O ponto mais alto.

Acordar às 5:30 da madrugada, depois de uma noite “distraída” a rever o Reservoir Dogs e a emborcar mais uma cerveja do que o aconselhável, o atravessar a rua até ao vidrão – para reciclar o vidro que conteve o líquido fresco e loiro da noite anterior, o ser surpreendido pelo companheiro de trabalho e a partida para a serra.

Atravessar caminhos chamuscados e outros com pequenos reacendimentos, o cheirar o queimado que empestou a região durante a semana passada, a primeira paragem para um café e a garrafa de água de 1,5L. Uma legião de motas que nos ultrapassa e uma outra que é ultrapassada por nós, a chegada a Manteigas para um reforço do pequeno-almoço e a compra de um pão local.

O seguir o mapa de outrém, para encontrar o início do trilho, o pedir informações a alguém local – que nos indica que “é sempre a subir!!!” (como aviso para a impossibilidade de ser feito a pé), o regresso ao carro com a certeza que escapamos ao inferno da subida. Nove minutos de carro, “sempre a subir” e eis a entrada do trilho e a constatação de que o carro foi a escolha acertada!

A imersão na verdura, acompanhados de perto por borboletas e outros bichos, um toque irritante na mão que mais não é do que um gafanhoto que parece pretender ser fotografado, imensas paragens para recolher imagens da natureza que nos rodeia, palavras de incentivo – sob a forma de “isso é o que todos fotografam!!!” – como forma de me obrigar a procurar ver o que habitualmente não é visto ou fotografado.

Por caminhos municipais, na procura de uma vista para acompanhar o almoço, estacionando junto a um pastor para o repasto pleno de colesterol e boa disposição. O retomar da fotografia, na descida da montanha, a bateria da máquina que cede muito antes do previsto. O regresso pelo caminho de ida e a atenção constante a bestas quadradas que apenas guiam um dia por semana.

Domingos de trabalho – 23/9/2024

Quando se almoça com esta vista…👌

O clique que faltava.

Já não me recordava da última expedição punitiva que havíamos feito ou sequer qual havia sido o destino o que, em bom abono da verdade, apenas significa que fui obrigado a relembrar as fotografias para poder lembrar-me do percurso. Viana do Castelo, pois claro!

Em cima da mesa estava agora a possibilidade de visitar uma praia de outrora e, da margem oposta, captar os melhores momentos do fogo de artifício que encerra o evento. Como sempre, a aventura não se cingiria ao planeado e tencionávamos aproveitar o máximo de luz solar bem como o pôr-do-sol.

Por entre domingueiros dispostos a guiar num dia diferente do habitual e “fanáticos” armados com toda a parafernália para um mês de férias, eis-nos a reconhecer o território muito antes da hora do evento principal. O local ideal, onde fazer a inversão de marcha para evitar o trânsito no final, onde beber um copo, planos B variados…nada foi deixado ao acaso!

Um salto rápido até a uma cidade próxima, um churrasco valente a servir de repasto, um copo tranquilamente bebido num Furadouro pejado de pessoas. A hora rapidamente chegou e, munidos de todos os estudos antecipadamente elaborados, dirigimo-nos para o ponto X, definido como o ponto perfeito para captar a essência do que aconteceria do outro lado da margem.

Infelizmente, outros estudiosos já haviam descoberto o ponto X e, por entre mesas de campismo, minis a serem sorvidas e esgares de quase ódio, lá conseguimos chegar a um dos pontos alternativos previamente definidos (é treta mas fica bem no texto). Montada a parafernália fotográfica, lá conseguimos captar alguns dos momentos altos do fogo de artifício que tínhamos planeado, por entre alguns encontrões e cuidados redobrados para não pisar algum incauto.

O vadiar do amador – 8/9/2024

Onze horas e meia de trabalho!

Saímos uns minutos mais cedo do que é habitual, chegamos ao primeiro café com a área de serviço ainda em modo nocturno, compramos os primeiros pertences fundamentais: a água e café.

Com um início de viagem por entre nevoeiro e neblinas matinais bem cerradas – até parecia inverno. Chegamos ao meio do caminho para a primeira montanha e tiramos as primeiras fotografias numa contraluz espectacular.

Continuamos a viagem, demos uns giros para recolher mais imagens, ligamos para o restaurante a tentar reservar o almoço – é domingo e, neste dia específico, há “profissionais” que reservam mesa mais rapidamente do que nós (provavelmente de uma semana para a seguinte) pelo que fomos obrigados a recorrer ao plano alternativo – a pizzaria de Gralheira. 

Com tempo ainda disponível, e com alguns pontos de interesse situados nas imediações do restaurante, fomos fotografar a vizinhança com um olho a observar o restaurante. Um ponto de água, uma ponte comunitária, as vielas e os becos que cercam o restaurante (onde a Sabrina é quem manda).

Arranjamos mesa, encomendamos vitela e, passados uns minutos, chegou o cozido à portuguesa, seguido de vitela assada no forno e, por último, um naco de vitela (trabalham por menu e cada cliente tem direito aos três pratos). Um copo (lol) de verde branco a acompanhar e um pudim de sobremesa fecharam o modesto almoço.

O regresso foi feito via serra da freita, paragem em Arouca (para umas castanhas e uma caminhada), captura de inúmeras libelinhas que ladeavam o trilho à beira rio. 

Foi um dia de temperatura quente, com vários trilhos percorridos – com o cheiro fresco dos cavalos a acompanhar, três castanhas comidas e um almoço numa pizzaria que só vende pizza aos incautos mal informados!

Pelos trilhos de Portugal – 21/7/2024

De costas voltadas.

Os caminhos de Portugal. 🎶🇵🇹

Um dia, estava eu a coçar a cabeça a tentar encontrar a configuração perfeita para tirar uma fotografia em modo manual, quando alguém me disse: de 15 em 15 dias, grosso modo, vou por aí fora tirar fotografias dos sítios por onde vou passando. Queres vir também?

O aprender a fotografar, como tanta coisa na vida, está na tentativa e erro. As decisões pobres que dão azo a decisões mais ricas, o constatar do que estamos a fazer mal e o rectificar até ficar melhor – num trilhar a caminho da perfeição. Embarquei na aventura e passei a acordar às 5:30 da manhã de domingo.

O acordar é feito com um sorriso e, antecipando o caminho a percorrer, revejo mentalmente erros anteriores que estragaram uma dada fotografia ou, pelo menos, lhe retiraram mérito qualitativo. O duche e pequeno-almoço são rotineiros como passo enorme rumo à saída de casa e início da aventura.

A atenção ao detalhe, o bicho que não vês mas cuja presença é denunciada por outro dos presentes, o ângulo que deves usar para obter um melhor efeito de luz, a revisão rápida no LED da máquina que confirma ou desmente o que achas que alcançaste. São domingos de ação, atenção ao detalhe, esforço físico no caminhar e, porque somos lusitanos, um brutal almoço!

Momentos de felicidade – 20/7/2024

Vamos almoçar.

O convite era inocente e despido de segundos sentidos – como as pessoas honestas tratam, nesta vida – e a resposta não surpreendeu ninguém! “Claro que sim, vamos nisso!” Obviamente, não fazia a mínima ideia onde ficava Pitões das Júnias, mas o detalhe era irrelevante! Havia um convite para almoçar e um almoço não se recusa!

O despertador tocou às 5 e meia da manhã e ainda não havia luz natural. O duche foi tomado no maior silêncio e os panados do dia anterior colocados nos pães que descongelaram pelo caminho (a “bucha” da manhã), dada a hora de inicio das “hostilidades” do dia. A partida foi feita com os primeiros raios de sol sobre a cidade e, assim que entramos na CREP, substituídos por um nevoeiro cerrado…aquilo prometia!

Chegados a Chaves, e mercê de um erro imperdoável, não compramos uns pastéis locais (daquelas coisas que nos perseguem até ao fim dos nossos dias). Saímos para umas fotografias rápidas e partimos em direção a Vilar de Perdizes. Imbuídos de um espírito de sacrifício (que não envolve animais, entenda-se) percorremos a distância sem mais demoras ou paragens.

Chegados ao local de culto do oculto eis que ainda se sente no ar o sangue do dia anterior – tratando-se de um domingo, equivale a dizer que ainda corre no ar um aroma de cerveja morna, das hostilidades tardias do dia anterior. Prosseguimos, com cuidado…recolhemos provas fotográficas, tivemos diálogo a requerer linguagem gestual, procuramos os melhores planos para capturar a beleza do local.

Partimos, rumo ao restaurante Casa do Preto, comemos que nem abades e demos uma enorme volta fotográfica, para melhor digerir a “singela” refeição. Invadimos Espanha, com o propósito pacífico de fotografar os melhores momentos, reentrando em Portugal, pelo Lindoso, com o sentimento fotográfico cumprido! Mencionei a falha gastronómica cometida em Chaves e imediatamente surgiu a alternativa pastéis de Fão (clarinhas, para os mais íntimos).

Chegados, de barriga cheia, mas ameaçando devolver os pastéis já digeridos por excesso de açúcar em pó! Vivos, cansados, com um sorriso que espelhava o sentimento de dever cumprido!

Pelos caminhos de Portugal – 29/4/2024

A realidade como consequência da expectativa.

Há que rentabilizar uma tarde em que sabes que a cidade vai estar cheia. O planeamento é muito importante e os dados recolhidos são fundamentais para o cálculo quântico (lol) do destino a escolher: qual a proveniência dos que enchem a cidade? Quais as horas a que chegam e partem da cidade? Que tipo de transporte usam? Se viajam por etapas, como evitar os pontos de trânsito, entre etapas? Onde é que há uma boa esplanada, com sombra, onde possa ver o MotoGP em paz e sossego?

Após a introdução dos dados, no mega computador que é a tua imaginação, decides não optar por Alfarelos e rumas a Ovar. Não é o pão de ló que te conduz – muito embora a sedução por ele exista. Um simples apalpão nos seios é suficiente para te afastar da doçaria. A pergunta “porque tens uns seios pronunciados?” é suficiente para te afastar de guloseimas eróticas e conduzir o pensamento para o lanche: “um cachorro especial é apenas o colmatar de uma saudade de quem não usufrui dele há bastante tempo…”

Um par de estalos emocional – faz-se mentalmente, sem necessidade de uma auto-agressão na via pública – é suficiente para te focares no objectivo: a esplanada, a sombra, o GP de Portugal de MotoGP! A memória, essa traiçoeira, passa-te a imagem mental de um jardim que ficava perto da estação…uma revista aos azulejos da estação – que podiam estar melhor cuidados – e começas a trilhar a rua, rumo ao destino que esperas ainda corresponda à imagem mental. 

Ouves pássaros, há um rio, “é aqui perto”, exclamas com alegria. Mais uns metros e enxergas uma esplanada deserta de onde vem o som do hino nacional. Perfeito, diz-te o coração, como se aconchegasse num abraço ao corpo. “Tem multibanco?”, procurando por um terminal que não consta dos objectos presentes no balcão. Indicam-te o Santander (o banco e não a cidade da Cantábria) e partes para a recolha de um montante mínimo que te permita pagar a despesa resultante do tempo passado a ver o Grande Prémio. 

Desces a rampa que subiste e escolhes uma mesa exterior com vista central para o ecrã interior. “Perfeito!”, exclamas. Os pilotos estão a terminar a volta de reconhecimento e a partida segue-se! Corrida louca, como sempre, com alguns erros a baralharem o resultado final (o costume). Segue-se o caminho de volta e, apesar de teres planeado um regresso a pé, resolves mudar o ponto de partida para mais perto de casa. Fazes o percurso nuns 90 minutos e, comandado por um automatismo que não controlas, dás por ti a enfrentar um cachorro especial…

Porque até os domingos são especiais. – 24/3/2024

Rumo ao norte, enfrentando a nortada.

A espeleologia.

Saudações

Primeiro há todo um ritual de saudações, entre duas pessoas que se conhecem, seguido de uma pequena conversa sobre o dia-a-dia. Actualizada a actualidade, segue-se a disposição do paciente na cadeira – num filme de terror, corresponde ao momento em que, desafortunadamente, abres os olhos apenas para ouvir e ver o médico – armado com uma motosserra e um sorriso como o do Hannibal Lecter, a preparar-se para um pequeno snack – mas, na situação presente impera a calma e boa disposição, e há que diagnosticar antes de começar.

Diagnóstico

Com um olho de lince e a experiência acumulada por muitas cáries tratadas, há uma primeira conclusão, que requer confirmação do raio x, obrigando a umas fotografias do interior da cavidade oral. Conclusões alcançadas, diagnóstico atingido, eis que chega a altura da anestesia.

Anestesia

A agulha no nervo, o lábio que se despede, a boca que parece partir para uma galáxia distante. A sacramental pergunta – sarcástica quanto baste – a aferir se ainda há sensação no lábio. Resposta dada, com a sensação de ter andaimes na boca, e eis que uma enorme broca surge no campo de visão.

Escavação 

Tal como um martelo pneumático consegue atingir o seu objectivo, também a broca – ao fim de muitas voltas – consegue alcançar a gengiva. Ouvem-se termos como limpeza, há uns rolos de algodão a segurar o caminho, alguém fala em limpar o ácido – solto uma gargalhada enquanto peço, respeitosamente, que deixem ficar o ácido. Sorrimos, como se de uma piada se tratasse, e começas a cheirar a massa a chegar.

Decoração de interiores 

Começando com um interior totalmente oco e despido, a massa progride para decorar o interior do dente, outrora vazio. Não estamos numa passerele mas todo o processo é, em muito, semelhante. Mais um retoque, secador, uma trinca no papel de teste, um acerto da artista, secador, outra trinca a testar o resultado que, no final, se assemelha a um Picasso dentário.

Saudações finais 

De boca descaída, mas com uma obra de arte que pretende expor, despede-se da artista e caminha em direção à dolorosa.

Pagamento da obra 

Chega o valor a ser cobrado e eis que o subconsciente pretende gritar de dor – não por falta de concordância mas por princípio. Dá um toque com o multibanco, insere o código secreto e, orgulhoso mas sentindo-se a descair da boca, enfrenta a multidão que, sem qualquer sentido artístico, não reconhece a obra de arte que o humilde narrador carrega consigo.

Nos idos anos 70.

Transparências ou reflexos?

A rua dele possuía dois tipos de personagens: os transparentes e os reflexivos.

Desde cedo apreciou uns e acumulava o saber dos outros – um apreciar nobre, despojado de conhecimento – como se partisse da douta ignorância para o conhecimento, num exercício supremo e constante de negar tudo para melhor absorver o diálogo dos conhecedores presentes na tertúlia. Com os erros inerentes a cada ser humano que, em conjunto, superava as agruras do conhecimento singular (ou do questionamento de tudo e todos, inerentes ao singular), num exercício constante de superação, rumo a um dogma citadino que só a união permite.

Os reflexivos, fruto de um constante auto-questionamento, equiparavam-se a enciclopédias – que, na ausência da internet, precisavam das actualizações que só a cooperação dos transparentes providenciava. Uma conjugação de putos “vadios” que faziam da união a sua força. Tertúlias maioritariamente desportivas que, por entre alterações no marcador, possuíam o dom de educar, aprofundar as relações e ideias, melhorar-nos enquanto seres humanos. O resultado final era secundário face a tudo o que era apreendido.

Os transparentes, que possuíam uma presença e personalidade bem visível, eram os introvertidos de hoje em dia. Calados mas atentos, parecendo desligados mas sendo sempre os primeiros a introduzir alterações ou a fazer notar incongruências no ambiente. Capazes de discordar para melhorar o aprofundamento do assunto, sempre dispostos a questionar para que novos termos fossem introduzidos (e todos estivessem equiparados no entender do assunto em questão), eternamente atentos para que nenhum detalhe escapasse no diálogo comunitário rumo ao saber.

A união faz a força, poderá o leitor resumir mas a vida não se resume – bem pelo contrário. A vida, tal como a ciência, é o constante questionar tudo e todos até que assente numa verdade impossível de ser desmentida e os participantes possam sorrir perante a descoberta do debate de ideias.

Where the streets have no name – 10/2/2024

Vadios que nos visitam.

Palavras desencontradas.

Ao escrever um texto, num conjunto de palavras que, de início, só para ti fazem sentido, deparas-te com imperfeições, desilusões e ilusões. A beleza do retoque permite, não só mas também, apreciar a linha de pensamento que trilhaste e, se bem que cries um novo ciclo a partir da amálgama inicial, sabes bem que o resultado final não existiria sem que as imperfeições fossem corrigidas.

Não é tentativa e erro mas sim o escrever “ao correr da pena” – por mim traduzido – corresponde ao despejar de tudo o que a mente imagina, mas sabendo de antemão que uma revisão providenciará algo mais perfeito do que apenas a soma das palavras. Como se dissesses tudo o que tens a dizer mas, na impossibilidade de ser directo, o corrigisses com a educação recebida e suavizasses o resultado final.

O ficheiro começa em branco e o título fica para o final. O turbilhão imaginativo toma conta da tela e, qual pintor “enraivecidamente comandado”, palavras soltas chegam ao cérebro que comanda o teclado e, com um sorriso na cara, vês a composição a tomar forma. Não ligas a erros, acentuação ou gramática – pois sabes que a revisão final permitirá eliminar as toxinas do texto. Uma pintura inicial é apreciada pelo autor que, nessa altura, já está a pensar no resultado final – que em nada se assemelha a tal pintura inicial.

Recordas o objetivo inicial, enquanto revês o conjunto de frases que agora compõem o rascunho, cortas palavras, acrescentas pontuação e tentas mudar o tom – para que fique de acordo com o anteriormente revisto. Lês, relês e, sabendo de antemão que a perfeição é inalcançável, dás a tarefa por terminada. Talvez o sentido seja agora diferente, afirmas tu mas, relendo mais uma vez, constatas que o final corresponde ao inicialmente pensado, agora embelezado por regras que fazem o texto fazer sentido. Ou talvez só faça sentido para ti mas, acima de tudo, escreves para ti – tornando assim redundante saber se mais alguém aprecia.

A tela imaginária coberta por letras ordenadas em frases – 12/1/2024

Hábitos de Atenas

Que os alarmes vieram resolver muitos dos problemas, sobretudo daqueles que assumem não ser omnipresentes, também é verdade que trouxeram com eles um nível de poluição sonora que não existia. Atenas tem várias redes criminosas – uma das quais especializada em pequenas motorizadas (outras existem, obviamente, para “cobrir” todo o “mercado”) – o que leva a que, a bem da segurança, esses motociclos tenham um alarme – para dissuadir qualquer criminoso mais expedito!

Para uma maior proximidade, deduzo que por razões sentimentais, os proprietários colocam os veículos motorizados mesmo junto à porta de entrada do prédio que habitam (independentemente do as andar em que habitam), possibilitando assim a reunião amorosa, entre proprietários e veículos, assim que atravessam a porta de entrada comum do edifício.

Recordo que existem em Atenas cerca de 2 milhões de motorizadas – dos vários tipos e feitios – que permitem o normal funcionamento da economia local (uns recolhem metais e reciclam, outros recolhem plástico para o mesmo efeito, uns deslocam-se para o emprego enquanto outros fazem da condução o emprego…).

Tentem recordar sons de brinquedos dos vossos filhos e certamente recordarão um ruído histérico – que é uma mescla de vários sons de veículos de emergência – que vocês, muito provavelmente, também odiavam e se peniticiavam pela compra do dito. É esse o som que a maioria das motocicletas possui! Num volume que supera a chegada do avião de Thessaloniki e faz estremecer o mais incauto dos transeuntes – que não consegue esboçar uma reação melhor do que um salto aflito, perante um som que faz estremecer o mais forte dos humanos! Há um modo “ARTILHARIA” nos alarmes gregos…

Uma ideia dos sons de Atenas – 27/11/2023

Full moon and the Parthenon Temple.

É feriado…

Acordas, lavas a cara, atiras um bocado de desodorizante, lavas os dentes e sais.

A 20 metros da porta está um vizinho, que aguarda que o cão obre. Olhamo-nos e eu fico a pensar na situação do gajo: cerca de 2 metros de altura, uma trela enorme (só para chegar à manápula do gajo…), um cão que se assemelha a um coelho anão…que ladra e, salvo se não tivermos desenvolvimentos à vista, também obra!

O pensamento de merda esfuma-se e reduzo o ritmo (já de si bastante lento) para olhar a fotografia do grego irritado – há um fotógrafo grego, na esquina, que tem uma fotografia de um bebé irritado com o banho que o obrigam a tomar…dobro a esquina, como um verdadeiro super-herói, e vejo um café abandonado no orelhão da vizinhança…

Aproximo-me – o que, na Grécia, significa que fui para a rua e mantive uma distância segura – e vejo uma T-shirt, que descai de um suporte que o orelhão possui. No chão jazem calças e meias…apalpo-me e sinto o casaco vestido…não pode ter sido um golpe de calor, penso eu! 😂 Fotografo o momento, para a posteridade.

O caminho até ao café é longo e assemelha-se a uma travessia no deserto – quando, após umas centenas de quilómetros montado nas costas de um camelo, finalmente chegas ao oásis – apenas para constatares que tens que ir urinar, o que te obrigará a seres o último na fila de água do oásis (não é nada disto, fica a 100 metros de casa, mas há que enquadrar…😂😎). A areia são os passeios irregulares, a tempestade de areia é a possibilidade de levares com uma laranja nos cornos, ressalvo, couro cabeludo, o café é o almejado oásis…

Freddo espresso sketo, parakalo!

Um pequeno gole para o café, um enorme despertar para o Henrique!

Cabine de teletransporte!

De público não tem nada!

Sentado no autocarro, com uma morena voluptuosa e linda sentada ao meu lado. A vontade de deixar descair o corpo, para sentir o dela, a tornar-se em algo sem sentido, quando ela deixa descair o corpo dela sobre o meu. Na imaginação dos transportes públicos tudo é possível e, cada vez mais imbuído desse espírito, sinto que os olhares trocados, ao longo das últimas semanas, dão agora o esperado fruto.

Quanto mais afasto o corpo para a janela mais sinto a pulsação do corpo dela, como um oposto que se atrai, ou uma alma inteligente que sabe tirar partido da inércia inerente a qualquer transporte público em movimento? A Grécia contém questões filosóficas profundas, não ao alcance do comum mortal. Planos maquiavelicamente amorosos são escrevinhados mentalmente, sem que os meios de defesa do estado sejam suficientes para os deter! Bem haja!

O tique nervoso do cabelo – bolas, ela fica ainda mais bonita quando o faz, a maneira como oscila a perna cruzada, que inevitavelmente embate em mim, a troca de contactos – agora que dialogamos e já nos conhecemos! Bom fim de semana e boa Páscoa!

Até já…😬

Eram putos…

Ouve-se muito, em Portugal, a expressão “isto é que me revolta” e, tendo em conta o acidente ocorrido, só me resta concordar! Revolta ver um dos países mais lindos da Europa, quiçá do mundo, devorado por canibais financeiros, cuja única consideração é o dinheiro. Em 2015, as principais estruturas gregas foram desbaratadas em função do que a Alemanha oferecia. O Porto de Piraeus, um colosso que se estende por quilómetros, foi um desses casos. A ferrovia, sempre a dar prejuízo, foi entregue às Rodovias do estado italiano (desconheço em que termos).

Todos os dias acordava cedo, apanhava boleia e ia trabalhar. Simples, barato (o passe mensal custa 27 euros) e eficaz (duas horas diárias a comutar). Hoje cheguei a casa às 21 horas (saí de casa às 8) 5 horas a comutar! Não me arrependo, pois sei que nunca mais entrarei num comboio grego (a viagem Atenas-Thessaloniki era algo que vinha planeando e que só não aconteceu neste fim de semana por um acaso, um feliz acaso).

Enquanto utilizador do suburbano, não era raro termos que parar para que o “rápido”, que liga Atenas a Thessaloniki, passasse. O meu plano era apanhar o primeiro comboio da manhã, já de merenda pronta, para curtir as 6 horas de viagem a fazer algo que adoro – apreciar a paisagem (sim, há tolinhos assim)!

A confiança foi abalada, pela primeira vez, quando o comboio que eu aguardava, em Doukissis Plakentias, chegou do lado errado – maquinista aos berros para que embarcássemos rapidamente. O abalo seguinte foi algo que fui notando: de cada vez que demorávamos mais um bocadinho, parados numa qualquer estação, era possível ouvir o maquinista, a falar, no sentido de obter autorização para prosseguir (sempre tomei a informação que me era dada como uma piada…que, afinal, não o era).

Aborrecem-me estas nódoas que, de alguma forma, afectam a tela mental que tinha idealizado…

Desabafo sentido – 2/3/2023

Os sons de Atenas

Há uma parafernália de sons, radicalmente opostos mas complementares na beleza sonora que irradiam, capazes de exercitar em nós um conjunto de novas sensações.

Tem sido, quase sempre, bastante recompensador recordar: o azeiteiro, de carro rebaixado e vidros escuros, é quem normalmente fecha a noite. Numa espécie de exibicionismo de mau gosto (devia ser punível), que vai da vestimenta até ao modo como tenta atrair a atenção de uma vizinhança mais focada na intimidade familiar. Do escape de rendimento a uma seleção musical que quase faz regurgitar.

Antes de caíres no sono nocturno, e quando já estás afectado por ele, ainda consegues ouvir uma ou outra laranja que, caindo da laranjeira, faz um som bastante engraçado ao embater no metal dos carros estacionados. Mais engraçado se torna quando a laranja salta, após o embate, num equivalente sonoro ao conseguir fazer uma pedra chapinhar inúmeras vezes.

O adormecer profundo está normalmente associado ao som das tampas dos contadores de água – são tampas metálicas, de aproximadamente 50x50cm, que estão no passeio público, frente ao prédio a que dizem respeito. Entendam as diferenças: nós temos contadores de água e luz dentro do prédio e, na Grécia, as tampas da água é onde está o contador do consumo, os contadores da luz estão na sub-cave, onde também está o enorme radiador a óleo que aquece as partes comuns do edifício. A sub-cave é um local digno de um filme do Stephen King: teias de aranha, uma corrente de ar inexplicável, escuro – mesmo com as luzes acesas, arrepiante – no sentido em que os pêlos em pé só perdem a potência quando se voltam a sentir confortáveis e longe dali.

O despertar varia, consoante os artistas disponíveis: pode ser a repetição da laranja, o azeiteiro que se atrasou no regresso a casa ou, o meu preferido, quando começam os diálogos junto da padaria em frente ao prédio (é sinal que já abriu e, abrindo as janelas, consigo “roubar” algum do cheiro a pão quente. Livrei-me da aprendiz de flautista (de quem até os ratos fugiam, numa espécie de “Hamelín”, ao contrário!), ouço agora ópera – de um vizinho velhinho que gosta de exibir o seu bom gosto musical, por vezes o vizinho do acordeão aparece. Anteriormente era o reunir dos pássaros que te despertava – reuniam-se todos no prédio em frente ao meu e, assim que o sol nascia, partiam para os seus diferentes destinos. Poucos minutos depois eram substituídos pelos papagaios dos jardins nacionais que, amantes de desportos radicais, voavam por entre as árvores.

Também é bom ouvir-te Atenas – 26/2/2023

É o país, estúpido!

O agir como um turista, no caminho que separa a casa do trabalho, tem as suas virtudes e defeitos – o virtuosismo fica contigo: acordas, atrasas-te, apanhas o interregional ou o autocarro, vais documentando o caminho – sem que haja um compromisso para algum dia reunir tudo, sabes a magia do que saber guardar – em termos de imagens – e o que desprezar, em termos de espaço disponível na cloud.

A secretaria é agora mais pequena mas, atrás de ti, está o departamento de informática, pelo que, qualquer pequeno distúrbio binário é rapidamente ultrapassado. Há uma clarabóia acima de ti – que te seduz pela luz natural que deixa entrar, ou faz chorar – quando reflectida no monitor. A cozinha está perto, pelo que és obrigado a superar o babar – quando o olfacto detecta o pão torrado, no ponto perfeito, entre o torrado e o perigo de causar um incêndio.

A fonte de água está a escassos passos de ti, o que te obriga a uma penitência – entre Sex Pistols, PIL, Joy Division, na tentativa de abafar o som da catarata de água, evitando despertar em ti o desejo de visitar o WC. Em frente tenho uma enciclopédia humana, ao lado uma colega permanentemente a sorrir. Não questiono nada nem ninguém – apenas usufruo das imagens das pessoas, no constante burburinho que um escritório com 3000 pessoas produz.

O cozinheiro de serviço foi um dos concorrentes do Master Chef local e, pelo que me tem sido dado a provar, não percebo como não ganhou! Tivemos um churrasco, num momento de comunhão de toda a empresa, e poder-se-ia pensar que a qualidade decresceria – dada a dimensão do evento – mas eu ousaria dizer que, mais uma vez, ele superou as expectativas! Tropeças na grande líder, cumprimentas o grande líder, estás na fila para usufruir de um pequeno lanche grego, conforme designação humorística local. Estava divino! Percebes igualmente que é hora de ponta no WC (não desse tipo de ponta mas agrada-me o teu raciocínio 😉).

O dia de trabalho chega ao fim com um alento adicional – ainda é de dia e podemos observar, bem ao fundo, o sol a cobrir o Peloponeso e a dirigir-se para o outro lado do planeta. Uma passada vigorosa, por entre conversas escutadas em grego, e estás no caminho de volta, por entre umas centenas – que te acompanham, neste regresso de final do dia.

O frio está a acabar, os dias a crescer, a vontade de planear ao rubro, fim de semana prolongado a chegar.

O humilde narrador.

Outono

Há folhas caídas e assam-se castanhas na rua (algo muito cómico, quando comparado com o método português do fogareiro), estão 22 graus e há corajosos na praia (com potencial para criar um bom ajuntamento de carros, no retorno à capital).

As tabernas estão cheias e o cheiro a vitela estufada com ervilhas consegue embriagar o teu palato estomacal, os degraus estão secos e bem seguros, pelo que os chinelos foram uma boa opção, no que a locomoção diz respeito. Olham-te porque estás com a habitual indumentária, cumprimentam-te porque te reconhecem nessa mesma indumentária.

Cumpres os teus rituais sociais e sobes a rua, acompanhado do teu Freddo e dos biscoitos do Veneti. Observas tudo o que te rodeia, como método de estimular a mente enquanto mecanicamente regressas a casa. Vês as diferenças nos prédios da vizinhança, cumprimentas as velhinhas na janela ou varanda, ouves a música de uma flauta, ao longe – questionas-te se vais obedecer à flauta, numa fábula rápida que te cruza o raciocínio.

Cedeste, quando passaste por outra taberna, e agora aqui estamos – a dizer bem do saganaki, das batatas fritas, da vitela estufada…por vezes é bom ceder emocionalmente! É o mais racional a fazer…

O humilde narrador a passear por Atenas.

Dias preenchidos

As sextas-feiras possuem, no seu núcleo, uma aura de boa disposição que se alarga ou retrai, conforme o dia decorre. Em Atenas, tal significa que tanto podes acordar com um dos milhares de sinos de igrejas que te rodeiam ou continuar o teu sono, até que algum pássaro – obviamente aterrado junto à tua janela – comece a canção que definirá a sua tarde.

Saída de casa, a vizinha passeia o cão, a passagem obrigatória pelo contentor do lixo. Um barulho estranho, uma velhinha que me estica a mão, enquanto me deseja bom dia. Pergunto, em grego, se fala inglês, uma vez que o meu grego é limitado (estou na fase do “só sei que nada sei”). Para minha surpresa (e agora também para espanto dos 7,753 biliões de subscritores deste blogue) a conversa continuou em inglês! E o inglês da senhora é brilhante!

É a senhora que alimenta os rafeiros da vizinhança. Atenas tem cerca de 4 milhões de cães e gatos de rua e, quando o governo propôs um programa de esterilização, todos os veterinários do país entraram em greve. Imagine-se um grego sem acesso ao veterinário! Há tantos animais domésticos quanto população logo, basta imaginar.

Enquanto a senhora conversava sobre os gatos, cumprimentou a vizinha com o cão e eu também, continuei a ouvir a explicação sobre o método utilizado para alimentar a gataria toda da vizinhança. Havia o sentimento de estar a ser flanqueado e, rodando a cabeça, apercebo-me que estou rodeado de uns 20 gatos (ninjas, que nem um ruído fizeram com aquelas pantufas calçadas). Ela sorri, perante o meu espanto, e exclama, com orgulho grego “São os meus meninos, eles reconhecem-me”. Ambos sorrimos, enquanto os ninjas começam a miar “despachem lá a conversa que nós estamos com fome”!

Despedimo-nos, com o sentimento que nos voltaremos a encontrar. Entretanto, no cimo das escadas, está a equipa de jardinagem que cumprimento – da última vez tive que ouvir 15 minutos com o homem a explicar-me que o 15 de Agosto era dia da Madonna…e eu, inculto, nem sabia que uma estrela pop dava direito a feriado…

Aquele abraço!

Conversa de merda

Uma das primeiras preocupações, de qualquer expatriado que se preze, é a sincronia entre o intestino e o local onde agora se encontram. Em Portugal temos produtos lácteos maravilhosos mas que em nada se assemelham a uma República da Irlanda ou Grécia (são diferentes, não estamos a aferir qualidade).

Num país que deu a democracia ao mundo, nem a prisão de ventre é permitida! Numa dieta improvisada, que normalmente começa numa quinta-feira, eis o vosso humilde narrador a consumir iogurte, com nozes e mel, que nem um esquilo a almoçar com um urso, num planeamento cuidadosamente delineado, de maneira a ter um fim-de-semana de “plenos poderes”, sentado no trono, orgulhosamente obrando tudo o que a semana reuniu até então.

O poder de todo um filme de aventuras, que começa com o primeiro take e só termina após o herói principal desaparecer. Toda uma limpeza interior que supera qualquer meditação, os sons que se assemelham a taças tibetanas que, muito depois de manuseadas, prolongam o seu som até uma última vibração muito ténue. O amontoado de todas as virtudes e insucessos da semana para, com uma purga turbinada, enfrentar a nova semana.

O autoclismo que encerra todo o devaneio merdoso, enquanto o nadegueiro culpa o Gameboy pela baixa temperatura a que se encontra. Porque és um homem de prioridades, terminas o Super Mário em 45 minutos e, após uma cuidadosa limpeza de toda a zona de batalha, exclamas, enquanto gentilmente bates na barriguinha: Ahhhhhh

E sabes que estás pronto para um novo dia…

“Do not touch” must be one of the scariest things to read in Braille.

E como foi o teu dia?

Uma lufada de ar fresco! Senão, vejamos: após um recolhimento deveras antecipado, em relação ao habitualmente praticado, e após um acordar tão sereno que ainda consegui encontrar o culpado pelo miar de presença, arrastei-me até uma varanda, gelada pela temperatura mas, obviamente, a descongelar pela minha ardente presença, para degustar um arábico, duplo, e aguardei, com uma paciência – que deixou de ter limites para ter admissões muito reservadas – por um dos espectáculos diários que a natureza nos proporciona.

A cadeira colocada virada para a montanha que, apesar do aumento da temperatura, ainda ostenta uns, muito breves, fios de neve, e o café a estabelecer a temperatura das mãos. Ao longe o barulho de estores, que vão sendo levantados para mais uma jornada de trabalho, por cima de mim, pendurado numa antena, um pássaro preto e branco que parece perguntar-me o que faço ali. Tento estabelecer contacto ocular mas a ave não parece querer deixar transparecer em que direcção está a olhar. Envio uma mensagem telepática que, espero, seja entregue. O pássaro olha-me e, com um desdém de quem não lhe interessa sequer defecar em mim, parte rumo ao nascer do sol.

A luz parece ligada a um reóstato que intensifica o céu – ou será a lua que tirou a intensidade? – e o vosso humilde narrador mais não conseguiu do que esboçar um sorriso aberto e lindo perante a natureza que o obrigou a render-se! O café foi sorvido, o cigarro foi fumado e o prazer do início do dia ainda perdura.

A natureza é um afrodisíaco de boa disposição!

Os cantinhos da vida

Não se trata da história de um jogador de futebol, especialista na marcação de escanteios, como dizem os Brasileiros, mas apenas uma reunião de locais que nos conquistam – não no sentido parolo de quanto mas caro, melhor – mas no sentido emocional do quando mais reconfortante é recompensador, melhor! Este conquistou-me pelos limões! Não, não se trata de uma analogia às partes do corpo masculino, habitualmente penduradas no meio das pernas, mas sim da minha homenagem a uma das melhores limonadas que já provei!

Afinal é sobre limonada, dirão os incautos, inconscientes de que falamos da mãe de todas as limonadas e não de apenas mais uma limonada! Há uma clara diferença que é preciso acentuar, numa tentativa constante de afastar o comum mortal da frivolidade rumo ao conhecimento, ao norte, ao estímulo intelectual! Basta espremer limões, esclarecerá o intelecto do analista desportivo, ciente da sua incapacidade para aprender versus o curioso que, interrompendo o analista, lhe pede para deixar ouvir até ao fim pois tem curiosidade em conhecer, independentemente da aparente simplicidade do assunto.

Talvez a receita seja tão secreta quanto o molho de francesinha, em que nem o cônjuge pode estar presente na preparação, apesar de todos os votos de até que a morte os separe! A verdade é que é um prazer estar a saboreá-la, no calor mais controlado de hoje, assistindo a tudo o que me rodeia, num exercício equiparável ao dos pacientes em estado vegetativo – de olhar perdido, a seguir um ou outro pássaro, tentando não salivar em demasia e, porventura, só voltando a mim quando um carro azeiteiro passa, com as colunas de som num volume ao nível da estupidez de quem o conduz!

Pés bem assentes na Terra, no planeta mesmo!

A melancia

É a fruta preferida dos praticantes de tiro, sobretudo nos Estados Unidos da América, pelas semelhanças com o corpo humano (o que diz bastante sobre o povo que constituiu esse país e sobre nós, enquanto seres humanos, que não passamos de uma enorme percentagem de água que possui raciocínio)! Sendo ambicioso, vá, porque certamente há exemplos que claramente já deixaram que ambos se diluíssem!

E porque é de calor que se fala – pelo menos por aqui – anuncio desde já a chegada dos 40 graus, para os próximos dias. Como não pretendo fazer parte do grupo das melancias, vou arriscar e não fumar durante os picos de calor. Já passamos pelos 39, duas vezes, mas numa das ocasiões eu estava na frescura de Meteora, muito longe do epicentro do calor e rodeado de uma frescura de montanha, enquanto subia por caminhos endeusados (dizem) e dava por mim com um joelho brutalmente dorido! Um sinal das trevas, claro está…

São dias de cansaço extremo, sobretudo devido ao calor e independentemente da quantidade de água ingerida. Um corrupio constante para o chuveiro para, com a água gelada, obrigar o corpo a descer a temperatura! Não levo toalha porque o simples trânsito entre o final do chuveiro e o quarto permite que o corpo seque e estou pronto para o chuveiro seguinte. Devo andar com um sorriso parvo na cara mas, quem conhece, sabe o que tal sorriso significa…estou em casa!!!!

Devaneios de uma noite quente, mais uma! – 30/6/2021

O saco de pão diz tudo!

Num qualquer portal distante, a muitos anos-luz da Terra, havia uma sincronia entre duas pessoas: uma baseava-se nos sentimentos para comunicar e a outra no ego – ambas conseguiam assim a cobertura de rede necessária para psiquicamente comunicarem. As noites passavam a ser de insónia, as saídas a escassear ou a serem dirigidas para novos destinos, o batimento cardíaco fica amorosamente descompassado e a razão começa a esfumar-se para uma galáxia ainda mais distante. Num último suspiro de razão – no momento anterior ao embarque na nave espacial que a enviaria para muito longe – ela ainda conseguiu gritar as palavras: Pensa!!!!!! E ele, ciente de que a razão tinha o habitual dom de ter razão, não se tratando aqui de uma redundância mas sim de uma certeza, abraçou-a e sentiu o batimento cardíaco dela e não mais a soltou. A partida foi adiada e, de mãos dadas com a razão, sentaram-se a um canto a recordar os momentos racionais passíveis de serem recordados – com alegria, sem mágoa ou qualquer tipo de ressentimento, apenas recordando.

A razão havia trazido a maturidade – outrora tão ausente, havia trazido a responsabilidade – outrora inexistente, o compromisso havia passado a constar do vocabulário – não apenas como uma palavra sem nexo “alpha” mas como uma acção capaz de ser praticada, a cooperação era feita de mimos permanentes – em prol de um sucesso comum e a dois umbigos, os dois corpos fundindo-se numa só força de vontade que, apesar de ter altos e baixos, mantinha uma média de felicidade bem acima dos comuns mortais. Talvez haja um boneco de vodu envolvido nisto, e existam diferentes alfinetes que despertam diferentes sentimentos, talvez nenhum de nós esteja na posse desse boneco e seja urgente que o recuperemos, talvez um esforço conjunto seja o ideal para um primeiro passo – recuperar o boneco que gere os nossos sentimentos parece-me a tarefa ideal de libertação e prosperidade conjunta mas….porque é que sou eu sempre a falar?

Acordou quando a mão embateu na mesinha de cabeceira e derrubou a revista “Sábado” que aí se encontrava (a “Visão” estava esgotada). Havia um misto de medo e alegria no seu rosto e, com a visão turva – de sonhos, do despertar repentino e de toda uma série de questões existenciais que nos assombram assim que despertamos, do tipo “consigo mesmo tomar café antes de chegar ao WC?” e coisas do género (normalmente levo o café comigo para o WC, se precisam mesmo de saber) – sorriu e lembrou-se que tudo não tinha passado de um sonho demasiado antigo.

E tudo isto porque o Indiana levava um saco cheio de pão…

Os pássaros

Identificados todos os especímenes de um bando de pardais é agora mais fácil descortinar cada um pelos diferentes tipos de voos – com a contribuição de columbófilos de toda a região, e num exercício de natureza empática – ou de empatia com a natureza, conforme prefiram ler.

As migalhas deixadas constituíam o alimento que não se podiam negar a bicar e, inevitavelmente, voltavam diariamente para alegria dos que preferem a paz do seu canto matinal. As manhãs começavam sempre com o chilrear envergonhado que, muito rapidamente, dava lugar a um cantar mais pujante e desavergonhado.

Os melros e o seu contraste de cores como exemplo da possibilidade de convivência entre pássaros que não são iguais, as gaivotas que não conseguem aterrar neste jardim mas defecam abundantemente os jardins vizinhos, o casal, de uma espécie que não identifico, que chega para aterrar na nespereira e deliciar-se com uma dieta de fruta.

A paz de olhar para o chaveiro de casa e constatar que há molhos de chaves que não voltarão e outros que deveriam voltar, a olhar para o canto da sala e sorrir – com a cadeira ao sol, o chapéu do Rio Grande do Sul. A ultimar a chegada de amigos do coração que merecem tudo o que tiver em mim para dar!

Retalhos de uma manta bem desenhada! – 17/4/2021

Deve ser um vírus…

Despertar louco, de madrugada, numa tentativa vã de acalmar a passarada que alimento. Uma mistura de pão recesso com bolachas de água e sal e os jovens lá acalmaram de maneira a permitir o sono do vosso humilde narrador.

A gata preta que salta o portão, os pássaros que fogem e eu que fico sem saber se, quando voltarem, terei que novamente os calar com mais comida….parece aquela aldeia de irredutíveis gauleses em que a comida é o ponto de ligação entre as tarefas do dia.

Felizmente eu adoro o som que os pássaros produzem e entendo o privilégio de morar numa casa com jardim que permite que eu os alimente e eles, em troca, alimentam-me os ouvidos com as suas melodias que rapidamente me adormecem – numa simbiose perfeita!

Acordei com fome e lá fui obrigado a desistir do aconchego do pijama – o presente de aniversário que mais prezo no mundo – e, levitando após o duche tomado, fui até uma padaria da vizinhança. A esplanada estava vazia e eu podia esticar-me a meu belo prazer.

O croissant com fiambre, o ice tea de limão, o café após os dois toques ligeiros no vidro que me separa do interior. Um ritual do fim-de-semana que apenas varia de local.

A chuva que começa a cair – levando a que as clientes entretanto chegadas tivessem que se aproximar. A funcionária que, com algum sarcasmo subtil e muito engraçado, exclama que, com todos bem apertadinhos, ninguém se molhará…mas não acatamos o conselho e mantivemos a distância a que a lei obriga.

Expulso às 13 horas em ponto e, como ainda chovia, obrigado a fazer o caminho de volta – de havaianas – a curtir a chuva na cara e nos pés nus. A chuva é fria mas, há que testar uma boa dose, de cabeça tombada para trás e oferecendo a face a uma natureza que não se faz rogada em humidificar o humilde narrador. A comunhão ideal para início de fim-de-semana! Um sorriso numa cara humidamente feliz. ☺️

Bom fim de semana – 10/4/2021

Final de tarde.

Começou inocentemente, como as coisas simples e bonitas da vida começam, mas depressa o sumo de cevada começou a libertar os presentes para um final de tarde de maravilhoso convívio, boa conversa e muitas gargalhadas.

A ausência do contacto, ou de convívio, expressão usada pelo patrão, talvez tenha contribuído mas a qualidade dos presentes era muito mais do que qualquer planeamento poderia reunir! Havia calor, saudade, carinho mas, acima de tudo, uma saudade enorme de celebrar de copo na mão, de dar gargalhadas sonoras e saudáveis.

Até o inquilino e amigo passou e deu o seu aval ao festim saudosista que no Bombar se desenrolava. Fomos putos saudáveis, num excelente final de tarde que, posteriormente e fruto do calção molhado, degenerou em resfriado bem chato de afastar – nada que a receita do mano não cure mas que me chumbou em sonos profundos dois dias seguidos!

Poder-se-ia dizer que houve de tudo um pouco – numa clara alusão ao contributo de cada um – mas seria redutor tendo em conta que só o conjunto fez o sucesso do convívio. Até o espanhol, agora residente português, compareceu para os habituais amendoins…

Foi como voltar a Buenos Aires, abraçar o Aníbal e a sua família e recordar que a amizade pode sempre acontecer…até no táxi de um Peronista que, indo buscar um cliente ao hotel mais capitalista, se surpreendeu por ele não ser tão capitalista quanto o hotel!

Memórias de um final de tarde maravilhoso – 9/4/2021

Mudança de cenário

Era hoje o dia programado para ver o pôr-do-sol mas, como nem sempre na vida as circunstâncias são ideais, retirei a minha percepção do pôr-do-sol que abaixo publico.

Onze quilómetros cumpridos, com uns headphones maravilhosos a cancelar o ruído e a deixar o humilde narrador curtir a música na plenitude. Por entre cafés e água no Bombar, a constatação da beleza que o sol constitui.

O banho a recuperar um corpo cansado e o cansaço de ver quem visita mas nada mais ousa…

Dias de um mundo perverso – 18/3/2021

Aquele talvez

Talvez fosse do esforço, no retomar do passeio diário, ou o efeito de estar a respirar profundamente o ar do mar. Talvez seja uma maleita e tu o parasita (sempre calorosamente acolhida, retirando qualquer sentido menos bom que alguém queira tirar do parasitismo consentido! Tal como as baleias são constantemente seguidas por cracas coladas ao corpo – que muitos acham que é um parasita – que aproveitam a boleia sem interferir no normal dia-a-dia da baleia! Mais uma vez vale a pena realçar que uso o exemplo da baleia sem pretender inferir que a tua esbelta silhueta esteja a ser colocada em causa, bem pelo contrário, relembro cada detalhe de ti conforme a descrição que o coração me dá e esse músculo, ao contrário do cérebro, não mente! Até me lembro de sermos felizes numa cozinha…jovens que deviam claramente estar presos! Um ao outro! Talvez me tenha lembrado de ti…malditos carrilhões do sino da igreja!!!! 😉😘

O gozo de ter adormecido cedo e o gozo de cedo acordar imediatamente passaram a uma obrigatoriedade – acertar o passo! Não é acertar o passo a alguém mas sim efectuar a rotina diária de passeio higiénico. Desloquei-me até à casa-mãe e cumpri com a refeição mais importante do dia. Findo o repasto eis o vosso humilde narrador a caminho do hipermercado para abastecer de água (as pêras seguem no bolso, lavadinhas e a vários dias de estarem maduras ou, resumindo, como eu gosto!).

Lá arranquei o vizinho da cama e fizemos-nos à estrada. Cumprido o troço urbano – continua a andar muito povinho sem máscara – eis que entramos na parte de vegetação…um bom hino ao respirar fundo e à higiene pulmonar. Algum alarme quando vimos o passadiço fechado mas, como bons vareiros que somos, demos a volta à coisa! Fizemos o passadiço como se fôssemos traficantes de droga galegos e rapidamente chegamos ao bairro piscatório e a território seguro. Limpo o suor da testa e recompostos do momento galego eis-nos a caminho do checkpoint Charlie, de café. Ao longe vimos o objectivo com uma multidão digna de uma festa do avante em tempos de pandemia e passamos ao largo, para evitar um aglomerado de pessoas ainda maior! Um caminhar até aos degraus da piscina e o merecido descanso enquanto observávamos quem ainda se esforçava! Um cigarro de pulmão aberto fumado e eis-nos a caminho de casa.

Não é uma loucura, são passeios – 14/3/2021

A imaginação e as suas asas

Sentado na minha esplanada caseira, de pernas bem esticadas em cima da mesa e a recuperar dos cinco quilómetros da tarde – de tarde o mais curioso, em relação ao passeio da manhã, é a existência de mais povo do que de manhã – uma demonstração de como as pessoas sabem dividir os horários de maneira a nunca encavalitar tudo numa massa humana digna de CMTV.

Os locais onde outrora treinávamos atletismo e alongamentos, quando chegávamos da bicha das sete cabeças. Ter tido o professor quer como treinador de voleibol quer como professor foi espectacular para ainda recordar os trilhos que ficaram gravados na caixinha dos bons momentos de infância.

Dez quilómetros feitos com tranquilidade e sempre de olho posto na natureza – uma forma subtil de enganar a mente quanto à distância percorrida – embriagado pela quantidade de informação observada o cérebro tem mais dificuldade em dizer não, amuar e fazer uma cena (obviamente em público!)

Um café que não retira o cansaço de uns olhos que clamam por uma sesta, a falta de café a obrigar-te a adiar o sonho. O supermercado que, cada vez mais, é o ponto de encontro por excelência – uma adaptação dos tempos modernos em que o cumprimento ao longe é uma arma de defesa! A ver o Platoon pela enésima vez, pelo simples gozo de ver uma obra de arte do cinema.

O dinâmica da manhã a passar o testemunho ao doce conforto do sofá azul – 9/3/2021

Sereno

Mas que grande noite de sono…uma espécie de adormecer e acompanhar vários fusos horários a darem-me sempre um pouco mais de noite. Foi como um hino ao descanso, como ver o fictício ser ainda na manjedoura a brincar com um unicórnio de peluche e a questionar a sua existência. O Hino da Liberdade dos sonos, atrever-me-ia a dizer…porque ando atrevido, na arte de descansar e cedo vaguear. 

Há mais encanto na cidade bocejante. Uma série de autómatos, movidos a cafeína, outros a imitarem o Carlos Lopes, as peixeiras que enobrecem a cidade com os gritos que nos confortam e fortalecem a nossa naturalidade “É do NOSSO mar!” As esplanadas a serem limpas e montadas, os primeiros cumprimentos ainda pouco audíveis e mais semelhantes à linguagem gestual.

É um bocejo completamente livre, sem autoritarismos de qualquer espécie, um cumprimento à boa educação que, pela manhã cedo, ainda prevalece. Tudo parece novo, virgem, terra e mar em constante movimento e um mar do mais verde que vi em algumas décadas de vida. Quase sentimos a rotação da Terra – tal o tempo que demora o despertar – e, ao sentirmos o movimento, mais não fazemos do que sorrir perante um planeta que nos surpreende…sempre que estivermos dispostos a ser surpreendidos.

Bocejando – 18/6/2020

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O eremita

Deixei de fazer a barba e cortar o cabelo assemelha-se a tarefa impossível – nunca desejei tanto estar no dia em que fui rapar o cabelo para ir para a Marinha! Afinal não fui para Marinha nenhuma (excesso de contingente) e ainda estive na Roda da Sorte com o couro cabeludo à mostra! Vicissitudes da vida…

Nutro muito mais empatia por este outro eu – ar de vagabundo, bem cheiroso com o banho acabado de tomar, sentado a escrevinhar junto à janela da cozinha, de café em café até ao café final….Hoje coloquei um perfume….somente para dar aquela sensação que vou sociabilizar e vai ser um dia normal…uma piada que faço amiúde comigo mesmo! Rimo-nos os dois e o dia corre melhor…

Com um bom Casablanca planeado para a tarde, um resto de arroz de polvo e muito café…nada faltará para que o sábado seja o dia mais alegre da semana! É sábado, não é? Começo a pensar entregar-me nas mãos de alguém que detenha a propriedade de uma qualquer serrilha capilar, com a medida 6, e que se apresente para tal tarefa em tempos invulgares!…caso não arranje vaga na segunda-feira! Faço figas para não agredir nenhum careca que esteja nitidamente deslocado num cabeleireiro que, por ora, tem que ser pertença dos cabeludos! Já viram imagens daquele oceano de plástico que existe no Pacífico? É algo idêntico, em termos de cabelos, o que nos espera, se as prioridades não forem atendidas!!!!

Como a positividade não é algo que procuremos – em tempos de pandemia – proponho um brinde a nós – pela resiliência e disciplina que temos mostrado! Fica a fotografia de outrora, para animar as hostes! Bom fim de semana!

ika2222

Abruptamente…

Foi um salto que me despertou….demorei uns minutos a perceber o que se passava e porque raio tinha o Keith Richards na memória…Será realidade? Já mais acordado, percebi que tinha sonhado com um noticiário de última hora, com notícias certamente inquietantes, mas cujo pivot era o Keith Richards! Tentei “puxar pela cabeça”, na tentativa de desenterrar mais detalhes da memória recente e tinha uma imagem mais ou menos completa do sonho…

O nome do canal de TV era “Anything but Fake News”, com uma decoração demasiado semelhante à decoração do estúdio da Fox News mas com notícias de eventos que realmente existiam, opiniões realmente isentas e um painel, em estúdio, capaz de debater quaisquer agruras que o planeta estivesse a sofrer.

O Keith Richards abria o noticiário anunciando “Boa noite! Não, não fui eu….eu continuo aqui” e vai anunciando os nomes dos britânicos que ainda acreditam no primeiro-ministro. Cinco a dez segundos depois, anunciando as primeiras notícias da política, é interrompido por um Mick Jagger, tornado irreverente aos 76 anos de idade e sentado como moderador do painel, que grita “Let it be!!!!”, como que querendo saltar a parte de política e querendo saber como andava a selecção Inglesa. O Paul McCartney, que estava nos bastidores, enquanto convidado VIP, não se conteve e entrou em cena! Perguntou ao Mick se aquilo era alguma piada…ao que o Mick respondeu com um ““Out of Time”. O Paul olhou para trás, viu que estava sozinho, e sentiu os olhos de todas as pedras rolantes em cima dele. Começou a trautear o “We Can Work It Out” e foi saindo de cena, de volta aos bastidores! 

No estúdio, entretanto, o Mick Jagger já era o pivot, o Keith Richards curtia uns acordes de bateria e o Charlie Watts passeava-se pelo estúdio num ritmo lento, estudado mas sem falhar um passo. O Ronnie Wood observava toda a cena, enquanto se aproximava da assistente de produção e lhe segredava “I can be your sugar grandpa” e ela, completamente louca, esquecia-se que tinha acabado de deixar de ser adolescente…

Não são os sonhos que são complicados…nós é que não podemos tentar vivê-los sem o diapasão correcto! E, com tudo bem afinado, somos sempre a melhor banda musical do mundo e arredores!

Acordei muito cedo…mas com um som divinal – 9/4/2020

stones

Turbulência

Sentado no lugar 1A, já ouvi o “cross-check” e as instruções no caso de emergência – basicamente, ouvi a hospedeira explicar que, caso dê merda e houver tempo, devemos seguir as recomendações dela…A mulher do 1B tem a mão esquerda cravada no apoio de cotovelo que separa os nossos lugares e olha para mim com um ar de medo profundo – há uma união de sentimentos no receio mas acalmo-a dizendo que estas coisas raramente têm acidentes o que, numa semana com mais um acidente aéreo, não inspira grande confiança…

O plano de ataque está definido, o plano de voo á muito que foi aprovado e o destino pertence a uma conjugação de factores naturais que não convém desafiar. “Clear to take off” e posicionamo-nos na pista, prontos para largar…motores a fundo, travões também e, após o soltar dos travões, eis que o nosso avião ganha altura ruma aos céus…onde aquelas rodas vão pousar é algo que só à nossa imaginação pertence…

A calma ou acalma…eis a questão.

Prometeste-te (sim, está bem escrito…prometes a ti próprio) um fim de semana tranquilo, cumprindo somente a tradição habitual do brunch e pouco mais. Compras só algumas Super-Bock para acompanhar e sabes que o fim de semana vai ser de descanso.

Se a sexta-feira foi de música, amendoins e Super-Bock, enjaulado entre as quatro paredes da casa do Altus que te permitem vencer o frio, já o mesmo não se pode dizer dos dias seguintes…viver com Brasileiros é um samba constante!

Não só a Super-Bock desapareceu como o frigorífico apareceu cheio de Heineken!

Um homem nunca se deixa derrotar e, por entre uns hambúrgueres maravilhosamente confeccionados, a Heineken foi escorregando pelo esófago. Acho que tanto o sábado como o domingo foram momentos ímpares de confraternização, gargalhadas – com e sem sentido – e uma dor de cabeça no dia seguinte.

O que tem realmente piada na casa é o facto de conseguirmos sempre mais uma gargalhada, mais um sorriso, mais uma situação inesperada – com que todos nos rimos – sem atrapalhar a harmonia diária.

Regras da natureza…

Dia de celebração, de contentamento, de Super-Bock, de tempestade e de muita televisão. Porquê? Porque agora o menino “Callum” está a atravessar a cidade de Cork – ventos estupidamente fortes, chuva de toda e qualquer direcção, frio, algumas enchentes na cidade e um mal estar…

Enquanto Irlandês herdado temporariamente pela República da Irlanda, telefonei para o Off Licence e reservei oito Super-Bocks para o fim de semana (4 litros de cerveja para entreter estes dias de reclusão). Preso em casa mas com a mente solta a navegar por ideias que nem sempre ouso escrever, gritos que não vou dar e abraços que, estando em stock, terei que entregar.

Após ter passado o dia de ontem a desfilar o casaco novo pela herdade de Altus, hoje é dia de melhorar as prestações no Fortnite! Começar uns treinos após o jantar, pausa para uma trinca rápida e de volta ao treino. O gozo inerente ao já não conseguir jogar o que outrora jogava e ver outros, com a idade que outrora tive, a darem verdadeiras lições de como jogar o jogo.

A vida é igual…mas real e sem armas! Combate-se com o coração…

Escoceses…

Há sempre um sorriso quando ele chega. A maneira de falar, o sotaque que uma vida não mudará, o sarcasmo muito bem aprimorado, eis o amigalhaço escocês logo pela manhã! Este homem é o personagem mais terapêutico do edifício em que me encontro: tem absoluta noção de onde está, porque está e quanto tempo vai estar e, acima de tudo, ainda nos ensina o porquê de tudo isto lhe dar tanto gozo.

Há que criar o contexto para que percebam melhor: indivíduo na casa dos seus sessenta anos, com pouco cabelo – que permanece permanentemente coberto por um gorro, aqueles óculos caídos pelo nariz, os poucos cabelos brancos e o olhar entre a parte de cima dos óculos e os teus olhos. Um encolher de ombros quando as condições meteorológicas mudam – algo que, aqui, acontece a cada piscar de olhos, um sorriso perante o Sol e uma imediata piada, com aquele sotaque bem profundo, contatando algo como: foi por causa deste Sol que me mudei para este país “tropical”.

Incentiva-nos pela experiência de vida que nos vai contando, pela piada que sabe que o seu sotaque causa – há inclusivé um outro escocês que diz não o entender muito bem (e sorri, enquanto o diz) e pela rapidez de raciocínio com que alimenta o diálogo – que por vezes se torna num monólogo – de tal maneira os restantes intervenientes ficam de queixo caído perante o “dialecto”.

A melhor comparação que conheço, para vos tentar elucidar, serão os dois velhotes dos Marretas (Statler & Waldorf) mas, e este mas faz toda a diferença, naqueles momentos de elevado sarcasmo que, pelo menos uma vez, terminam com um velhote desaparecido do balcão e o outro a perguntar “ele saltou?”

A semana começa numa segunda-feira mas o sentido de humor nunca adormece!

Boleia

Num país onde não tens carro, e onde o autocarro pode demorar 20 minutos a chegar e outros 40 até ao centro, qualquer oferta de boleia para casa é uma benção – para quem acredita nessas coisas. 😉

Acho que, pela quinta vez, me cruzei com o mesmo português – a quem outrora pedi desculpa por não ter reconhecido – e, mais uma vez (nestas coisas há que ser coerente) não o reconheci. Saí por volta das 20, para apanhar ar, e vi alguém – numa postura quase militar, de face mal humorada e com cara de poucos amigos – que me intimidou pela pose. Quinze minutos depois, quando todos saímos, qual não foi o meu espanto quando o colega que me tinha dito que havia boleia se dirigiu ao “alguém” de postura militar e lhe perguntou se havia boleia para mim… 🙂

Obviamente estes desencontros devem fazer parte desse processo milenar designado por envelhecimento! 🙂 A gargalhada que eu e o “alguém” demos foi mesmo porque ele tinha a certeza que eu não o reconheceria e a certeza dele  – que se tinha confirmado…mais uma vez! Tenho que arranjar uns comprimidos para a memória ou começar a guardar fotografias das pessoas que mais vezes esqueço – haverá cartões de memória capazes de armazenar tanta informação? 🙂

Viagem divertida e bem tranquila até ao centro, num carro que tinha chegado no próprio dia, e foi já na última curva que o pneu cedeu….cedeu perante a pressão da curva à esquerda em que, por segundos, o pneu foi trilhado contra o passeio e…borracha versus cimento é uma luta desigual! 😉

Saltamos os cinco do carro e, qual equipa de mecânicos de Fórmula 1, tratamos da mudança do pneu estourado. Eu disse “qual equipa de mecânicos de Fórmula 1”? Menti…tivemos que ver vídeos no YouTube para entender como se removia a roda e, mercê do conhecimento mais profundo de um dos envolvidos – que enfiou um bom biqueiro no pneu – o pneu foi substituído pela “rodinha 24” que hoje em dia serve de pneu suplente. 🙂

Seguiram-se as despedidas, com o sentimento de dever cumprido, e o caminho para o centro. Entretanto o Cucas havia ligado e estava a acompanhar – via Skype – a mudança do pneu, o estado de espírito dos envolvidos e, com palavras de força e incentivo, resolvemos o problema com toda a motivação do mundo. 

Demos umas gargalhadas valentes – eu e o Cucas – pela piada que é o programares tudo para ainda haver tempo para compras, antes do jantar, sendo que a mudança do pneu havia frustrado esses planos. Lá fomos juntos, na conversa até casa, a debater o novo plantel desse grande treinador do Fifa 2017. 🙂 🙂 🙂

Pequenos momentos inesperados que conquistamos com um sorriso na face!

Dias na ilha…

Dias passados ao som de Kasabian – adorável o concerto, gravado ao vivo no King Power Stadium, aquando da vitória do Leicester City na Premier League.

Mais dois dias de férias marcados – há que respeitar a existência de meias-finais do Campeonato do Mundo – e a ideia de 2 dias para ordenar o que não tem estado bem ordenado…ultimamente.

Melhorias substanciais na capacidade de jogar o Fortnite – muito por influência do filho, do sobrinho e do colega de casa – empurram-me para os lugares cimeiros. Ainda a anos-luz do jogo praticado pelos habituais finalistas mas, e isso sempre foi o mais importante, com muitas gargalhadas soltas perante o superior jogo dos adolescentes.

Farto do sol…talvez não esteja habituado a ele aqui. A República começa a apresentar os primeiros sinais dessa falta de Sol e o racionamento de água já se faz em Dublin. Há uma imposição contra a rega de jardins e afins (desperdícios de água) para prevenir o esgotar da água presentemente existente.

Mais um capítulo fechado, no que a passado diz respeito. Em paz com ele, de olhos no presente mas com o sonho no futuro – as férias com a família. Saudade de mergulhos de mar e rio, de gargalhadas com as piadas do júnior, de finais de tarde de cansaço mas com o sentimento de dever cumprido. Vontade de cumprir essas férias longe de casa, com os de casa – pode parecer ironia mas temos tanto para descobrir juntos…

Quase na hora de desejar um feliz aniversário a uma menina lindíssima, que nos acompanha desde 2004, que já deve estar uma pequena adulta, à semelhança do primo.

Sorridente? Sim. Com uma agenda bastante atribulada para Julho/Agosto porque, finalmente, vou cortar o cabelo.

Voltarei a escrever quando houver algo racional para dizer! 

Que dia é hoje???

Uma sexta-feira que me foi roubada, um fim de semana que me foi oferecido. Eis um resumo sucinto do quão díspares os dias podem ser nesta Manhattan irlandesa.

De um encontro às cegas a uma festa de pizza…houve de tudo um pouco. A hospitalidade irlandesa é um riso constante e, estar às 2 da manhã a debater a melhor forma de fazer uma pizza, tornou-se deveras hilariante.

Conhecido o grupo de desconhecidos, que por sua vez “meteu conversa” com outro grupo de desconhecidas. Dás por ti a ser surpreendido por alguém que não julgavas que te pudesse surpreender e terminas a noite com um sorriso desmedido na cara – limpa de cabelos compridos e barbas descomunais.

Um acordar diferente, um café saboroso, um fim de semana muito lucrativo em termos emocionais. Mais uma lufada de ar fresco para a semana que já quase termina.

Uma lógica na falta de lógica, um vento num país habituado a chuva. Sol….acho que foi do Sol….

Aquele abraço.

Aquele domingo chuvoso

Chove, desde que acordaste. As previsões meteorológicas dizem que a tempestade Ophelia deverá passar muito perto de Cork. Estás abastecido de mantimentos.

Se a chuva, por si só, não constitui uma novidade sabes, de antemão, que o alerta vermelho indicia algo de perigoso. O plano de contingência passa por chamar um táxi para, da maneira que te parece ser a mais segura, ires trabalhar. As escolas estarão fechadas e há um alerta para eventuais cheias do Rio Lee!

Vieste de uma terra de alertas vermelhos porque estavam 42 graus e havia uma tempestade de areia para uma terra com alertas vermelhos onde levas com cargas de água semelhantes á que levou o outro senhor a construir uma arca…opções!

As árvores demonstram a força do vento e estás seriamente a ponderar ir para um hotel, só por uma noite, para evitares o receio que é estar a viver ao lado de pinheiros com mais de 25 metros a cerca de 10 metros de casa! Não é preciso ser um génio da matemática para perceber que são potencialmente perigosos.

Terminada a aventura com a conterrânea do Sr. Putin, estás agora mais livre para fazeres aquilo que gostas. E continuas com a Escócia debaixo de olho! Nunca paraste a tua procura e sabes que, a qualquer momento, poderás ter que fazer as malas e partir. Não são malas de cartão e tu há muito que compreendeste a piada que é partir para um sítio novo, desconhecido e cheio de locais para conhecer – não de férias, mas para trabalhar e conhecer, de novo, pessoas novas, locais novos e ver a natureza, acima de tudo isso, desses novos lugares por explorar.

De dedos cruzados e com um sorriso de quem quer o melhor para si próprio, sem réstia de egoísmo, mas com a certeza do seu valor próprio, vais tomar um duche e desces até à cidade.

Aquele abraço.

Um país atento

Há sempre um alerta meteorológico neste país! Hoje é amarelo e, desde que cheguei, acho que nunca houve um dia sem o registo de uma qualquer intempérie…se está sol (um milagre que raramente acontece) a exposição UV é sempre perigosa e, quando chove, há sempre vento a acompanhar…8 ou 80!

Ainda não consegui perceber como é que os locais conseguem andar 90% do tempo vestidos de calções e t-shirt mas confesso que não vou esforçar-me mais por compreender.

Que, de facto, são um povo caloroso isso não há dúvida! Que possuem um património digno de ser preservado e partilhado com as gerações futuras…sem dúvida.

Adoro o verde neste país. Sinto-me em África com a frescura irlandesa.

Aquele abraço.

Aquele sábado

Após a limpeza da casa dirijo-me para o meu canto pacífico onde, ironicamente, há um casamento. Lentamente comendo o meu bife com cebola grelhada, a calma é interrompida pelos convidados que resolvem vir fumar para a esplanada.

Os empregados olham os noivos que chegam num clássico. Carro bonito e noivos de cara feliz, abraçando aqueles que os saúdam logo á entrada.

O gerente dá um ar da sua graça quando exclama, dirigindo-se às funcionárias, um sarcástico “até parece que nunca viram um casamento” mas o olhar das funcionárias está naquele momento, no que sentem as pessoas, na felicidade que paira no ar.

Uma lufada de ar fresco numa rotina de trabalho? Talvez. Um momento a observar? Sempre. A constatação da felicidade alheia é sempre um bom contributo para a nossa própria felicidade – um alhear daqueles sentimentos que são considerados pecados e uma empatia com os valores mais nobres da vida em sociedade.

Mais uma pint, um sorriso quando a convidada dá um nó de laço no vestido de maneira completamente oposta á que utilizarias. Uma constatação de que tudo na vida pode ser feito ao contrário da maneira como fazes e o resultado ser perfeito.

Retalhos de um sábado…

Pausas

Quando tens aquela possibilidade de, durante o teu horário de trabalho, simplesmente parar. Aproveitar o sol, deitado na almofada gigante, vendo os corvos a passar – certamente a caminho de mais uma travessura – a responsável pela horta a mostrar-te as últimas colheitas, os carros que passam ao longe… muito saboroso!

Hoje é dia de despedida de alguém que tem um significado especial para ti. Durante dois meses vão estar afastados e, muito provavelmente, o reencontro será em Outubro. Aguardas serenamente e gozas este teu novo estado de espírito…a serenidade é o melhor dos confortos.

Toca o despertador e, perante o chilrear dos pássaros, percorres o caminho de volta ao teu posto de trabalho. Dias cansativos mas largamente recompensadores.

Vamos a isto! Aquele abraço.

Rio

Escolhes fazer uma caminhada, atravessar a cidade, procurar um lugar recatado que ainda não conheças, onde possas estar ao sol.

Recordas que te falaram de um café português, sobre o rio, com muito boa exposição solar e muito tranquilo. Como é dia de caminhada e tens que fazer algumas compras para casa o local escolhido tem que passar pelo centro. Escolhes o Rio café e descobres que te mentiram! Não há Super Bock!!!! Heresia.

Telefonas para o 21 e descobres que há 8 em stock com um preço promocional…€20! Fazes a reserva e tens agora 4 litros de cerveja reservados por €20! Uma boa maneira de teres algo para acompanhar o jantar…

Entendes agora perfeitamente o porquê do povo desta ilha ter um bronzeado “de camionista”. Ao teu lado tens duas mulheres a debater o quão libertina a vizinha se tornou, desde que se divorciou. Há um misto de horror e inveja nas palavras delas e sorris, na direcção oposta á da conversa. Foi com fenómenos destes que a vídeo-vigilância prosperou!

No rio continua um desportista, no seu kayak, dando voltas sobre si mesmo. Não parece que precise de ajuda e, passados uns minutos, já circula pelo rio a um ritmo de quem apenas se refrescou antes de continuar.

Ora tens sol, ora está encoberto. Vês os aviões a partir e a fazer a habitual curva á direita que os leva a passar por cima do teu apartamento. Questionas-te porque não farão uma curva á esquerda mas ninguém te responde.

Fumas mais um cigarro e dás graças por teres encontrado 8 Super Bock por €20! Prioridades…

Aquele abraço.

Segundas

Curiosa a forma como os Irlandeses celebram a aparição do sol. Os sorrisos abrem-se, o passo é mais vigoroso e seguro, a postura é perfeita e a sensação que um forasteiro tem é que algo muito bom está a acontecer…☀️☀️☀️🇮🇪🇮🇪🇮🇪

As segundas-feiras são dias muito pouco apreciados pelo mundo fora. A excepção é uma cidade, infelizmente sem gauleses irredutíveis, que celebra a sua feira semanal. Por entre trocas de material que foi testado e não serviu, apetrechos para a semana que começa e devaneios para um dia que pode nunca chegar, eis a massa popular reunida para a confraternização semanal. Talvez afinal a cidade esteja pejada de gauleses… quem sabe? ❤️🇵🇹

Confesso que habitualmente fujo na direcção oposta á do evento… não só na segunda-feira mas também nos restantes dias e só me aventuro por terrenos acima da rua 20 quando convidado para confraternizar com uma família que me é muito próxima! 😉

O texto refere-se ao dia de ontem. Hoje está nublado, já caíram umas pingas mas o vosso humilde narrador continua de sorriso maroto e bem aberto. A magia anda no ar….😂

Clock ticking

Acordado pela passarada, corpo bem esticado por um espreguiçar ímpar, com muita preguiça de fazer até o próprio café…

A necessitar de fazer as compras semanais e deparado com uma cidade que já dorme a sesta, de ar condicionado ligado, como se a temperatura fosse tão aflitiva…

Estão uns 18 graus, corre uma brisa ligeira, de vez em quando, e estou na esplanada do Ó Conail que, apesar de ter como especialidade o chocolate, tem um cappuccino muito bom.

Sorvo mais um gole e vejo quem passa. Salvo raras excepções está tudo num ritmo típico de domingo e até eu, já depois de ter visitado o Fitzgerald Park, anseio por uma soneca.

Semana muito recompensadora, em termos humanos, com novas pessoas conhecidas. Algumas amizades a fazerem-me questionar como por vezes podemos ter colegas de trabalho como amigos!

O café toca música dos anos 80/90 e os turistas param, espantados, antes de entrar para relaxar um pouco. Este é o meu canto secreto, aquele onde descanso enquanto escrevo, aquele onde bebo café enquanto vejo quem passa, aquele onde me sinto bem.

Ao contrário do Néctar, este café fica numa viela entre a rua principal e uma paralela que nos conduz á Ópera (direita) ou Grand Parade (esquerda). É essencialmente percorrida por pessoas ávidas de conhecer detalhes e não o que o roteiro indica, fugir do vento para uma pequena brisa, apreciar sem pressas e com detalhe.

Um bom domingo. Aquele abraço.

Passo acelerado

Estes Irlandeses não param de me espantar! Agora é o motorista que realmente está a passar um mau bocado, a nível pessoal, e partilha a história com uma utente que ia a sair do autocarro. Não se conheciam, estivemos parados uns 5 minutos, mas imediatamente eles partilharam momentos menos felizes das suas vidas. A simplicidade de quem sabe viver em sociedade. ❤️

Durante o período em que estivemos parados nem um dos restantes utentes emitiu um som. Uma rápida solidariedade apoderou-se de todos os presentes e cada vez mais percebo porque todos os dias cumprimentamos efusivamente aquele que nos transporta. 🤗

Enganei-me no botão do despertador e aqui estou no expresso para o local de trabalho. Parte mais tarde mas chega apenas 10 minutos depois do anterior… perfeito. Por vezes questiono-me se estes momentos não serão escritos antecipadamente para que os possamos viver…🤔

É sexta-feira e estamos a uma semana de receber o quinhão relativo ao trabalho deste mês! O tempo voltou a ser Irlandês e o céu nublado tomou conta do céu. Nada que não se ultrapasse com um sorriso aberto e umas pints. Sábado os Portugueses reúnem-se para ver o futebol… vamos lá conhecê-los!

Aquele abraço.

Fim de semana

O Sean Connery dizia, num dos filmes do Highlander, a frase que mais se adequa (também) a este país “There’s no sun in this bloody country” (referindo-se ao seu país, a Escócia). Havia um sorriso trocista na cara dele mas, sendo um dos melhores actores de sempre, era difícil – para o comum dos mortais – distinguir realidade de ficção mas eu vos garanto que aquela foi das deixas que ele mais adorou dizer… e pagaram-lhe para ele o fazer!!!! 😎

Já depreenderam… chove! O autocarro segue a caminho do centro e a música parola toca bem alto – deve haver um nome para esta tortura mas, dado que a música é cantada em Gaélico, a tortura é menos perceptível….😂

O fim de semana que hoje começa ameaça ser divertido! A terminar com o concerto de Eddie Vedder no domingo. Só espero que a chuva dê tréguas…🤗

Animal racional já adaptado às mudanças radicais do clima, encantado pela verdura do país, arrebatado pela pessoa mais inteligente que até hoje conheci… posso, a plenos pulmões, gritar “Sou feliz”! 🤗

Ócio

Finalmente parado, a descansar de visitas feitas e recebidas, de coração cheio, de bacalhau já comido, família visitada, conversas em dia.

A receber um sorriso do sol, aguardando que o vento acalme, pronto para um banho na praia de sempre, um fino à beira mar e o regresso à cidade onde trabalho.

De check-in já efectuado, boarding pass já impresso, bilhete para o Eddie Vedder também impresso e pronto para ser recebido pela meteorologia Irlandesa.

Correr para uns abraços reconfortantes, matar saudades de quem não pôde vir e beber uns pints em homenagem a nós. Continuar a terapia que me dás, devolver os sorrisos que me provocas e, com os nossos baby steps, continuar a nossa vida juntos.

O adepto do planeamento antecipado – 6/6/2017

Dia de concerto

Madrugaste para chegar a horas ao ponto de encontro, choveu desde as 9 da noite de ontem e, tendo em conta que o concerto é nos jardins relvados de um castelo, só aguardas que um banho de lama esteja incluído. 😬

Nada afecta o teu estado de espírito e, 25 anos depois do concerto de Alvalade – Soundgarden, Faith no More e Guns and Roses – estás pronto para ver como o tempo terá afectado a banda. 😎

Estás nostálgico no sentido em que tentas ir ver sempre bandas que temes não voltar a ver mas sabes que sofres do “síndrome Rolling Stones” e, muito provavelmente, esta banda ainda durará mais umas décadas (os amuos deles não são tão severos quanto os dos irmãos Gallagher 😂).

Segue-se Eddie Vedder – mas aí em ambiente fechado e sem deslocações para fora de Cork. Vais apreciando as vacas irlandesas e concluis que, tal como as mulas Gregas, elas desempenham um papel fundamental no funcionamento do país. 😇

Sorris perante a paisagem que separa Cork de Dublin, vais a uma cidade onde muito festejaste em 2011, entoas mais uma das músicas que o “cantante” debita. É chegada a hora de voltar a entoar hinos dos teus 20 anos! O tempo também passa para ti puto! 🤗

A conhecer o prado Irlandês – 27/5/2017

Brunch

Domingo passou a significar brunch com a malta da Internations. Fazes a caminhada do costume e desces à cidade, espreitas as novidades nas redes sociais, as visitas do blog e sorris…sorris com a diversidade de países de língua portuguesa que te visitam e um outro onde há pessoas que conheces de vista.

Sabes que especular sobre quem será que te visita no blog é como amar sem ser amado – o teu texto está lá no pressuposto de não saberes quem o irá ler. E és feliz com esse sentimento.

O pequeno-almoço tardio – que é o que o brunch significa – estava maravilhoso. As salsichas, os ovos, o pudding (black and white), os cogumelos, etc… tudo maravilhoso. Infelizmente tive que correr para o WC mais próximo pois a soma de todos os elementos atrás referidos resultou na necessidade de uma evacuação de emergência! (conversa de me*da, dirão alguns dos leitores… uma emergência, responderei eu).

Amanhã começam duas semanas terríveis de trabalho, auto infligido e por mim requisitado, autorizado superiormente pela minha manager (Uma jóia de moça).

Que tudo me corra bem e a vocês também. Boa semana caríssimas e caríssimos.

Fim de semana ventoso – 14/5/2017

Há nervo no canal…

Esta coisa de viver num país estrangeiro tem que se lhe diga…qualquer um se adapta mas há sempre aqueles pequenos detalhes que nos enervam enquanto divertem. E porque é que enervam? Porque o nervo é sensível e é muito difícil esconder a dor…tudo isto a propósito de uma ida ao dentista.

Se da primeira vez que aqui fui ao dentista – e tarde descobri que ele não falava inglês – da segunda vez tive o cuidado de ligar primeiro e pedir para falar com o profissional dos dentes! Da primeira vez indiquei o dente cariado e ele fez-me uma limpeza, bateu no peito dele (como quem indica que é por conta da casa) e eu vim-me embora…com a mesma cárie com que havia entrado mas com os dentes muito mais brancos! :p (nunca mais lá pus os pés e, obviamente, os dentes).

Sentado na segunda cadeira de dentista, e após o diálogo em inglês ter entrado numa conversa fluída, eis que ele me pede para reclinar a cabeça e apontar o dente que dói…explico que vou indicar com a língua e, após o ter feito, ele diz-me que vai certificar-se (para mim não restam duvidas; todavia, na minha mente, fica a interrogação: “Vai certificar-se como? Não basta a minha indicação? Este gajo não confia em mim?”). Dou um salto na cadeira e ele, com uma cara bastante séria, atrás dos pitorescos óculos redondos, exclama um “É este!!!” E eu, em modo silencioso, profiro todos uma serie de impropérios que nem sabia conhecer…Ele, tentando reganhar a minha confiança, dá a explicação cientifica indicando que havia pulverizado o dente em questão com uma qualquer substância a não sei quantos graus negativos…comecei a ver o gajo como o Major Strasser do Casablanca e a duvidar muito que aquilo fosse o começo de uma bela amizade e que, muito provavelmente, o desfecho do Major seria o mesmo do do filme e Capitão Renault…nem vê-lo.

Mas não era um filme a preto e branco e o único refugiado aqui era o maldito do nervo do dente. Nervo disse eu? Descobri agora que são quatro…como? Da única maneira possível: por tentativa e erro! Feito o diagnostico da obrigatoriedade de desvitalizar eis que passamos ao acto (aqui se prova que a teoria é muito mais bela do que a prática…cof, cof). O homem procura o canal e tenta encontrar o nervo e o único que lhe pode indicar que o caminho é o correcto é o paciente! (há que modernizar isto no tratamento dentário!!!!) De cada vez que ele encontrava um nervo o vosso humilde narrador dava um salto na cadeira como se fosse o último – a dor é excruciante e, de cada vez que um canal é encontrado a sensação que te dão é que foi o último…Não sei se os trate por políticos ou apenas por perversos sádicos que podem legalmente praticar o seu prazer.

Recordei que já tinha passado por isto, há uns anos atrás, e pouco a pouco a confiança foi voltando mas quase se desvaneceu quando vi a cara dele, completamente alterada e com um esgar que parecia sorrir, com um bocado de nervo numa das limas que eles usam para a introspecção, e a exclamar “Saiu inteirinho”…como se de uma das maiores conquistas da humanidade se tratasse…

Perdi uns nervos mas ganhei um dentista!

Linha de pensamento…

Por mais que evite pensar no assunto eu não consigo. Qual menino a quem dão um presente novo, inesperado, e sobre o qual ele não tem nenhuma pista também eu quero “desembrulhar” a próxima ilha. Depois de no ano da chegada ter conseguido visitar Aegina, Poros, Kea e Hydra eis que agora concretizo um dos destinos que sempre quis conhecer – Zakynthos. Sou gozado por “alguém” com quem falo mas é um gozo bonito e salutar…como quem, ao ouvido, nos sussurra “quem me dera ir contigo”!

Sem querer “aturar” ninguém, sem querer ter tudo planeado – mas quase tudo já está “debaixo de olho” quanto ao planeamento – eis que parto na próxima 6ª feira ao final da tarde. É um voo curto, com cerca de 50 minutos, numa sexta-feira dia 13 (não sou supersticioso mas, por favor,  deixem-me curtir a ilha primeiro e depois levem-me se for esse o propósito).

A meteorologia prevê uns bons 24 graus celsius – que, para um gajo que apanha escaldões em qualquer raio de Sol, é algo bastante perfeito – e marés muito calmas – como se aqui as vagas fossem acima do dedo grande do pé…quando a rebentação dos navios que passam ao largo chega à praia o máximo que podemos temer é uma ou outra gota de água morna a bater no joelho!

A mochila está pronta, com o último livro em português que me resta, com nada mais do que o fundamental e básico nestas ocasiões – calção de banho, pijama, escova e pasta de dentes, havaianas, desodorizante e uma muda de meias e cuecas. Qual Robinson Crusoe auto-imposto e dos tempos modernos eu só quero descansar, conhecer e passear…muito. Nem que para isso tenha que chegar, no domingo, no mesmo estado lastimoso em que cheguei de Bucareste – completamente exausto, pés em sangue mas feliz…muito muito feliz por ter sentido que tinha “ouvido” a história – ao estar em frente ao Parlamento Romeno e a imaginar os 100,000 habitantes que outrora acordaram o casal Ceaușescu para mais uma das revoluções num país que havia pertencido ao Pacto de Varsóvia. Algo muito íntimo, muito meu, mas que me deu um gozo, uma alegria e uma nova maneira de olhar as coisas, pessoas e até a vida.

Tenho “pesadelos” que me acordam com o barulho do meu corpo a entrar nas águas mornas do Mar Jónico…os mesmos que me fazem sonhar com uma ida ao Mar Morto! Ter “pesadelos” assim não custa…o que custa é concretizar o sonho e esse, aos poucos, eu vou concretizando.

Aquele abraço.

Henrique Milheiro da Costa Correia de Matos

Dia cinzento

Eu realmente quero apressar a chegada do verão! Os ossos ainda tiritam do frio do inverno e preciso de temperaturas altas para expulsar a humidade armazenada em mim.

O ritual matinal cumpriu-se: levantar às 7 da manhã, ligar o cilindro de água quente, telefonar a encomendar o pequeno almoço e curtir a vista da minha varanda enquanto comia. É extremamente gratificante o ter aqueles minutos em que, enquanto faço a primeira refeição do dia, vou observando a mistura daqueles que se levantam e os que se dirigem para casa (num passo típico de quem passou a noite fora)…uma espécie de janela indiscreta mas com menos sangue.

Um olhar rápido pelas principais notícias do dia e um duche, bem fervido, que desperta enquanto remove as impurezas do dia anterior.

O sair de casa, nesta altura do ano, é sempre um momento de muita indecisão: levo casaco? (!), está calor e vai estar?, como vai ser a meteorologia deste dia? Se é verdade que a temperatura mínima estabilizou – e não há o perigo de errarmos muito – a verdade é que hoje me enganei…De manga curta e num passo de atleta de marcha saí procurando alcançar o Sol o mais rapidamente possível e…não o encontrei. Foi uma viagem penosa (num comboio em que as janelas só se fecham três meses por ano) até ao destino em Tavros.

Entretanto a Terra tremeu e tive que interromper este resumo. Coisa de miúdos… 3,7!!!  😉

Em Tavros aguarda-me, em dias de semana, uma deliciosa bougatsa que, com a Sprite como bebida, como enquanto me preparam um fredo cappuccino que levo na mão – pelo caminho para o emprego. Passo por uma escola primária e por um liceu mas, definitivamente, a escola primária faz-me sorrir pois cruzo-me com os putos que, de sorriso constante ou arrastados e de olhos fechados, se dirigem para as aulas. Sei que não é nostalgia mas sim o conforto de saber que os sorrisos e corpos arrastados com que hoje me cruzo serão o amanhã – numa altura em que provavelmente será a minha vez de me arrastar e, posteriormente, fechar os olhos.

A temperatura lá subiu um pouco, para cerca de 23, e aguentei bem a escolha matinal da indumentária… Estou é amuado pois o gajo da Fedex não deu com a morada do apartamento novo e ainda não tenho as minhas Havaianas novas…criancices!!!

Uma coisa vos digo…este calor dá uma moleza tal que o deitar cedo é uma constante.

Aquele abraço.

Henrique Milheiro da Costa Correia de Matos

Armado em super herói

Acordei com calor e sabia que estava adiantado em relação ao despertador – o amargo despertar versus a sensação de vitória sobre o despertador que habitualmente determina o fim do descanso.

Olhei à volta e vi que o edredão tinha voado durante a noite – interroguei-me tentando perceber se teria sido aquele gesto que tinha interrompido o sono…Não, eu tenho calor! exclamei para mim próprio. E levantei-me, heróico por ter vencido o despertador e cambaleando pelo mesmo facto (uma espécie de super herói depois de um dia agitado).

Olhei para o disjuntor que controla o cilindro de água quente e resolvi não o ligar – nada melhor do que um bom duche fresquinho para começar o dia…

Despido o pijama, colocado no centro da banheira e pronto para o alegre despertar! Abro a água e noto que talvez esteja excessivamente confiante face a uma água profundamente gelada. E estava… Verdade seja dita que desde as 7 da manhã a sensação que tenho é que, com o passar das horas, algumas partes da minha anatomia estão a voltar.

O excesso de confiança pode conduzir-nos a banhos gelados mas o objectivo final é atingido na sua plenitude – ficamos limpos para o dia que começa…

Aquele abraço.

Henrique Milheiro da Costa Correia de Matos