Poderia parecer o nome de um filme bacoco, de baixo orçamento e com inúmeros actores e actrizes a fazerem corações com as mãos, a falharem falas e a verem o futuro muito negro mas, apercebendo-se que o guião estava nas suas mãos, ele ia escrever não apenas mais uma obra-prima mas o livro que contava a viagem de uma vida que não a sua!
Decidira ser invejoso num só detalhe e viajou sozinho. Ainda tinha na memória o desconforto que uma pessoa desagradável trouxe, em anteriores expedições, pelo que se sentia seguro não sabendo o que queria mas tendo a certeza absoluta quanto ao que não queria – drama oligofrénico, assim a havia apelidado “A criança que tem um problema para cada solução”. O respirar fundo que se seguia, de cada vez que mais um detalhe se acercava da memória, era libertador, revigorante e, de tal forma retemperador, que ele resolveu criar uma memória constante, com um qualquer facto perturbador de outrora, de maneira a melhorar a sua higiene pulmonar e a sua saúde, em geral.
A mala de cabine com todos os artigos fundamentais e um desejo imenso de partir à descoberta. Vou voltar a uma aldeia portuguesa maravilhosa e posso, em paz, rever todos os detalhes que fazem dela uma das mais emblemáticas do Algarve. Relembrar amigos, campos e caminhos, a doce alegria de sentir o dia correr sem ter que correr atrás dele mas sim tendo dias que nos fazem correr, sem termos a noção de estar a praticar exercício. Um sorriso de criança como forma de responder a quem nos chama, mais uma comidinha porque estamos eternamente a crescer (conceito português que adoro e que a muitas dietas obriga), alguém que inventa uma brincadeira nova ou um jogo tradicional português que surge.
Alte é das aldeias portuguesas mais lindas onde o tradicional português tem uma representação pública – num espectáculo de cor e ordenamento que deveria ser copiado para as cidades. Uma espécie de quadro que não pintaríamos da mesma maneira mas que imediatamente reconhecemos a necessidade de existir, preservar e incentivar de forma a podermos mostrar a beleza aos que mais apreciamos!
Após memorizar cada detalhe, porque gosto muito da ideia de ter uma ideia mental completa das coisas, senti que tinha necessidade de ar fresco e rumei ao Carvoeiro. Passei no Gramacho a espreitar o golfe e, meia volta dada, eis o carro à entrada da Praia do Carvoeiro. Faço o check in no Mistral e desço a rua para procurar um restaurante. Olho para “O Bote” e sorrio com a memória de todas as histórias que ouvi sobre este local e a minha presença, com 10 anos, numa noite de verão em que eu só sorria porque tudo era novo e agradável de conhecer. Comi bem, passeei no “Rossio” do Carvoeiro, recordei o primeiro Snoopy aqui comprado e o fabuloso companheiro de férias em que se tornou. Na manhã seguinte subi ao Algar Seco e dei um mergulho da rocha directamente para a água e da água directamente para a rocha – a praia que eu adorava precisamente por causa desse detalhe que é a inexistência de areia. Passagem por Benagil e Centianes e parto rumo à Praia da Oura.
A Oura mostra muitos capítulos mas esconde um Borda d’Água onde existia a mais bela e eficiente esplanada sobre a praia. Dei um mergulho madrugador, a relembrar os bons momentos passados na Casa da Carroça, julguei ouvir Jô Soares, ao fundo, novamente. Sem tempo a perder rumei a Monsanto e almocei com os meus primos. A tarde é sempre um “faça o que quiser” que culmina com um passeio ao castelo, após todos terem dormido a sesta. A hora do lanche apenas serviu para uma bucha rápida e a partida para Viseu.
Perdido no Fontelo, de café na mão, constatando que a beleza que o meu pai atribuía a este local fica aquém do que sentimos, quando afundados no manto verde, sentindo o palpitar de um corpo que agradece uma qualidade do ar muito superior ao que está habituado. Hora de partir para Vila Real uma vez que comida boa nunca tem faltado pelo caminho….talvez uma pequena paragem em Trancoso!? Melhor não….😂
A descrição que tenho de Vila Real é algo que em mim guardo e onde a viagem termina. Não foi o fim do mundo!? Obviamente que não! Foi uma viagem feita com sentimento! Experiência que nem todos conseguem alcançar!!!! – 17/3/2021
