Talvez o melhor de tudo isto seja o tempo que tenho disponível para gastar em mim próprio – não sendo egoísta mas preservando tempo livre para todas as pequenas tarefas que gosto de executar com uma calma capaz de fazer corar um caracol que, apressado, tenta ultrapassar-me. Talvez possa culpar o calor mas a verdade é que ainda não estou aclimatizado tão bem quanto outrora e ainda tenho que tomar doses diárias de chuveiros gelados que, aquando da estadia anterior, já não necessitava.
Sinto uma sadia maturidade em todos os passos que vou dando e que, cada vez mais, fazem diferenciar quem atraio ou por quem sou atraído – numa espécie de magnetismo perfeito, sem histerismos ou desequilíbrios artificialmente sustentados, rumo a um estado de espírito de alegria, conforto e, acima de tudo, paz! Como se tivesse assinado um armistício comigo mesmo e conseguisse abordar qualquer assunto com uma abertura que, por vezes, me choca interiormente sem que a reacção passe de uma gargalhada.
A respiração é profunda e pausada e o que me rodeia traz uma uma satisfação que, não sendo elevada, é sempre constante – como se não descesse de uma velocidade ou subisse mas tão só e apenas mantivesse uma velocidade que, não sendo perfeita, é perfeita para mim. Vejo a natureza de forma mais cuidada, observo as obras humanas de maneira mais cuidada e nutro por mim mais cuidados do que alguma vez tive – não que ambicione ser um metrossexual do século XXI mas porque me dá um certo gozo – dentro da tal velocidade constante – “perder tempo” a cuidar de mim.
Desenho o itinerário da próxima viagem, desta vez sozinho, e constato que o destino tem que ser visitado por um humilde narrador desprovido de companhia e totalmente focado numa viagem com tantos anos de recordação que, contados, seriam suficientes para fazer corar qualquer viajante auto suficiente. Não quero ser um viajante mas sim o tripulante da minha nave espacial de sonhos que, provida de tempo suficiente, me levará a ilhas que ambiciono conhecer e que sei que poucos terão o mesmo desejo – o meu ideal de viagem é mesmo esse…alcançar algo meu, sem seguir passos, roteiros ou conselhos de outrem. Desprovido de catana, de “exploradores” anteriores, mas armado de coragem e disposto a afastar todos os ramos mais persistentes com que a natureza ouse desafiar-me.
As horas passadas no barco mais não são do que a natureza a demonstrar a sua grandeza e tu, com o grande respeito que sempre tiveste por ela, sabes que é possível ver diferenças num mar a ser conquistado por um barco – seja nas gaivotas que o acompanham, nas vagas que ele vai criando ou até, simplesmente, a observar a esteira do caminho percorrido e esse exercício de imaginação é o que de mais puro tens, como arma descarregada, para o desafio seguinte.
