A pureza do coração.

Numa esplanada, algures ao lado de uma bela floresta portuguesa, com o barulho e o cheiro do mar ao fundo, sentindo a aragem do vento norte. Há três senhoras sentadas a uma mesa, numa conversa sobre a saudade e de que maneira ela afecta cada um de nós. A conversa é interrompida por uma quarta senhora que chega, mesmo no momento mais importante da parte que eu, até então, havia escutado. A última frase que se ouviu foi “essa é uma mulher frustrada, com o chakra do coração fechado!”

Como nunca fui grande fã do hinduísmo, e porque a hipótese de haver corações fechados para a vida me soou como o supremo acto de irracionalidade, fui investigar o que aquilo poderia significar. O chakra cardíaco, segundo a literatura disponível, regula a capacidade de amar e ser amado! Caiu-me o queixo com a sugestão de que efectivamente existem seres humanos incapazes de amar ou serem amados. Mentalmente procurei encontrar semelhanças com cenários de vida com que me tivesse deparado e, mesmo apesar do absurdo de algumas situações, nunca o atribuiria a uma falta de capacidade…condicionamento, quando muito. 

Lembrei-me dos tempos das aldeias, essas trevas face ao desenvolvimento citadino, em que o filho dos ricos só pode casar com outro semelhante, em termos de riqueza. Sorri, com a ausência de sentimentos face a uma diluição de património entre iguais ou semelhantes, mas a racionalidade impôs-se ao emocional e, por breves momentos, dei por mim a concordar. Felizmente, e porque o planeta é pródigo em lições imediatas, uma das senhoras sentadas (facilmente reconhecível) começou a discorrer sobre a situação da sua família.

A filha, herdeira de uma cadeia de distribuição local, havia preterido a herança para emigrar para a Suíça. “O amor pelo marido superou tudo!”, dizia ela e, acrescentou “Ainda hoje me envergonho de lhe termos tentado negar um futuro amoroso com o argumento do dinheiro!”, dizia amargurada. “Deu-nos uma lição do que é o amor, três netos que são o orgulho da família e, ainda por cima, visita-nos todos os anos em Agosto como se nada tivesse acontecido.” Explicou depois, literalmente com o coração nas mãos, o quanto mais a amava – por ter confiado no coração, por ter triunfado com coração e por continuar a demonstrar o quanto o coração comanda a vida.

“Eu, em Agosto, não estou para ninguém!”, acrescentou. “Sorvo cada bocadinho do amor que eles espalham e tento tornar-me uma pessoa melhor com o que aprendo, constantemente, com eles.” e, completando o raciocínio de todo o processo, concluiu dizendo “O meu neto assumiu o negócio da distribuição e já somos uma multinacional europeia! Há uma certa ironia em tudo isto, não há?” – a pergunta retórica merecia ser respondida mas eu achei que todo o contexto e processo já o havia feito. Tremi de satisfação e alegria sabendo que o amor ainda triunfa por este mundo fora…

O triunfo do miocárdio – 7/8/2024

Recomendo lerem:

Deixe um comentário