A novidade que não o é.

A intimidade entre um casal é, quanto a mim, primariamente definida pela força que ambos colocam na sua constituição: o saber viver para nós, o saber priorizar o nós, o ter um gosto enorme em contribuir para algo novo que é só nosso. 

O processo é demasiadamente fácil para que um ser racional falhe mas o mundo está cheio de exemplos falhados. A exclusividade, o acerto de duas personalidades, o respeito pelo sempre necessário tempo do outro, o carinho e a elevação de outra pessoa acima de nós mesmos pode colidir com personalidades narcisistas, ou sem maturidade suficiente para simplesmente ser de uma honestidade simples e confessar “não sou capaz de abdicar de mim em prol de nós” – que é a mais honesta expressão de não querer pactuar mas, ao mesmo tempo, respeitar suficientemente a outra pessoa para ser capaz de o confessar.

O mundo também está cheio de pessoas cobardes que, ao invés de constatarem as suas fraquezas em prol da sua superação, optam por atitudes bélicas e de desafio que jamais encontrarão um alvo igual para as praticar. Sim, é verdade, o mundo também está cheio de potenciais alvos, logo a cobardia pode ser assim escondida, desde que o alvo seja sempre diferente e a imaturidade permaneça como volante da vontade de viver desse ou dessa personagem, como algo reciclável e partilhável pela sociedade.

A ambição desmedida fez nascer os sentimentais de merda – sujeitos para quem a intimidade é o bem maior, que os torna cegos (excepto para verem, decorarem e enxergarem, com todo o encanto que possuem, a pessoa amada). Vivem com a fusão de dois corações num só e aceitam que a partilha do miocárdio seja a mais alta aspiração do seu relacionamento. Transformam a sua singularidade num pluralismo do casal que orgulhosamente ostentam, como os veteranos ostentam as medalhas das suas conquistas – com muito orgulho!

Não há neles discussões mas sim conversas em prol de consensos – sabendo sempre que o miocárdio só é musculado se ambos estiverem em constante equilíbrio na busca de um bem comum que não conhecem e que, potencialmente, poderão nunca alcançar, mas que nunca desistem de procurar – pelo bem de ambos. O coração aberto a outrem, como se de uma cirurgia de peito aberto se tratasse, com toda a fragilidade que o processo acarreta e toda a confiança nos dois envolvidos. É difícil, há quem passe uma vida inteira na tristeza de nunca o experimentar.

Arritmia de fim de tarde – 17/7/2024

Deixe um comentário