualquer necessidade de retoque ou edição. Nunca conseguirei sequer estar perto de um esboço desse desenho perfeito de amizade que és, mas a simples tarefa de tentar dá-me a certeza da tua grandeza e do teu engrandecer constante.

Tudo em ti parece fácil de executar – porque és tu que executas! Se, após ter memorizado como o executas, tentar o mesmo exercício eu apenas consigo sorrir, desistir de tentar e, com o meu sorriso malandro, sentir o maior orgulho do mundo de cada vez que me chamas de amigo.

Amar é possível na amizade e eu sempre soube que amava a nossa amizade pela simplicidade com que sempre a executamos. Uma espécie de engrenagem que se encaixa e se mantém em movimento muito para além do tempo em que estamos juntos.

Tentei, mas acho que ainda não consegui a descrição ideal da nossa amizade. Continuarei a tentar! Sempre juntos!!!

Sonhos de um jogo de futebol…

…feminino!

Bastaria levantar-se e sair pelo lado esquerdo. A lógica, vista pelo meu ponto de vista, assim o dita. Todavia, levanta-se e vira-se de frente, dá um jeito na silhueta e, escolhendo o lado esquerdo de agora – oposto ao lado esquerdo de quando estava de costas – passa pela minha frente.

Sem lentes de contacto, mas a fazer um esforço por equilibrar o astigmatismo e a ligeira miopia, utilizo o canto do olho para marcar a trajectória. Assemelho-me a um central que, aquando da marcação do pontapé de canto, se ergue para cabecear como mandam as regras….de cima para baixo!

Faz deslizar a sua silhueta, por um “relvado” de alcatifa, num estilo semelhante aos melhores pontas de lança quando se dirigem isolados para a baliza…não falha a marcação e a convicção com que se isolou já o determinou.

Volta do intervalo com um sorriso renovado, solta o cabelo com os dedos, concentra-se na segunda parte. Está na frente do marcador e os segundos 45 minutos decidirão quem ganhará o jogo. O equipamento ainda tem provas do esforço despendido no primeiro tempo – colado ao corpo, revelando as formas e o quão em forma está.

Dá um jeito às chuteiras, puxa as meias até ao joelho, respira fundo e começa a segunda parte…

Um dia conto-vos o resultado final…

Beleza

Eram imagens rápidas, mas de uma beleza cativante – quase me projectavam para a presença, em termos de espaço e tempo. Decorava e sorvia os detalhes como se não houvesse amanhã e, com grande esforço, consegui armazenar uma grande parte na minha memória…espero não perder esse dom!

Foi totalmente inesperado, mas de uma proximidade sem igual. Foi a expressão de um desejo versus a expressão do mesmo desejo. Confusos? A confusão faz parte do caminho a trilhar para descobrirmos o caminho – uma espécie de vegetação densa que, com a ajuda de uma boa catana, se vai desbravando. Sim, já em 2002 passaste por uma experiência semelhante e, após o caminho aberto, viste uma das mais belas paisagens da tua vida. Parece que estás habilitado a este tipo de experiências e nunca deixaste de explorar a paisagem em todo o seu esplendor.

Há vontade de correr, de apertar, de ver mais de perto e poder, em conjunto, descobrir a paisagem na sua plenitude. Vontade de repetir a imagem, vezes sem conta, até se tornar uma memória permanente no teu cérebro. Uma espécie de beleza que queres incrustada na cabeça para, qual GPS, descobrires os melhores caminhos para a clareira.

Debateste as melhores formas de abordar o caminho e, em conjunto, chegaram à conclusão que é melhor perder o mapa e usufruir apenas dos sentidos para – tateando – descobrir a paisagem que procuram.

É um jogo de vontades e alinhamentos, de desejos e curiosidade, mas acima de tudo é a vida a desenrolar-se numa direcção que te apraz registar e aguardas pela tua vez de usar a catana para chegar ao objectivo. Com golpes delicados, mas decididos!

άλφα

Hoje foi uma espécie de dia atípico em que me coube a missão de explicar à audiência as diferentes fases de evolução de um programa (aplicação ou o desenvolvimento de software do início ao fim).

Não houve o início que todos esperavam pois comecei com uma grande gargalhada – maioritariamente cruzei-me com o assunto em 1988, ajudei ao desenvolvimento da aplicação de então e fiquei com a incumbência de, em ambiente de teste, obrigar a aplicação a cargas sempre superiores ao que a empresa desenvolvedora recomendava.

O produto passou por ambientes de teste, desenvolvimento e, após tudo muito bem testado e comprovado, foi colocado em produção. Foi, mais tarde, substituído por uma versão em que já não havia necessidade de dial-up a uma rede X25, nem N.U.I.’s…nada! A nova versão assentava nessa coisa inovadora de então que se designava por internet.

Confesso que já não me lembrava de grande coisa dessa altura, mas com a ajuda de alguns colegas de trabalho de outrora, construí algo que deixou o assunto bem explicado e interiorizado – foi a opinião final que me deram.

A gargalhada do início vem do termo “alfa” – que, na informática, designa a versão mais simples da aplicação. Significa isto que a primeira versão entregue tem que ser testada muito mais exaustivamente que todas as seguintes pois será a que mais erros certamente irá conter.

Incrivelmente dei por mim com um olhar de satisfação…talvez pelo facto dessa versão alfa se ter desenvolvido e se ter tornado num dos mais apetecíveis produtos de um dos bancos portugueses. Ou talvez tenha sido um ar de reprovação…por outras versões alfa nunca conseguirem sequer ver a luz do dia…. Curioso como a aplicação deixou saudades!

A informática tem o dom de fazer despertar chagas de outrora, mas – e todos hoje o sabemos – a informática é uma ciência de 0’s (desligado) ou 1’s (ligado) e, para memória futura, essa aplicação ainda hoje é usada por empresas com um número de movimentos diários que mais nenhuma outra aplicação comporta…talvez seja uma espécie de produto velho a quem não é dada a oportunidade de se reformar!

Desabafei…

É ao som de Soundgarden que o dia se desenrola…misturado com umas músicas de Kasabian (a inevitável gravação do King Power Stadium, aquando da conquista do campeonato por parte do Leicester).  🙂

Voltou o misto de chuva e sol…mas está um frio desagradável. Aqueles dias de calor, em que o vosso humilde arriscou mesmo uma ida à praia e um mergulho, estão no passado e agora estou somente focado na viagem a casa! 🙂 🙂 🙂

A vizinhança melhorou bastante e já consigo ver a verdura do exterior do edifício (LOL) – as árvores, bem pronunciadas, o relvado bem aparado e a beleza natural das árvores jovens que se vão desenvolvendo. Trata-se de uma analogia tão óbvia que até me apetece deixar isso escrito para memória futura…

De casaco simples mas com capuz, de sapatos quentes mas sem vontade de os usar, de cabeça num mergulho de praia mas refém num escritório de cimento.

Sorrindo por antecipação e amargurado pela demora! 😦 Quase a caminho. 😉

Aquele abraço.

https://youtu.be/xSji7VVNetY

Escoceses…

Há sempre um sorriso quando ele chega. A maneira de falar, o sotaque que uma vida não mudará, o sarcasmo muito bem aprimorado, eis o amigalhaço escocês logo pela manhã! Este homem é o personagem mais terapêutico do edifício em que me encontro: tem absoluta noção de onde está, porque está e quanto tempo vai estar e, acima de tudo, ainda nos ensina o porquê de tudo isto lhe dar tanto gozo.

Há que criar o contexto para que percebam melhor: indivíduo na casa dos seus sessenta anos, com pouco cabelo – que permanece permanentemente coberto por um gorro, aqueles óculos caídos pelo nariz, os poucos cabelos brancos e o olhar entre a parte de cima dos óculos e os teus olhos. Um encolher de ombros quando as condições meteorológicas mudam – algo que, aqui, acontece a cada piscar de olhos, um sorriso perante o Sol e uma imediata piada, com aquele sotaque bem profundo, contatando algo como: foi por causa deste Sol que me mudei para este país “tropical”.

Incentiva-nos pela experiência de vida que nos vai contando, pela piada que sabe que o seu sotaque causa – há inclusivé um outro escocês que diz não o entender muito bem (e sorri, enquanto o diz) e pela rapidez de raciocínio com que alimenta o diálogo – que por vezes se torna num monólogo – de tal maneira os restantes intervenientes ficam de queixo caído perante o “dialecto”.

A melhor comparação que conheço, para vos tentar elucidar, serão os dois velhotes dos Marretas (Statler & Waldorf) mas, e este mas faz toda a diferença, naqueles momentos de elevado sarcasmo que, pelo menos uma vez, terminam com um velhote desaparecido do balcão e o outro a perguntar “ele saltou?”

A semana começa numa segunda-feira mas o sentido de humor nunca adormece!

Boleia

Num país onde não tens carro, e onde o autocarro pode demorar 20 minutos a chegar e outros 40 até ao centro, qualquer oferta de boleia para casa é uma benção – para quem acredita nessas coisas. 😉

Acho que, pela quinta vez, me cruzei com o mesmo português – a quem outrora pedi desculpa por não ter reconhecido – e, mais uma vez (nestas coisas há que ser coerente) não o reconheci. Saí por volta das 20, para apanhar ar, e vi alguém – numa postura quase militar, de face mal humorada e com cara de poucos amigos – que me intimidou pela pose. Quinze minutos depois, quando todos saímos, qual não foi o meu espanto quando o colega que me tinha dito que havia boleia se dirigiu ao “alguém” de postura militar e lhe perguntou se havia boleia para mim… 🙂

Obviamente estes desencontros devem fazer parte desse processo milenar designado por envelhecimento! 🙂 A gargalhada que eu e o “alguém” demos foi mesmo porque ele tinha a certeza que eu não o reconheceria e a certeza dele  – que se tinha confirmado…mais uma vez! Tenho que arranjar uns comprimidos para a memória ou começar a guardar fotografias das pessoas que mais vezes esqueço – haverá cartões de memória capazes de armazenar tanta informação? 🙂

Viagem divertida e bem tranquila até ao centro, num carro que tinha chegado no próprio dia, e foi já na última curva que o pneu cedeu….cedeu perante a pressão da curva à esquerda em que, por segundos, o pneu foi trilhado contra o passeio e…borracha versus cimento é uma luta desigual! 😉

Saltamos os cinco do carro e, qual equipa de mecânicos de Fórmula 1, tratamos da mudança do pneu estourado. Eu disse “qual equipa de mecânicos de Fórmula 1”? Menti…tivemos que ver vídeos no YouTube para entender como se removia a roda e, mercê do conhecimento mais profundo de um dos envolvidos – que enfiou um bom biqueiro no pneu – o pneu foi substituído pela “rodinha 24” que hoje em dia serve de pneu suplente. 🙂

Seguiram-se as despedidas, com o sentimento de dever cumprido, e o caminho para o centro. Entretanto o Cucas havia ligado e estava a acompanhar – via Skype – a mudança do pneu, o estado de espírito dos envolvidos e, com palavras de força e incentivo, resolvemos o problema com toda a motivação do mundo. 

Demos umas gargalhadas valentes – eu e o Cucas – pela piada que é o programares tudo para ainda haver tempo para compras, antes do jantar, sendo que a mudança do pneu havia frustrado esses planos. Lá fomos juntos, na conversa até casa, a debater o novo plantel desse grande treinador do Fifa 2017. 🙂 🙂 🙂

Pequenos momentos inesperados que conquistamos com um sorriso na face!

Sonho tornado realidade

Sonhei que idealizava a amizade perfeita:  com um sincronismo de raciocínio muito semelhante entre as duas pessoas, com um sentimentalismo muito parecido, com uma cumplicidade muito superior à de qualquer irmão, com um sorriso permanente – muito semelhante ao do vencedor que, do degrau mais alto do pódio, sorri perante as adversidades que acabou de vencer…para ser o melhor.

Acordei e vi que me tinhas enviado uma mensagem com um simples “Só tu…” e um emoji simbolizando uma gargalhada nossa. Há duas exclamações em ti, pelo menos para comigo, que sempre me habituei a responder com uma gargalhada – nunca de gozo mas sim de antecipação!

As expressões são o “Só tu…” e o “Oh IKA” – que, desde sempre, serviram para tu exemplificares algo com o qual não concordas mas igualmente não discordas! Naquela tua maneira tão low-profile de fingir que se trata de algo que jamais farias mas, e ao mesmo tempo, não discordas totalmente que eu o tenha feito. Enfim, respeitas que eu seja traquinas e sorves cada detalhe dos meus momentos de traquinice – que, embora não sendo muitos, são deliciosos. Eu sei porque os vivo e, apesar da amargura em alguns dos casos, a experiência tem sido muito recompensadora.

Vivo sabendo que és real, que batalhas, que sorris, que discutes, que gritas, que dás gargalhadas sonoras que tentas retirar, depois de dadas, como se estivesses envergonhada do volume das mesmas. Nunca estejas! São sorrisos desses que fazem as pessoas sentir aquela doce sensação de felicidade que tanto procuramos e tu…tu ensinaste-me a saber procurá-la, constatar quando a achasse…talvez agora aprenda a saber segurá-la! Cabe-me a mim aprender essa lição.

Obrigado amizade, sempre contigo! Beijo de uma grandeza tal que permita expurgar tudo o que te apoquenta e trocar tudo isso por sorrisos!