Arrepios, lençóis e cobertores…

As pessoas passam na rua com os primeiros casacos, as crianças circulam nos carrinhos já cobertas com algo, há espirros e as folhas começam a cair ou a ser cortadas pelos serviços camarários. Já não sais de casa com os teus calções e tshirt e passas o dia a destilar, a água continua a ser companhia obrigatória e a primeira coisa que te é servida assim que te sentas.

As havaianas parecem estar geladas nos teus pés e, quando descobres os teus chinelos de inverno, constatas que tens que comprar uns novos. Procuras o edredão – que desde Março anda alheado do teu contacto – e colocas junto à tua cama como complemento do conforto que queres ter enquanto dormes. Adormeces descoberto e acordas coberto, espirras, olhas para as meias e sentes que vais ter que voltar a usar aquele complemento para te sentires um pouco mais quente. Essa necessidade de te sentires quente, que durante 6 meses a natureza te deu naturalmente sem que a roupa fosse sequer um acessório necessário – não fora o pudor da vida em sociedade – regressa como um arrepio que negas a princípio mas sabes não poder controlar, no final.

As amplitudes térmicas regressam e sais de casa para um dia de praia e regressas a casa como se voltasses de um dia de inverno. Imaginas-te uma criança rebelde – porque ousas tomar banho num mar que os locais já designam de muito frio – mas sabes que essa rebeldia vem de um hábito caseiro de quem passou tantos anos a descer 10 quarteirões para dar um mergulho – de tshirt, calções e havaianas – num Atlântico tantas vezes referido por atletas de alta competição como sendo uma virtude para quem tem que competir nadando nas mais diversas temperaturas. E recordas todos os mergulhos que deste fora de época e o gozo que cada um deles te deu.

Voltam as grandes caminhadas e passeios históricos, desaparecem as ventoinhas de alta velocidade (e com água) e retornam os aquecedores de grande potência. Ansiavas que o inferno do Verão passasse – e finalmente conseguiste o que querias – e agora desejas apenas que o frio passe e o calor volte – não o infernal mas aquele equilíbrio anterior a Julho e Agosto que te permite sentires-te como o Tarzan – numa selva urbana e desregrada a que agora chamas a tua casa, o teu país de adopção, o local onde respiras melhor e os teus sorrisos são mais honestos.

Voltam os amigos que estiveram retirados em ilhas durante o inferno do Verão, aparecem novas caras e novos amigos, os locais mudam da beira-mar para o interior, as trovoadas – nunca ausentes, mesmo durante o Verão – são agora mais baixas do que nunca e a multidão já não vem para as varandas como o fazia no Verão – em que o desejo de algum ar fresco levava a essa atitude infantil de saudar a chuva como se num deserto vivêssemos.

Ligas a caldeira 30 minutos antes de tomares banho – algo que havias abandonado em Março – e a água quente tem exactamente o mesmo efeito relaxante que a fria teve ao longo do período de calor. És mais célere em termos de escolher e vestir a indumentária para o dia e o casaco passa a companheiro inseparável. Acordas mais tarde ao fim de semana pois o calor já não te incomoda e o edredão coloca o teu corpo na temperatura ideal para descansares. Sorris – não porque não gostes do Verão mas porque constatas o quão belo tudo isto é – as estações do ano, a chuva, o Sol, os pássaros a baterem em retirada para o norte de África. Ouves as histórias do povo Grego que te amedronta dizendo que o Inverno passado não foi nada comparado com o verdadeiro Inverno Grego…pensas novamente nos chinelos novos que tens que comprar e começas a duvidar que só um edredão seja suficiente. Sorris com eles – que imediatamente abrem as portas de suas casas caso sintas essa necessidade e não estejas preparado para o rigor da estação que se avizinha. Obviamente falam em comida, em bebida e numa alegre conversa pela noite dentro…e assim adormeces, com um sonho de conforto digno de quem se sente bem na companhia deste povo.

Aquele abraço.