Não usaria palavras – era um risco mas, como tinha vertigens e fazer queda livre estava fora de questão – seria o seu desporto radical desse dia. Não era o método Ludovico, que Kubrick deu ao mundo, mas uma alternativa muito mais hilariante. Não implicava qualquer coação física e, quando muito, seria apelidado de louco pela tentativa de impor ao mundo um novo alfabeto…de sorrisos.
Por cada gota de água da chuva teria que sorrir e, de cada vez que interrompesse o seu passo – nessa longa caminhada, que se quer sorridente, chamada vida – teria que exteriorizar a soma de todos os sorrisos dados no percurso. Tinha consciência (teria de facto?) das diferentes interpretações que esta nova realidade poderia trazer ao seu dia-a-dia mas, colocando o científico acima da maneira de ver de quem o rodeia, destemidamente avançou!
O dia era de aguaceiros pelo que, mais cedo ou mais tarde, teria a “aberta” desejada para colocar a teoria em prática! Assim que notou umas pingas, que timidamente pintavam o chão onde pousavam, vestiu o fato com todos os sensores e dirigiu-se a um café próximo. Um sorriso tímido primeiro mas, fruto do aumento da cadência da chuva, o atrevido assumiu o lugar do tímido e o cientista sorria agora – como um puto adolescente a quem deram a chave do primeiro carro.
Baralhava as pessoas com quem se cruzava enquanto ele próprio estava baralhado e, atingindo o café que tinha definido como objectivo, soltou uma sonora gargalhada. Espantou todos os presentes que, como saudação de volta, lhe devolveram sorrisos. A empregada de balcão, ainda esboçando um sorriso, perguntou “Um café e uma água das pedras?” e ele, com os lábios invertidos e a formar um C invertido a 90 graus, anuiu. Poderia ser esta a solução para a humanidade? – perguntava interiormente a parte da sua mente, logo interessada em capitalizar o processo. Sorriu com a imagem, sem que o lucro fosse o propósito.
Entretanto parou de chover – 10/7/2024
