A conversa talvez nunca tenha acontecido mas, a ter tido lugar, era assim que ele a visualizava. Invariavelmente estariam na varanda e, por entre um ou outro cigarro, o humilde narrador seria “interrogado” pela sua maravilhosa melhor amiga.
- Conta-me tudo!
- Desde quando?
- De 2011 em diante…
E o vosso humilde narrador, provavelmente corado, descreveria os eventos que tinham tido lugar entre o ano referido e a data de então. Consigo visualizar as gargalhadas, as lágrimas de riso e de choro, as nossas expressões de surpresa, o pedido de detalhes mais minuciosos, a partilha de toda uma série de informações sensíveis que eu sabia estar a depositar no cofre mais seguro de toda a galáxia!
Não foi preciso muito tempo até a conversa ter sido interrompida, para um recuperar do fôlego de toda a odisseia. E, obviamente, ela percebeu, percebeu bem demais que o maldito brilho nos meus olhos não era fruto de drogas leves mas sim de um coração completamente rendido. Rimo-nos perante as evidências – algo que sempre foi a nossa reação, sempre que atingíamos esse estado. Rimos das coisas boas e das coisas más, recordamos a loucura de tudo e o quão desfasado da realidade – da nossa, pelo menos – tudo era.
“Hoje senti-a!”, disse o vosso humilde narrador, nessa hipotética conversa. O sentir alguém era algo que, desde tenra idade, partilhávamos – algo não palpável, nem cientificamente comprovável – mas que concordávamos que existia. Uma espécie de aura que fazia o coração tremer quando sentia a proximidade de outrém, sem que pudesse constatar se outrém estava perto ou não. Mas, que batia sempre certo! Daí a cientificidade com que o usávamos!
A rires-te, deste-me a tua aprovação – chamavas-lhe benção mas eu sou ateu e traduzi.
Desabafo de um madrugador – 20/6/2020
